Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador isonomia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador isonomia. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 14 de março de 2022

Juízes de Rondônia receberam mais de R$ 1 milhão no contracheque de janeiro

Mariana Carneiro

Penduricalho milionário

O Judiciário de Rondônia pagou em janeiro mais de R$ 1 milhão em extras a um grupo de oito juízes aposentados e herdeiros de magistrados do estado. São pagamentos relativos a auxílio-moradia não recebidos entre 1987 a 1993.

Edifício do TJ-RO

Os valores chamaram a atenção de servidores ao surgir no portal da transparência do estado, no mês passado. Vêm de uma decisão de 2014, que beneficiou ao todo 93 juízes e custou aos cofres públicos de Rondônia quase R$ 251 milhões desde que os pagamentos começaram, em 2016.

Leia também: Por que a Petrobras não repassou o reajuste integral do petróleo para a gasolina e o diesel

Quanto cada juiz recebeu varia de acordo com o tempo trabalhado neste período, mas,  por uma uma média simples, cada um colocou no bolso cerca de R$ 2,7 milhões. E isso sem descontar nem mesmo o Imposto de Renda, pois o pagamento foi caracterizado como indenização. 

Leia ainda: Flávio Bolsonaro diz que guerra na Ucrânia é prova de que armas salvam vidas 

Os juízes foram sendo agraciados em levas, a partir de duas ações propostas ao Supremo Tribunal Federal em 1990 e em 1995. Nas ações, eles reclamavam que o Tribunal de Justiça de Rondônia suspendeu os auxílios unilateralmente por esse período. 

O caso pulou de escaninho em escaninho no STF até que, em 2014, o ministro Luiz Fux propôs uma conciliação entre os juízes e o Tribunal de Justiça de Rondônia. 

Pelo acordo, o tribunal pagaria 90% do valor devido, mais juros e correção. Em troca, os juízes abririam mão de cobrar o auxílio-transporte, a que eles também tinham direito e também deixou de ser pago. [auxílio-transporte??? mas os magistrados são servidos por carros oficiais.] Nesta ocasião, 46 juízes e pensionistas dos que já haviam morrido foram agraciados.

A guerra de Putin: Para não prejudicar relação com Rússia, Planalto veta alerta a brasileiros na Ucrânia

Em 2016, novo embarque no trem do auxílio. O Conselho Nacional de Justiça, atendeu a um pedido de juízes que também haviam trabalhado na época dos atrasados, mas não tinham recorrido ao STF, e deu o benefício retroativo pelo critério da isonomia. Desta vez, mandou o TJ-RO aumentar a lista de agraciados para mais 37. 

Eleição em São Paulo: Para filiar Datena ao Republicanos, deputado e ex-Record pede bênção a chefe da Band

Mas em 2017 e em 2018, o auxílio-moradia começou a ser revisto no país. Em 2018, o Congresso aprovou uma lei restringindo o benefício a apenas magistrados que trabalham em cidades onde não moram. E o CNJ vedou pagamentos retroativos em diferentes estados, como Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Amapá e Sergipe.

Ainda assim, em 2017, o TJ de Rondônia baixou três atos administrativos autorizando automaticamente a entrada de mais dez juízes e herdeiros no grupo de beneficiados pelo auxílio-moradia passado.  

Um desses magistrados  está entre os que receberam mais de R$ 1 milhão em janeiro. O juiz aposentado José Carlos dos Santos, que recebeu R$ 1,5 milhão, encabeça a lista dos pagamentos milionários de Rondônia deste início de ano. 

O processo administrativo que o atendeu foi assinado pelo desembargador Sansão Saldanha, ele mesmo um dos agraciados pelo auxílio-moradia da primeira leva, aquela que reclamou diretamente ao STF nos anos 90. Dos 20 desembargadores ainda hoje em atuação no TJ de Rondônia, 15 receberam o benefício.

Lista dos maiores rendimentos do TJ-RO mostra juízes aposentados com pagamentos de até R$ 1,5 milhão

Segundo o Tribunal de Justiça de Rondônia, os pagamentos se encerraram em janeiro, com a quitação antecipada de dez parcelas que ainda venceriam ao longo deste ano. O argumento do órgão é que, ao desembolsar uma bolada de R$ 23,8 milhões com a antecipação, foi possível economizar R$ 6 milhões só com o pagamento de juros. [juros de quase 25%??? com a Selic anual a pouco mais de 10%.]

