Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Robespierre. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Robespierre. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

Randolfe e Moraes, feitos um para o outro - Percival Puggina

 

O inevitável senador pelo Amapá postulou e o intemperante ministro do STF por Michel Temer concedeu ordem para desmontar à força o acampamento a frente do Comando Militar em Brasília. “Ordem dada, missão cumprida”. É assim que no Brasil destes anos imoderados se faz política no Brasil. Sem modos e sem povo.

“Deus cria, o diabo espalha e eles por si se juntam”, constata o ditado popular. A História está cheia desses exemplos, como os de Mao Zedong e Zhou Enlai, Hitler e Goebbels. Às vezes se juntam e se separam como os três monstros da Revolução Francesa – Robespierre, Danton e Marat – ou Lênin e Trotsky.

Aqui no Brasil temos o recente caso da dupla Alexandre de Moraes e Randolfe Rodrigues.  
Um ministro do Supremo e um senador pelo Amapá que se tornou famoso em virtude do ritmo alucinante que, sozinho, consegue imprimir aos tribunais superiores da República. Ele é o cara que faz girar a roleta. E ganha sempre.  
Moraes e Randolfe parecem almas gêmeas, nascidas uma para a outra.
 
O senador alegou que o acampamento estava tumultuando a vida da capital do país e era necessário “puni-los exemplarmente”.  
É óbvio que os acontecimentos posteriores à prisão do cacique têm que ser investigados e as autores identificados e submetidos à lei. 
Se a investigação for feita como deve, certamente evidenciará que houve infiltração.  
Seja porque a conduta dos malfeitores é totalmente atípica em relação aos manifestantes acampados, seja porque, ao contrário, do que pensam o senador e o ministro, ela caracteriza um tipo bem conhecido de militância.

A Vice-Procuradora-Geral da República, Lindôra Araújo, em contestação à decisão, escreveu:

"O Ministério Público Federal requer, em caráter de urgência, o exercício do juízo de retratação pelo eminente Ministro Relator, reconsiderando-se a decisão agravada, com a consequente negativa de seguimento ao pedido incidental formulado por agente político e o desentranhamento dos autos deste inquérito, com arquivamento das petições, sob os fundamentos de falta de legitimidade ad causam, ausência de conexão, violação do sistema acusatório e ocorrência de “bis in idem", Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral da República.

A Vice-Procuradora afirma uma verdade que a dupla não se empenhou em buscar. A Justiça não pode funcionar desse jeito, na base do “ordem dada, missão cumprida” (“falta de legitimidade”), violando constantemente o sistema acusatório da competência da PGR, nem agir onde já existe inquérito funcionando “(bis in idem”). [aos poucos o senador 'estridente' vai aprendendo que um supremo ministro pode muito mas não pode tudo - pode mandar prender um cidadão que expresse um pensamento que  desagrade ao ministro, mas mandar a polícia entrar em ÁREA MILITAR temos certeza que ainda está fora do alcance de um supremo ministro.
Quanto ao senador Randolfe ele terá que acertar contas com o seu eleitorado nas próximas eleições e obtenha uma votação condizente com o que ele tem feito pelo povo do Amapá.
Quanto a poder TUDO, é algo que DEUS não concedeu a nenhum ser humano.]

Mas o Brasil está assim. O povo não gostou do modo como é tratado? Vá para casa e faça cara feia onde ninguém veja. Tal qual em Cuba, que conheço melhor do que o Lula (onde falei e falo com quem ele jamais falou) e certamente como na Venezuela e Nicarágua, que o Lula conhece melhor do que eu (mas na campanha eleitoral não se podia dizer).

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


segunda-feira, 2 de maio de 2022

O que esse jornalismo não viu? - Percival Puggina

O ministro Alexandre de Moraes tem certeza de que as redes sociais estão infiltradas de máquinas de direita a que chamam robôs. Estes atuariam como se fossem seres humanos, influenciariam a comunicação nas redes sociais multiplicando mensagens. Observando tão alardeada perseguição, sugiro a Sua Excelência ligar o televisor. Verá ali robôs em abundância, dizendo o mesmo sobre as mesmas coisas. Uma chatice dos infernos. São raros os sinais de inteligência não artificial.

