A astronomia desconhece
unidades de medidas cotidianas, como metro e quilômetro. Tudo é, no mínimo, bilhão. São 5,9 bilhões de
quilômetros da Terra a Plutão, e 263 bilhões da Terra ao centro da Via Láctea.
Assimilá-las não é trivial. Acontece o mesmo com as
despesas do Estado, listadas em bilhão, dezenas de bilhão, centenas de bilhão
de reais, tudo astronômico e desafiador como as distâncias cósmicas. Em
2015, as pastas
da Educação e da Saúde receberam dotação de mais de R$ 100 bilhões cada uma.
Ainda assim, faltou dinheiro. O gasto
com o pagamento dos servidores federais superou os R$ 280 bilhões. A Previdência
custou mais de meio trilhão. O Orçamento Geral da União foi de R$ 2,68 trilhões
de reais. Números siderais, com
tantos zeros, são alcançados pelas calculadoras. Mas deixam as pessoas um pouco
confusas. Uma forma de trazer o debate a um patamar mais terreno é realizar os
cálculos com apoio do calendário (a boa e velha
folhinha) e do cronômetro. Pode parecer estranho, mas faz sentido.
Acompanhe.
A folhinha nos oferece o custo
médio do Estado brasileiro por mês (R$ 223 bilhões ), e por dia (R$
7,3 bilhões). O cronômetro, por
hora (R$ 306 milhões) e por minuto (R$ 5 milhões). Com estes novos fatiamentos, podemos
executar cálculos mais palpáveis. Para
melhorar o saneamento, por exemplo, um dos grandes flagelos nacionais, o Estado reserva, por ano, apenas nove horas das despesas
globais. O Congresso Nacional
custa, anualmente, um dia e seis horas de orçamento. O
Bolsa Família, três dias e 19 horas. O Ministério da Defesa, 11 dias, Saúde e a Educação, cerca de 15 dias
cada.
Além de
dimensionar as despesas no tempo, o
método revela que certas economias apresentadas pelas autoridades como
fruto de um admirável esforço fiscal são
mais modestas do que parecem. Em setembro do ano passado, o Ministério do
Planejamento divulgou um pacote de cortes que incluía
extinção de ministérios, eliminação de cargos de confiança e reduções variadas
de gastos administrativos. Total
da economia do pacote: R$ 2 bilhões no ano. Pelo cronômetro, o Estado comprometeu-se a enxugar seis horas e 34 minutos do
bolo anual. Pouco, já que o ano
tem 8.760 horas. No caso de 2016, bissexto, 24 horas a mais.
O Orçamento de 2015,
que deveria apresentar superávit, fechou com déficit de R$ 118,6 bilhões. Zerá-lo significaria um esforço fiscal semelhante a 16 dias da despesa
anual. Equivaleria a cortar, em cada mês, um dia e oito horas de custos.
Mas as autoridades não conseguiram, e isso nos rendeu a perda do grau de
investimento. A folhinha e o cronômetro
escancaram o tipo de país que estamos construindo.
Em 2015, o Estado reservou aos investimentos, base para o futuro,
apenas dez dias de recursos — e executou cinco. Investimento é
infraestrutura. São obras necessárias para tornar o país socialmente mais justo
e economicamente mais competitivo. Já as despesas
referentes aos compromissos assumidos no passado consomem quase cinco meses do
Orçamento. São dois meses e sete
dias do ano para os serviços da dívida pública e outros dois meses e 12 dias
para o pagamento da Previdência.
Como o Brasil vai progredir
destinando cinco dias do ano ao futuro e quase cinco meses ao passado? Parar de
pagar a dívida não é opção, mas conter seu avanço vertiginoso, uma obrigação. O
mesmo vale para a Previdência, um
sistema que só para em pé se guiado pela lógica atuarial, não por conceitos
subjetivos e discutíveis de justiça. Se o método do cronômetro e da
folhinha não ajudar os governantes a compreender o tamanho do desafio, restará o método da moedinha. Cara, o Brasil vira um país insignificante; coroa, ele quebra
.
Fonte: Coluna do Augusto Nunes - Publicado no Globo
- Eduardo Oinegue
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