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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

O guarda da esquina

O guarda da esquina

Haverá retrocessos, mas não consigo ver o Congresso fechado ou o Supremo calado. Qual general daria um golpe para manter um capitão?

A frase é atribuída ao ex-vice-presidente Pedro Aleixo e teria sido dita durante a reunião em que o general-presidente Costa e Silva assinou o AI-5, o ato institucional que consolidou a ditadura no Brasil, no dia 13 de dezembro de 1968. Questionado se duvidava das mãos honradas do presidente, que seria o único juiz da aplicação do ato, o vice-presidente civil respondeu: “Das mãos honradas do presidente Costa e Silva, jamais. Desconfio é do guarda da esquina.” Pedro Aleixo queria dizer que o perigo da ditadura estava no poder que se assentava nas mãos de uma escala de autoridades que descendia do presidente da República até o guarda que vigia a rua.

Claro que os presidentes que governaram sob o AI-5 usaram o poder conferido pelo ato para fechar o Congresso, cassar mandatos políticos, suspender direitos civis e adotar medidas sem qualquer tipo de consulta ao povo ou aos seus representantes, mas foram os “guardas da esquina” que abusaram. Foram oficiais e praças das Forças Armadas e das PMs, delegados e agentes das polícias Federal e Civil que fizeram prisões ilegais, sequestraram, torturaram e mataram aqueles que, ao seu juízo, eram inimigos do regime. Também muitos civis, sádicos e simpatizantes, transformaram-se em algozes e participaram da barbárie que durou mais tempo do que o próprio ato.

Hoje, no Brasil, o discurso original de Jair Bolsonaro, o candidato que tem mais chances de ganhara eleição e se eleger presidente do Brasil, incita novos “guardas da esquina”. Por ora, os empoderados pelo seu grito de guerra são em sua maioria civis, jovens, muitos de classe média, que se sentem encorajados e agridem qualquer um que pense de modo distinto do seu. Ofensas pessoais no Brasil não assustam ninguém desde que o “nós contra eles” foi inaugurado pelo ex-presidente Lula. O problema é quando as ofensas se transformam em atos.

O ódio e a intolerância que tomaram o Brasil durante o processo de impeachment da ex-presidente Dilma, separando petistas e antipetistas, ganharam carga explosiva quando Bolsonaro passou a representar o anti-PT. Até então, o máximo que se via eram ofensas nas redes sociais, alguns bate-bocas públicos, coros e vaias em shows musicais e legítimas manifestações de rua. Agora, estamos assistindo a uma escalada de violência que já resultou em inúmeras agressões físicas e pelo menos numa morte, a do capoeirista Mestre Moado Katendê, na Bahia. [o único vínculo que liga o assassino ao capitão Bolsonaro é que o homicida vestia uma camisa com publicidade da candidatura de Jair Bolsonaro, que milhões de brasileiros vestem.
Se qualquer um deles praticar um ato criminoso vestindo uma camisa do Bolsonaro, é lícito, honesto, legal, tentar responsabilizar Bolsonaro?
Outro vínculo liga a vítima ao capitão, qual seja: Bolsonaro foi vítima de covarde agressão a faca e graças a DEUS conseguiu sobreviver - embora ainda convalesça das cirurgias que sofreu.] 
 
O capoeirista, que votou em Haddad, foi morto com 12 facadas por um eleitor de Bolsonaro depois de uma discussão política. No Paraná, um estudante foi espancado por um grupo de dez homens porque usava um boné do MST. [o MST é autor contumaz de covardes atentados, tanto o próprio MST - chamado pelo presidiário Lula de 'exército de Stédile' - quanto seu braço Via Campesina.]  O nível de agressividade tem tudo para extrapolar para além da campanha se Bolsonaro não desautorizar imediatamente e de maneira categórica os que intimidam e agridem pessoas na defesa de seu nome, e que são minoria. Depois da morte de Mestre Moa, o candidato apenas lamentou o episódio e indagou: “um cara com uma camisa minha comete lá um excesso, o que eu tenho com isso?”. [Bolsonaro não só desautorizou qualquer agressão aos que não votaram nele, como também aconselhou tais agressores a votarem em Haddad ou em brando e nulo.]
 
Não foi excesso, candidato, foi assassinato. E outros ocorrerão durante e depois da campanha se nada for feito já. Jornalistas, artistas, ativistas são agredidos diariamente nas redes sociais por eleitores inconformados com a crítica ou o contraditório. Mas isso já víamos no Fla-Flu de coxinhas e mortadelas, a novidade é que agora também são ameaçados de estupro, tortura e morte. Intimidação é a nova regra. Até mesmo candidatos a governador que disputam o segundo turno recorrem ao expediente. O clima é de truculência.

Não acredito que Bolsonaro, eleito, seja uma ameaça à democracia. Os pesos e contrapesos da sociedade organizada no Brasil devem impedir qualquer aventura. Mesmo que consiga atrair a maioria parlamentar, não conseguirá avançar sobre as instituições de maneira a mudá-las ou mutilá-las. O Brasil ficará mais conservador sob uma gestão de Bolsonaro. Haverá retrocessos em conquistas civis, mas não consigo ver o Congresso fechado ou o Supremo calado. Qual general daria um golpe de estado para manter um capitão no poder? O que está claro é que, se Bolsonaro não der um basta agora, veremos muitas cenas de violência nas ruas das cidades.

Ascânio Seleme - O Globo


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