Questionado sobre o motivo de autorizar a inclusão de dez juízes por meio de um mero processo administrativo, sem o amparo das instâncias federais, o TJ-RO afirmou que "em razão do acordo no STF e da decisão do CNJ, o tribunal entendeu que os magistrados que estavam na mesma situação dos grupos anteriores se enquadravam naquela decisão e, certamente, obteriam o mesmo resultado nessas instâncias."

Malu Gaspar, jornalista - Blog em O Globo

 


terça-feira, 23 de novembro de 2021

'Coroné' Alcolumbre sacrifica Mendonça por vingança - O Globo

Carlos Andreazza

Orçamento secreto

Rei morto, rei posto

Você leu a excelente reportagem de Natália Portinari neste GLOBO, no último domingo? Tinha por chamada, na capa: “Alcolumbre fez do Amapá líder de verbas do orçamento secreto”; com o que se evoca o trabalho referencial de outro grande repórter, Breno Pires, do Estadão, aquele cuja investigação puxou o fio do controle — discricionário e oculto — de bilhões do Orçamento da União por e para poucos parlamentares. (Aliás: por onde andará o senador Marcio Bittar, relator-geral do Orçamento de 2021?)

Destaque-se o tempo verbal aplicado ao “fazer” na manchete: fez. Alcolumbre, então presidente do Senado, fez de seu estado, em 2020, a unidade da Federação com maior repasse proporcional de verbas oriundas das emendas do relator. Só que aquele ano acabaria e, com ele, o biênio do jovem coronel na presidência do Congresso.

[excelente matéria; só que o ilustre colunista 'esqueceu',  nas muitas interrogações que postou, uma: "como andam as rachadinhas do rei Alcolumbre?" O povo quer saber a resposta, ou será tudo convenientemente esquecido?] 

Rei morto, rei posto.
Mas o rei morto é valente. Não se entrega. E usa prerrogativa do Senadomanipula a concertação que dá equilíbrio aos Poderes para ir à forra. Quem paga a conta do bezerro desmamado, ableitado porém brioso, de súbito sem a derrama do orçamento secreto, ofendido para além da morte, rei morto e ainda a desonra maior deserdado? André Mendonça, cuja cadeira no Supremo depende de aval do Senado.

Eis o título da matéria de Portinari, à página 4: “Orçamento secreto é pano de fundo para trava de Alcolumbre à sabatina de Mendonça ao STF”.

Mendonça paga. E nada de arguição na Comissão de Constituição e Justiça. Coroné Alcolumbre não quer. Plantou até que seria ato de resistência, em defesa da democracia, contra o golpismo de Bolsonaro. Um esculacho. Não deixa, contudo, de reagir a um golpe. Levou rasteira dos antigos sócios. Tiraram-lhe a propriedade sobre destinos de dinheiros públicos.

Rei morto, rei posto.
Mas o rei morto é intrépido e cedo aprendeu a explorar a privatização sem limites das prerrogativas de senador. É o presidente da CCJ. Mexeram com o patrimonialista errado. Paga Mendonça. Pagaria qualquer um, até um que estivesse à altura de guardar a Constituição.

Paga a conta pelo personalismo vingativo-chantagista de Alcolumbreisto, sim a República. Porque o rei morto, tendo feito sucessor no comando do Congresso, pensou que pudesse ser príncipe e manter a gestão de bilhões sob a máscara das emendas do relator. Pensou. E pensou erradamente. Passou o trono. A fonte secou. Ficou bravo. Diz-se que retalia o governo, que decerto traiu acordos. Bolsonaro é traidor. Sem dúvida. Todos corretos uns sobre os outros. Ok.

Acrescente-se, entretanto, nova linha à trama. Uma obviedade. Coroné Alcolumbre se vinga também — e não se fala a respeito — de Rodrigo Pacheco, o rei posto, cuja presidência do Senado é atrapalhada pelo engessamento da CCJ.

