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sábado, 20 de fevereiro de 2021

Great Reset’: o desejo de controle - ]Governo Mundial] Revista Oeste

Rodrigo Constantino

A senha para a defesa de um 'governo mundial' está dada. E o método é o autoritarismo 'necessário' exercido por bilionários 'abnegados' e líderes globalistas

Na pandemia atual, muitos ficaram perplexos com o avanço das medidas arbitrárias tomadas por autoridades, sempre em nome da ciência e do bem coletivo. Comércio fechado, lojas impedidas de abrir, uso obrigatório de máscaras e até gente presa por frequentar praia ou praça pública: tudo isso fez com que aqueles com maior apreço pelas liberdades individuais ficassem estarrecidos. Afinal, os países ocidentais não deveriam se transformar em províncias chinesas.

Por trás dessa escalada autoritária estava o uso de entidades supranacionais, como a Organização Mundial da Saúde, para dar respaldo “científico” às decisões arbitrárias desses líderes. Para quem não sabia ainda do que se tratava a ameaça globalista, ela ficou escancarada nessa pandemia. A soberania nacional cede lugar aos burocratas sem rosto e sem voto dessas entidades.

O poder de um Tedros Adhanom, o etíope marxista que comanda a OMS, parece ofuscar aquele de presidentes eleitos. Estamos diante da “tirania dos especialistas”, tecnocratas que nem são exatamente especialistas, mas monopolizam a fala em nome da ciência.  A fim de compreender melhor a mentalidade globalista, fui ler Covid-19: The Great Reset, livro publicado pelo fundador do Fórum de Davos, Klaus Schwab. Cada página exala o desejo inconfesso de controle sobre as vidas alheias. Como alertou Mencken, “o desejo de salvar a humanidade é quase sempre um disfarce para o desejo de controlá-la”.

Vale notar que o livro foi escrito em meados de 2020, bem no meio da tal primeira onda da pandemia, e mesmo assim o autor já fazia previsões alarmistas de mudanças essenciais no estilo de vida ocidental. “A crise mundial desencadeada pela pandemia do coronavírus não tem paralelo na história moderna. Não podemos ser acusados ​​de hipérbole quando dizemos que isso está mergulhando nosso mundo em sua totalidade e cada um de nós individualmente nos tempos mais desafiadores que enfrentamos em gerações”, escreve logo no começo.

Não se trata de hipérbole? Gerações anteriores enfrentaram duas guerras mundiais com dezenas de milhões de mortos, pandemias muito piores, como a gripe espanhola no começo do século 20, e mesmo assim Schwab achou normal rotular essa crise como a mais desafiadora em gerações, isso em junho de 2020? O intuito do livro começa a ficar mais claro ainda nas primeiras páginas, quando Schwab diz que as “linhas de fratura” do mundo são as divisões sociais, a falta de justiça, a ausência de cooperação e o fracasso de uma governança global, que estariam todas expostas como nunca antes. “Um novo mundo emergirá, cujos contornos são para nós imaginarmos e desenharmos”, afirma num claro arroubo autoritário. Todo revolucionário sonhou com um “novo mundo” e com páginas em branco para brincar de desenhá-lo. Não é nada original esse anseio, portanto.

Schwab questiona quando as coisas voltarão ao normal, e responde, sem titubear: nunca! Ele elabora seu raciocínio: “Nada jamais retornará ao sentido ‘quebrado’ de normalidade que prevalecia antes da crise, porque a pandemia do coronavírus marca um ponto de inflexão fundamental em nossa trajetória global”. Alguém poderia dizer que o autor está quase empolgado com a pandemia, torcendo por ela para “consertar” o mundo “quebrado” que tínhamos antes. Seria ele um “pandeminion”, ou um “coronalover”, então?

Sabemos no que resulta o sonho de um mundo sem fronteiras: em gulags na Sibéria

A coisa chega ao ápice da arrogância quando ele diz que podemos até falar em AC/BC, para se referir a antes do coronavírus e depois do coronavírus, marcando a mudança de uma era. A partir de agora teremos uma “nova normal” radicalmente diferente, diz, e passa a comparar com rupturas passadas que fizeram impérios inteiros colapsarem e deixarem de existir. Mas isso não precisa significar receio. Schwab enxerga o céu como o limite para nossas mudanças: “As possibilidades de mudança e a nova ordem resultante são agora ilimitadas ou limitadas apenas pela nossa imaginação”.

