AOS ELEITORES DE BOLSONARO - Percival Puggina
O ano de 2020 começou para todos os brasileiros com uma
convergência de infortúnios. Uma assustadora pandemia. Uma crise de
governabilidade (o governo se recusou a comprar maioria parlamentar).
Uma crise econômica e fiscal (quase sem recursos disponíveis para
atender demandas súbitas e urgentes da sociedade, que empobrece a cada
volta do relógio, o governo precisou criar um “orçamento de guerra”).
Uma crise na comunicação entre o governo e a sociedade (“filtrada” pelo
partido da mídia, que tem o objetivo explícito de desestabilizar o
governo). É dentro desses e de outros contextos que os cidadãos são
chamados a tomar posição.
A grande mídia, desde a campanha
eleitoral, nunca teve outro inimigo além do Bolsonaro. A palavra
“governo”, por exemplo, é usada de modo a tornar impessoal e sem crédito
a ninguém tudo que vai bem, enquanto as palavras Presidente ou
Bolsonaro são o cabide para pendurar o que vai mal. Essa tarefa do
partido da mídia está facilitada pelo encarceramento da sociedade e o
desencarceramento dos criminosos. Pelos mesmos motivos epidemiológicos –
valha-me Deus! – que nos prende em casa, os bandidos são soltos. Sem
poder sair à rua, sem trabalho, sem futebol e sem alternativa, nunca
como nestes dias os brasileiros viraram audiência cativa e
disponibilizaram tanto de seu tempo para os fazedores de cabeça dos
grandes veículos atacarem infatigavelmente o governo por todos os
flancos. A contínua exposição a esse bombardeio testa a resistência do
alvo.
Visivelmente, o presidente optou, desde o início, por
servir otimismo à nação. Com o clima psicológico nacional oscilando
entre o purgatório e o inferno, Bolsonaro preferiu conferir à população
um ânimo positivo, de confiança. Vamos sair dessa, vamos sanar os
enfermos, vamos resguardar nossas crianças e nossos idosos e vamos
repor, gradualmente, normalidade às nossas vidas. Vamos trabalhar e
produzir nosso sustento.
É um discurso que espantaria a crise,
espantaria os urubus, espantaria quantos fizeram e ainda fazem volumosas
apostas no caos porque precisam da hecatombe universal. Quem cria o
caos não pode admitir que algum irresponsável atravanque o caminho para
acabar com ele recitando nomes de remédios. O caos estava garantido e
bem desenhadinho com borra de café no fundo da xícara, ora essa! Como
identificou há poucas horas o prof. Alex Pipkin, num artigo que postei
no meu blog, ninguém tem condições de testemunhar juramentado sobre onde
está a verdade. Não há como saber e não creio que alguém possa
apresentar evidência ou comprovar alguma hipótese tecnicamente aplicável
ao perfil geográfico, climático e demográfico do Brasil. A própria
existência de um ponto médio entre a crise médico-epidemiológica e a
crise econômico-fiscal é de existência presumível, mas incerta. É a tese
que levará Bolsonaro ao inferno ou ao paraíso.
Duas certezas,
porém, estão servidas em dose satisfatória pelo partido da mídia, sem
necessidade de prescrição, dúzias de vezes ao dia. Primeira, quem
pretende transformar Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre, o Congresso, o STF,
em respeitáveis referências nacionais não convence ninguém. Está lelé e a
mãe não sabe. Segunda, quem disser que o Presidente está se
desestabilizando por conta própria, o que é verdade frequente, deduzindo
daí que seus oponentes estejam a consolidar suas posições, não entendeu
o ano de 2018, nem percebeu para onde convergem os mais consistentes
anseios e rejeições dos eleitores brasileiros.
Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é
arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país.
Autor de Crônicas
contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A
Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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