Incidente ocorreu em prédio de luxo da Avenida Atlântica, no início de maio
O
osteopata Pedro Augusto Guerra fica ofegante ao se lembrar de um tiro que, por
pouco, não o atingiu na cabeça. E se mostra indignado ao contar que, segundo
ele, o disparo foi feito pelo juiz Jorge Jansen Counago Novelle, da 15ª Vara
Cível do Rio, dentro de um condomínio de frente para o mar na Avenida
Atlântica, em Copacabana. O ataque, ocorrido por volta das 4h do feriado de 1º
de maio, foi registrado com a câmera de um celular. A motivação ainda é
desconhecida.
O vídeo
mostra o instante em que o tiro é disparado, após uma discussão entre o
osteopata e o juiz. O caso só não terminou em tragédia porque a bala desviou na
grade de uma janela, abrindo, em seguida, um buraco na parede do edifício. Os dois
eram vizinhos. O juiz ainda mora no condomínio; já o osteopata saiu do prédio.
Pedro alugava um imóvel de cerca de 400 metros quadrados, um andar abaixo da
casa de Novelle.
Pelo vão interno de circulação de ar do edifício, um podia ver
parte do apartamento do outro. E foi nesse espaço que ocorreu o incidente,
filmado pelo osteopata. Na gravação, enquanto Pedro apoia o celular no
parapeito de uma janela, escuta-se um grito que seria do juiz: “Bandido!”.
Depois, o magistrado aparece na imagem, na área de serviço de seu apartamento,
e faz acusações contra o osteopata. “Tu é safado. Pedro safado!”, diz ele.
Logo em
seguida, Novelle sai, e ressurge 12 segundos depois. “Tu vai me filmar? Tá me
ameaçando?”, questiona o juiz, que aponta uma arma para a janela de Pedro.
“Então, tome bala”, avisa ele ao atirar. O osteopata afirma que estava com a
cabeça para fora da janela enquanto filmava. Após o disparo, o celular
continuou apoiado no parapeito, mas Pedro caiu no chão. — Achei
que o tiro tinha me acertado. Por sorte, a bala bateu na grade da janela. Fui
atingido apenas por um estilhaço na cabeça, que sangrou um pouco. Mas fiquei
meio perturbado, zonzo — relata Pedro.
Novelle,
por sua vez, não quis se manifestar. Na última sexta-feira pela manhã, uma
equipe do GLOBO o procurou em seu apartamento. Pelo telefone da portaria do
prédio, ele disse que só se pronunciaria em juízo. Ex-defensor
público, Novelle é juiz há quase 20 anos e está de licença médica do Tribunal
de Justiça do Rio. Antes de assumir a 15ª Vara Cível da capital, passou por
comarcas como as de Nova Friburgo e São Gonçalo. Em março deste ano, foi dele a decisão que deu prazo de 24 horas ao
Facebook para retirar do ar as fake news a respeito da vereadora Marielle
Franco (PSOL), assassinada alguns dias antes com o motorista
Anderson Gomes.
Pedro,
que é de São Paulo, mudou-se para o Rio em 2014. Estava morando há
aproximadamente um ano e meio no condomínio da Avenida Atlântica, período no
qual, segundo ele, quase não trocou palavras com o juiz: — Ele era
muito educado quando nos cruzávamos. Nunca tivemos atrito. No
entanto, o osteopata conta que, uma semana antes do ataque, foi acordado, de
madrugada, por gritos de Novelle. Os xingamentos, daquela vez, seriam dirigidos
ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao ex-governador Sérgio Cabral,
ambos presos. Pedro diz que, no feriado de 1º de maio, ouviu xingamentos por
quase duas horas. Antes de fazer o vídeo do disparo, ele gravou áudios que,
afirma, são do magistrado.
Em um dos
trechos, ouve-se uma ameaça: “Suba um andar para ver o que você vai levar na
cabeça ou no peito”. O osteopata diz que tomou a decisão de gravar um vídeo
depois que o juiz ameaçou duas amigas que o visitavam. Após o
disparo, a Polícia Militar foi chamada. E houve mais confusão, aponta a
ocorrência registrada na 14ª DP (Leblon). “Os policiais perceberam que Jorge
Jansen Counago Novelle aparentava estar embriagado, tendo, em determinado
momento, percebido que ele portava um revólver. (...) Ao perceber que os policiais
militares tinham a arma em seu poder, Jorge Jansen Counago Novelle se
descontrolou e passou a tentar reaver a arma de fogo, motivo pelo qual foi
contido pelos policiais militares envolvidos”, diz o boletim da delegacia.
Ainda de
acordo com o documento, enquanto esperavam o juiz trocar de roupa para ir à 14ª
DP, os policiais chamaram o osteopata, para que acompanhasse o registro da
ocorrência. Pedro, no entanto, teria se negado, justificando que iria à
delegacia por meios próprios. E Novelle, por sua vez, “não mais saiu de seu
apartamento”, relata o boletim. No dia seguinte, Pedro e seu advogado, Celso Pazos
Mareque, foram à 14ª DP, onde descobriram que o caso já tinha sido remetido à
Presidência do Tribunal de Justiça do Rio, onde é mantido sob sigilo. —
Solicitamos ao Ministério Público estadual que o caso seja considerado
tentativa de homicídio em vez de disparo de arma de fogo, como foi registrado.
Nossa petição defende ainda que o vídeo e os áudios sejam incluídos no processo
— diz Mareque.
Segundo pessoas
ligadas ao juiz, ele teria se irritado porque Pedro estaria sublocando o
apartamento. O osteopata alega poucas vezes recebeu visitantes no imóvel, e que
nunca discutiu com Novelle por isso.
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