E por falar em imaginação… Imagine é a música que vem à mente diante de seus devaneios. O ex-beatle John Lennon também sonhava, afinal, com um mundo sem fronteiras nacionais, sem religião, sem guerras e, claro, sem propriedade privada, todos unidos por um sentimento comunitário lindo e acolhedor. É verdade que ele sonhou isso de sua milionária cobertura em Nova York, mas estava longe de ser o único sonhador. Outros tentaram de fato pôr

Outros tentaram de fato pôr em prática esse sonho, e sabemos como o experimento terminou: em gulags na Sibéria!

A senha para a defesa de um “governo mundial” está dada na obra: “Já que agora estamos no mesmo barco, a humanidade tem que cuidar do barco global como um todo”. E o método é o autoritarismo “necessário”, como diria certo biólogo alçado ao patamar de especialista por nossa imprensa
Schwab usa a mesma fonte capenga adotada pelo biólogo brasileiro, e afirma, em nome da ciência, que, de acordo com um estudo conduzido pelo Imperial College London, bloqueios rigorosos em grande escala impostos em março de 2020 evitaram 3,1 milhões de mortes em 11 países europeus. Ciência, ciência, ciência!
O resumo da ópera é que tudo é sobre o controle de nossa vida, imposto de cima para baixo por tecnocratas e bilionários “abnegados”. 
 Não por acaso os globalistas já misturam deliberadamente o “aquecimento global” — agora rebatizado de “mudanças climáticas” — e a pandemia. Ambos fornecem o pretexto perfeito para uma espécie de governo mundial, atropelando as fronteiras nacionais em nome do combate a uma crise global. E sempre com o respaldo da “ciência”, naturalmente. Quem ousar contestar as diretrizes da OMS ou da ONU será “cancelado” nas redes sociais, acusado de “negacionista”, “obscurantista” ou mesmo “terraplanista” por seus detratores.

É disso que se trata o “Great Reset”, pregado abertamente por globalistas como Klaus Schwab, Justin Trudeau, George Soros, João Doria e tantos outros. Quem repete que tudo não passa de teoria conspiratória de reacionário paranoico está ou agindo de má-fé, ou com preguiça de ir direto à fonte. Basta ler o que os próprios globalistas estão dizendo, afinal de contas!

Leia também “Burocracia: do absurdo ao sinistro”

Rodrigo Constantino, colunista  - Revista Oeste


quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Como a Carta de 1988, a Constituição do atraso, inviabiliza o desenvolvimento do país

Selma Santa Cruz

As distribuidoras de energia têm o direito de suspender o fornecimento do serviço a clientes inadimplentes durante os fins de semana?
 Os bancos do Estado de Santa Catarina devem ser obrigados a implantar sistemas de segurança
 Determinada obra de infraestrutura contestada pelo Ministério Público poderá ser retomada? 
E a delação premiada do corrupto da vez, será ou não homologada? 
O país já se habituou a depender das deliberações da Justiça para resolver praticamente qualquer assunto. Questões mais comezinhas até as que acarretam desdobramentos políticos ou econômicos relevantes, como mostram os exemplos acima, estiveram na pauta do Supremo Tribunal Federal nas últimas semanas. Embora já não cause espanto, em meio a tantos descalabros do nosso ordenamento jurídico institucional, esta é apenas uma das inúmeras consequências perversas da Constituição de 1988, que completa 32 anos neste mês e está na origem de boa parte das mazelas nacionais.

Por seu feitio exageradamente minucioso e dirigista, cujo propósito é regular na prática tudo na vida dos cidadãos, ela terminou por criar um ambiente de insegurança jurídica permanente, engessar a economia e dificultar a governabilidade. Além de ter corrompido a democracia, já que o modelo político esquizofrênico que adotou impede a efetiva participação da sociedade nas decisões sobre o país — contribuindo, ao contrário, para perpetuar no poder uma casta oligárquica de políticos profissionais.

