Fronteiras vulneráveis permitem a entrada no país de drogas e armas, que estão na raiz dos problemas de violência em vários estados, incluindo o Rio de Janeiro
Quem observasse do alto as colunas de fumaça preta que se erguiam de pontos da Avenida Brasil e da Rodovia Washington Luís, na manhã de anteontem, poderia pensar que testemunhava um bombardeio na Síria. Mas era só mais uma batalha da guerra cotidiana do Rio. Traficantes haviam ateado fogo a nove ônibus e dois caminhões em represália a uma ação da polícia na Cidade Alta, em Cordovil, onde facções rivais se enfrentavam. Em consequência, algumas das vias mais importantes da Região Metropolitana tiveram de ser bloqueadas, enquanto motoristas e passageiros ficavam reféns da situação, alguns em meio a tiroteios. Para completar o caos, ainda houve saques às cargas dos caminhões incendiados.São vários os motivos que contribuem para esse descontrole da segurança no Rio. A começar pela grave situação fiscal do estado, que praticamente paralisou a administração, impactando setores essenciais — o governo chegou a admitir que a polícia corria o risco de parar este mês por falta de combustível. Soma-se a isso a fragilidade do governo Pezão, que tem se mostrado incapaz de reagir à crise, ficando à espera do socorro da União na medida em que a situação só se agrava.
Acrescente-se ainda o enfraquecimento das UPPs. Reportagem do GLOBO com base em pesquisa da FGV mostrou que, embora o número de homicídios não tenha voltado a patamares pré-UPP, houve um aumento de 23% entre 2012 e 2016. E já há crimes que se situam nos mesmos níveis de 2006. É mais um sinal de alerta para as autoridades. O projeto das UPPs, de retomada de territórios dominados pelo tráfico, representou m ganho importantíssimo para a sociedade. Por isso, é fundamental que o programa seja recuperado, dentro dos princípios que o nortearam, como o policiamento de proximidade que desestimularia ações desastradas da PM em comunidades.
Mas, acima de tudo, o controle da segurança depende do governo federal. E não apenas para enviar a Força Nacional ou contingentes das Forças Armadas em situações de emergência, como agora. A União precisa assumir o protagonismo na segurança. Não só no Rio, porque hoje a atuação das quadrilhas ultrapassa os limites dos estados e mesmo do país. Isso ficou comprovado nas sangrentas rebeliões em presídios do Norte-Nordeste com participação de facções do Sudeste. Ou no roubo a uma transportadora de valores em Ciudad del Este, Paraguai, por bandidos brasileiros.
Fronteiras vulneráveis permitem a entrada no país de drogas e armas, que estão na raiz dos problemas de violência em vários estados, incluindo o Rio. Durante a operação na Cidade Alta, anteontem, a polícia apreendeu 32 fuzis, quantidade maior do que a que foi recolhida em todo o mês de março. Nenhum deles foi fabricado no estado. O problema demanda ações coordenadas de inteligência. Sem que União e estados resolvem essas questões, cidadãos continuarão reféns dos bandidos, vivenciando cenas que estão mais para Aleppo do que para o Rio.
Fonte: Editorial - O Globo
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