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segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Palpite suspeito, Constituição de 88 (e Rêgo Barros) - por Vitor Hugo

Blog do Noblat

O deputado abusou da inteligência do país 

Transição de outubro para novembro de 2020 – o tempo mais sombrio e desesperador de que tenho lembrança – é quando começa, nas redações dos jornais e revistas, nos sites, blogs e outros portos de informações nas redes sociais, o levantamento de dados e fatos que os 12 meses do calendário legaram ou nos tragaram, para o bem ou para o mal. Desde já, peço espaço para indicação do “palpite mais infeliz e suspeito do ano”, da lavra do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP/PR), representante destacado do Centrão no nosso parlamento.

Misturando alhos com bugalhos, a começar por comparar a mobilização democrática da sociedade chilena pela Constituinte (que joga no merecido lixo da história, a Constituição herdada da ditadura de Augusto Pinochet), com a Constituição brasileira de 1988: nascida da Assembleia Nacional Constituinte depois do fim da ditadura militar. O deputado abusou da inteligência do país e da paciência de qualificados juristas e políticos que reagiram, sem meias palavras, à proposta golpista embutida na sugestão feita durante debate promovido pela Academia Brasileira de Direito Constitucional. Pois é!

Partindo de achismo pessoal, de que “o Brasil está ingovernável”, Barros propôs saída à chilena. “Para que possamos refazer a carta magna e escrever muitas vezes nela a palavra “deveres”, porque a nossa carta só tem direitos”, justificou. E recebeu o primeiro “chega prá lá” na lata, dentro do próprio evento – denominado “Um dia pela Democracia” – na voz do ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (e presidente do TSE). Ele assinalou que o Brasil tem uma democracia “bastante resiliente, que vive sob a Constituição de 1988, há 32 anos recém completados”. Para o jurista, além de qualquer retórica, nós temos as instituições sólidas, que têm resistido aos constantes vendavais.[uma 'constituição' em que o presidente da República = Poder Executivo = não governa, o Congresso Nacional = Poder Legislativo = não legisla e o Supremo Tribunal Federal = instância máxima do Poder Judiciário = julga, governa, legisla, investiga, denuncia.

Um único ministro do STF pode em decisão monocrática suspender a vigência de uma lei - que foi decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República.

Com um detalhe: a decisão solitária do supremo ministro só será modificada por decisão do colegiado do STF, quando apreciar o mérito da liminar solitária. Porém, quem decide quando a liminar será apreciada é o próprio ministro.]

Outra reação expressiva partiu da política. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ) frisou: No Brasil, o marco final do processo de redemocratização foi a Constituição de 88. “No Chile esse processo não se concluiu até hoje”, disse Maia, que conhece as duas realidades e considera imprópria a comparação. Com visão estratégica e objetiva, dos fatos, o ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, foi direto ao ponto. Em mensagem na rede social, o ex-juiz condutor da Lava Jato escreveu: “O que dificultou a governabilidade do Brasil nos últimos anos foi a corrupção desenfreada e a irresponsabilidade fiscal, não a Constituição de 1988 nem a Justiça ou o Ministério Público”. Ponto.

Para o jornalista, porém, o alerta amarelo parece acender, de fato, com o texto do general Otávio Rêgo Barros, rompendo em ressonante estilo com Bolsonaro e seu governo, publicado no Correio Brasiliense. Mesmo que, aparentemente, não tenha relação direta com a proposta da “nova constituinte” do bolso do colete do parlamentar do Centrão. Em sua análise do governo, o ex – porta-voz escreve: “As demais instituições dessa república – parte da tríade do poder – precisarão blindar-se contra atos indecorosos, desalinhados do interesses da sociedade, que advirão como decisões do “imperador imortal”. Deverão ser firmes, não recuar diante das pressões. A imprensa, sempre ela, deve fortalecer-se na ética para o cumprimento de seu papel de informar, esclarecendo a população os pontos de fragilidade e os de potencialidade nos atos do Cesar”. Precisa desenhar? [o ministro foi eloquente e suas palavras se sustentam parcialmente  na teimosia do presidente Bolsonaro em conceder 'entrevistas de corredor', 'conversas de cercadinho';

O presidente Bolsonaro, em teimosia extrema, insiste em não seguir o protocolo ideal: 
-  só se manifestar através de um porta-voz;
- entrevistas só em circunstâncias excepcionais - a juízo do presidente da República - com perguntas apresentadas previamente,  por escrito e, exclusivamente, a jornalistas credenciados.] 

Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - VEJA

 E-mail: vitors.h@uol.com.br  - Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta.



quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Como a Carta de 1988, a Constituição do atraso, inviabiliza o desenvolvimento do país

Selma Santa Cruz

As distribuidoras de energia têm o direito de suspender o fornecimento do serviço a clientes inadimplentes durante os fins de semana?
 Os bancos do Estado de Santa Catarina devem ser obrigados a implantar sistemas de segurança
 Determinada obra de infraestrutura contestada pelo Ministério Público poderá ser retomada? 
E a delação premiada do corrupto da vez, será ou não homologada? 
O país já se habituou a depender das deliberações da Justiça para resolver praticamente qualquer assunto. Questões mais comezinhas até as que acarretam desdobramentos políticos ou econômicos relevantes, como mostram os exemplos acima, estiveram na pauta do Supremo Tribunal Federal nas últimas semanas. Embora já não cause espanto, em meio a tantos descalabros do nosso ordenamento jurídico institucional, esta é apenas uma das inúmeras consequências perversas da Constituição de 1988, que completa 32 anos neste mês e está na origem de boa parte das mazelas nacionais.

Por seu feitio exageradamente minucioso e dirigista, cujo propósito é regular na prática tudo na vida dos cidadãos, ela terminou por criar um ambiente de insegurança jurídica permanente, engessar a economia e dificultar a governabilidade. Além de ter corrompido a democracia, já que o modelo político esquizofrênico que adotou impede a efetiva participação da sociedade nas decisões sobre o país — contribuindo, ao contrário, para perpetuar no poder uma casta oligárquica de políticos profissionais.

Trata-se, portanto, de um aniversário que não mereceria sequer ser lembrado, considerando-se a quase unanimidade de críticas aos defeitos de nascença da Carta, e sobretudo o preço que o país tem pago por eles em termos de atraso econômico, político e social. A menos que se aproveite a data para retomar o debate sobre a necessidade de um arcabouço jurídico alternativo, a partir do diagnóstico dos malefícios provocados pelo atual. O qual tem sido questionado por uma respeitável lista de juristas e economistas praticamente desde sua criação. “Com quimeras e tolices, a Nova República e sua douta Constituinte meteram o povo brasileiro num trem-bala para Bangladânia”, lamentou à época, referindo-se à pobreza de Bangladesh e ao isolamento da então socialista Albânia, o falecido economista Mário Henrique Simonsen (1935-1997), um dos mais brilhantes de sua geração.

Uma Carta dirigista num momento em que países em desenvolvimento se abriam aos mercados globais

De 1988 para cá, à medida que o tempo escancara a gravidade dos equívocos da Carta, a advertência de Simonsen sobre “o risco de se optar pelo atraso”, e sua previsão de que ela poderia “levar o país ao colapso”, reverberam com cada vez mais força. Apenas dois anos depois, em 1990, o título de uma coletânea de artigos de notáveis, Constituição de 88: o Avanço do Retrocesso, reforçou o consenso sobre o espírito retrógrado da Carta, que já nascera provecta e na contramão da história. Pois optava pelo dirigismo estatizante e uma plataforma nacional-desenvolvimentista justamente num momento em que o mundo caminhava na direção oposta.

Sob a liderança de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, os Estados Unidos e o Reino Unido encerravam o longo domínio das políticas keynesianas do pós-guerra para destravar suas economias por meio de privatizações e desregulamentação. Na Ásia, países como Coreia do Sul e Singapura despontavam como “tigres” do crescimento, ao abraçar o livre mercado e abrir-se à globalização. E até os gigantes comunistas começavam a curvar-se aos benefícios do capitalismo, com a liberalização promovida por Mikhail Gorbachev na União Soviética e por Deng Xiaoping na China.

