Direita no poder: a luta pela agenda liberal será dura, as ideias de alguns ministros são constrangedoras, militares têm sido o poder moderador dentro do governo
Nossa democracia estava capenga, afirmou o ministro da Economia, ao
dizer que só a centro-esquerda havia governado o Brasil. Mas que direita
é essa que chegou agora? Nos muitos discursos e certas decisões da
última semana, o novo rosto do poder começou a ser esboçado. A economia
perseguirá a agenda liberal, o que será uma guerra, na qual o front mais
ingrato será o interno. Em outras áreas, como direitos humanos,
educação e relações exteriores, os ministros mostraram um desconcertante
alheamento da realidade. Os militares nomeados parecem ser a força
moderadora dentro do próprio governo. A agricultura recebeu poderes
indevidos e que levarão a conflitos de interesse.
A democracia pressupõe alternância de grupos e ideias no poder. Até
agora, houve o governo de direita de Fernando Collor, de curta duração e
final infeliz. Depois o pêndulo oscilou entre o centro, tucano, e a
esquerda, petista. Houve uma administração tampão do MDB, que se pode
definir como centro-direita. E agora chega ao poder um governo
assumidamente de direita. No Brasil, os conceitos políticos são bem imprecisos. A esquerda fez
coisas como aumentar as transferências para o capital, ainda que tenha
também ampliado os programas sociais. Vamos entender nos próximos anos o
que realmente significa uma administração de direita no Brasil. Destes
pouquíssimos dias extrai-se pouca informação. O presidente, Jair
Bolsonaro, garantiu que cumprirá promessas de campanha, como a de
liberar a posse de armas.
O ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, surpreendeu favoravelmente anunciando que a Eletrobras será privatizada, o que levou a uma alta de 20% nas ações em um único pregão. Houve também momentos constrangedores. As ideias da ministra Damares sobre divisão de cores por gênero são principalmente infantis, as do ministro Ernesto Araújo, confusas. [os que torcem contra a Damares, tiveram o desprazer de constatar que Luciano Huck, o Global, tem exatamente as mesmas ideias da ministra quanto as cores para uso de meninos e meninas - aqui;
os a favor do quanto pior, melhor, e que queriam e continuam querendo depor o Araújo também constataram que as ideias do ministro Araújo mereceram o apoio do Grupo de Lima.]
O ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, surpreendeu favoravelmente anunciando que a Eletrobras será privatizada, o que levou a uma alta de 20% nas ações em um único pregão. Houve também momentos constrangedores. As ideias da ministra Damares sobre divisão de cores por gênero são principalmente infantis, as do ministro Ernesto Araújo, confusas. [os que torcem contra a Damares, tiveram o desprazer de constatar que Luciano Huck, o Global, tem exatamente as mesmas ideias da ministra quanto as cores para uso de meninos e meninas - aqui;
os a favor do quanto pior, melhor, e que queriam e continuam querendo depor o Araújo também constataram que as ideias do ministro Araújo mereceram o apoio do Grupo de Lima.]
No Ministério da Justiça, o que se tentará é, a partir da experiência da
Lava-Jato, reforçar o arcabouço legal contra a corrupção. Na posse, o
ministro Sérgio Moro explicou que “um juiz de Curitiba pode pouco”. Um
erro de interpretação dos fatos. Foi um juiz em Curitiba, no caso, ele
mesmo, que permitiu, com suas decisões, que a Operação Lava-Jato
alcançasse a dimensão que tem tido na vida nacional. Moro assumiu com
projeto pronto para o combate à corrupção, mas não parece ter propostas
para todos os outros assuntos que agora estão sob seu comando.
Na economia, o ministro Paulo Guedes tem ideias consolidadas. Ele é um
homem de ideias, um pensador. A vida real dentro de um gabinete
ministerial pode ser mais árdua do que ele imaginava. O que fazer diante
de um presidente que anuncia de forma confusa e contraditória pedaços
da “primeira e maior” das reformas econômicas? E quando o presidente
anuncia que subirá o IOF e o secretário da Receita precisa desmentir?
Confusos esses primeiros dias na área econômica.
A hora do espanto foi a do discurso barroco do ministro das Relações
Exteriores. Depois de citações em grego e latim, ele desculpou-se: “Não
conheço tantas línguas antigas assim. Não conheço hitita nem sânscrito”.
O problema do chanceler é respeitar a linguagem diplomática, que requer
mais cuidados do que ele demonstra ter ao falar de outros países. Ele
os escolhe pelo governo que está agora no poder. Elogiou a “nova Itália,
a Polônia, a Hungria”. Demonstra encantamento com Donald Trump. Como
qualquer aluno do Instituto Rio Branco sabe, os governos são
temporários, por isso as relações são entre os países. Ele propõe que o
Itamaraty lute contra a “teofobia”, sem esclarecer o que essa cruzada
contra problema inexistente tem a ver com os interesses do Brasil.
Na reorganização da administração, o governo acabou com o Ministério do
Trabalho, enfraqueceu a Funai e tirou poderes do Ministério do Meio
Ambiente. Tudo isso está dentro do ideário da direita. A redução do
número de ministérios é bem-vinda. O problema é entregar o poder de
demarcar as terras indígenas ao Ministério da Agricultura e transferir o
Serviço Florestal Brasileiro do Meio Ambiente para a Agricultura. Isso
certamente dará muito conflito. Foram apenas as primeiras pinceladas no novo rosto do poder. Seria bom
que as confusões e os delírios desses primeiros dias dessem lugar ao
entendimento da verdadeira natureza dos problemas nacionais.
Míriam Leitão, jornalista - O Globo
Míriam Leitão, jornalista - O Globo
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