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domingo, 16 de junho de 2019

Clubismo, silêncio e homofobia: como a torcida se comportou no Morumbi

Clima frio nas arquibancadas refletiu, também, dentro de campo

[Seleção = timinho; a cada dia está menor. A Copa América será mais uma derrota.

Pena que está contaminando  a seleção feminina.]

O Estádio do Morumbi voltou a receber um jogo da seleção brasileira nesta sexta-feira, 14, depois de quase cinco anos. O placar de 3 a 0 registrou uma vitória tranquila do Brasil sobre a Bolívia, na abertura da Copa América. A equipe, como em anos anteriores, não contagiou o público de mais de 47.000 pessoas, que se deteve ao clubismo e só entoou cânticos de incentivo ao time, como o agora consagrado “Brasil olê, olê, olê!”, depois do primeiro gol, aos 5 minutos do segundo tempo. Durante os 90 minutos, o que chamou a atenção foi a apatia do estádio na maior parte do jogo. A falta de empolgação da torcida deixou o jogo ainda mais frio, assim como os jogadores, vaiados na saída para o intervalo.

Apesar do fato de os portões estarem abertos quatro horas antes do início da partida, os torcedores começaram a ocupar as arquibancadas do Morumbi em cima do horário do jogo. Muitos relataram problemas, como ingressos “duplicados”, o que talvez explique o número de torcedores bem abaixo do esperado. A cerimônia de abertura do torneio, movida a fogos de artifício e música, foi o momento que mais prendeu a atenção do público. Com celulares em mãos, registraram boa parte da festa. O novo telão do estádio paulista também contagiou os torcedores com uma espécie de karaokê, focalizando os fãs mais animados, algo muito frequente nas ligas americanas, como na NBA e NFL.

Outro ponto alto foi a execução do hino nacional. Os torcedores presentes ao Morumbi parecem ter memorizado o ritual estabelecido durante a Copa de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 de continuar cantando o hino à capela até o fim, assim como os jogadores da seleção, mesmo após o corte da execução da melodia. Os cantos em uníssono, porém, acabaram por aí. A partir de então, o que prevaleceu foram demonstrações esparsas de clubismo – um grito de “vai Corinthians” aqui, um coro com uns versos do hino do São Paulo ali. A entrada do ex-jogador do Palmeiras Gabriel Jesus na partida provocou algum alvoroço no segundo tempo.

O clubismo também teve destaque durante a apresentação dos jogadores da seleção brasileira. O volante Casemiro e o atacante David Neres, formados pelo São Paulo, foram ovacionados, enquanto o goleiro Cássio e o lateral-direito Fagner, do Corinthians, foram extremamente vaiados. Tite foi tema de indecisão para os torcedores e ficou entre vaias e aplausos. Antes do início da partida, o técnico recebeu incentivos de alguns presentes, mas a manifestação durou menos de dez segundos. O mesmo serviu para o volante Fernandinho, criticado por suas atuações nas últimas duas Copas do Mundo.

Embora silenciosa na maior parte do jogo, uma manifestação destoou pelo lado negativo: a homofobia. Apesar da decisão recente do Superior Tribunal Federal que tornou demonstrações homofóbicas um ato equivalente ao crime de racismo, parte das arquibancadas insistiam em entoar o lamentável coro “Bicha!” a cada tiro de meta cobrado pelo goleiro boliviano Carlos Lampe.

A última reação dos torcedores antes do final da partida foi um suspiro de espanto, aos 42 minutos do segundo tempo, quando o locutor do estádio anunciou os mais de 22 milhões de reais de renda – um recorde dentro para o futebol brasileiro. Apesar do alto valor arrecadado com a venda de ingressos, o público de 47.260 pessoas (o tíquete médio custou incríveis 485 reais) não nem chegou perto dos 60 000 esperados antes do jogo.