Já o Brasil, apenas dois anos antes do desmoronamento dos regimes comunistas e da Queda do Muro de Berlim, preferiu retomar a agenda esquerdista e populista da década de 1960, multiplicando encargos e benefícios trabalhistas de país rico, fechando-se ao capital estrangeiro, e chegando ao cúmulo de tentar controlar a taxa de juros por força de lei — essa última excrescência só seria abolida uma década e meia mais tarde, em 2003. O pensamento dominante entre os constituintes, como recordou mais tarde o então ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, guiava-se por uma série de “ismos” já então comprovadamente ineficientes: “socialismo, marxismo, estatismo, intervencionismo, patrimonialismo, assistencialismo, corporativismo e garantismo”.

Em retrospecto, parece difícil acreditar que essa Constituição tenha sido saudada como “Constituição Cidadã”, termo criado pelo presidente da Assembleia Constituinte, o falecido deputado Ulysses Guimarães (1916-1992), no estilo laudatório típico da demagogia da época. “Será luz, ainda que lamparina, na noite dos desgraçados”, exagerou ele, abusando da hipérbole. “Será redentor o caminho que penetrar nos bolsões sujos, escuros e ignorados da miséria.” Tratava-se, como se viu mais tarde, de puro ato de ilusionismo, já que não foi possível abolir a miséria nem promover o desenvolvimento apenas com uma vara de condão legiferante, como sonharam os constituintes.

Uma generosa coleção de direitos sociais e econômicos, como se o papel fosse capaz de torná-la realidade

Uma combinação heterogênea de perfis, que incluía artistas de televisão, banqueiros, sindicalistas e ex-guerrilheiros além de lobistas e políticos profissionais, como não poderia deixar de ser —, os eleitos para redigir a nova Constituição espelhavam o ambiente político exacerbado da época, após o Movimento das Diretas Já e o fim do regime militar. Trabalharam, nesse sentido, mais olhando para o passado, visando a contrapor-se à legislação de exceção do período, do que focalizando o futuro, o que exigiria uma visão estratégica, um projeto novo de país.

Em  clima de happening, preferiram ignorar a referência de Cartas Magnas consagradas, a exemplo da norte-americana, que se limitam basicamente às garantias dos direitos civis fundamentais e princípios gerais, a ser transformados em leis à luz das demandas de cada época. A pretexto de inovar, inscreveram minuciosamente no texto uma generosa coleção de direitos sociais e econômicos, como se a Constituição fosse capaz, por si mesma, de torná-la realidade. Embalados pela utopia de resgatar a histórica dívida social brasileira, contudo, esqueceram-se de levar em conta que seria preciso também prover os meios para a concretização desses direitos. O que pressupõe um ambiente de negócios propício ao crescimento econômico, muito diferente daquele desenhado pela Carta, com a infinidade de entraves à atividade empresarial que se conhece.

Tentou-se, em suma, de forma idealista e nada pragmática, criar um Estado de bem-estar social incompatível com a capacidade do país, como reconhece, entre outros, o constitucionalista Gustavo Binenbojm. “O Brasil precisa compreender que levar direitos a sério significa levar o problema da escassez de recursos a sério, o que impõe uma série de escolhas trágicas envolvidas na sua alocação, sem ceder às tentações populistas e à ilusão fiscal.” O resultado foi um calhamaço com 245 artigos e mais de 400 páginasa terceira mais longa Constituição do mundo, segundo o Comparative Constitutions Project, um estudo comparativo de 180 Cartas, ficando atrás apenas das da Índia e da Nigéria.

Para piorar as coisas, o igualmente extenso capítulo tributário criou um intrincado sistema de transferência de recursos da União para Estados e municípios, que ganharam competência para também arrecadar tributos. Como a descentralização das receitas não foi acompanhada por uma diminuição proporcional dos gastos federais, no entanto, o Executivo lançou mão da criação e majoração de alíquotas de tributos não partilhados — as famigeradas “contribuições”. Em decorrência, os brasileiros passaram a carregar o peso de duas camadas de Estado superpostas, como apontou o economista Eduardo Giannetti de Fonseca em outro artigo de título sugestivo sobre a Constituição: “Retrato do fracasso”, publicado em 2013.

