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quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Há três anos, Lula saía da cadeia com o fim da prisão em 2ª instância - Deltan Dallagnol

Gazeta do Povo - VOZES

Justiça, política e fé

STF - Foto: Fellipe Sampaio /SCO/STF

Há três anos, Lula foi solto. Isso ocorreu em 8 de novembro de 2019, um dia depois de o Supremo Tribunal Federal derrubar a prisão após a condenação em segunda instância, por uma apertada maioria de seis votos a cinco. Essa decisão afeta a vida em sociedade mais do que você possa imaginar.

Além de Lula, José Dirceu, Vaccari, Delúbio e outros réus da Lava Jato condenados por saquearem bilhões, cerca de cinco mil presos estavam em condições de se beneficiar com a decisão, segundo informou na época o Conselho Nacional de Justiça.

Essas pessoas não foram soltas porque eram inocentes, faltaram provas ou ocorreu alguma injustiça no julgamento
Elas foram soltas porque o Supremo entendeu que condenados só podem ser presos após o julgamento do último recurso na última instância.

Um exemplo tornará mais claro o que isso significa. Imagine que sua família entre em conflito com um vizinho e ele mate alguém da sua família. Mesmo se for condenado por um juiz, ele não irá preso. Ele poderá oferecer vários recursos até ser julgado, anos depois, por um tribunal. Mesmo assim, ele ainda não irá preso ainda, podendo oferecer vários recursos até ser julgado, em Brasília, por um novo tribunal, anos mais tarde. Novamente, não irá preso, mas poderá oferecer novos recursos até que, muitos anos depois, um quarto tribunal o julgue.

Após vários recursos nessa quarta instância, o processo se encerrará, mas provavelmente o condenado não será preso novamente. Isso porque o processo terá prescrito. Como o caso demorou muito tempo na Justiça, o criminoso não sofrerá nenhuma consequência. Em bom português, ele se safa.

Foi assim com Omar Coelho Vítor, fazendeiro que alvejou Dirceu Moreira Brandão Filho numa feira agropecuária, por ter cantado sua mulher. Mesmo sendo atingido na boca e em região próxima à coluna, Dirceu sobreviveu por sorte. Omar foi condenado a seis meses de prisão.  O processo se arrastou por 21 anos na Justiça e, em 2012, o crime prescreveu.

Foi assim com Luiz Rufino, que matou Eusébio Oliveira após uma discussão porque este estacionou na frente de sua banca de jornais.  
O processo demorou vinte e cinco anos e, em 2016, ainda não tinha se encerrado. 
Nessa época, Rufino tinha 87 anos e várias autoridades do caso já haviam morrido. Ao fim, o crime também prescreveu.
 
O processo brasileiro tem recursos sem fim. O ex-senador Luiz Estevão, condenado por desvios superiores a 3 bilhões de reais, recorreu 36 vezes, sem contar os habeas corpus uma média de 9 recursos por instância
Duas décadas após os crimes, seu caso ainda não havia acabado e ele estava solto. 
Só foi preso quando o STF permitiu a prisão em segunda instância, em 2016.
 
O direito à ampla defesa se tornou o direito à impunidade. A Justiça Penal se tornou injustiça institucionalizada. E a garantia da impunidade faz o crime compensar. A turma pega pela Lava Jato roubou bilhões, sairá impune e aprenderá que vale a pena roubar.  José Dirceu aprendeu isso.  
Condenado como artífice do Mensalão, teve sua pena perdoada dois anos após começar a cumpri-la em 2014.  
Na Lava Jato, teve sua condenação a 27 anos de prisão mantida na terceira instância do Judiciário no início deste ano. Contudo, segue solto.
 
Se a turma do Mensalão e Petrolão voltar ao governo do PT, o que impede que nos roubem de novo? 
Não há consequências legais para o comportamento criminoso. 
Punir é necessário não por ódio ou vingança, mas por amor. 
A vítima e a sociedade estão desprotegidas.
O Estado deixou de cumprir o seu papel mais essencial, de garantir justiça. Isso enfraquece o império da lei e o estado de direito, que estão na base da prosperidade das nações, como sustentam Acemoglu e Robinson no seu célebre Por que as Nações Fracassam. 
“Venham, roubem e vão embora. O caminho está livre. Saqueiem nosso país à vontade”. Essa é a mensagem na porta da nossa casa, o Brasil. Ou, para usar a frase dita no jantar de lançamento da candidatura do Lula: “se o crime já aconteceu, de que adianta punir?”