Veja

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Marco Aurélio manda soltar pai que ordenou morte da filha; PGR recorre

[Já passa da hora do impeachment de um 'supremo ministro.]


O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), mandou soltar na última quarta-feira, 19, o empresário Renato Grembecki Archilla, condenado a 14 anos de prisão por mandar matar a própria filha. O caso, ocorrido em 2001, ficou conhecido como Crime do Papai Noel, pois o homem contratado para executar a vítima se fantasiou como o bom velhinho. A mulher conseguiu sobreviver.

A decisão do ministro do STF foi dada no mesmo dia em que ele também concedeu liminar para soltar condenados em segunda instância que não tiveram seus casos transitados em julgado, ou seja, que ainda podem recorrer a tribunais superiores. Esta liminar, porém, foi suspensa pelo presidente do STF, Dias Toffoli, no mesmo dia. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu no sábado, 22, da decisão de soltar Archilla. Ela alega que a pena foi considerada transitada em julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e a ordem de soltura foi dada sob a equivocada percepção de que se trataria de execução provisória.

Archilla foi condenado em 2017, pelo Primeiro Tribunal do Júri de São Paulo, à pena de 10 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão, em regime fechado. Após recurso do Ministério Público, a pena foi aumentada para 14 anos. A prisão do empresário, porém, ocorreu apenas no dia 12 deste mês, quando o TJ-SP determinou a certificação do trânsito em julgado, com o argumento de coibir os expedientes protelatórios do condenado. Com isso, mesmo com a possibilidade de recursos em instâncias superiores, para Dodge não há que se falar em execução provisória.

Segundo a procuradora-geral da República, possivelmente a defesa induziu em erro, pois “adota como premissa a existência de uma condenação mutável e de que a ordem de prisão seria para o fim de se promover a execução provisória do julgado”.
A procuradora-geral afirma ainda que o recurso tem como propósito impedir a soltura do empresário, já que “as comunicações da decisão já foram enviadas para os demais juízos vinculados ao caso e o cumprimento indevido da ordem de soltura é premente”. Dodge afirma ainda que o próprio acórdão proferido pelo Tribunal destaca a necessidade do cumprimento da pena em regime fechado, devido à violência e à gravidade do delito praticado.

A ordem de soltura ainda não havia sido cumprida neste domingo, 23. Renato está preso na penitenciária de Parelheiros, zona sul de São Paulo. Para o advogado Santiago Andre Schunck, que defende o empresário a decisão de Marco Aurélio foi acertada. “A condenação de Renato Archilla é um verdadeiro equivoco e a defesa vai provar a sua inocência”, disse. [a defesa teve oportunidade de provar a inocência do seu cliente quando do julgamento pelo Tribunal do Júri, quando da análise do recurso do MP pelo  Tribunal do Júri - ou estamos diante de outro caso similar ao presidiário petista Lula da Silva, o único bandido condenado que tem o  direito de impetrar dezenas e dezenas de recursos?
A propósito o número recorde de processos este ano no STF, é formado em sua maioria por 'habeas corpus', quase sempre julgados de forma monocrática pelos ministros (exceto os do  Lula que tem tratamento especial).
Se forem retirados os apresentados por Lula o número sofrerá apreciável redução.]
Sobre o pedido da PGR para reverter a liminar, Schunk espera não haver urgência a ponto de o STF decidir durante o recesso judiciário, que vai até fevereiro. “Além disso, o fundamento invocado para o seu pedido (da PGR) é o de que já há trânsito em julgado da decisão condenatória proferida pelo TJ-SP, porém, a defesa atacou a certificação do trânsito no HC em que a liminar foi deferida, por entendê-la ilegal e precipitada”, afirmou o advogado.