Levando em conta que a Carta também impulsionou a proliferação desenfreada e oportunista de municípios, podemos considerar que se trata na verdade de três camadas superpostas. Desde 1990, mais de mil municípios foram criados, na maioria sem condições de bancar as próprias despesas, mas que foram responsáveis por aumentar, só com suas câmaras de vereadores, em pelo menos 200 mil o número de servidores públicos cujo salário é pago pelo contribuinte. Não surpreende que a carga tributária, que era da ordem de 24% do PIB antes da “Constituição Cidadã”, tenha explodido para os cerca de 35% de hoje. A Constituição transformou o Estado brasileiro em um monstro obeso, opressivo e inoperante.

A Constituição transformou a política no país em um negócio empresarial lucrativo

A disposição dos constituintes para invencionices estendeu-se também, e com consequências igualmente deletérias, ao modelo político adotado, um sistema híbrido que mistura características do presidencialismo norte-americano com as do parlamentarismo da tradição europeia. Criou-se o malfadado presidencialismo de coalizão, que dificulta a governabilidade e favorece negociações nem sempre republicanas entre o Legislativo e o Executivo, na conhecida prática do “é dando que se recebe”. Cujo exemplo mais escandaloso foi a compra de votos praticada pelo Partido dos Trabalhadores durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com pagamento aos parlamentares, em forma de mesada e dinheiro vivo, na boca do caixa bancário — o infame Mensalão.

Em paralelo, a Constituição de 88 beneficiou políticos e partidos com tantos privilégios que acabou por transformar a política no país em um negócio empresarial lucrativo, que raramente tem qualquer relação com os interesses da população ou o bem comum. Do voto proporcional — artifício pelo qual a maioria dos brasileiros geralmente não sabe sequer o nome de quem elegeu — à proibição de candidaturas independentes, passando pelo foro privilegiado e pela consolidação do Fundo Partidário, criado durante o regime militar, tudo tem se somado, ao longo das últimas três décadas, para impedir a efetiva  participação e representatividade da sociedade na política. Haja vista o absoluto descaso do Congresso com as demandas de mudanças expressas a partir das manifestações de 2013.

Por essa ótica, a Constituição que nasceu para consagrar a democracia, e cujo mérito inquestionável foi a garantia dos direitos civis fundamentais, hoje é vista, paradoxalmente, como falha também nesse aspecto. Em vez de uma democracia substantiva, fundada na isonomia de direitos e deveres entre todos os cidadãos, e que extrapola portanto a mera realização periódica de eleições, deu origem a uma democracia de fachada, como afirma o jurista Modesto Carvalhosa. “No Brasil, o Estado é hegemônico, não restando à cidadania nenhum papel em nossa construção civilizatória. A sociedade civil é dominada por um Estado que se estruturou para preencher todos os espaços.”

O constitucionalista norte-americano Bruce Ackerman, um dos mais respeitados do mundo e antigo estudioso da legislação brasileira, vê nesse descompasso uma das principais causas da crescente frustração da população com a democracia. E se alinha aos que defendem a convocação de uma nova Assembleia Constituinte. “Uma vez eleitos, os representantes deveriam reconsiderar as decisões-chave da Assembleia de 1988 já que elas, ao longo das décadas, geraram a atual crise de confiança pública”, justificou em artigo recente. Essa é também a proposta de Carvalhosa, que em novembro lançará um projeto de Constituição completo para promover o debate no livro Uma Nova Constituição para o Brasil: de um Ps de Privilégios para uma Nação de Oportunidades.

Seria essa mudança radical do ordenamento jurídico realmente a melhor solução? É fato que os próprios constituintes reconheceram as deficiências de sua criação, já que propuseram a revisão do texto num prazo de cinco anos — uma providência bizarra, visto que cartas constitucionais se pretendem por natureza duradouras. A revisão, contudo, acabou sendo superficial, devido à crise em que o país estava mergulhado em 1993, em função do impeachment do ex-presidente Fernando Collor.  Em vez disso, optou-se por corrigir alguns dos erros mais flagrantes, sobretudo no capítulo da economia, como as restrições ao capital estrangeiro, e por remendos pontuais por meio de emendas. Propostas de mudanças estruturais, por outro lado, vêm sendo seguidamente adiadas, ou desvirtuadas, já que a Constituição se autoblindou, tornando o processo da aprovação de emendas longo e dificultoso.