Trata-se, portanto, de um aniversário que não mereceria sequer ser lembrado, considerando-se a quase unanimidade de críticas aos defeitos de nascença da Carta, e sobretudo o preço que o país tem pago por eles em termos de atraso econômico, político e social. A menos que se aproveite a data para retomar o debate sobre a necessidade de um arcabouço jurídico alternativo, a partir do diagnóstico dos malefícios provocados pelo atual. O qual tem sido questionado por uma respeitável lista de juristas e economistas praticamente desde sua criação. “Com quimeras e tolices, a Nova República e sua douta Constituinte meteram o povo brasileiro num trem-bala para Bangladânia”, lamentou à época, referindo-se à pobreza de Bangladesh e ao isolamento da então socialista Albânia, o falecido economista Mário Henrique Simonsen (1935-1997), um dos mais brilhantes de sua geração.

Uma Carta dirigista num momento em que países em desenvolvimento se abriam aos mercados globais

De 1988 para cá, à medida que o tempo escancara a gravidade dos equívocos da Carta, a advertência de Simonsen sobre “o risco de se optar pelo atraso”, e sua previsão de que ela poderia “levar o país ao colapso”, reverberam com cada vez mais força. Apenas dois anos depois, em 1990, o título de uma coletânea de artigos de notáveis, Constituição de 88: o Avanço do Retrocesso, reforçou o consenso sobre o espírito retrógrado da Carta, que já nascera provecta e na contramão da história. Pois optava pelo dirigismo estatizante e uma plataforma nacional-desenvolvimentista justamente num momento em que o mundo caminhava na direção oposta.

Sob a liderança de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, os Estados Unidos e o Reino Unido encerravam o longo domínio das políticas keynesianas do pós-guerra para destravar suas economias por meio de privatizações e desregulamentação. Na Ásia, países como Coreia do Sul e Singapura despontavam como “tigres” do crescimento, ao abraçar o livre mercado e abrir-se à globalização. E até os gigantes comunistas começavam a curvar-se aos benefícios do capitalismo, com a liberalização promovida por Mikhail Gorbachev na União Soviética e por Deng Xiaoping na China.

Já o Brasil, apenas dois anos antes do desmoronamento dos regimes comunistas e da Queda do Muro de Berlim, preferiu retomar a agenda esquerdista e populista da década de 1960, multiplicando encargos e benefícios trabalhistas de país rico, fechando-se ao capital estrangeiro, e chegando ao cúmulo de tentar controlar a taxa de juros por força de lei — essa última excrescência só seria abolida uma década e meia mais tarde, em 2003. O pensamento dominante entre os constituintes, como recordou mais tarde o então ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, guiava-se por uma série de “ismos” já então comprovadamente ineficientes: “socialismo, marxismo, estatismo, intervencionismo, patrimonialismo, assistencialismo, corporativismo e garantismo”.

Em retrospecto, parece difícil acreditar que essa Constituição tenha sido saudada como “Constituição Cidadã”, termo criado pelo presidente da Assembleia Constituinte, o falecido deputado Ulysses Guimarães (1916-1992), no estilo laudatório típico da demagogia da época. “Será luz, ainda que lamparina, na noite dos desgraçados”, exagerou ele, abusando da hipérbole. “Será redentor o caminho que penetrar nos bolsões sujos, escuros e ignorados da miséria.” Tratava-se, como se viu mais tarde, de puro ato de ilusionismo, já que não foi possível abolir a miséria nem promover o desenvolvimento apenas com uma vara de condão legiferante, como sonharam os constituintes.

Uma generosa coleção de direitos sociais e econômicos, como se o papel fosse capaz de torná-la realidade

Uma combinação heterogênea de perfis, que incluía artistas de televisão, banqueiros, sindicalistas e ex-guerrilheiros além de lobistas e políticos profissionais, como não poderia deixar de ser —, os eleitos para redigir a nova Constituição espelhavam o ambiente político exacerbado da época, após o Movimento das Diretas Já e o fim do regime militar. Trabalharam, nesse sentido, mais olhando para o passado, visando a contrapor-se à legislação de exceção do período, do que focalizando o futuro, o que exigiria uma visão estratégica, um projeto novo de país.

Em  clima de happening, preferiram ignorar a referência de Cartas Magnas consagradas, a exemplo da norte-americana, que se limitam basicamente às garantias dos direitos civis fundamentais e princípios gerais, a ser transformados em leis à luz das demandas de cada época. A pretexto de inovar, inscreveram minuciosamente no texto uma generosa coleção de direitos sociais e econômicos, como se a Constituição fosse capaz, por si mesma, de torná-la realidade. Embalados pela utopia de resgatar a histórica dívida social brasileira, contudo, esqueceram-se de levar em conta que seria preciso também prover os meios para a concretização desses direitos. O que pressupõe um ambiente de negócios propício ao crescimento econômico, muito diferente daquele desenhado pela Carta, com a infinidade de entraves à atividade empresarial que se conhece.

