Nos últimos dias, tenho a impressão de que estão enlouquecendo nas
altas esferas do poder e talvez não possamos fazer muito a respeito. No Brasil, o Congresso decidiu aprovar um pacote de benesses que vai nos custar mais R$ 100 bilhões.Considerando nossa crise, isso representa grandes problemas no ano
que vem: falta de recursos, atraso em pagamentos, quebradeira. O interessante é que os candidatos à presidência não protestaram.
Protestar contra a farra de gastos tira votos. E eles dividem o tempo
com muita precisão: uma coisa é o período eleitoral, outra o mandato.
Não percebem que, ao se calarem agora, perdem a possibilidade de
resistir lá na frente. Isso pode significar não só crise política séria,
mas até mesmo impeachment. De qualquer forma, o futuro imediato do Brasil está comprometido por
essas aventuras irresponsáveis. Há pouco o que fazer, exceto votar bem
mas ainda assim por mais que se acerte aqui e ali, o conjunto do
Congresso será assustador. A pesada máquina do atraso continuará esmagando as chances de
crescimento sustentável, renovação política e recuperação da confiança
nacional. Lá fora, a loucura ainda é maior. O Presidente dos Estados Unidos
critica duramente os aliados europeus e vai se prostrar aos pés de um
líder autoritário russo. Essa manobra de Trump, assim como a dos deputados brasileiros, é uma
ação disruptiva. Não usaria o termo subversiva pois ele implica em
alteração da ordem.
O que está acontecendo é apenas algo destinado a bagunçar, criar as bases instáveis para a chegada do caos. Os parlamentares brasileiros querem apenas alguns votos para garantir
sua permanência no poder. Eles já articularam uma reforma que lhes
garante o dinheiro público para disputar as eleições. Insatisfeitos,
cavam o próximo abismo sabendo que dinheiro não lhes faltará. Em último
caso, há sempre o aumento de impostos. O problema é que a sociedade brasileira parece aceitar isso. A
suposição de que o estado pode gastar ilimitadamente ainda é um fato na
cabeça de muitos, mesmo os que não são diretamente interessados em
conquistas corporativas. O que torna a questão mais angustiante ainda: a loucura dos
dirigentes não é apenas um descaminho lógico em suas cabeças mas algo
que tem base na própria tolerância social.
Da mesma forma, o que acontece na conjuntura mundial não revela
apenas um desvario individual. Dizem que os russos têm documentos que
comprometem Trump daí sua subserviência em Helsinque. Creio que a intepretação mais correta passa pelo fascínio que Trump
mostra por governos autoritários. Ao mesmo tempo, ele representa a
democracia mais poderosa do mundo. Muitas coisas estao mudando. Rejeitar os laços culturais e políticos
com uma Europa que sempre foi nossa referência, parece-me tão
iconoclástico para o Ocidente, como os talibãs destruindo estátuas
budistas. De todas as formas é assim que o mundo caminha. Salvaguardas existem
tanto no Brasil como nos Estados Unidos. É sempre possivel atenuar o
estrago. Mas é preciso muita água para apagar um incêndio que vem de cima.
Quando deputados decidem quebrar o país e Trump colocar-se ao lado da
Rússia contra aliados e o próprio serviço inteligência americano,
entramos num espaço mais difícil do que o combate à corrupção e à
incompetência.
Não basta apenas supor que estejam enlouquecendo. É preciso entender
como as sociedades não só convivem como, de certa forma, sustentam essa
loucura. Não se trata de realizar um esforço idealista para afirmar que exista
uma razão inequívoca e ela triunfará sobre os desvarios do poder. Tudo que nos resta é trocar de ilusão na tentativa de nos
aproximarmos um pouco mais da realidade. A ideia de que é possivel
gastar sem limites, no entanto, parece-me um componente de tragédia. Hegel dizia que na tragédia há um conflito entre o certo e o certo.
Muitas vezes, no entanto, ela é apenas o resultado da imprudência
humana.
Blog do Gabeira
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