É preciso falar sobre o rei posto, o novo Juscelino. Ou não estará posto? Há um passivo na mesa. E a conta não fecha sem inocência. O rei morto destinou, no ano passado, quando rei vivo, pelo menos R$ 320 milhões — em emendas do relator, a fachada para a circulação do orçamento secreto — ao Amapá.

E o rei posto? Nada? Tem nada com as emendas do relator? É rei desinteressado? Ou será somente reservado? (Como Pacheco se relaciona com o sumido Bittar, o relator?) Porque, de repente, parece que o orçamento secreto saiu do Senado com Alcolumbre da presidência. Ou que a engrenagem continua girando na Casa, mas sem patrono. Orçamento discreto? Orçamento secreto automático?

Saiu Alcolumbre, o guloso, e então Pacheco abriu mão de controlar a grana? O rei posto não reina? Abdicou de reinar? O rei desapegado. E aceitamos bem essa versão? Ou terá delegado?

Vinga-se Alcolumbre do governo, porque lhe tomou o poder das distribuições. Mas não de Juscelino Pacheco, herdeiro natural dessa mão? Hum... O estadista Pacheco, em rara união com o patriota Arthur Lira, não tardou a se manifestar — em defesa da autonomia do Legislativo — contra a liminar que suspendeu a execução das emendas do relator. Nenhum interesse pessoal no protesto. Tudo pela separação entre Poderes. Daí por que seja um dos articuladores — sempre em defesa das prerrogativas do Parlamento, como Alcolumbre — de uma resolução do Congresso por meio da qual se daria publicidade, nome aos bois, a deputados e senadores solicitantes das emendas do relator.

Um sentido que encaminharia a solução para o problema — ante o qual o STF exerceu o controle de constitucionalidade — da transparência. Mas que não cuidaria da corrupção da isonomia, da discricionariedade, essencialmente antirrepublicana, afronta à Constituição, como bilhões do Orçamento têm sido movimentados para beneficiar os que votam com o governo e os liras.

De modo que, do Rodrigo Pacheco em que se tenta acreditar, um independente, o esperado seria um pronunciamento pela restituição das emendas do relator a sua natureza técnica original: um recurso para a promoção pontual de correções em erros materiais na Lei Orçamentária Anual. Que tal?

É o que o mundo da fantasia espera do presidenciável de Gilberto Kassab.

Carlos Andreazza, colunista - O Globo


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Duas corporações vorazes – Editorial - O Estado de S. Paulo

Magistrados e procuradores insistem que não são iguais aos demais cidadãos

A menos de duas semanas da entrada em vigor das novas alíquotas de contribuição aprovadas pela reforma da Previdência Social, prevista para 1.º de março, cinco associações de juízes e procuradores pediram ao Supremo Tribunal Federal (STF) a suspensão da aplicação da alíquota de contribuição previdenciária progressiva dos membros do Judiciário e do Ministério Público.

Até o ano passado, a legislação estabelecia uma alíquota fixa de 11% sobre os vencimentos para quem entrou no funcionalismo público até 2013. Com a aprovação da reforma previdenciária, as alíquotas passaram de 7,5% a 22%, aumentando de acordo com a faixa salarial dos servidores. No final do ano passado, as mesmas associações de juízes e procuradores já haviam impetrado uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra essa mudança. Agora, apresentaram um pedido de medida cautelar. Movidas por integrantes das duas corporações, tramitam no STF outras ações contra a reforma previdenciária.

O que chama a atenção em todas essas medidas judiciais é sua fundamentação. Em vez de se limitar a apontar eventuais vícios jurídicos, os clubes de juízes e procuradores alegam que, com as novas alíquotas, a carga tributária sobre os salários de seus associados passará a ser de 46,5%, por causa da “cobrança simultânea do Imposto de Renda. Isso sem contar a tributação sobre o consumo e a propriedade”, o que “devorará mais de 50%” dos rendimentos das duas classes. Para seus membros, as novas alíquotas configuram uma “violação inadmissível às prerrogativas das corporações e às limitações ao poder de tributar, notadamente a vedação ao confisco sem base atuarial”.