Tentou-se, em suma, de forma idealista e nada pragmática, criar um Estado de bem-estar social incompatível com a capacidade do país, como reconhece, entre outros, o constitucionalista Gustavo Binenbojm. “O Brasil precisa compreender que levar direitos a sério significa levar o problema da escassez de recursos a sério, o que impõe uma série de escolhas trágicas envolvidas na sua alocação, sem ceder às tentações populistas e à ilusão fiscal.” O resultado foi um calhamaço com 245 artigos e mais de 400 páginasa terceira mais longa Constituição do mundo, segundo o Comparative Constitutions Project, um estudo comparativo de 180 Cartas, ficando atrás apenas das da Índia e da Nigéria.

Para piorar as coisas, o igualmente extenso capítulo tributário criou um intrincado sistema de transferência de recursos da União para Estados e municípios, que ganharam competência para também arrecadar tributos. Como a descentralização das receitas não foi acompanhada por uma diminuição proporcional dos gastos federais, no entanto, o Executivo lançou mão da criação e majoração de alíquotas de tributos não partilhados — as famigeradas “contribuições”. Em decorrência, os brasileiros passaram a carregar o peso de duas camadas de Estado superpostas, como apontou o economista Eduardo Giannetti de Fonseca em outro artigo de título sugestivo sobre a Constituição: “Retrato do fracasso”, publicado em 2013.

Levando em conta que a Carta também impulsionou a proliferação desenfreada e oportunista de municípios, podemos considerar que se trata na verdade de três camadas superpostas. Desde 1990, mais de mil municípios foram criados, na maioria sem condições de bancar as próprias despesas, mas que foram responsáveis por aumentar, só com suas câmaras de vereadores, em pelo menos 200 mil o número de servidores públicos cujo salário é pago pelo contribuinte. Não surpreende que a carga tributária, que era da ordem de 24% do PIB antes da “Constituição Cidadã”, tenha explodido para os cerca de 35% de hoje. A Constituição transformou o Estado brasileiro em um monstro obeso, opressivo e inoperante.

A Constituição transformou a política no país em um negócio empresarial lucrativo

A disposição dos constituintes para invencionices estendeu-se também, e com consequências igualmente deletérias, ao modelo político adotado, um sistema híbrido que mistura características do presidencialismo norte-americano com as do parlamentarismo da tradição europeia. Criou-se o malfadado presidencialismo de coalizão, que dificulta a governabilidade e favorece negociações nem sempre republicanas entre o Legislativo e o Executivo, na conhecida prática do “é dando que se recebe”. Cujo exemplo mais escandaloso foi a compra de votos praticada pelo Partido dos Trabalhadores durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com pagamento aos parlamentares, em forma de mesada e dinheiro vivo, na boca do caixa bancário — o infame Mensalão.

Em paralelo, a Constituição de 88 beneficiou políticos e partidos com tantos privilégios que acabou por transformar a política no país em um negócio empresarial lucrativo, que raramente tem qualquer relação com os interesses da população ou o bem comum. Do voto proporcional — artifício pelo qual a maioria dos brasileiros geralmente não sabe sequer o nome de quem elegeu — à proibição de candidaturas independentes, passando pelo foro privilegiado e pela consolidação do Fundo Partidário, criado durante o regime militar, tudo tem se somado, ao longo das últimas três décadas, para impedir a efetiva  participação e representatividade da sociedade na política. Haja vista o absoluto descaso do Congresso com as demandas de mudanças expressas a partir das manifestações de 2013.

Por essa ótica, a Constituição que nasceu para consagrar a democracia, e cujo mérito inquestionável foi a garantia dos direitos civis fundamentais, hoje é vista, paradoxalmente, como falha também nesse aspecto. Em vez de uma democracia substantiva, fundada na isonomia de direitos e deveres entre todos os cidadãos, e que extrapola portanto a mera realização periódica de eleições, deu origem a uma democracia de fachada, como afirma o jurista Modesto Carvalhosa. “No Brasil, o Estado é hegemônico, não restando à cidadania nenhum papel em nossa construção civilizatória. A sociedade civil é dominada por um Estado que se estruturou para preencher todos os espaços.”