O caso
O crime aconteceu em 17 de dezembro de 2001. Renata tinha 22 anos quando foi abordada por um homem vestido de Papai Noel em um semáforo no Morumbi, na zona oeste de São Paulo. Ela recebeu três tiros, dois dos quais no rosto, mas sobreviveu.
O pistoleiro era o policial militar José Benedito da Silva, que já havia sido condenado pelo TJ-SP a 13 anos de prisão. Na agenda do policial havia o telefone do avô de Renata e pai de Renato, o fazendeiro Nicolau Archilla Galan, que morreu antes de ser julgado.

A mãe de Renata conheceu seu pai nos anos 1970, no Guarujá, no litoral paulista, e ficou grávida aos 17 anos. A família do rapaz não queria que ele assumisse a paternidade e o casal se separou. A menina estudava no Colégio Sacré Coeur e o rapaz, no Colégio Rio Branco. Com o nascimento de Renata começou um processo que durou 12 anos para que a paternidade da criança fosse reconhecida. Renato, no entanto, nunca quis saber da filha.

MSN


quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Marcelo Odebrecht vai para 'nova prisão' de 3 mil m², no Morumbi



Somente a formalidade impede que o empresário retorne para casa 914 dias após ser preso na Lava Jato

Na próxima terça-feira, dia 19, o empresário Marcelo Odebrecht vai ficar frente a frente com o juiz de execução penal da 12ª Vara Federal de Curitiba, Danilo Pereira Junior, e indicará ao magistrado o endereço onde vai cumprir sua prisão domiciliar. A formalidade é o último passo para que o empreiteiro, herdeiro de uma das maiores construtoras do país, volte para casa exatos 914 dias depois de ser preso na 14ª fase da Operação Lava Jato.

Marcelo vai trocar a cela mal iluminada de 12 metros quadrados, nos fundos da Superintendência da Polícia Federal na capital paranaense - que dividia com outros acusados e delatores -, por sua residência em um condomínio de segurança máxima no Morumbi, área nobre de São Paulo. O local foi onde a Polícia Federal o prendeu no dia 19 de junho de 2015.

Sua defesa começou a fazer os preparativos finais para que ele deixe a prisão a tempo de passar o Natal em casa. A multa imposta no acordo de delação premiada - R$ 73,3 milhões - já foi quitada. Como ele vai voltar para casa ainda está indefinido. Os advogados têm em mente três opções para levar o empresário para a capital paulista. A primeira é fazer como o que foi feito com outros delatores e colocar Marcelo em um voo comercial escoltado por policiais.

A hipótese preocupa os defensores que temem algum tipo de hostilidade. Outra opção seria colocar o empresário em um carro e fazer o trajeto de 416,6 quilômetros até a residência. A última, que é a mais atrai a todos, é um avião fretado. No trajeto, agentes acompanhariam o empreiteiro. Cabe aos defensores indicarem o modo, mas o juiz costuma ouvir a PF para dar o "OK" final. Em São Paulo, sai de cena o beliche estreito de concreto e a rotina de exercícios em um corredor improvisado e entra a vida em uma casa ampla com piscina, campo de futebol e uma academia recém-reformada para atender as novas necessidades do empreiteiro.

Marcelo Odebrecht foi condenado a 19 anos e 4 meses de prisão, mas por causa de sua colaboração à Justiça cumpre 10 anos por lavagem de dinheiro e associação criminosa no âmbito da Operação Lava Jato. Pelo acordo, os primeiros 2 anos e meio, permaneceria preso em Curitiba. O restante, em casa, com tornozeleira.  A mudança de regime faz parte do acordo de colaboração premiada homologada pela presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, em 30 de janeiro, dias após a morte do ministro Teori Zavascki, então relator da Lava Jato.

Marcelo vai progredir ao regime domiciliar fechado. O empresário só volta a pisar na rua sem qualquer tipo de restrição em 2025 quando terminam os prazos acordados com a força-tarefa da Lava Jato.  Pessoas próximas ao empresário afirmam que a mulher, Isabela, e as três filhas adolescentes não escondem que encaram a progressão do regime fechado para o domiciliar como "liberdade" nas visitas à carceragem da PF. Em casa, ele poderá receber parentes de até 4º grau, como primos e tios-avós, além 15 pessoas indicadas por ele à Justiça.

