Não
há precedente na história da democracia de crise política que se
resolva de fora para dentro –isto é, sem o protagonismo dos próprios
políticos. Inversamente, há inúmeros casos em que, a pretexto de
condenar a ação nefasta de alguns, destruiu-se a democracia, na ilusão
de que a solução poderia vir de fora. O país assiste ao
ressurgimento desse equívoco, que tem como ponto de partida a
relativização –quando não a transgressão pura e simples– da lei.
O
ativismo político de parte do Judiciário e o retorno de manifestações
pró-intervenção militar são sintomas desse equívoco, que ignora as
lições do passado e vende uma ilusão: de que é possível uma democracia
sem políticos. Convém lembrar a lição de Winston Churchill, de
que a democracia é o pior dos regimes, excetuados todos os outros. Mais
que lição, é um alerta permanente.
A política brasileira está
enferma. Algumas das principais lideranças estão submetidas à Justiça,
umas já condenadas, outras denunciadas e algumas já presas. Incluem-se
aí nada menos que dois ex-presidentes –Lula (já condenado) e Dilma (ré)–
e o atual, Michel Temer (denunciado), além de alguns dos principais
empresários do país. São nos momentos de crise que se pode
avaliar a eficiência das instituições. Todo esse processo, inédito entre
nós, se dá sem a quebra da normalidade e rigorosamente dentro da ordem
jurídica do Estado democrático de Direito. Portanto, é hora de insistir
nesse procedimento.
O paciente está na UTI, mas recebe tratamento adequado, que não deve ser interrompido sob pena do pior. Senado
e STF divergem neste momento quanto ao enquadramento penal que se deve
dar a um parlamentar: deve ser julgado como um servidor público
estatutário –que não o é, assim como também não o são os ministros do
STF e o presidente da República– ou se pela Constituição. Cada uma daquelas funções está regulada pela Constituição, que, como é óbvio, se sobrepõe à legislação ordinária.
A
título de comparação, se uma comissão do Senado, que tem a prerrogativa
de julgar ministros do STF, enquadrasse um deles como servidor
estatutário e o suspendesse da função, antes do julgamento pelo
plenário, recolhendo-o à prisão domiciliar, estaria infringindo a
Constituição. O Senado já deu provas de que se dispõe a trabalhar
em harmonia com o Judiciário. Quando o STF decretou a prisão do então
senador Delcídio do Amaral, pediu, dentro do que estabelece a
Constituição, autorização ao Senado, que a aprovou no mesmo dia.
Posteriormente a Comissão de Ética casou o mandato.
Não há, pois,
razão para alimentar controvérsias. E o Senado entendeu e evitou
confrontos com o Supremo. Não o fez porque investe na superação da
crise. No dia 11, o pleno do STF decide Ação Direta de
Inconstitucionalidade, que trata do tema. Acreditamos que prevalecerá a
Constituição, que os ministros não sucumbirão ao ativismo político. A
tentação de legislar já se manifestou em outras ocasiões, mas integrante
do Judiciário é prisioneiro da lei. Se quiser legislar, terá de se
candidatar.
O sistema de pesos e contrapesos da República
funciona. Nenhum dos três Poderes é maior que os demais, e nenhum pode
ter sua esfera de ação invadida, por mais nobre que seja a causa. Não há
atalhos na lei. De minha parte, jamais serei conivente com a
corrupção em qualquer esfera da vida pública ou privada. Mas não darei
também apoio a qualquer ato que, seja lá qual for sua intenção, pretenda
se sobrepor à lei. Fora dela, já dizia Ruy Barbosa, não há salvação.
Por: Ronaldo Caiado - senador-DEM
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