O constitucionalista norte-americano Bruce Ackerman, um dos mais respeitados do mundo e antigo estudioso da legislação brasileira, vê nesse descompasso uma das principais causas da crescente frustração da população com a democracia. E se alinha aos que defendem a convocação de uma nova Assembleia Constituinte. “Uma vez eleitos, os representantes deveriam reconsiderar as decisões-chave da Assembleia de 1988 já que elas, ao longo das décadas, geraram a atual crise de confiança pública”, justificou em artigo recente. Essa é também a proposta de Carvalhosa, que em novembro lançará um projeto de Constituição completo para promover o debate no livro Uma Nova Constituição para o Brasil: de um Ps de Privilégios para uma Nação de Oportunidades.

Seria essa mudança radical do ordenamento jurídico realmente a melhor solução? É fato que os próprios constituintes reconheceram as deficiências de sua criação, já que propuseram a revisão do texto num prazo de cinco anos — uma providência bizarra, visto que cartas constitucionais se pretendem por natureza duradouras. A revisão, contudo, acabou sendo superficial, devido à crise em que o país estava mergulhado em 1993, em função do impeachment do ex-presidente Fernando Collor.  Em vez disso, optou-se por corrigir alguns dos erros mais flagrantes, sobretudo no capítulo da economia, como as restrições ao capital estrangeiro, e por remendos pontuais por meio de emendas. Propostas de mudanças estruturais, por outro lado, vêm sendo seguidamente adiadas, ou desvirtuadas, já que a Constituição se autoblindou, tornando o processo da aprovação de emendas longo e dificultoso.

No momento, parece não haver condições políticas para uma Constituinte, embora o assunto volte à tona com frequência, já tendo sido defendido também à esquerda, pelos ex-presidentes Dilma Rousseff e Lula. Mais recentemente, o presidente do Senado, David Alcolumbre, chegou a aventar essa possibilidade, quase como uma ameaça. Para alguns, como o consultor político Murillo de Aragão, seria mais recomendável aproveitar as crises para avançar nas reformas. Assim como ele, não falta quem alegue que a durabilidade da Constituição de 88, apesar das inúmeras crises que o país atravessou, comprovaria seu valor e resiliência. Para outros, como se viu, a Constituição é ela própria a origem da sucessão de crises.

Seria temerário tentar prever qual caminho prevalecerá. O que parece indiscutível é que o Brasil real no qual vivemos, com sua pesada carga de atribulações, não se parece nem um pouco com aquele idealizado pela Carta de 88. Este talvez seja o argumento definitivo contra ela. “Uma boa Constituição não é suficiente para proporcionar a felicidade de uma nação” resume o constitucionalista francês Guy Carcassonne. “Já a má Constituição pode levar à sua infelicidade.” Parece ser este o nosso caso.

Selma Santa Cruz, colunista - Revista Oeste


sábado, 18 de julho de 2020

Meu chapa, o genocida - Folha de S. Paulo

 Demétrio Magnoli

Banalizar o genocídio é uma forma de vestir a omissão com os andrajos do radicalismo retórico

Carl Jung escreveu que “contemplar o mal absoluto é uma rara e avassaladora experiência”. Genocídio é Auschwitz, o mal absoluto. Gilmar Mendes não tem o direito moral nem mesmo a pretexto de formular uma crítica urgente, justa e necessáriade mobilizar frivolamente o conceito. Genocídio é a figura histórica e jurídica que tipifica a operação deliberada, conduzida pelo Estado ou por forças em armas, de extermínio físico de uma população singular inteira. Contam-se, no século 20, além do Holocausto, três grandes eventos genocidas: o armênio, o do Camboja e o de Ruanda.

O Tribunal Penal Internacional (TPI), estabelecido para processar crimes contra a humanidade, classificou os massacres de muçulmanos bósnios no enclave de Srebrenica, em 1995, como “intenção de genocídio” e indiciou o ex-presidente sudanês Omar Bashir por crimes de genocídio cometidos na Guerra de Darfur, a partir de 2003. A invocação do crime dos crimes para fazer referência às imposturas do governo Bolsonaro diante da pandemia tem graves implicações filosóficas e práticas.