A nova "cela" de Marcelo Odebrecht tem mais de 3 mil metros quadrados, ampla área de lazer, quartos com closet e banheiros exclusivos - bem diferente do buraco usado como vaso sanitário na cela na PF. Corretores consultados pelo Estado avaliam que a casa custe entre R$ 20 milhões e R$ 30 milhões. O condomínio é vendido no mercado como "o mais seguro de São Paulo". O custo de manutenção é de cerca de R$ 20 mil mensais para cada morador. Parte desse custo vai para a manutenção de um jardim privativo projetado pelo paisagista Burle Marx.

Além da casa de Marcelo, outras 39 residências compõe o empreendimento. Nenhuma do tamanho da do empresário. Para entrar ou sair do condomínio, o visitante precisa ser autorizado por um morador, fornecer documento de identificação e digitais.
O imóvel é vigiado por câmeras por toda a sua extensão. Só na entrada, a reportagem contou 5 funcionários (entre seguranças e porteiros). Entrar pela primeira vez no condomínio pode demorar mais de 5 minutos. A reportagem tentou contato com a associação de moradores, mas as ligações foram atendidas por funcionários do condomínio - que além de serem proibidos de falar com a imprensa não garantiram nem sequer transmitir recados ou pedidos de entrevista.

Até a confirmação de que Marcelo Odebrecht de fato voltaria ao condomínio, a grande preocupação dos vizinhos era com os saguis que costumam frequentar um parque colado ao empreendimento. O temor era de que os casos de animais infectados com febre amarela registrados na zona norte da capital chegassem às suas portas. Agora, a volta de Marcelo virou uma preocupação. A calma do lugar, que só costumava ser alterada em dias de jogo no Estádio do Morumbi, começa a ser quebrada com a volta do empresário. "Ouvi alguns moradores brincando e dizendo que nosso vizinho famoso está voltando", disse um porteiro da região. Os moradores temem que com o retorno de Odebrecht a rua fique "apinhada de imprensa e curiosos".

Cárcere
Durante os 30 meses de reclusão, Marcelo mudou. Do empresário reativo que se recusava a responder a perguntas de policiais e do próprio juiz Sérgio Moro, o empreiteiro se tornou mais simpático, dividindo o dia a dia com os outros detentos, ajudando a colegas de cela e até desconhecidos que passavam apenas uma noite na prisão. De acordo com pessoas que viram de perto a mudança, o empreiteiro chegou a doar roupas a um preso por contrabando de cigarro falsificado que chegou à carceragem sem casaco durante o período de inverno. Dominado pela ideia de "liberdade", abandonou nos último dias o hábito de escrever e a dieta rigorosa que seguia com frutas e barras de cereais, mas ainda manteve a rotina de exercícios físicos diários.

Marcelo e o companheiro de cela, o lobista Adir Assad, acordam antes do sol nascer, fazem flexões, abdominais e step (exercício em que se sob e desce um degrau repetidas vezes).  Na Custódia da Polícia Federal em Curitiba, onde Odebrecht passou a maior parte do tempo de presidiário - ele chegou a ficar um breve período no Complexo Médico-Penal - a limpeza é feita pelo presos. A PF fornece três refeições: um café com leite e pão com manteiga pela manhã e almoço e jantar, onde o cardápio é uma variação de arroz, macarrão, feijão e carne. Foram raras as vezes que Marcelo aceitou a comida fornecida. Ele possui uma rede, que apelidou de "logística", montada pela empreiteira para levar alimentos frescos e refeições que aquecia em um micro-ondas ou em um fogão elétrico instalados na carceragem.