No momento, parece não haver condições políticas para uma Constituinte, embora o assunto volte à tona com frequência, já tendo sido defendido também à esquerda, pelos ex-presidentes Dilma Rousseff e Lula. Mais recentemente, o presidente do Senado, David Alcolumbre, chegou a aventar essa possibilidade, quase como uma ameaça. Para alguns, como o consultor político Murillo de Aragão, seria mais recomendável aproveitar as crises para avançar nas reformas. Assim como ele, não falta quem alegue que a durabilidade da Constituição de 88, apesar das inúmeras crises que o país atravessou, comprovaria seu valor e resiliência. Para outros, como se viu, a Constituição é ela própria a origem da sucessão de crises.

Seria temerário tentar prever qual caminho prevalecerá. O que parece indiscutível é que o Brasil real no qual vivemos, com sua pesada carga de atribulações, não se parece nem um pouco com aquele idealizado pela Carta de 88. Este talvez seja o argumento definitivo contra ela. “Uma boa Constituição não é suficiente para proporcionar a felicidade de uma nação” resume o constitucionalista francês Guy Carcassonne. “Já a má Constituição pode levar à sua infelicidade.” Parece ser este o nosso caso.

Selma Santa Cruz, colunista - Revista Oeste


quarta-feira, 28 de março de 2018

A se acreditar na denúncia mentirosa do PT, a democracia no Brasil é uma piada; tudo a coloca em risco

Tiros em caravana de Lula e ameaça a Fachin atingem a democracia

Protestar é parte do jogo democrático. Atirar, ameaçar de violência extrema, inaceitável

Se a violência no Rio chega a requerer a intervenção federal, ela avança também em outras regiões. Nada resta a não ser enfrentá-la por todos os meios legais e, tanto quanto isso, impedir que se alastre pelo tecido social.

Neste sentido, é preocupante e potencialmente muito perigosa a coincidência de ser este um momento também de paixões político-partidárias e ideológicas, quando se aproxima uma campanha eleitoral decisiva para o país e com enorme fragmentação de candidatos.
Tiros na caravana de Lula no Sul e ameaças à família do ministro do Supremo Edson Fachin, relator na Corte de processos da Lava-Jato, entre eles um em que o ex-presidente está condenado já em duas instâncias, são atos repulsivos, antidemocráticos. Protestar é parte do jogo democrático. Jogar pedras, um crime. Atirar, ameaçar de violência extrema, inaceitável. [só ao PT, unicamente ao PT, interessa posar de vítima; quadrilheiros contumazes em agressões, resolvem denunciar que caravana escoltada por bandidos inclusive da Via Campesina - destruidores de pesquisas realizadas por instituições federais - foi atacada e de pronto todos acreditam.
Só interessa ao PT juntar ao papel de perseguido político que apregoa aos quatro cantos do Brasil o de vítima de violência.
Quem pregou e continua pregando a violência, fazendo ameaças, é o sentenciado Lula e a presidente do PT, cujo currículo, melhor dizendo, folha corrida, junta à condição de senadora e ré em ação  penal.]
 
Precisam, por óbvio, de rápida e incisiva investigação. O Brasil atravessou boa parcela de seu período republicano sob governos autoritários. Mas já completa 30 anos no estado democrático de direito, cuja pedra fundamental é a Constituição de 88. Estas três décadas são o mais extenso ciclo de equilíbrio institucional da democracia representativa no país. O Brasil tem passado por campanhas disputadas, mas dentro dos marcos legais. Nos desvios, as instituições atuam e restabelecem a legalidade. Inaceitável será que haja algum acidente nesta trajetória, por descaso da sociedade e do próprio Estado.

