Qualquer autoridade de segundo ou mesmo terceiro escalão, só deve se manifestar sobre assuntos de importância - as do primeiro escalão, sequer devem pensar em se manifestar sobre assuntos menores.] Mas vimos, ontem, 8 de janeiro, um magistrado da ativa, um desembargador, determinar — com uma só canetada, sob motivação religiosa num estado laico — a censura ao especial de Natal da produtora que motivara o ataque terrorista. [aos juízes, desembargadores e autoridade do Poder Judiciário e demais Poderes não é vedado que usem como supedâneo para suas decisões, ensinamentos da religião que professem.
Não podem é aplicar sentenças divergentes das leis, incompatíveis com as provas do processo, ou penas seguindo os limites de suas religiões.
Mas, usar ensinamentos, especialmente CRISTÃOS, é lícito, legal, moral, conveniente e educativo.]
Aqui, recorro à memória. O pedido de suspensão do filme tem origem em ação do Centro Dom Bosco de Fé e Cultura. O mesmo Centro Dom Bosco que, em março de 2018, foi vítima de empastelamento por querer difundir seu pensamento. O episódio ocorreu na PUC do Rio de Janeiro. Escrevi a respeito neste jornal. Isto porque há quem não lide seletivamente com a liberdade de expressão nem flexione posições a depender do vento ideológico. Naquela ocasião, dois jovens foram cercados, escarrados e barbaramente impedidos de fazer circular — na universidade — uma publicação que em nada feria a lei brasileira, mas trazia uma entrevista com Olavo de Carvalho e falava, com simpatia, de Jair Bolsonaro. Exemplares do jornal foram destruídos. A PUC se omitiu. O Centro Acadêmico de Comunicação Social apoiou a blitz.
E agora vemos o mesmo Centro Dom Bosco, vítima naquela vez, agindo contra a liberdade de expressão — e endossado pelo Judiciário brasileiro. Temos aí um bom retrato do Brasil. Silêncio assustador dos governantes frente ao primeiro atentado terrorista reivindicado havido no país desde a ditadura militar. E eloquência de um desembargador a nos lembrar que, compondo o espírito do tempo autoritário corrente, vivemos também sob uma magistrocracia.
Vamos botar as coisas em seus devidos lugares, goste você, ou não, do que fez o Porta dos Fundos: com a liminar — uma obra-prima da inconstitucionalidade — que mandou tirar um filme do ar, o desembargador avalizou, premiou mesmo, a ação terrorista. Nenhum entre os fascistas que atacaram a produtora poderia esperar melhor amparo jurídico; talvez mesmo um estímulo. O desembargador legitima a ação terrorista. Os vagabundos estão festejando. O magistrado ancora a vergonhosa peça com que estabelece a censura no conceito de “acalmar os ânimos” — figura jurídica inexistente. E assim, afrontando o princípio constitucional fundamental da liberdade de expressão, nos dá um exemplo — mais um — de Justiça que pune a vítima.
Acalmar, com censura, um clima incendiado pelo ato terrorista!? E isto, claro, enquanto não há nem sequer um dos terroristas presos — um dos quais debochando do Brasil enquanto se vende como possível asilado político na Rússia. Não tenho muita dúvida de que a liminar doente cairá a qualquer momento. Do ponto de vista técnico, sua base de sustenção inexiste. Não encontrei, no artigo 300 do Código de Processo Civil, a passagem em que se concede a tutela de urgência para "acalmar ânimos". Trata-se de invenção arbitrária de um — mais um — imperador togado. Seria ótima ocasião, portanto, para que o Supremo Tribunal Federal se manifestasse — como corpo, como conjunto, como pleno — contra a censura. E que se dane o recesso do Judiciário.
Mas como, se o próprio STF também é um censor!? Ou já nos teremos esquecido, no bojo de um inquérito anômalo até hoje em curso, que o presidente daquela casa, Dias Toffoli, por meio do ministro Alexandre de Moraes, censurou a revista “Crusoé”? O exemplo vem de cima...
Não são bons os tempos que vivemos.
Mesmo não concordando que quem escreveu aquele texto seja a mesma pessoa que escreveu o acima.
Também estranhamos no texto sob comento que o ilustre articulista baseie sua crítica decisão soberana de um desembargador na ocorrência de uma ação de vandalismo, que chama ato de terrorismo.]
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