No
mensalão, o Supremo Tribunal Federal despertou no brasileiro uma mania de
Justiça. Os magistrados granjearam prestígio social inédito ao demonstrar que
não há reforma política mais eficaz do que a remessa dos ladrões para a cadeia.
No petrolão, um pedaço da Suprema Corte acalenta a ideia de abrir as celas num
julgamento marcado para 10 de abril. Se isso acontecer, o Judiciário tende a
ficar tão queimado quanto a banda devassa do Legislativo e do Executivo. Com
uma diferença: a toga pula na fogueira voluntariamente.
Nenhum
cidadão no mundo recebe mais informações jurídicas do que o brasileiro. Basta
passar na frente de um telejornal antes da novela para ser atropelado pelo
noticiário sobre roubos, inquéritos, denúncias, ações penais, sentenças,
embargos e habeas corpus. A maioria dos patrícios entende de leis apenas o
suficiente para saber que precisaria compreender muito mais. Entretanto, a
superexposição à TV Justiça, reproduzida por emissoras comerciais, desenvolveu
na plateia habilidades que evitam confundir magistrados certos com certos
magistrados.
A histórica decisão em que o Supremo autorizou o encarceramento de
corruptos condenados em segunda instância já foi confirmada uma, duas, três,
quatro vezes. Na decisão mais recente, a tranca prevaleceu por 6 votos a 5.
Como certos magistrados mudaram de posição, não são negligenciáveis as chances
de uma reviravolta. Não importa que o placar seja apertado. Dependendo do
resultado, 54,5% dos ministros do Supremo (6) darão aos outros 45,5% uma
péssima reputação.
Deve-se o sucesso da Lava Jato a três fatores: Um, o risco de cana
tornou o roubo uma atividade arriscada; dois, a antecipação do cumprimento da
pena para a segunda instância estimulou as delações; três, a loquacidade dos
corruptores deixou nus os corruptos. Ao oferecer à bandidagem a doce impunidade
da Justiça Eleitoral, o Supremo reduziu a uma taxa próxima de zero o risco de o
assalto ao erário terminar em castigo. Abrindo as celas, a Corte restabelecerá
aquele cenário em que a concretização da justiça é um momento infinito. Com a
perspectiva de recorrer em liberdade até a prescrição dos crimes, apenas os
bobos cogitariam delatar.
A aversão
ao Supremo cresce porque a explosão de escândalos de corrupção, um se
sobrepondo ao outro, despertou no brasileiro uma fome de justiça. A mulher já
não apanha do marido calada, não tolera o assédio e se queixa da discriminação
salarial. O consumidor não suporta ser passado para trás. O eleitor comete
erros diferentes. E o contribuinte em dia com suas obrigações fiscais já se deu
conta de que a corrupção mata literalmente na fila do hospital e
metaforicamente nas escolas que nada ensinam.
Cogita-se
a abertura das celas num instante em que aguardam na fila por uma condenação
pessoas como Aécio Neves e Michel Temer, amigos de Gilmar Mendes. E sonha com a
reconquista do meio-fio um personagem como Lula, amigo de Ricardo Lewandowski e
ex-superior hierárquico de Dias Toffoli. Antes do mensalão, a oligarquia
política e empresarial do país achava que nenhuma ilegalidade justificava a
incivilidade de uma reprimenda. Depois do petrolão, o país se deu conta de que
o problema das prisões não era a superlotação de pobres e pardos. O que
envergonhava a nação era a ausência de bandidos de grife atrás das grades.
Se
modificar a regra sobre prisão, o Supremo Tribunal Federal vai virar carvão
antes de conseguir assar as primeiras pizzas. Dias Toffoli, o presidente da
Corte, fez muito bem em abrir por conta própria um processo para identificar e
punir os detratores da Corte. São intoleráveis os sujeitos que sistematicamente
desmoralizam o Supremo, jogando a opinião pública contra o tribunal. O problema
é que, infelizmente, os que fazem isso vestem toga e dão expediente na última
instância do Judiciário, o que dificulta a punição.
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