Editorial - O Globo 
 

quinta-feira, 22 de março de 2018

O silêncio que esse barulho todo esconde

A continuação da privilegiatura é insustentável nos limites da democracia

E de repente, ao tombar o quinto milésimo centésimo vigésimo sexto corpo nas ruas onde, se nada piorar, haverão de cair outros 54.864 homens, mulheres e crianças assassinados antes que 2018 acabe, levantou-se o grito: “Mataram um dos nossos”!
E o mundo veio abaixo!  Os arautos do ódio - de classe, de raça, de gênero e o mais - assumem-se. Não pedem soluções, tratam apenas de justificar a guerra. Todos os demais parecem perdidos. Não há mais fronteira entre fato e versão ou relação entre causa e efeito. As “narrativas” são reafirmadas como conclusão da coleção de fatos que as negam. O escrivão da Polícia Federal que “desviou” a munição que matou Marielle, a mesma com que foi perpetrado o maior massacre da história de São Paulo e aparece em mais meia dúzia de outras cenas de crimes hediondos, “foi preso, mas já está solto”. E “nunca foi expulso da corporação”. Frequenta os mesmos locais de trabalho dos heróis da Lava Jato na única polícia centralizada e com alcance nacional do País.

As armas que dispararam as balas que ele forneceu provavelmente têm origem semelhante, mas, ainda que o barulho todo se tenha justificado pela busca de culpados, um valor mais alto se alevanta. O único culpado identificado permanece intocável. Os parentes de suas vítimas continuam pagando os seus especialíssimos “direitos adquiridos”. E não há dado da realidade que abale a fé cega das nossas televisões e seus especialistas amestrados na capacidade das “autoridades” de fazer decretos sonhados se transformarem em realidade. Elas seguem impávidas martelando por minuto que o “controle de armas” e a centralização de todas as polícias são as soluções finais para a epidemia de crimes que insiste em se alastrar desenfreada pelo País com o mais rígido controle de armas e munições do mundo.

Corre paralela uma cruzada furiosa “contra a maledicência”. Exige-se a criminalização da dissonância. “Coletivos” de “especialistas em democracia digital” (?), chancelados como tal pela imprensa profissional, animam-se a publicar índices de pessoas e de sites proibidos. Redes nacionais de televisão promovem diariamente rituais de execração pública de mensagens privadas. Poetas e jornalistas clamam por censura. Tudo está fora de ordem. A mentira e o autopoliciamento já são condições de sobrevivência e as retratações públicas antes das execuções se vão tornando corriqueiras.

“Por minha culpa, minha máxima culpa, pequei por pensamentos, palavras... e obras.” Velhos hábitos demoram para morrer. Cá estamos de volta à fronteira entre a democracia e a heresia. Quantas vezes a humanidade já apagou essa linha e acabou terrivelmente mal? Os debates nas televisões já começam vencidos. Por trás de cada argumento posto ou omitido esconde-se um privilegiozinho que se quer eterno. O que se propõe nunca é resolver problemas, é, no máximo, impedir que se manifestem os efeitos de não se atacar a causa fundamental que os produz. Vale falar de tudo menos da dispensa da competição, da estabilidade vitalícia no emprego, haja o que houver, dos brasileiros de primeira classe, em plena era da disrupção. A mãe de todos os privilégios. O maior de todos os “foros especiais”. E isso “brifa” todas as tribunas públicas da Nação.

A Constituição de 88 transformou a proteção condicionada às funções de Estado no “direito” de não ser julgado pela qualidade do seu trabalho e a estendeu a todo e qualquer sujeito que, pelo método que for, conseguir enfiar, um dia, um pé dentro das fronteiras do Estado. E, a seguir, “petrificou” sua obra. São 30 anos de impotência absoluta do eleitor e do contribuinte brasileiros antes e depois do ato fugaz de depositar seu voto na urna. São 30 anos de seleção negativa. Tempo bastante para nos acomodarmos, de geração em geração, à discriminação institucionalizada. Tempo bastante para cada casta aprender o seu lugar neste florão da América. De degrau em degrau, chegamos à beira do último. Já não é o governo quem governa. Ele ousou desafiar os privilégios da privilegiatura e, por isso e não mais que isso, foi desconstruído. Decisões negociadas no Congresso Nacional em nome de 144 milhões de votos? Revoguem-se! É outro que ousou ensaiar um voto contrário aos privilégios da privilegiatura!