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Os protestos e a intervenção militar 

Entre 2016 e 2019, enquanto a prisão após condenação em segunda instância esteve em vigor, o medo real da punição conduziu delinquentes à confissão em cascata, à devolução de 25 bilhões de reais e à delação de centenas de criminosos que passaram a ser investigados.
Brasília tremeu. “Vai todo mundo delatar”, afirmou um assustado Romero Jucá, então conhecido como “Resolvedor da República no Congresso”, para Sérgio Machado, que entregou a gravação em seu acordo de colaboração premiada. Para Jucá, era preciso “estancar essa sangria”. Falaram em um “grande acordo nacional”.

O acordo nacional era previsível. O mundo todo sabe: “corruption strikes back”, “a corrupção contra-ataca”.  
O fim da prisão em segunda instância foi o início da morte da Lava Jato. Sem receio de prisão, não havia mais delação. Sem delação, as investigações não mais se multiplicavam.

Se queremos ressuscitar o combate à corrupção, precisamos começar pela prisão em segunda instância, o que precisa ser uma das maiores prioridades do novo Congresso Nacional. O papel da sociedade, cobrando seus representantes, é fundamental. Precisamos mostrar que a integridade e a honestidade também contra-atacam.


Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima


Deltan Dallagnol, Colunista - Gazeta do Povo - VOZES


quinta-feira, 14 de junho de 2018

País sequestrado por um condenado preso

Quem cai na história de que político nenhum presta, acaba escolhendo um entre tantos condenados que no passado mais recente lhes “encheram o bucho”

José Nêumanne

Os resultados da última pesquisa Datafolha, publicada domingo pela Folha de S.Paulo, não podem ser considerados definitivos para prenunciar a apuração da eleição de daqui a quatro meses porque representam um retrato atual, como sempre, nunca uma profecia exata. E também porque revelam agora uma decisão que muitos cidadãos ainda estão por tomar. Configuram, contudo, e ao que parece de forma cristalizada, tendências que dificilmente mudarão, pois refletem uma situação antiga, crônica, lógica e irrefutável.

Os 30% de preferência pelo soit-disant presidenciável do Partido dos Trabalhadores (PT), Luiz Inácio Lula da Silva, impressionam por dois motivos. Antes de tudo, porque ele foi condenado em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, em Porto Alegre, a 12 anos e 1 mês por corrupção e lavagem de dinheiro. E é inelegível. Em segundo lugar, por cumprir pena em Curitiba e, portanto, não ser disponível para participar de comícios, carreatas e até, conforme presume quem tem bom senso, gravar pronunciamentos para a propaganda nada gratuita no rádio e na televisão.

O comportamento inusitado da Justiça, permitindo-lhe um dia a dia não vivido por outro preso comum e ele é apenas mais um , pode pôr em questão a segunda afirmativa. Mas, por enquanto, prever a continuação dessa anomalia, vencidos os prazos legais para o registro de candidaturas, não é realista.  A fidelidade de quase um terço do eleitorado brasileiro ao carisma do mais popular líder político e mais famoso presidiário do País, a esta altura do campeonato, confirma uma evidência e nega uma lenda urbana. O primeiro lugar no ranking atesta que a emoção é decisiva no ato de digitar o número do pretendente na máquina de votar. E o petista é, disparado, o único dos que se apresentaram à liça a despertar a paixão do cidadão, seja por afeto, seja por repulsa. Mas também, por paradoxal que pareça, o voto em quaisquer nível social e escolaridade é decidido pelo estômago e pelo bolso.

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, perdeste o senso”, resmungará o leitor aflito, citando o repetido verso de Olavo Bilac. Afinal, além de condenado, Lula responde na Justiça a mais seis processos criminais, que, juntos, o desmascaram na chefia de uma organização criminosa que levou a Petrobras à falência, quebrou as contas públicas, esfolou a economia a ponto de gerar 24 milhões de desempregados e desiludidos, conforme o confiável IBGE, e indicou os dois presidentes mais desastrados e, por isso mesmo, mais impopulares da História: a companheira petista Dilma Rousseff e o cúmplice Michel Temer, do PMDB. Sem Temer, Dilma não teria sido eleita. Sem os votos do PT, Temer não seria presidente. [registro indispensável: apesar do fato de Michel Temer estar fazendo um governo desastrosa, cabe registrar de forma indelével que ele teve contra si duas denúncias, antipatrióticas por prejudicar mais ao Brasil do que ao denunciado e por nenhuma delas ser fundada em provas lícitas e incontestáveis;
contra Temer existe a indecisão, a leniência que desautoriza, mas, a seu favor não pode ser olvidado que alguma melhora - apesar de todos os percalços - ele conseguiu realizar na economia;
já Dilma era um fracasso atrás do outro, uma asneira seguindo outra, um verdadeiro desastre em todos os aspectos. 
por tudo isso, há ingratidão em colocar Dilma e Temer no mesmo cesto = mais adequado  para Temer um cesto para Dilma um saco de lixo.]

