A Lava Jato quer muito mais do que o controle de R$ 2,5 bilhões oriundos
do caixa da Petrobras. Quer o poder. Já o detém em parte. O procurador Deltan
Dallagnol, coordenador da Força Tarefa, que conta com muitos porta-vozes na
imprensa, enxerga uma pedra no meio do caminho para ser a última palavra em
matéria de investigação e direito: o STF — ou, ao menos, os ministros que não
dizem "amém" àquilo que ele determina. Neste domingo, o ataque ao
tribunal ultrapassou a linha da divergência ou da contestação. Em sua coluna no
jornal O Globo, o jornalista Bernardo Mello Franco publica uma espécie de
exortação à depredação do Supremo caso este não vote de acordo com a pretensão
de alguns grupos de pressão. Lá está escrito: "De um ministro que ficou
vencido na quinta-feira, quando a Corte despachou para a Justiça Eleitoral
processos contra políticos acusados de caixa dois e corrupção: 'Se depois disso
a gente ainda derrubar a prisão em segunda instância, vão depredar o prédio do
Supremo.
E eu sou capaz de sair para jogar pedra também'". Dallagnol não
teve dúvida. No Twitter, reproduziu, em tom de assentimento, a espantosa
irresponsabilidade que vai no jornal, especialmente porque sem autoria. Em nota
enviada ao Globo, Dias Toffoli, presidente da Casa, repudiou a ameaça e nega
que um dos ministros seja o autor de tamanha estupidez. Já chego lá. Antes,
algumas considerações. A imprensa é hoje
um dos principais alvos do poder de turno e de seus esbirros. Vejam o caso de
Olavo de Carvalho, aquele senhor que se diz "filósofo e professor".
Segundo diz, jornalistas são consumidores de drogas interessados em depor Jair
Bolsonaro. Mas nem os fascistoides de plantão sugeriram, até agora, depredar
veículos de comunicação. Aliás, note-se que o MBL (Movimento Brasil Livre)
nasceu, segundo seus integrantes, como reação a grupos de esquerda que tentaram
invadir a Editora Abril em novembro de 2014, inconformados com uma reportagem
publicada pela "Veja".
A
propósito: é aceitável que alguém ameace depredar o prédio do Globo caso o
jornal publique alguma coisa que não seja do seu agrado?
Faz sentido dar curso
a uma espécie de exortação anônima dessa natureza, cuja origem seria um
ministro do Supremo?
Chegamos, então, a esse ponto? As ameaças ao tribunal se
multiplicam nas redes sociais, vão muito além do direito à liberdade de
expressão, e algumas incitam a agressão física aos ministros.
A se dar crédito ao que escreve o jornalista, o membro da Corte que se
dispõe a atirar pedras no próprio tribunal é um dos que foram vencidos no caso
do não fatiamento dos processos que envolvem crime eleitoral, a saber: Carmen
Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux, Rosa Weber e Roberto Barroso. Não estamos diante
de uma opinião polêmica vazada em off. A coisa é mais séria. Se o jornalista
não mentiu em coisa de tamanha gravidade, um desses cinco está flertando com o
ataque criminoso ao tribunal, endossando as ameaças que estão em curso e ainda
se dispondo a jogar a sua própria pedra. Que cada um deles emita a sua própria
nota de repúdio, ora bolas! Ou todos permanecerão como suspeitos. Caso o
tribunal venha a ser atacado, tornam-se corresponsáveis morais pelo crime. É
simples. Depois de ter dado curso à ameaça e percebido que, mais uma vez,
ultrapassou a linha, Dallagnol voltou ao Twitter para escrever: "As
instituições democráticas devem ser respeitadas.
Contudo, podem ser criticadas
mesmo duramente. Liberdade de expressão é igualmente importante p/ democracia.
A manifestação do ministro é evidentemente uma metáfora do seu descontentamento
com os rumos que a Corte está seguindo".
Dallagnol é ruim em direito e também em linguagem. Não sabe o que é
metáfora. Essa figura de linguagem consiste em se empregar uma palavra em lugar
de outra em razão de uma contiguidade de sentido que há entre elas. A
propósito: tanto "depredar" quer dizer "depredar" que o
suposto ministro fala, em seguida, em pegar a sua própria "pedra"
para atacar o tribunal. Em sendo metáfora, vai adiante, então, numa construção
alegórica que aponta para a destruição do STF. Eis o ponto: tal ministro,
então, mesmo na hipótese metafórica, se oferece para ajudar a pôr abaixo a sede
do Poder Judiciário. A propósito: caso você se desentenda com alguém, leitor,
ameace quebrar a cara do oponente. Se ele acusar violência, diga tratar-se de
uma metáfora. Explique que você apenas estava querendo dizer que iria contraditá-lo
com muita firmeza.
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