Quem de fato governa; quem tem a última palavra sobre tudo são as corporações do Estado aparelhadas pelo “ativismo”, não mais “do Judiciário” como um todo, porque já não é preciso tanto, mas da metade + 1 do STF aparelhado pelo lulismo, que é quanto basta no ponto a que chegamos.  Sem a prerrogativa de retomar mandatos e empregos públicos abusados, de rejeitar leis e decretos malcheirosos, de repelir juízes a serviço da injustiça; sem armar o eleitor para empurrar cada ação do “sistema” na direção do interesse coletivo, a conquista de empregos públicos, de mandatos e de governos basta-se a si mesma e tudo o que as urnas decidem é a delimitação de territórios privativos de caça.

Darwin não tem partido nem respeita nível de escolaridade. Só sobrevive quem se adapta. O “concursismo” passa a ser a única alternativa para a servidão e o “aposentadorismo”, o único horizonte para o futuro. Todo brasileiro sabe, até os analfabetos, qual é a diferença entre prender na 2.ª instância ou nunca, entre permitir ou não que ladrões voltem para dentro dos cofres públicos, entre admitir ou não a permanência de criminosos condenados dentro da polícia. A corrupção sistêmica, a servidão tributária, a anemia crônica do Estado, a miséria e a violência de que o Rio de Janeiro é o exemplo paroxístico e Marielle foi mais uma vítima, são mera consequência disso.  A continuação da privilegiatura é insustentável nos limites da democracia e mesmo nos limites muito mais elásticos da nossa pseudodemocracia. Uma das duas terá de acabar, e já. É isso que está em jogo.


Fernão Lara Mesquita, jornalista - O Estado de S. Paulo 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

''Especialistas' e OAB, estão sempre contra a polícia e a favor dos bandidos

Especialistas criticam 'fichamento' de moradores durante operação em favelas

Segundo representante da OAB, medida é controversa 

[agora é só os 'especialistas' - em que são especialistas? -  se reunir à OAB e entrarem com ação junto a um juiz pedindo para prender os militares e libertar algum bandido que tenha sido preso devido o 'fichamento'.
O problema dos que reclamam é que não podem ver um microfone e um repórter e logo querem dar uma opinião - sempre que possível contra as forças da Lei e da Ordem.]
O tipo de abordagem utilizado por fuzileiros navais, na manhã desta sexta-feira, na primeira ação desde que a intervenção federal foi anunciada, dia 16 deste mês, causou polêmica. Os agentes abordavam, aleatoriamente, as moradores das comunidades da Vila Kennedy, da Vila Aliança e da Coreia, na Zona Oeste, e fotografavam seus documentos de identificação. Para o presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB/RJ, Breno Melaragno, a medida é controversa:

— O agente de segurança pode solicitar o documento de identificação, mas fazer esse "fichamento", com foto e questionário, é controverso. Aconteceu em 2013, durante as manifestações, e foi muito polêmico. Não há unanimidade sob o ponto de vista jurídico.

Na ação, os dados e as fotos dos moradores eram enviados à Polícia Civil para um levantamento sobre a ficha criminal das pessoas. Enquanto os fuzileiros obtinham as informações, o morador era obrigado a aguardar. Segundo Melaragno, o ato de reter o cidadão fere seu direito de ir e vir: Reter a pessoa enquanto é feito esse procedimento é ilegal, não está previsto em lei, mas é uma prática muito comum da polícia. Essa medida não está na lei penal, na Constituição, na Garantia da Lei e da Ordem nem no decreto de intervenção - garantiu o presidente da comissão. [a retenção é necessária, já que o retido for bandido será identificado e preso; só é contra o 'fichamento' quem for bandido ou for a favor de bandido.
O Rio atravessa uma situação especial e medidas especiais precisam ser adotadas.]

O coordenador do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria, Daniel Lozoya, considera um "excesso" esse tipo de abordagem dos militares. 

MATÉRIA COMPLETA, clique aqui