Isso deveria ser motivo de preocupação para quem tem zelo efetivo pela democracia
Em todo o país, inteligências não artificiais refletem sobre causas e consequências de tão lamentável situação. 
Nas edições de hoje, os robôs da mídia impressa criticam as manifestações de desagrado perante a atuação dos ministros do STF ocorridas nos atos populares deste 1º de Maio.

Por isso, pergunto aos robôs atuando na imprensa brasileira: o que vocês, jornalistas, não viram?

  1. Não viram o Inquérito do Fim do Mundo atraindo para si tudo que desagrade a Corte? Não o viram dar causa à censura, à prisão de jornalistas, fechamento de blogs, desmonetizações, intervenção nas plataformas?
  2. Não viram ali a morte do Estado de Direito e da Democracia, nem anteviram os subsequentes abusos de poder?
  3. Não viram o Regimento Interno do STF incluir todo o território nacional nas suas “dependências”, tratando como crime ocorrido dentro do Supremo qualquer fato ou ato, insulto ou ameaça contra os senhores ministros? Não viram tais ocorrências sendo, por isso, objeto de investigação e julgamento intramuros?
  4. Não viram um vídeo na nuvem do YouTube dar causa a “flagrante perpétuo”, com prisão do autor em seu domicílio, dentro de casa?
  5. Não viram os ministros vítimas acusarem o réu e o julgarem, numa sessão de fazer inveja a Danton e Robespierre? Não viram o despropósito de uma ação que, em “juízo normal”, se resolveria com um pito e cesta básica, redundar em mais de oito anos de prisão? Não viram a demissão sem justa causa do senso de proporção?
  6. Não viram a Constituição virando massa de moldar, voto de ministro em tom de discurso, a Casa se tornando confraria: “Mexeu com um, mexeu com todos!”? Isso nada lhes revelou?

Todos os cidadãos livres podem e devem ter opiniões e convicções, mas não brinquem com a profissão que escolheram. Não a façam instrumento de suas paixões. Se vão ser desumanos, sejam; mas não reservem a condição humana aos companheiros, negando aos adversários os direitos naturais e positivos que reclamam para si e para os seus.

A omissão do Senado em relação ao julgamento de ministros do STF e a do STF em relação aos senadores anulam importante instrumento institucional. Por outro lado, a omissão do jornalismo a esse respeito convalida danos irreparáveis. Perante verdades “estatizadas” e vontades “constitucionalizadas”, a nação passa a viver sob ameaça, insegura e com medo.

São os mesmos sintomas inerentes às tiranias. Por isso, tenho pensado muito em Torquemada, Robespierre e Latsis.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

sexta-feira, 31 de julho de 2020

Julgamento - STF precisa decidir se mantém santuário para bandidos ou aplica a lei

Há um tempo, o ministro Edson Fachin atendeu ao pedido do PSB e concedeu uma liminar proibindo a polícia de entrar nas comunidades do Rio de Janeiro durante a pandemia da Covid-19. Agora, o Supremo Tribunal Federal está votando se mantém essa liminar ou não. Os três primeiros votos foram a favor: Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.

Policia do Rio de Janeiro está impedida de entrar em comunidades dominadas por bandidos por liminar do STF enquanto durar a pandemia.
Policia do Rio de Janeiro está impedida de entrar em comunidades dominadas por bandidos por liminar do STF enquanto durar a pandemia.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

O primeiro voto contra aconteceu na terça-feira (28) e foi do ministro Alexandre de Moraes, que foi ministro da Justiça. Para ele, se a liminar continuar em vigor, a segurança da população das comunidades será retirada. E completou afirmando que isso não é atribuição do STF.
Com essa liminar, a Corte estabelece que o fator de segurança é quem comete crimes e não a polícia, ou seja, que se a polícia entrar é um fator de insegurança, um absurdo. E que essas favelas são territórios soberanos de bandidos, fora da lei nacional. Em tempos de guerra do Vietnã, a gente costumava chamar isso de santuário.

Crime não compensa
Está sendo leiloado o lote de 15 diamantes e cinco barras de ouro 24 quilates do Ali Babá carioca, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral. O dinheiro arrecadado vai para o Ministério da Justiça e o Fundo Antidrogas.
Essa era a riqueza que o ex-governador podia guardar em casa. Cabral foi condenado, pela Lava Jato, a 281 anos de prisão por corrupção. Há muitos casos em que o crime não compensa.

