Formação
geopolítica - A Bacia Amazônica é um sistema fisiográfico fechado e
isolado do restante do continente, com características climáticas peculiares e
vocação endógena. Tem o rio Amazonas como espinha dorsal de uma rede
hidrográfica de 20 mil quilômetros, com dezenas de ecossistemas singulares que
se integram harmonicamente no universo da hileia. Por sua magnitude, porém
subpovoada e remota, Djalma Batista apelidou-a de “esfinge amazônica” e Armando
Mendes a classificou como “mega latifúndio” político.
A atração
gravitacional do Grande Rio favorece a centralização política da Bacia. A
colonização portuguesa, iniciada em 1614, aproveitou essa vantagem para
preservar-lhe a unidade. O Grão-Pará teve a sua formação independente do
Brasil, até 15 de agosto de 1823, quando foi incorporado à soberania
nacional. Após a
Independência, eclodiu a cabanagem, extravasando um ressentimento secular dos
nativos contra a opressão e a exploração. A violência generalizada, entre 1835
e 1840, consumiu 20% da população total. Reprimida pela força, a cabanagem
permanece latente no inconsciente coletivo.
A estrutura
econômica evoluiu por surtos extrativistas. O ciclo das drogas do sertão
alimentou o processo colonial. Na segunda metade do século XIX, a indústria
automobilística em expansão ensejou o “boom” econômico da borracha, atraindo
investimentos internacionais para as regiões metropolitanas. Esgotado o ciclo
em 1914, a região ficou à deriva até a década de 1940, quando nova demanda da
borracha foi induzida pelo esforço da 2ª Guerra Mundial. Nessa época, a Região
sofreu o bloqueio da foz do Amazonas pela força de submarinos alemã, que causou
apagões e racionamento em Manaus e Belém. Durante os
ciclos da borracha, ocorreu a migração em massa de nordestinos para os
seringais de “hevea braziliensis”, povoando os afluentes da margem Sul. A Calha
Norte, onde predomina a “hevea benthamiana”, de produtividade inferior,
manteve-se intocada. O Norte do Pará tem área equivalente à da Itália, mas com
uma população (ribeirinha) de Copacabana, sendo o vazio demográfico de maior
risco geopolítico à soberania do Brasil.
Situação atual
Os índices
regionais apontam subdesenvolvimento e dependência. Todos os estados amazônicos
seriam inviáveis sem as transferências obrigatórias da União. 41,61% da
população (16,468 milhões de pessoas) vive abaixo da linha de pobreza, mas
cresce na proporção de 3,07 %, quase o dobro da taxa média nacional
(1,8%). A renda-per-capita equivale a 56,7% da nacional, e o IDH
(0,681) é inferior ao do país (0,699). A maior e mais rica região do Brasil em
recursos naturais contribui com apenas 4,8% para o PIB nacional.
Os
indicadores da Zona Franca de Manaus retratam estagnação, com tendência
declinante: entre 2010 e 2018, sua contribuição para o PIB do Amazonas caiu de
25,92% para 23,41%. Os benefícios ficaram restritos à região metropolitana. O
modelo esgotou-se. O contexto
estratégico é preocupante. Pressões ambientalistas e indigenistas de toda a
ordem invalidam as políticas governamentais. No entorno, multiplicam-se os
ilícitos transnacionais. A Venezuela tende à fragmentação da ordem interna. O
Suriname e a Guiana enfrentam o problema da expansão chinesa.
Estratégias governamentais
As
políticas governamentais para a Amazônia foram reativas e descontínuas, até a
década de 1970. No contexto da 2ª Guerra Mundial, o governo Vargas criou os
territórios federais de Guaporé (atual Rondônia), Rio Branco (atual Roraima) e
Amapá. Durante a Constituinte de 1946, houve pressões em favor da
internacionalização, contidas graças à liderança do deputado Arthur Bernardes.
O Art. 199 da CF destinou 3% da arrecadação federal para o Plano de Valorização
da Amazônia, por 20 anos, mas só foi regulamentado em 1953. A rodovia
Belém-Brasília foi construída em 1959/1960, no governo Juscelino Kubitschek,
como alternativa de acesso terrestre à Região.
O ciclo
militar foi a época dos grandes projetos. Criou-se a Zona Franca de Manaus, com
a finalidade de desenvolver a Amazônia Ocidental, e o Programa de Integração
Nacional – PIN, objetivando implantar a infraestrutura econômica regional. Seus
recursos permitiram construir as rodovias Transamazônica (BR-230), BR-319, 163
e 174 e iniciar a Perimetral Norte. A COMARA concretizou a rede de aeroportos
estratégicos. Contudo, o PIN terminou incompleto, devido à crise do petróleo.
Nos anos 1980, cessaram os investimentos.
Em 1988, a
Região foi contemplada no Art. 159 da Constituição, que instituiu as
Transferências Obrigatórias da União. Nessa conjuntura, construiu-se a BR-364 e
foram transferidas a 16ª Bda Inf Sl para Tefé e a 2ª Bda Inf Sl para S. Gabriel
da Cachoeira. O Programa
Amazônia Sustentável, lançado em 2008, não passou de um discurso ideológico de
cooptação da população nativa, sem resultado prático.
Programa Barão do Rio Branco
Concebido
para integrar a Calha Norte e fomentar o mercado regional da Bacia Amazônica, o
programa Barão do Rio Branco homenageia a memória do grande diplomata que
solucionou as questões do Amapá, do Acre e do Japurá. Consiste, basicamente, na
implantação da ponte de Óbidos sobre o rio Amazonas e da hidrelétrica do rio
Trombetas, em Cachoeira Porteira. Essas duas obras conjugadas têm potencial
sinergético para transformar Santarém em um entreposto estratégico, desenvolver
o Baixo Amazonas e ensejar um fluxo comercial contínuo entre Manaus e Belém.
A ponte
Barão do Rio Branco vai permitir a integração do Amapá, bem como a Calha Norte
do Amazonas e o estado de Roraima ao sistema rodoferroviário nacional. E abrir
a possibilidade de estender a BR-163 até a fronteira do Suriname. Após a ponte,
o porto de Óbidos pode tornar-se um modal hidro-rodo-ferroviário estratégico,
por oferecer calado de 14 m no pico da vazante, permitindo a atracação de
embarcações de 30 mil toneladas, o que vai contribuir para a redução do frete
hidroviário.
A
hidrelétrica do rio Trombetas vai aumentar a oferta regional de energia e
estabilizar o balanço de carga, pelo aproveitamento da variação anual do regime
de águas: quando a Calha Sul está na vazante, a Calha Norte está na cheia e
vice-versa. A eletricidade vai viabilizar a industrialização do minério de
alumina-alumínio, abundante em Oriximiná, Óbidos e nos demais municípios da
Calha Norte.
Conclusão
Relegada a
Bacia Amazônica por três décadas, esvaziou-se o interior, cresceu a favelização
urbana e estagnou-se a economia. O Programa Barão do Rio Branco é um “cluster”
geopolítico com potencial para impulsionar-lhe o mercado interno. Um mercado
pujante e autônomo pode ser a solução para o problema do desenvolvimento
regional.