Esses argumentos dão a medida do grau de irrealismo e desconhecimento da comprometedora situação financeira do poder público por parte de duas corporações que sempre foram as mais bem remuneradas do funcionalismo. Embora os vencimentos da magistratura e dos procuradores variem conforme os braços especializados do Judiciário e do Ministério Público, a média salarial das duas corporações é mais do que o dobro da média dos servidores do Executivo. Além disso, elas há muito se valem de variados artifícios para burlar o teto constitucional, de R$ 39.293,00. Graças a esses penduricalhos como auxílio-transporte, auxílio-livro, auxílio-paletó e até auxílio para quem trabalha em comarca de “difícil acesso”, no final de 2019 os 360 desembargadores ativos e os 400 aposentados do Tribunal de Justiça de São Paulo estavam recebendo R$ 56 mil por mês, em média, segundo reportagem do Estado. Em outros Estados, a média salarial da magistratura estadual é ainda mais alta. E como a maioria desses penduricalhos é paga a título de “verba indenizatória”, seus valores não são levados em conta no cálculo do teto do funcionalismo e para pagamento de Imposto de Renda, o que aumenta ainda mais os vencimentos líquidos dos membros da magistratura e das procuradorias, pois seus salários e benefícios são alinhados, em nome do princípio da isonomia.

Por isso, quando se queixam de que têm de pagar alíquotas previdenciárias mais altas e progressivas, os membros das duas corporações desprezam um princípio tributário básico – o de que quem ganha mais paga mais. E, quando se queixam de que custa caro pagar “simultaneamente” impostos sobre renda, consumo e propriedade e reclamam direitos que não são concedidos aos demais trabalhadores dos setores público e privado, desprezam um princípio elementar do Estado de Direito – o de que todos são iguais perante a lei.

O pedido de suspensão imediata das regras que aumentaram as alíquotas previdenciárias, levado ao STF por cinco associações de juízes e procuradores, não deixa margem a dúvidas. Para seus membros, justiça é um princípio que eles parecem esquecer, quando veem no cargo que exercem apenas um instrumento que lhes garante um bem-estar que é negado aos demais cidadãos.
 
 Editorial  -  O Estado de S. Paulo 
 
 
 

segunda-feira, 21 de outubro de 2019

A doutrina do Ministério Público – Editorial

O Estado de S. Paulo

A doutrina do MPF é e sempre deve ser exclusivamente a lei. A bíblia que vale para nortear sua atuação é a Constituição. Toda ação que dela se desviar é abuso.

Nos últimos cinco anos, desde a deflagração da primeira fase da Operação Lava Jato – e lá se vão 66 até o momento –, não foram poucos os editoriais publicados nesta página em louvor ao inestimável serviço prestado ao País pela força-tarefa composta por membros da Polícia Federal (PF), do Ministério Público Federal (MPF) e da Receita Federal. Os números da maior operação de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro já realizada no Brasil são impressionantes e falam por si sós. Porém, muito mais importante do que os resultados tangíveis da Lava Jato foi o resgate da confiança dos brasileiros no primado da igualdade de todos os cidadãos perante a lei. Este, sem dúvida, é o maior legado da operação.

Até o advento da Lava Jato, salvo raras exceções, a isonomia consagrada pela Constituição não passava de letra morta no imaginário da sociedade, sabedora de que as cadeias no Brasil, tradicionalmente, eram lugares destinados apenas aos criminosos negros e pobres. A realidade mostra que ainda não deixaram de ser, mas já é possível notar fissuras nesse muro até então intransponível para os mais abastados.

Coerente com seu compromisso centenário de defender a lei e a liberdade acima de tudo, o Estado também não se furtou de apontar neste mesmo espaço os desvios legais cometidos por alguns membros da força-tarefa da Lava Jato e do Poder Judiciário em nome do combate à corrupção e de uma suposta “depuração” do País, cujo corolário mais nefasto foi a desqualificação da atividade política. Na inarredável defesa da lei e do devido processo legal, não raro o Estado foi de encontro à corrente de pensamento, por vezes majoritária, que defende a nobreza dos fins como forma de escamotear os vícios dos meios.


