O
loteamento do governo avança, assentado em critérios patrimonialistas, sem
distinção entre o público e o privado
Sob o olhar obsequioso de Dilma Rousseff, eles lutam pelo controle dos
postos-chave de organismos estatais responsáveis pela água que vaza nas cidades
e goteja no sertão, a terra para plantio e o crédito barato no banco regional. Disputam o domínio
de instrumentos clássicos do Estado para a política no Nordeste — o segundo maior colégio eleitoral, com 38,2
milhões de votos.
No caixa
de três desses órgãos federais prevê-se R$
10 bilhões fluindo para gastos e investimentos durante a temporada de
eleições municipais do ano que vem. Nas últimas semanas, caciques regionais do PMDB e do PP se revezaram em reuniões
com quatro negociadores de Dilma: o vice-presidente Michel Temer e os
ministros Eliseu Padilha (Aviação), Ricardo Berzoini (Comunicações) e Aloizio
Mercadante (Casa Civil).
No centro da mesa de negociações da
Presidência estavam o Departamento Nacional de
Obras Contra as Secas (Dnocs), a Companhia de
Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) e o Banco do Nordeste. O senador cearense Eunício de Oliveira liderava o PMDB nordestino no
embate com o PP regional,
chefiado pelo senador piauiense Ciro Nogueira. Esgrimiam
com ameaças veladas ao governo em futuras votações no Congresso, caso
não recebessem o que pretendiam.
Houve um
momento em que a situação podia ser assim resumida, conforme as coloridas
anotações de um dos negociadores presidenciais: como o
PP de Ciro Nogueira recebeu o Ministério da Integração e a Codevasf, o PMDB de Eunício de Oliveira achou-se no “direito” de ficar com o Banco do Nordeste e o Dnocs. O governo propôs, então, a partilha cruzada
dos cargos: se o comando do banco nordestino está com o PMDB, o escalão
inferior pode ser dividido com o PP. E vice-versa. Eunício vetou. Acabara de conquistar o controle, depois de quatro meses
de batalha. Recebera um banco estatal cujo balanço de 2014 exibiu o melhor
resultado financeiro desde a criação, há 63 anos: lucro de R$ 747 milhões, o
dobro do ano anterior. O senador cearense, líder do PMDB, aparentemente possui
um projeto próprio para o Banco do Nordeste: “Não é para dar lucro, é para fazer desenvolvimento”, disse à
repórter Beatriz Cavalcante.
O loteamento do governo avança,
assentado em critérios patrimonialistas, sem distinção
entre o público e o privado. A partilha de capitanias
estatais no condomínio político-empresarial liderado pelo PMDB, PP e PT,
com a complacência de Lula e Dilma, resultou no mensalão e agora em múltiplas
investigações — dentro e fora do país
— sobre a corrupção na Petrobras.
Na
sexta-feira, enquanto caciques
nordestinos digladiavam no Palácio do Planalto, procuradores pediram à Justiça a declaração de
estado de emergência no sistema público de saúde do Ceará. Ontem em Fortaleza, no
entorno do Banco do Nordeste, do Dnocs e da Codevasf, contavam-se 364 pessoas “internadas” nos corredores das unidades
de saúde — segundo o “Corredômetro
das Emergências” divulgado diariamente pelo Sindicato dos Médicos. Deitadas no chão,
aguardavam leitos em hospitais públicos, superlotados e sem medicamentos.
É a política da incúria.
Por: José Casado, jornalista
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