É aí que entra neste raciocínio a negação de que o brasileiro não tem memória, uma lenda antiga e frágil. Os apressadinhos, que, conforme ensinava vovó, comem cru ou sapecado, arguirão que, ao desprezarem os dados da realidade que fazem de Lula um réprobo, e não os quindins de iaiá, os brasileiros que vegetam abaixo da linha da pobreza não têm memória mesmo e ponto final. Alto lá! História é uma coisa, memória é outra. A História é objetiva, relata fatos indesmentíveis, questiona mitos aparentemente indestrutíveis. A memória é subjetiva. Cada um tem a sua. A lembrança dos fatos ao redor é sempre imprecisa e traiçoeira. A recordação dos benefícios pessoais é permanente. Os que asseguram que votarão em Lula têm a memória gostosa dos tempos de ouro do crédito fácil e do acesso à proteína barata sobre a mesa da família.

A História revela que a inflação acabou, o poder de compra da moeda permitiu o acesso das famílias pobres ao consumo inatingível, por obra e graça do Plano Real, do câmbio flutuante e da Lei de Responsabilidade Fiscal, sob a égide do tucano Fernando Henrique. Mas a memória ressuscita o crédito farto e fácil e é isso que segura Lula no topo das pesquisas.  Detratores de institutos de opinião poderão até constatar que os índices recentes não se confirmarão. Mas dificilmente as tendências serão desmentidas. A principal delas é a novidade que ameaça surgir do panorama visto da pinguela sobre a fossa: a disseminação generalizada de que político nenhum presta mesmo e, então, o melhor é escolher um entre tantos condenados que no passado mais recente lhes “encheram o bucho”, como se diz em meu Nordeste de origem, região tida como baluarte lulista. Sabe o “rouba, mas faz”? Pois…

Em 2013, a população foi à rua protestar contra tudo e no ano seguinte reelegeu Dilma e Temer, dois precipícios para a tragédia. Em 2016 o eleitor surrou o PT porque a Lava Jato levou o partido aos tribunais e às prisões. Presos em Curitiba estão todos os chefões petistas: o próprio Lula, Zé Dirceu e Palocci. E, pior de tudo, três ex-tesoureiros ─ Delúbio, Vaccari e Paulo Ferreira ─ tiveram o mesmo destino. Há quem lembre diante desse fato que a organização criminosa, vulgo quadrilha, se afigura na forma da lei com a reunião de mais de quatro membros. Ou seja…

Em 2014 o PSDB fez de Aécio Neves a esperança anti-PT para pelo menos metade da sociedade, que não cai na lábia do profeta de Vila Euclides. O neto de Tancredo Neves, ilusão da Nova República abatida pela septicemia, contudo, protagonizou a maior frustração política da nossa História. Denunciado por um suspeito de ter enriquecido pelo compadrio de Lula e asseclas, gravado anunciando a morte do primo, caso este o delatasse, o mineiro poderia ter passado em branco pela inutilidade que protagonizou em seu mandato de senador pelo Estado mais habilidoso do Brasil. Mas fez muito pior, ao mostrar que seu adversário-mor comprou até a oposição fajuta em que ele mandava.
Lula nem precisará candidatar-se para encarnar o paradoxo deste país surreal, que mantém sob sequestro em sua cela de preso comum: beneficia-se por ter escolhido sucessores que quebraram o Brasil e pagou à oposição para anulá-la.

Publicado no Blog do Nêumanne

 

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Suporte jurídico

As eleições e os processos contra líderes convertem a Lava-Jato e outras ações em alvo prioritário

A deflagração de operações anticorrupção, apoiadas em forças-tarefas constituídas por representantes do Ministério Público, da Justiça e Polícia Federal tem permitido um avanço inédito na repressão ao roubo do dinheiro do contribuinte.  Uma das principais conquistas desses tempos é o rompimento da antiga norma de que rico e poderoso não vai preso. Não ia. A regra começou a ser pulverizada no julgamento do mensalão, o primeiro escândalo envolvendo lulopetistas e aliados, no início da gestão Lula.

