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quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Jornalistas, não robôs


Para que precisamos de jornalistas?

Sei que muita gente responde com outra pergunta: precisamos?

Mas o fato é que não há como escapar dos jornalistas. Alguém precisa contar o que está acontecendo e os que as pessoas estão achando disso tudo. De maneira que vale a questão: como a imprensa, como nós, jornalistas, exercemos esse papel indispensável, especialmente em um momento eleitoral. Façam as perguntas e deixem a gente falar – é o diriam os candidatos se fossem sinceros.

Mas é também o que muitos eleitores reclamaram, por exemplo, das entrevistas do Jornal Nacional.  (Sim, todas as emissoras estão trabalhando pesado nestas eleições. Mas tomaremos o JN como o caso principal, simplesmente porque suas entrevistas são elas próprias um fato da campanha. Sei que os colegas do JN, como os jornalistas em geral, não gostariam de ser notícia, mas, paciência, faz parte das eleições em um regime democrático. Falar daquelas entrevistas é também, espero, dar uma geral no jornalismo brasileiro do momento eleitoral).

Assim, quais as queixas principais feitas nas mídias?
Primeira: os âncoras não deixam o candidato falar, interrompem demais, voltam toda hora aos mesmos temas.
Ora, se fosse para perguntar e ficar ouvindo a resposta, qualquer que fosse, não precisaríamos de jornalistas. Bastariam robôs. O papel do jornalista é justamente o de intervir, questionar uma resposta insatisfatória, relacionar a fala do momento com comentários passados e com atitudes do candidato. [o que complica a definição do papel do jornalista é que eles não questionam apenas as respostas que possam considerar insatisfatória, eles sempre tentam impedir que o entrevistado (especialmente quando se trata de Bolsonaro ou mesmo do Alckmin) explique um ponto que começou a ser respondido, o jornalista, digamos, não gostou da resposta - ou do ruma da prosa - tenta desviar o assunto.
Inclusive, na entrevista de Bolsonaro ao JN, a forma encontrada pelo candidato para se defender da pergunta/acusação apresentada pelo entrevistador (que parecia mais um investigador) foi não se calar diante das interrupções e conseguiu explicar um pouco, diminuindo a força da pergunta /acusação e inibiu o entrevistador de adotar a medida extrema: cortar o microfone.]

 
Se não for assim, a coisa fica como aqueles debates cercados por regras impostas pelos políticos. Um pergunta sobre a previdência, o outro fala do gasto com pessoal, o primeiro replica com segurança e a tréplica vai para a educação. Tudo com tempo cronometrado e sem possibilidade de alguém dizer e insistir: ei! Não se trata disso!   De todo modo, o candidato e seus simpatizantes não gostam quando o jornalista intervém, mas adoram quando isso acontece com os adversários. 

Segunda queixa: os âncoras parecem inquisidores.
Exagerado. Inquisidores, isso lembra tortura, violência – e não se pode dizer isso de âncoras tão educados. Mas se considerarmos inquisição uma técnica para extrair do entrevistado algo que ele não gostaria de expor, então vá lá. 

Terceira queixa: os âncoras só falam do passado do candidato, do que falou, fez ou deixou de fazer, em vez de perguntar sobre propostas para o futuro.
Ora, como um candidato pode propor algo que contraria seu comportamento e opiniões anteriores? Claro, ele pode dizer que mudou seu ponto de vista e tentar explicar por que fez isso – assim como o âncora pode insistir no tema o quanto quiser. [a insistência exagerada pode induzir quem assiste a pensar que o entrevistado não mudou seu ponto de vista (aquele que a insistência do âncora deixa a impressão de que era algo ruim para o Brasil) e com isso o prejudicado, pela pressão indevida do 'inquidiro', é o candidato.]
 
Quarta: a entrevista deve servir para o candidato mostrar suas propostas.
Aí fica fácil demais. Sabem qual o tipo de pergunta que o candidato mais gosta? Assim: tantas mulheres são assassinadas por dia; isso é um absurdo; qual a sua proposta?
Jornalismo é diferente de propaganda. Nesta, o candidato fala o que quiser. Para o jornalista, porém, informar o público não é simplesmente relatar as propostas, mas explicar o que significam, sua viabilidade, suas falhas.

Quinta queixa: os âncoras brigaram com os entrevistados, num clima de disputa eleitoral, como se fossem eles candidatos ou donos da verdade.
Ora, não são candidatos a nada, a não ser entregar o serviço que se espera deles. O ambiente da entrevista depende do candidato. Nunca tem briga com Marina, Alckmin, Haddad ou Lula. São espertos, mesmo quando apanhados em equívocos. Seguem a velha regra: não há perguntas inconvenientes, há respostas inconvenientes. Mas quase sempre tem briga com Bolsonaro ou com Ciro. Aliás, o comentário era de que Ciro estava muito calmo no JN. Treinou.

Também os jornalistas não se julgam nem são donos da verdade. Mas baseiam as perguntas em inúmeras pesquisas e investigações, checadas e rechecadas. E, finalmente, quem julga tudo é o público, antes, durante e depois das eleições. E o público pode não saber definir, mas reconhece quando encontra jornalismo independente. E dá sua audiência.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

 

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