Hidroxicloroquina
A médica nigeriana Stella Immanuel, que mora e trabalha em Houston (EUA), fez um desabafo recentemente sobre o uso da hidroxicloroquina. Muitos de vocês já devem ter visto o vídeo. Stella disse que já salvou 350 pacientes que tinham coronavírus, inclusive pessoas com diabetes, pressão alta, asma e idosos. Afirmou que é um absurdo pessoas morrerem de Covid-19.
Para ela, o tratamento com hidroxicloroquina, zinco e azitromicina deve ser usado. Stella afirma que os médicos que falam que ainda não há provas consistentes de que o uso desses medicamentos é eficaz não trataram ninguém com o vírus.

A médica diz que essa é a prova. Lá na Suíça também há uma prova: quando o tratamento com a hidroxicloroquina foi suspenso, a quantidade de mortes por milhão aumentou e quando o uso foi retomado, as mortes caíram novamente.

Regime de terror
Novamente um decreto municipal passou por cima dos direitos constitucionais. Dessa vez aconteceu em Balneário Camboriú (SC). Decretos municipais estão permitindo que a polícia entre na casa de pessoas sem mandado judicial.
Isso é um regime de terror. Digo isso porque nesta terça-feira (28) completou 236 anos que Maximilien de Robespierre, o líder do regime do terror, foi guilhotinado em Paris durante a Revolução Francesa.

Sem foro privilegiado
A Câmara está reclamando ao STF que a polícia não pode fazer busca e  apreensão nos gabinetes dos deputados. Só que algumas operações não são referentes ao período de mandato do parlamentar.
Quando uma investigação se refere a um fato anterior ao mandato, um juiz de primeira instância pode determinar a busca e apreensão porque o caso não tem mais foro privilegiado. O próprio Supremo decidiu isso.

Alexandre Garcia, jornalista - Gazeta do Povo - Vozes




terça-feira, 1 de outubro de 2019

SUPREMO NA BERLINDA - Alexandre Garcia




Um jornalista sério e equilibrado tuitou nesse fim de semana adjetivos sobre o Supremo, tão agressivos que eu não seria capaz de reproduzir aqui. Na segunda-feira, ouvi o mesmo do dentista, do garçom, da balconista e do policial. Eu nunca percebera antes tanta raiva e tanta descrença contra a nossa corte suprema.

A Constituição segue Montesquieu e, já no segundo artigo, diz que os poderes são “independentes e harmônicos entre si”. É óbvio que os três poderes têm que estar em primeiro lugar harmônicos com as aspirações do povo, pois o primeiro artigo da Constituição estabelece que “todo o poder emana do povo”. Assim, o Poder Judiciário, embora não seja escolhido pelo voto popular, igualmente emana do povo, com escolhidos pelos representantes eleitos.

Não estaria o Supremo, portanto, que estar em harmonia  com as aspirações do povo, como a de combater a corrupção, punindo os corruptos? Claro, o Supremo não pode ser um tribunal de exceção, tampouco pode ficar sob a tutela de emoções expressas nas ruas ou nas redes sociais. Mas não pode ficar numa torre de marfim, acima e distante da sociedade em que jurisdiciona Justiça em última instância. Entre Robespierre e Salomão, melhor pender para a sabedoria salomônica, ainda que o jacobino fosse de “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”.

Nesta semana, o Supremo terá que ser salomônico, na decisão sobre um habeas corpus em que o réu não foi ouvido de novo após o depoimento de colaborador premiado que o acusa. Sem regra escrita sobre isso no Código de Processo Penal nem na Lei da Colaboração Premiada o sensato é que valha após a manifestação do Supremo; não antes. [com todas as vênias o mais sensato seria o assunto ser tratado pelo Congresso,na forma de Lei - projeto de um congressista ou do Poder Executivo;  
Não tem sentido, sendo uma agressão ao princípio de INDEPENDÊNCIA e HARMONIA entre os Poderes, uma manifestação do Supremo se tornar lei.
Por se tratar de decisão exarada em cima de um habeas corpus não terá efeito vinculante mas será lei.] Diz-se que se retroagir em benefício dos réus, prejudicaria 32 sentenças da Lava-jato, com 143 condenados. Seria um tiro de bala de prata na grande operação contra a corrupção. A conferir.