Em nota, a Odebrecht afirmou que "Marcelo Odebrecht está inteiramente empenhado em continuar contribuindo de forma efetiva com as autoridades nos termos do seu acordo de colaboração". 





sexta-feira, 3 de junho de 2016

PM mata criança de 10 anos suspeita de roubar um carro



Segundo a Polícia Militar, dois garotos trocaram tiros com os policiais que revidaram alvejando um deles na cabeça, na Zona Sul de São Paulo
Um garoto de 10 anos, suspeito de furtar um carro, foi morto por policiais militares durante troca de tiros na noite desta quinta-feira, na Vila Andrade, Zona Sul de São Paulo. Outro menino de 11 anos, que o acompanhava no veículo, foi apreendido e levado para prestar depoimento.

De acordo com a PM, policiais faziam patrulhamento por volta das 19 horas na Rua José Ramon Urtiza quando viram um carro furtado circulando pela região. O motorista fugiu da abordagem e os agentes iniciaram perseguição, que só terminou após o veículo bater em um ônibus. Os PMs teriam se aproximado do carro e, segundo a polícia, foram recebidos a tiros pelos suspeitos. Os policiais teriam revidado, atirando contra os garotos. Um deles foi alvejado na cabeça e morreu no local. Uma arma calibre 38 foi apreendida.

A ocorrência foi levada ao 89º Distrito Policial, no Morumbi, mas o caso será investigado pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). Procurada, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo informou que comunicou o Conselho Tutelar e a Vara da Infância e da Juventude. O Conselho da região de Campo Limpo confirmou ao site de VEJA que foi acionado na noite desta quinta-feira, mas disse que não precisou ir ao local porque familiares dos dois meninos compareceram à delegacia. O órgão também disse que está levantando os dados dos garotos, como endereço residencial, por exemplo, para saber qual Conselho ficará responsável pelo caso.

Depoimento - Acompanhado da mãe, o menino de 11 anos afirmou à Polícia Civil que estava em casa quando foi procurado pelo amigo. Segundo o boletim de ocorrência, o garoto mais novo disse ao mais velho que tinha uma arma e o convidou para roubar um prédio localizado no Campo Limpo, também na Zona Sul. O menino disse aos policiais que não queria acompanhar o amigo, mas que foi ameaçado e obrigado. Os dois chegaram de ônibus ao local e pularam o muro para invadir o condomínio. Na garagem, perceberam que um carro tinha o vidro do motorista aberto e a chave no contato.

O menino de 10 anos assumiu o volante, enquanto o amigo ficou no banco de trás. Segundo ele, os dois deixaram o prédio sem dificuldade, mas o colega não sabia trocar as marchas do carro e logo passaram a ser perseguidos por policiais militares. De acordo com o menino mais velho, o amigo não respeitou a abordagem policial e efetuou dois tiros para fora.

O garoto de 11 anos afirmou que, após a batida no ônibus, o amigo atirou na direção dos PMs, momento em que houve o revide. Ele foi alvejado na cabeça e morreu no local. O outro menino sofreu escoriações na face decorrentes da colisão. A arma calibre 38 usada pelo menino foi apreendida.

Fonte: Estadão Conteúdo

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

O Grilo Falante de Lula



Nem Pinóquio teve uma ajuda tão generosa. Mas Pinóquio não tinha um BNDES, só um Gepeto
O palestrante Luiz Inácio da Silva é um sujeito de sorte. Antes de se consagrar com suas palestras internacionais, ele passou pela Presidência da República, onde não ganhava tão bem. Mas tinha bons amigos, especialmente na empreiteira Odebrecht, que lhe sopravam o que dizer nas reuniões com outros chefes de Estado. Os recados eram passados ao futuro palestrante, então presidente, sob o título “ajuda memória” – ou seja, os empreiteiros estavam ajudando o presidente a se lembrar de coisas úteis, uma espécie de transplante de consciência. A Odebrecht era o Grilo Falante de Lula.