Surgia ali o primeiro caso irrefutável de desvio de dinheiro público para sustentar o projeto de poder petista: compra literal de apoio de parlamentares e partidos ao governo. Um grande escândalo, causa da saída de militantes e parlamentares do PT; porém o maior caso, o petrolão, viria depois.  O mensalão surgiu da denúncia de um aliado do PT desgostoso das partilhas, Roberto Jefferson, do PTB fluminense, e foi crucial o papel de juízes, promotores e, em especial, de um Supremo Tribunal sério, independente. Mesmo constituído por vários ministros indicados por Lula e Dilma, a Corte condenou estrelas da legenda petista: José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares etc.

Mas não basta vontade pessoal. O MP ganhava maturidade para exercer as prerrogativas recebidas pela Constituição de 88 — tem autonomia para representar a sociedade na defesa dos interesses dela. Não se subordina, em sua operação, a nenhum poder.
Assim, pôde fazer um trabalho importante na Lava-Jato, a partir de março de 2014. Outro forte argumento para afastar qualquer ideia de que a repressão à corrupção tem ultrapassado limites legais é que a força-tarefa baseada em Curitiba só conseguiu começar a desfazer o novelo da corrupção em torno da Petrobras porque, em 2013, a presidente Dilma sancionou a lei 12.850, para definir organização criminosa e regular os métodos legais de combate a ela. Um deles, a “colaboração premiada”.


A delação premiada, embora não fosse um instrumento estranho ao ordenamento jurídico brasileiro, ganhou com esta lei grande força, como no exterior. E passou a servir de ferramenta eficaz no desmantelamento de esquemas como o petrolão, que se estendeu a outras estatais, e também na criminalidade comum (quadrilha de PMs em São Gonçalo).
Mas como há intensa luta política, porque líderes têm sido apanhados na Lava-Jato e em outras operações — de Lula do PT a Aécio Neves do PSDB —, há tentativas de criminalizar-se a atuação das forças-tarefas. Sem considerar manobras no Legislativo para inviabilizá-las. A proximidade das eleições de 2018, enquanto tramitam processos contra Lula, autodeclarado candidato, torna o ambiente ainda mais tenso, e as análises mais teleguiadas.

Não se discute é que qualquer balanço sobre veredictos originados na Lava-Jato indica grande índice de confirmação de sentenças nos recursos à instância superior. Isso não aconteceria sem embasamento jurídico sólido.


Fonte: O Globo - Editorial


segunda-feira, 19 de outubro de 2015

O Grilo Falante de Lula



Nem Pinóquio teve uma ajuda tão generosa. Mas Pinóquio não tinha um BNDES, só um Gepeto
O palestrante Luiz Inácio da Silva é um sujeito de sorte. Antes de se consagrar com suas palestras internacionais, ele passou pela Presidência da República, onde não ganhava tão bem. Mas tinha bons amigos, especialmente na empreiteira Odebrecht, que lhe sopravam o que dizer nas reuniões com outros chefes de Estado. Os recados eram passados ao futuro palestrante, então presidente, sob o título “ajuda memória” – ou seja, os empreiteiros estavam ajudando o presidente a se lembrar de coisas úteis, uma espécie de transplante de consciência. A Odebrecht era o Grilo Falante de Lula.

Nem Pinóquio teve uma ajuda-memória tão generosa. A de Lula se transformou em negócios de bilhões de reais – mas é bem verdade que Pinóquio não tinha um BNDES, só um Gepeto. É uma desvantagem considerável, especialmente porque Gepeto não fazia operações secretas, ao que se saiba. “O PR fez o lobby”, escreveu o então ministro da Indústria e do Comércio aos amigos da Odebrecht, respondendo à cobrança da empreiteira sobre a defesa de seus interesses pelo PR Lula junto ao PR da Namíbia. Essa e outras ajudas-­memórias valiosas, reveladas pelo jornal O Globo, não tiveram nada de mais. Segundo todos os envolvidos, isso é normal.