Ainda atingindo o Poder Judiciário, parece não haver harmonia dentro dele próprio.  O mais ativo dos acusadores, como chefe da Procuradoria-Geral, Rodrigo Janot, revelou que estava disposto a matar o Ministro Gilmar Mendes dentro do Supremo, e suicidar-se em seguida. E que usava bebidas alcoólicas no seu gabinete, para aliviar as tensões.

Mesmo sem crime cometido, o Supremo reagiu como histórias de ficção: cassou-lhe o porte de arma, aprendeu-lhe a pistola, retirou de seus escritório e apartamento computadores e celulares, criando a figura de crime de pensamento, que até agora só existia na lista de pecados religiosos. E é bom constatar que tudo isso é porque o Supremo virou tribunal penal de primeira instância para uma multidão de privilegiados, pela Constituição de 1988. [até banheiro público unissex se tornou assunto a ser decidido - por enquanto, está na fase de pedido de vista - pela Suprema Corte.] Quando foi promulgada, o então Presidente da República, José Sarney, declarou: “Com esta Constituição, o país fica ingovernável”.

Alexandre Garcia, Gazeta do Povo




sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Os bandidos agradecem, Janot!

Para tentar preservar os porões do MP, Janot dá uma ajuda à bandidagem

Começo a minha coluna com uma saudação de rigor: "Tchau, Dilma!". Ou, para lembrar a governanta: "Às vezes, quem está na chuva não quer estar na chuva."

Agora ao Brasil do futuro.  Desde que li o poemeto "Anedota Búlgara", de Carlos Drummond de Andrade, não tomo os defensores de borboletas como expressão do bem absoluto, embora, em si, protegê-las me pareça uma boa ideia. Nem todos conhecem ou se lembram. É assim: "Era uma vez um czar naturalista/ que caçava homens./ Quando lhe disseram que também se caçam borboletas e/ andorinhas,/ ficou muito espantado/ e achou uma barbaridade."

Pegou fogo nesta semana e veio à superfície um embate antes subterrâneo envolvendo a Lava Jato. Há coisas que estão completamente fora do lugar –e minha crítica não é nova.  Um vazamento sobre as tratativas para a delação de Léo Pinheiro acendeu o sinal vermelho em vários setores do Judiciário. A "Veja" revelou que o nome do ministro Dias Toffoli, do Supremo, integrava um anexo oficioso que circulava lá pelo Ministério Público Federal. Não especulo sobre as fontes da revista. À imprensa não cabe guardar segredos, mas revelá-los. E segue sendo uma obrigação do poder público apurar os vazamentos. Cada um no seu quadrado. Se há porões no MPF –e, pelo visto, há–, a revista presta um serviço ao revelá-lo.

Nas democracias, se cada um cumprir o seu papel, as coisas avançam.  A aposta quase unânime é a de que o vazamento partiu do próprio MPF, o que Rodrigo Janot nega. De forma inexplicável, o homem pôs fim à delação de Léo Pinheiro, como se o vazamento do que ele assegura não existir (???) interessasse ao ex-chefão da OAS. Ora, a consequência prova que não.

Restou em muitos setores do meio jurídico a seguinte constatação
: "Ai de quem discordar dos comandantes da Lava Jato! Terá a reputação maculada". Toffoli deu ao menos dois votos que não agradaram à força-tarefa. Ministros do Supremo lidam com a informação de que há uma espécie de esforço concentrado para fazer a Lava Jato chegar como um tsunami à Corte.  E como Rodrigo Janot respondeu à coisa? Pôs fim à delação de Léo Pinheiro. Ora, mantida a decisão, o empreiteiro levará para a lápide fria as informações que seriam certamente do interesse do país. A esta altura, há figurões rezando para que as coisas assim permaneçam, não é mesmo, Lula? A delação dos diretores da Odebrecht está em andamento. E se alguém que se sabe na mira resolver se antecipar e "vazar" sucessos de verões passados? Suspende-se também essa?

