Empresário, tido como prodígio nos negócios, viu seu império
‘X’ ruir
Eike Batista é condenado a 30 anos de prisão por propina a Cabral
Sentença é do juiz Marcelo Bretas, em processo que faz parte da Lava Jato no Rio de Janeiro; também condenado, Cabral passou de 120 anos de penas de prisão
A
condenação do empresário Eike Batista a 30 anos de prisão pelo juiz Marcelo
Bretas — revelada nesta terça-feira pela coluna do
Lauro Jardim, do Globo — é um marco na vida do homem que há apenas
seis anos era o sétimo mais rico do mundo, segundo a
revista Forbes. Ele foi condenado a pagar uma multa de R$ 53
milhões no processo em que o ex-bilionário foi investigado pelo
Ministério Público Federal por corrupção ativa no esquema de propina de Sérgio
Cabral. Eike foi acusado de pagar propina de US$ 16,5 milhões ao ex-governador.
Seu ex-braço-direito e ex-vice-presidente do Flamengo, Flavio Godinho, foi
condenado a 22 anos de prisão
Este é
apenas um dos muitos processos que Eike enfrenta após a construção e derrocada
do Império X — supersticioso, o empresário batizava suas empresas com a letra
“X”, associada à multiplicação de riqueza. No ano passado, ele foi condenado pela
Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pelo uso de informação privilegiada
(insider trading) em processo que investigava venda irregular de
ações da OSX, empresa naval do grupo “X, com uma multa de R$ 21 milhões. Há
ainda vários outros em andamento. Dez anos
antes, era difícil prever que o empresário tido como um prodígio nos negócios —
que construiu companhias em áreas como energia, indústria naval, mineração,
turismo e gastronomia — fosse ver seu império ruir. Em junho de 2008, foi
destaque na reportagem “Gás na Bolsa e R$ 24 bi no bolso”, que noticiava a
estreia da OGX, na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).
Na maior
oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês) realizada no país até então, a
empresa captou R$ 6,7 bilhões. Era a coroação de uma trajetória de pesados
investimentos capitaneados pelo empresário. Em novembro de 2007, a OGX foi
responsável por 74% do total arrecadado pelo governo na 9ª Rodada de leilões da
Agência Nacional do Petróleo (ANP), arrematando 21 blocos.
E tudo terminou na prisão
Dos primeiros passos do grupo X à caminhada de Eike
até a prisão, foram muitos os erros cometidos pelo empresário. Desde o excesso
de otimismo e diversificação nos negócios até as relações suspeitas com
políticos, com acusações de pagamentos de propinas que levaram o ex-bilionário
para atrás das grades.
SUCESSO
COMEÇOU NOS ESPORTES
Em O
GLOBO, a história de Eike ganhou luzes nas páginas de Esportes. Ele colecionou
vitórias em competições náuticas offshore, ainda no início dos anos 1990. Mais
adiante, era descrito em suas empreitadas como filho de Eliezer Batista,
ex-presidente da Vale e ex-ministro de Minas e Energia, morto no início deste mês.
E, com maior destaque, “marido de Luma” (de Oliveira, a ex-modelo), como ele
mesmo gostava de se apresentar.
O império
“X” foi desenhado para ser integrado. Quando buscava investidores para os
projetos de suas empresas, estes eram vendidos como um pacote completo. Se a
estratégia fosse bem-sucedida, o empresário certamente galgaria mais alguns
degraus na lista da revista americana. Nos
tempos de bonança, ele costumava dizer: “Meu objetivo é passar Bill Gates”, que
ocupava o topo do ranking dos mais ricos do mundo. Por outro lado, qualquer
problema em uma das empresas do grupo arrastaria as demais, num efeito dominó
que poderia comprometer todos os negócios. Foi o que acabou acontecendo.
Mesmo
quando a desvalorização das ações de suas empresas já era acentuada, Eike não dava
o braço a torcer. Em entrevista ao GLOBO publicada em agosto de 2011, falou a
célebre frase “Meus ativos são à prova de idiotas”. Perguntado na mesma ocasião
se temia ser rebaixado na lista da “Forbes”, respondeu: “Não, porque todo mundo
vai baixar junto, né? Quando a maré baixa, mademoiselle, os barcos
bonitos, os iates de alto luxo e as canoas baixam”.
APÓS
RECUPERAÇÃO JUDICIAL, SILÊNCIO
E a maré
virou. Mais precisamente em junho de 2012, quando a OGX revisou a produção do
campo Tubarão Azul, na Bacia de Campos, para um quarto do previsto. O campo era
a grande aposta da companhia. As ações da petrolífera desceram ladeira abaixo e
mergulharam as demais empresas numa profunda crise de confiança, que culminou
com o pedido de recuperação judicial da OGX, em outubro de 2013, o maior da
América Latina. O pedido das outras duas empresas — OSX e MMX Sudeste — foi
questão de tempo.