Mas de que valeria o combate à corrupção que há muito mantém o Brasil no atraso se o seu efeito colateral pode ser um mal tão ou mais pernicioso, o triunfo do Estado policialesco? [imperioso lembrar o óbvio: o Estado policialesco só assusta aos criminosos; 
as pessoas de BEM vivem até melhor sob o chamado 'estado policialesco', podem até ter algum direito suprimido, mas, que adianta ter um um lote imenso de direitos e não poder desfrutar deles? - impedidos pela criminalidade de todos os tipos = a criminalidade é nociva tanto quando um ladrão assalta, um vigarista aplica um pequeno golpe, ou temos um presidente da República ladrão.]

A Operação Lava Jato, ou ao menos a força-tarefa de Curitiba, a mais conhecida, está perto do fim. É bom que assim seja porque o que deve ser perene é o império da Constituição, das leis e do devido processo legal, não algumas operações específicas. Respeitadas as leis e garantido o devido processo pelo Poder Judiciário, não há mais razões para crer que o combate à corrupção sofrerá algum revés apenas porque a notória operação chegou ao fim. Esta, aliás, foi uma das muitas falácias usadas como pretexto para justificar alguns abusos cometidos no curso da Lava Jato.

Com a aproximação do fim da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba – que não tem muito tempo pela frente porque realizou o trabalho que tinha de realizar, não por qualquer outra razão –, noticia-se que seu mais famoso personagem, o procurador da República Deltan Dallagnol, negocia uma “saída honrosa” do front de combate à corrupção sem que isso sugira “desistência” ou “abandono” da coordenação da força-tarefa após a divulgação de controvertidas conversas privadas entre ele, outros membros do MPF e o então juiz federal Sérgio Moro.

A solução, de acordo com um grupo de procuradores ligados a Dallagnol, seria a criação de um grupo permanente de combate à corrupção, nos moldes dos Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) dos MPs estaduais. Deltan Dallagnol teria de solicitar ao Conselho Superior do Ministério Público sua promoção a procurador regional, de modo que possa coordenar esse “Gaeco” do MPF e, então, implementar a “doutrina” de combate à corrupção criada pela Lava Jato no novo órgão, de natureza permanente. [qualquer ação do Estado tem que ser impessoal - vincular tudo a Dallagnol seria tentar (em ação  fadada ao fracasso) criar o principio de que alguém é insubstituível.]

Ambas as iniciativas, tanto a criação de um “Gaeco” federal como a perpetuação da tal “doutrina lavajatista”, são uma temeridade. A doutrina do MPF é e sempre deve ser exclusivamente a lei. A bíblia que vale para nortear sua atuação é a Constituição. Toda ação que dela se desviar é abuso, é ilegalidade. A vingar a chamada “saída honrosa” nos moldes em que vem sendo anunciada, fica claro que o objetivo final de parte do MPF é continuar atuando à margem de qualquer tipo de controle, interno ou externo, pautado apenas pela consciência de alguns de seus ilustres membros na virtude de seus próprios desígnios.
Editorial - O Estado de S. Paulo

domingo, 8 de setembro de 2019

O MP precisa saber o seu lugar - Elio Gaspari


Não cabe a procuradores contestar ato legítimo do presidente da República

Assim como Bolsonaro foi para a Presidência pelo voto popular, Aras vai para a cadeira porque a Constituição dá ao presidente esse poder 

Quando Ulysses Guimarães trabalhou para transformar o Ministério Público numa entidade independente, sonhava com uma instituição. Passados 30 anos, surgiu uma corporação. Quase um soviete, ela reclama porque o presidente Jair Bolsonaro nomeou para a procuradoria-geral o procurador Augusto Aras, que não entrou na lista tríplice da guilda da categoria. Assim como Bolsonaro foi para a Presidência pelo voto popular, Aras vai para a cadeira porque a Constituição dá ao presidente esse poder. A Associação Nacional dos Procuradores disse que Bolsonaro interrompeu “um costume constitucional”. Isso não existe; o que há é o texto da Constituição, e o presidente cumpriu-o. 

[desde o advento da Constituição de 88 - os blogs sequer existiam - e já defendíamos a necessidade do Ministério Público ENTENDER e ACEITAR que NÃO é o QUARTO PODER;

o desenho dado ao MP pela CF 88, deixou claro que aquela instituição não é um PODER,  mas,  ao mesmo tempo não deixou claro que ela está abaixo dos 3 PODERES, apesar da clareza cristalina do artigo 2º da CF:

"...Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.."