Qual é o ponto? O meritório trabalho do Ministério Público Federal e da PF, que está criando condições para um Brasil melhor do que aquele que teríamos sem ele, está sendo assediado pelo espírito de Savonarola que toma algumas lideranças. Pesquisem a respeito. O homem não era mau. Ele só não sabia distinguir Dante ou Botticelli de sabotadores da fé. Mandava tudo para a fogueira das vaidades.

Não temos Dantes e Botticellis dando sopa por aí. Mas nem todo mundo que discorda de alguns métodos dos bravos rapazes do MP, ou de suas propostas, são defensores da corrupção. Entre as tais 10 medidas, há a defesa de provas colhidas ilicitamente, "desde que de "boa fé". Hein? A "boa fé" de Robespierre era a guilhotina. A de Savonarola, a fogueira.

O ministro Gilmar Mendes chamou a proposta de "coisa de cretinos". E de cretinos contraproducentes, acrescento, que sempre conseguem o oposto do que almejam com a sua estupidez purificadora.  Ou não é isso que teremos se Léo Pinheiro levar seus segredos para o além?


Fonte: Folha de SP - Coluna do Reinaldo Azevedo


terça-feira, 19 de julho de 2016

O terror é apenas o horror



Alá deve estar mais envergonhado da ação assassina de seus soldados da jihad do que toda a cristandade

Em 1890, o marinheiro polonês naturalizado britânico Jósef Konrad subiu o Rio Congo e testemunhou uma carnificina na qual metade da população local sucumbiu. Tornado o escritor que sempre justifica uma releitura prazerosa por outro gênio, Jorge Luís Borges, Joseph Conrad registrou seu testemunho no romance No Coração das Trevas. E deu voz ao ódio ao colonialismo. Do livro o gênio do cinema Francis Ford Coppola extraiu o enredo de Apocalypse Now, expressando o ódio ao imperialismo invasor. Antes disso, finda a Segunda Guerra Mundial, em Paris, dois gênios da literatura francesa, ambos ganhadores do Prêmio Nobel da Literatura, injustamente nunca concedido ao autor de Lord Jim, transformaram numa rixa uma boa amizade mantida nas mesas do café Deux Magots, em Saint Germain-des-Près.

O  caolho Sartre defendia o terrorismo como arma na luta da Argélia contra o colonialismo francês. O argelino Camus cunhou a máxima de que ele não perdoaria o terrorista cuja bomba matasse aleatoriamente sua mãe numa estação de metrô em Oran, onde ele nasceu. E assim o terrorismo – amor ou ódio? – , dilema crucial do século 20, invadiu e dilacera o século 21.

Sartre, o pai do existencialismo, tornou-se um dos maiores ídolos do social-comunismo da História. Mas em seu enterro gigantesco também foi enterrada a reputação de um intelectual brilhante que tinha tudo para imortalizar-se como o filósofo de O Ser e o Nada. E terminou permanecendo vivo como o escritor de As Palavras. Edição recente de textos esparsos de galã Camus mostra como o amigo que virou rival dele não é mais apenas o genial romancista de O Estrangeiro, como era conhecido antes, pois ele, não Sartre, é que tinha razão nesta questão capital: não há razão nenhuma para a execução aleatória de cidadãos inocentes e alheios às questões que acionam os explosivos de um terrorista suicida.

O atentado contra a redação do Charlie Hebdo, a sequência de chacinas de 13 de novembro em casas noturnas da capital francesa e o caminhão-bomba que atropelou e matou 84 na comemoração do aniversário da queda da Bastilha, em 14 de julho de 2016, expõem mais do que nunca a completa razão lógica de Camus. O colonialismo não foi derrotado nas execuções aleatórias da Casbah, em Argel. O imperialismo não sucumbiu à explosão das Torres Gêmeas em Nova York. O terrorismo não tem causa, contém apenas ódio, preconceito, irracionalidade e uma brutalidade do qual o único animal capaz é o soi-disant racional. Um leão na floresta não promove chacinas como a do aeroporto de Istambul.