Filosoficamente, percorre-se a trilha da banalização do mal. Conrado Hübner sugere que o maior dos crimes “libertou-se das amarras do conceito jurídico-penal”, passando “a se referir a ações e omissões difusas que multiplicam a morte em grupos sociais específicos” (Folha, 7/7). Conceitos, porém, não cultivam o hábito de se “libertar” sozinhos, e o TPI continua a exigir a deliberação de extermínio para qualificar o genocídio. Daí, é forçoso concluir que a tentativa de diluir o conceito não passa de um truque de linguagem imerso nas polêmicas ideológicas circunstanciais.

No super-Estado de Oceania, de Orwell, o Partido suprimiu os registros históricos objetivos, fazendo de sua narrativa a fonte exclusiva de informação sobre o mundo exterior. Desse modo, instalou um presente perpétuo, no qual “o inimigo do momento sempre representou o mal absoluto”. A linguagem das redes sociais, que abomina a história, reproduz parcialmente o cenário orwelliano. Nessa moldura, a finalidade da palavra já não é nomear precisamente um fenômeno, mas causar escândalo, gerar comoção instantânea, marcar a ferro o alvo da hora. Nem mesmo juristas, que deviam saber mais, escapam à tentação.

O esporte tem consequências. Prevenindo-se de investigações por crimes de guerra, o governo dos EUA saltou do mero boicote para sanções diplomáticas contra o TPI. Para Trump, nada mais útil que a inundação da corte internacional por denúncias vazias de genocídio, baseadas em “ações e omissões difusas”. A transformação do tribunal em câmara de eco de controvérsias políticas nacionais significaria a desmoralização do instrumento principal de punição do mal absoluto.

Banalizar o genocídio é uma forma de vestir a omissão com os andrajos do radicalismo retórico. Na prática, troca-se a obrigação de abrir processo contra agentes de crimes definidos na lei por falsas exibições de coragem. Se o policial que assassinou George Floyd não fosse denunciado por homicídio qualificado, mas por genocídio, seria certamente absolvido. Quando um juiz da corte suprema aventa o crime maior, de competência do TPI, exime-se do dever de apontar os crimes efetivos do governo, que estão sob a jurisdição do STF. [se eximiu motivado pelo fato da não existência de crimes.]

Os juristas do grupo Prerrogativas alegaram que o ministro do STF limitou-se a manipular o recurso da “hipérbole”. Dias depois de sua manifestação hiperbólica, Gilmar Mendes telefonou para Bolsonaro e, na sequência, para Pazuello, fumando o cachimbo da paz com os supostos agente e cúmplice de genocídio. Ninguém será denunciado à corte de Haia. O governo seguirá, impunemente, violando o direito constitucional à saúde dos cidadãos. Os heróis da resistência já inscreveram seus nomes no panteão das redes sociais.


 Demétrio Magnoli, colunista -Folha de S. Paulo

quarta-feira, 20 de março de 2019

O Supremo fala, mas não quer ouvir

Juízes e procuradores não gostam de contestações fora do ritual dos processos

O presidente do Supremo Tribunal Federal disse que vai "checar" o texto de um artigo do procurador Diogo Castor para decidir se representa contra ele junto ao Conselho Nacional do Ministério Público. Tomara que a checagem desestimule o doutor. Alguns ministros do STF incomodaram-se com as críticas feitas ao tribunal e a outras esferas do Judiciário. No seu artigo, Castor denunciou um "novo golpe à Lava Jato" e em dois momentos mencionou uma "turma do abafa".
Fala de freira, se comparada à oratória de Gilmar Mendes na sessão do STF do dia 14, quando se referiu a procuradores da Lava Jato como "gentalha", "gente desqualificada", "despreparada", "covarde", "gângsteres", "cretinos", "infelizes", e "reles", porque "integram máfias, organizações criminosas". Numa hipérbole, foi além: "força-tarefa é sinônimo de patifaria".
Como já ensinou o próprio Gilmar Mendes, "ninguém se livra de pedrada de doido nem de coice de burro". Apesar de sua rotina empolada, o Supremo Tribunal Federal já ouviu coisas piores. No início do século passado, o ministro Epitácio Pessoa referiu-se em artigos ao seu colega Pedro Lessa como "cavalgadura" e "alimária". Negro, com bigodes de oficial inglês, Lessa seria um "pardavasco alto e corpanzudo, pernóstico e gabola (que) raspa a cabeça para dissimular a carapinha". O próprio Gilmar ouviu poucas e boas: "O senhor é uma mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia", disse-lhe o ministro Luís Roberto Barroso.
Como diria Gilmar Mendes, aqui se trata de discutir os limites da liberdade de expressão. Juízes e procuradores não gostam de contestações fora do ritual dos processos. Quando veem discutidas suas decisões, falhas ou incompetências, buscam a proteção do corporativismo e transformam as críticas em ataques às instituições a que pertencem. Seria mais razoável que cada um recorresse aos tribunais, como devem fazer aquelas pessoas a quem ninguém chama da "excelência".  Pedro Lessa poderia ter processado Epitácio Pessoa pelo que escreveu, ou ainda por ter se aposentado em 1912 por motivo de saúde, aos 47 anos. (Tornou-se presidente da República aos 53 e morreu aos 77.)