Essa pequena falta de clareza, digamos, uma inconsistência constitucional, precisa ser retificada, por deixar um ' buraco negro' que é habilmente explorado pelo MP, quando lhe convém.] 


O que Aras fará no cargo, só ele e o tempo dirão. Logo logo, irá para a sua mesa uma representação de deputados petistas contra o corregedor do Ministério Público pela maneira como lidou com as palestras de Deltan Dallagnol. A ver o que fará. A cadeira para a qual vai Aras já foi ocupada por um engavetador-geral e por um exibidor-geral. Um dia antes da escolha de Bolsonaro, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, viu-se diante de uma rebeldia legítima (e legal) dos seis colegas da equipe da Lava-Jato de Brasília, que devolveram seu cargos, insatisfeitos com a conduta da chefe. Horas depois o sexteto ganhou a solidariedade da força-tarefa da Lava-Jato de Curitiba.

Nos seus grupos de bate-papos, os procuradores diziam o que queriam e planejavam o que não deviam. Expostos pelo The Intercept Brasil, blindaram-se, numa estratégia de absurda negativa, como se nenhuma mensagem fosse verdadeira. Não querem explicar o que escreveram. O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprova aumentos salariais capazes de fazer inveja aos mais ativos sindicatos de trabalhadores. Refletem o corporativismo generalizado na busca de benefícios. O próprio doutor Aras usufruiu o direito legal de servir ao Estado como procurador e a si mesmo como advogado. Algo como jogar com a camisa do Barcelona no campeonato espanhol e com a do PSG no francês.

Durante o consulado tucano, os petistas inebriavam-se com um procurador que infernizava a vida do ex-secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge Caldas Pereira. Ele bateu à porta do CNMP mostrando que estava sendo perseguido. Só em 2007 o procurador foi punido e só em 2009 o Conselho incluiu a palavra “perseguição” no seu acórdão. Passaram-se dez anos ao longo dos quais o ministro do STF Gilmar Mendes foi uma voz no deserto, reclamando da prepotência do Ministério Público. Hoje, graças ao Intercept, sabe-se o que eles armavam na Lava-Jato. Conhece-se também a expressa preferência dos doutores (e doutoras) pelo aspecto antipetista da candidatura de Jair Bolsonaro.

A sacrossanta instituição fortalecida por Ulysses Guimarães precisa se defender de dois males dela mesma: o corporativismo e a prepotência. O Ministério Público é independente mas não é um soviete, capaz de armar cavilosamente investigações contra ministros do Supremo, fazendo de conta que não via os colegas que protegiam Sérgio Cabral ou a máquina de propinas tucanas de São Paulo. Deve entender que pode investigar qualquer um, inclusive ele mesmo, e que não lhe cabe contestar um ato legítimo do presidente da República.
Blindou-se tão bem que, ao gritar contra a escolha de Aras, menos gente os ouve.

Campo minado
Jair Bolsonaro precisa fazer algumas coisas para conter os murmúrios de que está cultivando boas relações com sargentos e suboficiais das Forças Armadas.
Pode fazer tudo por eles, menos dar essa impressão.
Ele sentiu o bafo do descontentamento quando ouviu o eco do desconforto criado pelo governador Wilson Witzel (Harvard Fake’15) ao pretender criar o cargo honorífico de general na Polícia Militar do Rio. Se a ideia do governador fosse em frente, por isonomia, deveria criar o posto de almirante honorífico para o Corpo Marítimo de Salvamento dos bombeiros. 

Yossi Shelley
Nenhum embaixador de Israel conseguiu um convívio tão próximo com um presidente brasileiro como o de Yossi Shelley com Jair Bolsonaro.
E nenhum embaixador de Israel conseguiu criar um ambiente tão divisivo na comunidade judaica brasileira.
Nisso são irrelevantes as controvérsias da política israelense ou da brasileira. Shelley sabe quão precipitado foi ao se meter nas operações de resgate de vítimas de Brumadinho e na oferta de “retardantes de fogo” para as queimadas da Amazônia.
O embaixador entra em coisas em que nenhum de seus antecessores entrou.
(...)
Folha de S. Paulo e O Globo - Elio Gaspari, jornalista - MATÉRIA COMPLETA


sexta-feira, 4 de maio de 2018

Fim do foro, fim da festa?

