Haverá “pós-Covid”? - Alon Feuerwerker
Análise Política
A racionalidade manda projetar cenários e ir ajustando a atitude
conforme os fatos, sempre eles, vão construindo a realidade da qual não
se pode fugir. Mas o ser humano não vive só de razão, tem também a fé. E
uma das formas mais arraigadas desta nos tempos modernos é a fé na
ciência.
Dizer que governa com base na ciência virou peça de narrativa política, e
quando se misturam política e ciência o aspecto quase religioso é
levado ao limite. No caso do SARS-CoV-2 há os que têm fé em quem manda
todo mundo ficar em casa, como em Israel, ou em quem diz que não é bem
assim, como na Suécia.
Antes de ser acusado de relativismo e mandado para a fogueira, esclareço
que acredito no efeito benéfico do achatamento da curva. Dito isso,
vale registrar o que lembrou hoje o diretor de emergências da OMS,
Michael Ryan: "Pode ser que [o SARS-CoV-2] nunca desapareça, que se torne endêmico, como outros vírus. O HIV não desapareceu”.
Colocar todas as fichas na possibilidade de haver um mundo “puro" pós-Covid talvez seja arriscado.
Autoridade e competência
[nos criticam quando dizemos que excesso de democracia atrapalha o combate ao coronavírus;
nos desagrada escrever, ver uma vantagem no comunismo, mesmo que no modelo chinês, é uma inconveniência, mas o 'sucesso' da China no combate à covir-19 é evidente.
Para vencer o vírus é necessário um governo forte, com um comando único.
Um manda fazer, outro diz que não faz, manda não fazer, a Justiça manda fazer, não funciona.
Após mais de dois meses de isolamento total, com um aparente sucesso, a cidade de São Paulo, a exemplo de muitas outras, caminha para o 'lockdown'.
Com o excesso atual de democracia, levaremos um ano decidindo o que pode e o que não pode ser feito.]
Países notam algum repique da contaminação pelo SARS-CoV-2 quando
começam a reabrir as atividades. Inclusive países-exemplo na luta contra
a pandemia, como Alemanha e Coreia do Sul. Não chega a ser surpresa. Em
meio às polêmicas científicas mundo afora, há um consenso: solução
mesmo só com a imunidade, provocada pelo vírus ou pela vacina.
Como a vacina ainda demora, resta a ação viral. E como o isolamento
social protege exatamente contra a contaminação, tem um efeito
colateral. O contágio coletivo é mais lento, e por isso a imunização
coletiva também. E vem o problema: Qual o grau ótimo de achatamento da
curva de contágio de modo a não colapsar o sistema de saúde e tampouco
matar a economia?
Uma curva achatada demais protege bem o sistema hospitalar, o que é bom.
Mas pode ter efeitos trágicos sobre a atividade e o emprego, e portanto
sobre a saúde. O que é indesejável. Para controlar o andamento desses
dois fatores o ideal aqui seria um Estado central com autoridade e
competência. Sofreríamos, mas menos do que vamos sofrer com o nosso
desarranjo atual.
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político - Análise Política
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