Após a
revisão das estimativas, Eike se calou. Mas continuou a escrever em seu perfil
no Twitter. Algumas dessas mensagens, que pediam “paciência” aos investidores
para enfrentar a crise, foram postadas nos mesmos dias em que o empresário
vendia ações da ex-OGX na Bolsa, como revelou o GLOBO em dezembro de 2013. Ao
usar canais extraoficiais para falar sobre seus negócios, Eike violou a Lei das
Sociedades Anônimas.
A
reportagem deu munição a queixas de pequenos investidores, que se sentiram
lesados com o comportamento do empresário, e embasou investigação da Comissão
de Valores Mobiliários (CVM). O órgão que funciona como o xerife do mercado
financeiro multou Eike em R$ 1,4 milhão por irregularidades em quatro processos
relacionados às companhias OGX (atual OGPar), LLX (hoje Prumo), MPX (agora
Eneva) e CCX. Em setembro de 2014, Eike foi alvo de três denúncias oferecidas
pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPF-RJ) e de São Paulo.
Logo após
se tornar réu no processo, o ex-bilionário quebrou o silêncio que durava quase
um ano e concedeu algumas entrevistas. Ao GLOBO, disse: “Botei do bolso.
Levaram todo o meu patrimônio”. E argumentou ter patrimônio negativo de US$ 1
bilhão. Afirmou ainda ter sido “criado como um jovem de classe média”, quando
perguntado sobre o arresto de seus bens determinado em maio de 2014.
O aperto
no patrimônio se agravou. Em fevereiro de 2016, a Justiça determinou bloqueio
de R$ 1,5 bilhão de Eike e familiares. A Polícia Federal realizou operações de
busca e apreensão na casa do empresário, onde reteve bens como um piano, uma
réplica de ovo Fabergé e seis veículos, incluindo o Lamborghini Aventador que
decorava a sala de estar da casa do criador do grupo “X”, no Jardim Botânico.
Houve
também apreensões na casa do empresário de Angra dos Reis e na casa de Luma de
Oliveira. Os policiais bateram à porta da ex-modelo às 7h30m da manhã. O GLOBO
acompanhou a operação. “Quanta bobagem, né? Fica calma”, sussurrou Eike num
longo abraço com Luma, de acordo com uma testemunha.
JUIZ AO
VOLANTE DO PORSCHE
Com o
episódio do juiz ao volante do Porsche, o magistrado acabou afastado do caso,
por decisão da Corregedoria Nacional de Justiça e também do Tribunal Regional
Federal da 2ª Região (TRF) votando a favor do pedido de afastamento de Flávio
Roberto de Souza, apresentado pela defesa do empresário no fim de 2014. Os
advogados de Eike argumentavam que o juiz perdera a imparcialidade na condução
do caso.
O
processo em que foi condenado agora a 30 anos de prisão trata de um montante de
US$ 16,5 milhões, que foi solicitado por Cabral a Eike Batista em 2010 e, para
dar aparência de legalidade à operação, foi realizado em 2011 um contrato
de fachada entre a empresa Centennial Asset Mining Fuind Llc, holding de Eike,
e a empresa Arcadia Associados, por uma falsa intermediação na compra e venda
de uma mina de ouro. A Arcadia recebeu os valores ilícitos numa conta no
Uruguai, em nome de terceiros mas à disposição de Sérgio Cabral, de acordo
com o MPF.
Eike
Batista, Godinho e Cabral também são suspeitos de terem cometido atos de
obstrução da investigação, porque numa busca e apreensão em endereço
vinculado a Eike em 2015 foram apreendidos extratos que comprovavam a
transferência dos valores ilícitos da conta Golden Rock para a empresa
Arcádia. Na oportunidade os três investigados orientaram os donos da Arcadia
a manterem perante as autoridades a versão de que o contrato de
intermediação seria verdadeiro.
O Globo
O empresário Eike Batista foi condenado a 30 anos de prisão pelo juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, nesta segunda-feira, 2. Na sentença, Eike, condenado pela primeira vez, foi considerado culpado dos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro, por sua participação em um esquema de propinas ao então governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (MDB).
“Trata-se de pessoa que, a despeito de possuir situação financeira abastada, revelou dolo elevado em seu agir. Homem de negócios conhecido mundialmente, e exatamente por isso, suas práticas empresariais criminosas foram potencialmente capazes de contaminar o ambiente de negócios e a reputação do empresariado brasileiro, causando cicatrizes profundas na confiança de investidores e empreendedores que, num passado recente, viam o Brasil como boa opção de investimento”, escreveu o juiz, que também condenou o empresário a pagar uma multa de 53 milhões de reais.
Segundo a sentença, ele pagou 16,5 milhões de dólares (o equivalente a 64,4 milhões de reais pelo câmbio atual) ao esquema criminoso do ex-governador, que contou, segundo Bretas, com Carlos Miranda e Wilson Carlos Cordeiro como operadores, os “homens da mala”. Outra parte dos valores foram “lavados” no escritório de advocacia ao qual era ligada a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo.
Os quatro também foram condenados, junto com Eike e Flávio Godinho, ex-braço-direito do empresário. Cabral foi condenado a 22 anos e 8 meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, chegando a seis condenações em processos da força-tarefa da Operação Lava Jato e uma pena total, até o momento, de 122 anos e 8 meses de prisão.
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