A defesa corporativa jogou sobre a mesa do ministro Alexandre de Moraes o que será uma investigação escalafobética para apurar a origem de ataques ao Supremo, inclusive em redes sociais. Sabe-se lá o que será essa investigação. Mais difícil é saber por que os ministros investigam as pedradas que levam, enquanto os outros bípedes ficam na várzea. No caso da checagem das palavras do procurador Castor pode-se argumentar que o Ministério Público está obrigado a respeitar normas disciplinares da corporação. Nesse caso, vem aí um bonito debate para se medir o alcance da liberdade de expressão.
Em tempo: Não vale dizer que os militares não podem falar, pois eles entraram para uma carreira regida pelo rigor da disciplina. Sem disciplina não há organização militar. Com mordaça, não há Judiciário. Noutra instituição regida pela fé e pela disciplina, o papa Francisco quebrou o manto de silêncio que protegia a Cúria Romana e com isso fortaleceu o catolicismo. Já houve tempo em que o Vaticano queimava as pessoas por muito menos.
A catilinária de Gilmar Mendes contra os procuradores da Lava Jato foi um capítulo do debate, assim como artigo de tom conventual do procurador. Calado, Gilmar Mendes faria falta, mas calando-se quem desperta sua ira as coisas pioram. O naufrágio da iniciativa da turma de Curitiba ao tentar criar uma fundação mostrou que a luz do sol continua a ser o melhor detergente.
Elio Gaspari, jornalista - O Globo

terça-feira, 4 de setembro de 2018

PT vai ao STF contra Bolsonaro por vídeo em que ele defende 'fuzilar a petralhada'



Candidato é réu em outras duas ações penais sob acusação de incitar crime de estupro 


O PT entrou com uma notícia crime no STF contra o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e a coligação com PRTB por injúria eleitoral e incitação ao crime por causa de um vídeo em que o candidato defende “fuzilar a petralhada”.
“Vamos fuzilar a petralhada toda aqui do Acre. Vamos botar esses picaretas pra correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem que ir pra lá. Só que lá não tem nem mortadela galera, vão ter que comer é capim mesmo”, disse Bolsonaro em evento.

No documento, protocolado nesta segunda-feira (3), o PT afirma que “por mera divergência política, entende o candidato ser necessário o fuzilamento de toda uma parcela da população, o que representa, a um só tempo, os cometimentos dos crimes de ameaça e incitação ao crime”.
O PT pede para que a notícia de crime seja enviada à Procuradoria-Geral da República para a instauração de procedimento investigatório, visando à denúncia e condenação de Bolsonaro.

[chega ao ridículo a denúncia do PT {o que não surpreende, já que o ridículo e a  cúpula (cabe mais cópula, já que o perda total está tão f ... , tão arrombado,  que parece ter passado por várias cópulas coletivas e sucessivas)  dirigente do perda total, são irmãos siameses} - quando está patente que Bolsonaro fez o comentário em sentido figurado.

As pessoas sérias também tem duvidas  se a denúncia será acolhida pelo STF, pela obviedade da ironia contida no comentário.

A própria defesa do candidato Bolsonaro, abaixo transcrita,  não deixa dúvidas sobre ser o denunciado resultado do uso de uma mera figura de linguagem.]

"Existe a figura de linguagem, hipérbole ..."  "Não vem com esse papinho de mimimi, ... peguei um tripé de um colega de vocês, jornalistas,  simulei uma metralhadora",  disse Bolsonaro.