A normalidade é tanta que a parceria foi profissionalizada. Quando Luiz Inácio terminou seu estágio como PR, foi contratado pela Odebrecht como palestrante. Nada mais justo. Com a quantidade de ajuda-­memória que ele recebera da empresa durante oito anos, haveria de ter muita coisa para contar pelo mundo. Foi uma história bonita. Lula soltinho, sem a agenda operária de PR, viajando pelos países nas asas do lobista da Odebrecht, fazendo brotar obras monumentais por aí e mandando Dilma e o BNDES bancá-las, enquanto botava para dentro cachês astronômicos como palestrante contratado da empresa ganhadora das obras. Normal.

A parceria também funcionou no Brasil, claro, com belos projetos como o estádio do Corinthians – que uniu seu time do coração com a sua empreiteira idem. Num drible desconcertante dos titãs, o Morumbi foi desclassificado para a Copa de 2014 e brotou em seu lugar o Itaquerão, por R$ 1 bilhão. Como não dava para Gepeto fazer a mágica, o Pinóquio PR chamou o bom e velho BNDES para operar mais esse milagre. Após alguns anos fazendo os bilhões escorrerem dos cofres públicos para parcerias interessantes como essas – incluindo as obras completas da Petrobras –, o palestrante e seu partido levaram o Brasil à breca. Ainda hoje, em meio à mais terrível crise das últimas décadas, que derrubou o aval para investimento no Brasil e fará dele um país mais pobre, a opinião pública se pergunta: como foi que isso aconteceu?

Graças a essa pergunta abilolada, o esquema parasitário que tomou de assalto o Estado brasileiro ainda permanece, incrivelmente, sediado no Palácio do Planalto. O tráfico de influência como meio de privatização de recursos públicos – através de parcerias, consultorias, convênios, mensalões e pixulecos mais ou menos desavergonhados – foi institucionalizado, de cabo a rabo, no governo petista. Lula, o palestrante, é investigado pelo Ministério Público por tráfico de influência internacional. O Brasil se surpreende porque quer: esse é o modus operandi de todos os companheiros que já caíram em desgraçaVaccari, Delúbio, Erenice, Palocci, Dirceu, Valério, Youssef, Duque, Vargas, João Paulo, Rosemary... Faltou alguém? Ou melhor: sobrou alguém?

Marcelo Odebrecht recomendou que Lula ressaltasse o papel de “pacificador e líder regional” do presidente de Angola. E assim foi feito. Deu para entender? O dono da empresa e cliente do governo era quase um adido cultural do presidente. Se o Brasil não consegue ver promiscuidade (ou seria obscenidade?) nesse enredo, melhor botar o Sergio Moro em cana e liberar o pixuleco.

Acaba de ser arquivado o inquérito contra Lula no mensalão. No auge do escândalo com a Odebrecht e demais envolvidas no petrolão, o PT bate seu próprio recorde de cinismo advogando a proibição das doações eleitorais de empresas. Pixuleco nunca mais. Ajuda-memória ao gigante: ou abre os olhos agora ou não verá as pegadas companheiras sendo mais uma vez apagadas. Aí os inocentes profissionais estarão prontos para o próximo golpe. 

Fonte: Guilherme Fiuza – Revista Época


quarta-feira, 23 de setembro de 2015

O que Lula não tem – viver é muito perigoso, que o digam Celso Daniel, Toninho do PT



Viver é muito perigoso. Mas viver no limite da irresponsabilidade é muito mais. Há quem goste. Soa como um desafio. Exemplo: quanto não deve excitar Lula a proximidade da sombra da Lava- Jato? As informações reunidas pelo juiz Sérgio Moro comprometem Lula com o que começou de fato a acontecer durante o seu segundo governo. Era preciso pagar dívidas da campanha de 2006. A saída? Roubar a Petrobras.

LULA É UM sobrevivente (cuidado com sobreviventes. Acham-se capazes de tudo). Sobreviveu à seca no Nordeste, à miséria em São Paulo, aos riscos da vida sindical na ditadura de 64, e a três derrotas seguidas para presidente. O candidato antes favorável à limitação do direito de propriedade privada, ao aborto e à estatização dos bancos virou o Lulinha Paz e Amor e, afinal, elegeu-se. 

