Ele nada disse à polícia. Nem precisava, porque deixara o roteiro escrito. As investigações agora avançam na Camex e na Secretaria de Assuntos Internacionais da Fazenda
Desta
vez, a
iniciativa não foi do Ministério Público, criticado nas últimas
semanas pelo formato da denúncia contra o ex-presidente Lula e da prisão do
ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Foi
a Polícia Federal que apresentou ao juiz Sérgio Moro o pedido de prisão de
Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda de Lula e chefe da Casa Civil de
Dilma Rousseff. O detalhe é relevante porque sinaliza um nível inédito de
cooperação entre instituições encarregadas das investigações sobre corrupção.
Notável, também, é a aparente
quietude do empresário Marcelo Odebrecht. Preso há 15 meses, guardou silêncio diante dos
policiais, porque seu pai, Emílio, conduz negociações
para um acordo com a Procuradoria em troca da sua prisão domiciliar. No
próximo dia 18, completa 48 anos. Até a eventual homologação da colaboração com
a Justiça, é incerto o tempo que resta a Marcelo Odebrecht atrás das grades. Ainda assim, foi integral sua contribuição
na prisão do ex-ministro Palocci, ontem. Ele nada disse, segundo a polícia.
Nem precisava, porque registrara nomes e notas em arquivos eletrônicos. Detalhes
estavam na rede de contabilidade paralela do grupo Odebrecht, que Marcelo
organizou para centralizar o controle dos pagamentos de subornos a agentes
públicos no Brasil e em países pelos quais espraiavam negócios de exportação,
subsidiados pelo BNDES. Entre 2004 e
2013, as empreiteiras brasileiras
exportaram US$ 13 bilhões (R$ 42,9 bilhões). O
grupo Odebrecht foi responsável por 76% dessas vendas (US$ 9,8 bilhões,
equivalentes a R$ 32,3 bilhões).
Ficou
com 96% de todo o crédito público dado às exportações de engenharia, via
BNDES. Dessa montanha de dinheiro eram
extraídos os subornos nacionais e internacionais. Na era Lula,
quando o petróleo oscilou na faixa de US$ 100 por barril, Odebrecht extraiu da Petrobras lucros de US$ 1 bilhão anuais. Em Angola e Venezuela os negócios
chegaram a render US$ 500 milhões (ou seja, R$ 1,6 bilhão) por ano.
Os dados
já repassados pelo grupo privado à Procuradoria sugerem que o bilionário “caixa” de Angola e Venezuela viabilizou a escalada de subornos a governantes e partidos
políticos dentro e fora do Brasil, quase sempre pagos no exterior. Palocci, por exemplo, foi preso sob a acusação de intermediar
repasses ilegais de R$ 128 milhões, o equivalente a US$ 38,7 milhões, já
identificados. Não se sabe se por ele
transitaram as maiores “gratificações”
por serviços ilícitos no Brasil. Os telefones de Marcelo registram, entre
outros, um “Amigo” brasileiro de US$ 23 milhões.
Figuram, ainda, empresários-satélites nas operações
externas, como José Roberto Colnaghi, da Asperbras, em negócios com os
donos do poder em Angola (o presidente José Eduardo Santos, o vice Manuel
Vicente e os generais Manuel Dias “Kopelipa”, Leopoldino Fragoso, Adriano
Makevela, António Faceira, Armando da Cruz Neto, Carlos Alberto Hendrick Vaal,
João Baptista de Matos e Luís Pereira Faceira).
É nítido,
porém, o avanço das investigações na direção da Câmara de Comércio Exterior
(Camex) e da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda.
Nelas estavam outros “amigos”, alguns
deles com poder decisivo sobre a liberação de créditos às exportações e
serviços e sempre prestativos no tráfico de informações privilegiadas.
Fonte: José Casado – O
Globo
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