“O inferno são os outros”, definiu subliminarmente Sartre na peça Huis Clos (Entre Quatro Paredes), na boca do protagonista Garcin a essência do terror como arma. É uma ironia que Sartre não tenha entendido o próprio conceito e que Camus não tenha conseguido como ele resumir tudo o que pensava sobre o assunto numa síntese absoluta como esta.  O atentado de 14 de julho em Nice, à margem do “mare nostrum”, o Mediterrâneo, em cujo azul deslumbrante circularam as antigas civilizações grega e romana, ilustra à perfeição essa síntese. Não representa a vingança dos sarracenos contra os cruzados e os israelitas na luta milenar pela Terra Sagrada de Jerusalém. Alá deve estar mais envergonhado da ação assassina de seus soldados da jihad do que toda a cristandade. Maomé pode até ter tornado mais difíceis de aturar seus períodos de jejum, pois não entende como em seu ainda nome se derrama tanto sangue inocente. Marx, o jornalista que bradava contra a censura na Gazeta Renana, também não concebeu nem conceberia tanta crueldade. Não há fé nem ideal que justifiquem o ataque à liberdade dos outros de pensarem como quiserem e de rezarem para em que acreditem. Não há motivo, razão nem lógica.

A polícia francesa procura por algo inútil para dizer ao bobalhão do Hollande se o atentado foi planejado ou sequer autorizado pelo Estado Islâmico. Esta é uma manifestação da tonteira generalizada compartilhada pelos turcos que gastam bilhões para garantir a segurança em seu território e não conseguem evitar atentados em seu aeroporto que homenageia o grande estadista Ataturk. Ou da completa burrice dos responsáveis pela segurança do Rio de Janeiro durante a Olimpíada para a qual virão os principais alvos do “ódio do novo califado”, todos representados pela elite de seus ídolos esportivos: EUA, Reino Unido, Alemanha, França, etc.

Se o 14 de julho do sanguinário Robespierre e do corrupto Danton foi violado por um caminhoneiro lunático, não importa o mínimo se este foi treinado pelo Estado Islâmico ou se apenas inspirou-se no ódio que move hoje todos os psicopatas que se recusam a conviver com os diferentes e, por isso, os liquidam. O Brasil não é inimigo do Islã. E nossa presidente afastada, no auge de escassez de sua parca inteligente, chegou a propor na Nova York das Torres Gêmeas negociações com o califado da intolerância.

O que importa é que os imbecis continuam acreditando nas mesmas sandices escritas, não por Maomé, mas por Sartre. Os franceses desconfiam que um terrorista brasileiro pretende atacar a delegação francesa. Ninguém deu bola. Todo mundo acredita que a irrelevância de nosso país na geopolítica global nos torna imunes à fúria terrorista. Falta-nos a consciência que Camus tinha de que a desumanidade do extermínio do outro, seja quem for, desde que não seja o próprio combatente, nunca tem justificativa e logo não pode ser perdoada.

A única lógica do atentado de Nice é disseminar o medo. Não adiantam as lamúrias de Hollande, a tristeza de Merkel, o estupor de miss May, a diplomática solidariedade de Obama nem a patética ignorância de madama Rousseff. O medo está disseminado. Que o medo seja, então, a nossa arma. A única capaz de mostrar que ninguém é invulnerável, nem os esquimós no Alaska nem os visitantes da bela El Calafate, na Patagônia argentina. Os peles-vermelhas das reservas americanas, os caçadores mongóis e os monges do Tibete são todos alvos eventuais do terror desumano. Enquanto todos estes, inclusive nós, não tivermos essa consciência, continuaremos sem ter nenhuma chance de defesa contra o homofóbico de Orlando, os irmãos que infernizaram a maratona de Boston para ganhar a pior das notoriedades ou os separatistas de origem russa da Ucrânia que se dão ao luxo de abater aviões comerciais em pleno voo. Ninguém é seguro em lugar nenhum deste planeta. 

E o inimigo não é só o terrorista em potencial, mas todo babaca que ainda prega a tolerância com o terror por motivos ideológicos, políticos ou religiosos. Não pense a vítima que eles são inocentes porque não têm armas. Eles têm algo pior do que a bomba de Hidrogênio: eles têm a crença de que só eles salvarão a Terra

O terror é apenas e tão somente, aprendamos todos, por favor, o que exprime a fala de Mc Duff na cena 3 do segundo ato de Macbeth, de Shakespeare, usada por Conrad como epígrafe em No Coração das Trevas: o horror, horror, horror


Publicado no Blog do Nêumanne