UM DOS segredos do seu sucesso: a falta de princípios. Poderia repetir a sério o que o comediante norte-americano Groucho Marx afirmou fazendo graça: "Esses são meus princípios. Mas se você não gosta deles, tenho outros". Lula por ele: "Sou uma metamorfose ambulante" Lula por Hélio Bicudo, fundador do PT: "Ele só está em busca de vantagem para ele e para sua família"

NA SEMANA PASSADA, Lula reuniu-se com Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados. Pediu-lhe que segurasse qualquer pedido de impeachment contra Dilma. Indecorosa atitude! Um pedido de impeachment que respeite os preceitos legais deve ser mandado adiante. O presidente da Câmara exorbitaria dos seus poderes se o retivesse.

SE SABE disso, Lula não se importa. No seu primeiro governo, telefonou para José Viegas, ministro da Defesa, intercedendo pelo advogado Roberto Teixeira. Havia morado de graça em um apartamento dele em São Bernardo. Pediu a Viegas para facilitar a vida de Teixeira, interessado nos espaços ocupados pela massa falida da Transbrasil em aeroportos país afora. Um ótimo negócio.

A DELÚBIO SOARES, ex-tesoureiro do PT condenado no caso do mensalão, Lula pedia para esconder acesa a cigarrilha que fumava quando era alvo de fotógrafos. Ao senador que o procurou em 2006 dizendo que Marcos Valério, operador do mensalão, queria dinheiro para ficar calado, Lula limitou-se a perguntar: "Você procurou Okamotto?" Paulo Okamotto, hoje, preside o Instituto Lula.

VALÉRIO JAMAIS abriu a boca. Quando tentou, era tarde. Pegou 40 anos de cadeia. Lula escapou depois de se dizer traído pelos mensaleiros e entregar a cabeça de José Dirceu. Nega-se a admitir que o mensalão existiu. Mas pediu o voto de quatro ministros do Supremo Tribunal Federal em favor dos mensaleiros. Um dos ministros: Gilmar Mendes.

O MESMO QUE assistiu, certa vez, a uma cena inesquecível. Estava na antessala do gabinete de Lula, no Palácio do Planalto, quando o viu sair acompanhado de José Sérgio Gabrielli, então presidente da Petrobras. "Veja só, Gilmar. Um procurador da Fazenda, no Rio, está chantageando a Petrobras", narrou Lula. "Eu falei pro Gabrielli: Por que você não manda grampear ele?" Grampo é crime.

LULA NÃO VÊ nada demais em ter informado ao Exército, ao completar 18 anos, que media dois centímetros a mais do que media. Nem vê nada demais no fato do seu filho mais velho ter enriquecido enquanto ele presidia o país. Lula considera natural ter enriquecido prestando serviços a empresários, e de nessa condição aspirar a um novo mandato de presidente. Ilegal não seria. Seria imoral.

Fonte: Blog do Noblat – Ricardo Noblat

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

O PT deve estar pronto para tudo

O que dirá o PT se João Vaccari, ex-tesoureiro preso em Curitiba, firmar acordo de delação premiada e contar tudo ou grande parte do que sabe? E se ele admitir que de fato roubou para encher as burras do partido e o próprio bolso? O PT dirá que não sabia?

Dirá que, a exemplo de Delúbio Soares, um dos mensaleiros condenados, Vaccari era o único responsável pelas finanças do partido? E que todos confiavam nele, todos o tinham como honesto, e todos, por isso mesmo, estão agora perplexos?

Quem acreditará mais  nisso? É bom que o partido monte vários cenários e se prepare para todos eles. No caso da nova prisão de José Dirceu, não parecia preparado. Olho no Renato Duque, ex-diretor da Petrobras, ligado a Dirceu. Ele vai abrir o bico. E promete entregar políticos graúdos.

Duque operava para o PT como é público. É dono de segredos preciosos. Sua capacidade de produzir estragos não deve ser subestimada. Não aposte tudo no silêncio de Marcelo Odebrecht. Ele é muito jovem e ambicioso para aguentar calado a ameaça de uma longa pena.

Prepare-se, também, para a eventualidade de Lula ser chamado a prestar esclarecimentos. Não falo em prisão, mas em depoimento. O presidente do PT disse que todos são inocentes até prova em contrário e condenação final. Vale para Dirceu. Deve valer para Lula.