Nem Pinóquio teve uma ajuda-memória tão generosa. A de Lula se transformou em negócios de bilhões de reais – mas é bem verdade que Pinóquio não tinha um BNDES, só um Gepeto. É uma desvantagem considerável, especialmente porque Gepeto não fazia operações secretas, ao que se saiba. “O PR fez o lobby”, escreveu o então ministro da Indústria e do Comércio aos amigos da Odebrecht, respondendo à cobrança da empreiteira sobre a defesa de seus interesses pelo PR Lula junto ao PR da Namíbia. Essa e outras ajudas-­memórias valiosas, reveladas pelo jornal O Globo, não tiveram nada de mais. Segundo todos os envolvidos, isso é normal.

A normalidade é tanta que a parceria foi profissionalizada. Quando Luiz Inácio terminou seu estágio como PR, foi contratado pela Odebrecht como palestrante. Nada mais justo. Com a quantidade de ajuda-­memória que ele recebera da empresa durante oito anos, haveria de ter muita coisa para contar pelo mundo. Foi uma história bonita. Lula soltinho, sem a agenda operária de PR, viajando pelos países nas asas do lobista da Odebrecht, fazendo brotar obras monumentais por aí e mandando Dilma e o BNDES bancá-las, enquanto botava para dentro cachês astronômicos como palestrante contratado da empresa ganhadora das obras. Normal.

A parceria também funcionou no Brasil, claro, com belos projetos como o estádio do Corinthians – que uniu seu time do coração com a sua empreiteira idem. Num drible desconcertante dos titãs, o Morumbi foi desclassificado para a Copa de 2014 e brotou em seu lugar o Itaquerão, por R$ 1 bilhão. Como não dava para Gepeto fazer a mágica, o Pinóquio PR chamou o bom e velho BNDES para operar mais esse milagre. Após alguns anos fazendo os bilhões escorrerem dos cofres públicos para parcerias interessantes como essas – incluindo as obras completas da Petrobras –, o palestrante e seu partido levaram o Brasil à breca. Ainda hoje, em meio à mais terrível crise das últimas décadas, que derrubou o aval para investimento no Brasil e fará dele um país mais pobre, a opinião pública se pergunta: como foi que isso aconteceu?

Graças a essa pergunta abilolada, o esquema parasitário que tomou de assalto o Estado brasileiro ainda permanece, incrivelmente, sediado no Palácio do Planalto. O tráfico de influência como meio de privatização de recursos públicos – através de parcerias, consultorias, convênios, mensalões e pixulecos mais ou menos desavergonhados – foi institucionalizado, de cabo a rabo, no governo petista. Lula, o palestrante, é investigado pelo Ministério Público por tráfico de influência internacional. O Brasil se surpreende porque quer: esse é o modus operandi de todos os companheiros que já caíram em desgraçaVaccari, Delúbio, Erenice, Palocci, Dirceu, Valério, Youssef, Duque, Vargas, João Paulo, Rosemary... Faltou alguém? Ou melhor: sobrou alguém?

Marcelo Odebrecht recomendou que Lula ressaltasse o papel de “pacificador e líder regional” do presidente de Angola. E assim foi feito. Deu para entender? O dono da empresa e cliente do governo era quase um adido cultural do presidente. Se o Brasil não consegue ver promiscuidade (ou seria obscenidade?) nesse enredo, melhor botar o Sergio Moro em cana e liberar o pixuleco.

Acaba de ser arquivado o inquérito contra Lula no mensalão. No auge do escândalo com a Odebrecht e demais envolvidas no petrolão, o PT bate seu próprio recorde de cinismo advogando a proibição das doações eleitorais de empresas. Pixuleco nunca mais. Ajuda-memória ao gigante: ou abre os olhos agora ou não verá as pegadas companheiras sendo mais uma vez apagadas. Aí os inocentes profissionais estarão prontos para o próximo golpe. 

Fonte: Guilherme Fiuza – Revista Época