Restrição ao foro foi grande passo, mas as dúvidas são muitas e vão durar

Ao restringir o foro privilegiado para senadores e deputados federais apenas por crimes cometidos durante o mandato e relativos a ele, o Supremo quebrou um paradigma, abriu uma ampla avenida para derrubar o foro de demais autoridades e lavou a alma da opinião pública. Mas isso é só o começo.  Depois da sessão, perguntei à presidente Cármen Lúcia quando a mudança vai começar na prática: “Imediatamente”, ela respondeu, sem titubear. E pode ser hoje. As dúvidas, porém, são muitas:

1) O próprio STF terá de avaliar, caso a caso, o que é e o que não é crime relativo ao mandato. Receber propina para votar um projeto, evidentemente, é. O marido bater na mulher, ao contrário, não tem nenhuma relação com a função. E quando o deputado dá um tapa na cara de alguém num evento político, como aconteceu no Pará?

2) Após a decisão do STF, os advogados vão avaliar se é melhor para o réu ficar no STF ou ir para a primeira instância. E vem a maratona de recursos, numa direção ou outra. Quanto tempo isso dará ao réu e quanta energia tomará do ministro e de uma turma do STF?

3) Não haverá mudança de instância após a instrução do processoquando o ministro dá prazo às partes para alegações finais –, pelo princípio da “prorrogação de competência”. Afinal, o juiz que acompanha um caso, ouve acusação e defesa e conhece as provas é o mais apto para proferir a sentença. Então, dois casos semelhantes poderão ter destinos diferentes por questão de timing. Um ficará no STF, outro irá para a primeira instância. Uma confusão.

4) Todos os processos referentes à Lava Jato irão automaticamente para o juiz Sérgio Moro, ou uns vão para o Rio, outros para Brasília, outros ainda para a Bahia e assim por diante? Com 18 mil juízes no País, há ou não o risco de olhares, interpretações e sentenças muito díspares? Para uns réus, a ida para a primeira instância será o inferno e, para outros, o paraíso?

5) Mais: Moro está numa Vara especializada nos crimes da Lava Jato, mas em Belo Horizonte, por exemplo, há dezenas de juízes com milhares de processos referentes a tráfico, estelionato, assassinato etc. Quando um juiz receber um caso do Supremo, por sorteio, vai se deparar com um processo complexo, cheio de minúcias e de excelentes advogados pagos a peso de ouro. Isso vai ou não parar tudo até ele tomar pé da situação?

6) Renan Calheiros, Romero Jucá e Aécio Neves, campeões de inquéritos entre os que têm foro no STF, enfrentam processos por variados motivos. Cada processo vai para um Estado, uma Vara, um juiz? Vão ter advogados em Curitiba, Brasília, São Paulo, Minas, Alagoas, Roraima? Vão virar muitos Renans, Jucás e Aécios?

7) Como indagou o ministro Gilmar Mendes, o que acontece com os processos de parlamentares que trocam de cargo? Detalhando: como deputado, o sujeito era julgado no STF, agora cai na primeira instância, aí vira ministro e volta para o STF? E, se é demitido, volta de novo para o juiz de primeira instância?

8) Aliás, quando virá a “isonomia” cobrada por Dias Toffoli? Ou seja, e a restrição de foro também para ministros, governadores, membros do próprio Supremo…? Nesse caso, um dos 18 mil juízes poderá pedir busca e apreensão no Planalto e no STF?

9) E a principal dúvida é se, e quando, vier o fim da prisão em segunda instância. O sujeito será julgado antes na primeira e depois na segunda instância, mas, condenado, o que acontecerá? Nada. Ele fará um ar indignado, posará de injustiçado, culpará os inimigos e a mídia e irá para casa curtir mil e um recursos durante 20 anos. Até seu caso voltar à origem: o próprio Supremo.

O Brasil precisa mesmo rever o foro, mas não achem que será rápido, fácil, muito menos uma festa.

Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo 


quarta-feira, 4 de maio de 2016

Cunha pode ficar na presidência da Câmara? e, sendo presidente da Câmara é o segundo na linha sucessória, pode assumir a presidência da República?



O “sim” e o “não” contam com argumentos aceitáveis; um é mais de natureza técnica; o outro, política

Huuummmm… Uma questão espinhosa vai chegar ao Supremo Tribunal Federal, amanhã, dia 5 de maio.

Será que o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tem de deixar a Presidência da Câmara uma vez que já é réu, isto é, que a denúncia contra ele foi aceita pelo Supremo? Será que essa dúvida se coloca especialmente agora, quando, assim que Michel Temer assumir a Presidência, será ele o primeiro na fila a substituir o presidente?

Que fique claro, hein? Isso vale apenas para a vacância temporária. Se o agora vice perder o mandato quando na Presidência, haverá eleições diretas se isso ocorrer até 31 de dezembro de 2016 e indiretas se a partir de 1º de janeiro do ano que vem. É mentira que Cunha vai passar a ser vice-presidente. Adiante, que a questão é mais complexa do que parece.

A Procuradoria-Geral da República entrou, no fim do ano passado, no Supremo, com uma ação cautelar pedindo que Cunha seja afastado da Presidência da Câmara porque estaria usando o cargo para obstruir o processo contra si mesmo no Conselho de Ética.

Pois é… Para que os ministros deponham Cunha do comando da Casa, será preciso evidenciar que ele apelou a manobras não regimentais para impedir que o processo prosperasse. Sem essa materialidade, dificilmente o Supremo interferiria dessa forma em outro Poder. E isso não está claro no pedido da Procuradoria, diga-se.

Muito bem! Essa questão estava posta antes de o afastamento de Dilma ser dado como certo. Com a iminência da posse de Temer, surge outra questão relevante: Cunha pode substituí-lo em vacâncias temporárias? De onde decorre a dúvida? Notem: um presidente da República não pode continuar no cargo depois que a denúncia contra ele é aceita pelo Supremo (no caso de crime comum) ou pelo Senado (no caso de crime de responsabilidade).

Assim, por isonomia, é perfeitamente legítimo entender que, se um presidente titular não pode ser um réu, tampouco pode aquele que o substitui, ainda que temporariamente. Vista a coisa por esse ângulo, a resposta parece óbvia.
E, no entanto, não é.

Vamos ver. Quem vai assumir o lugar de Temer, temporariamente, não é o “indivíduo Cunha”, mas o presidente da Câmara, seja ele quem for. Ora, se a lei não obriga um parlamentar réu a se afastar, ele continua um parlamentar no pleno exercício de suas prerrogativase, entre essas prerrogativas, está presidir a Câmara. E, entre as prerrogativas do presidente da Câmara, está assumir a interinidade quando necessário.

Observem que, quando Janot foi ao Supremo para tirar Cunha da Presidência da Casa, ele ainda não era réu. Mas, ainda que já fosse, não teria feito tal alegação porque não há lei que impeça o deputado de exercer a função. Janot apontou uma espécie de abuso de poder com desvio de função: uso do cargo para impedir que prospere o processo no Conselho de Ética.

Teori Zavascki, o relator do pedido de afastamento de Cunha, prefere ouvir o plenário sobre o conjunto da obra. Acreditem: é mais fácil abraçar a tese de Janot, embora seja preciso apresentar as provas de manipulação do Regimento do que a da isonomia. E a razão é simples: se um sujeito pode continuar a ser deputado mesmo depois de réu, como alegar que isso é possível, mas sem as prerrogativas do cargo?

Para a sanidade do processo político, é claro que seria melhor que Cunha deixasse a Presidência da Câmara. Ocorre que isso precisa de base jurídica, e esta não é das mais simples. Um resultado ele fica na Presidência tem uma sustentação que é principalmente técnica; o outro ele sai se ancora mais numa argumentação política.

Antes que reclamem, saibam: o direito tem zonas cinzentas de definição em qualquer lugar do mundo. Não fosse assim, não haveria juízes para decidir, mas computadores. E eu lhes asseguro que o mundo seria bem pior.

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo - VEJA
Atualizado diante da matéria constar da pauta de amanhã, dia 5, do STF