Como observou um procurador da Lava Jato, qualquer cidadão pode ser investigado e deve prestar as informações que a autoridade lhe peça. Por suposto, vale para Lula, cidadão que é.  Não me venham depois com choramingas. Nem com teorias conspiratórias. Se avisados não foram, avisados estão.


quinta-feira, 4 de junho de 2015

O manifesto da virtude não contabilizada

O Brasil estava à deriva, até que veio o encontro nacional do PT em São Paulo. Os presidentes dos 27 diretórios reuniram-se em torno do oráculo, e aí tudo ficou claro como a pele da elite branca. É sempre assim: por mais tenebrosa que seja a tempestade lá fora, quando o PT se junta em torno de Lula da Silva, tudo fica belo e luminoso. Ficamos sabendo que a crise é pura inveja que os ricos têm do povo. E saiu um novo manifesto – atenção, Brasil! – no qual o partido do mensalão e do petrolão ensina aos brasileiros o que é virtude.

É claro que o manifesto do PT não trata da estagnação econômica, nem da previsão de recessão apontada pelo Boletim Focus do Banco Central. Eles estão no Palácio há 12 anos, mas não têm nada com isso. O documento também não trata da mais recente façanha do partido – a inscrição de seu tesoureiro como réu no processo da Lava Jato. Isso é o tipo de coisa que só interessa à imprensa burguesa. E é justamente a imprensa o que preocupa os companheiros em seu mundo dourado. O manifesto propõe um projeto de lei para controlar a mídia (novidade!) – no exato momento em que a presidente dá posse ao novo ministro da Secretaria de Comunicação exaltando a... liberdade de expressão.

Dilma falou que sabe quanto a imprensa livre é importante, porque ela é uma pessoa que viveu sob uma ditadura. Atualmente, no Brasil, praticamente só Dilma viveu sob uma ditadura. Todos aprendemos a acompanhar, contritos, o sofrimento diuturno de Dilma Rousseff em sua resistência implacável aos militares. Quando começamos a achar que a batalha está concluída, o Palácio do Planalto solta mais um release sobre os anos de chumbo, e lá vamos nós sofrer mais um pouco ao lado de nossa heroína. Não há nada mais urgente hoje no Brasil do que apoiar Dilma contra o regime militar. Ela há de nos libertar desse inimigo morto e enterrado há 30 anos.

Enquanto a presidente luta heroicamente pela liberdade de expressão, que só ela sabe quanto é valiosa, seu partido costura docemente a mordaça. O PT já tentou colocar rédeas na mídia até através de um pacote de direitos humanos. Agora, o tal manifesto propõe uma nova regulamentação do direito de resposta. Os companheiros só vão sossegar quando a comunicação de massa no país alcançar o padrão de uma assembleia do partido. Chega de perseguição a guerreiros do povo brasileiro como João Vaccari. A cada denúncia publicada sobre as peripécias do tesoureiro na arrecadação de fundos para a revolução progressista, a mídia há de ter que abrir espaço para a resposta do guerreiro. E ele terá o sagrado direito de declarar, como seu antecessor Delúbio no mensalão, que há uma conspiração da direita contra o governo popular.

O manifesto divulgado pelo PT no dia 30 de março explica que o partido está sendo “atacado por suas virtudes”. Não esclarece se entre essas virtudes está a formidável capacidade de captação de recursos junto às empresas investigadas na Lava Jato. Ou a invejável capacidade de escolher e cultivar os diretores certos para a Petrobras, sem os quais uma legião de parasitas e picaretas morreria de fome. Talvez por humildade exacerbada, o manifesto do PT não cita entre suas virtudes a façanha de ter jogado a maior empresa brasileira na lona, rebaixando-a ao grau de investimento especulativo. Tamanho virtuosismo realmente só poderia gerar inveja e perseguição.

“A campanha de agora é uma ofensiva de cerco e aniquilamento”, diagnostica o manifesto. “Para isso, vale tudo. Inclusive criminalizar o PT.” Eis o escândalo: estão criminalizando o PT. Será que não percebem que todos os crimes pelos quais os petistas têm sido indiciados, julgados e condenados são crimes decorrentes das suas virtudes? Será possível que essa elite golpista não aprendeu a distinguir o crime mau do crime bom?

Na reunião de cúpula, o assessor da Presidência, Marco Aurélio TOP TOP Garcia, esclareceu: “Ganhamos a eleição com uma narrativa que a presidente assumiu de forma corajosa”. No dia seguinte, no Senado, o ministro da Fazenda tentava salvar a pele do governo com uma narrativa oposta a essa que a presidente assumiu corajosamente. Talvez seja por isso que as multidões voltaram às ruas: entenderam enfim que estão sendo governadas há 12 anos por uma narrativa.

Fonte: Guilherme Fiuza