STF obriga a retirada das grades em prédios residenciais do Cruzeiro
Ministro
do STF dá decisão final sobre o cercamento dos prédios residenciais do
bairro, o que obriga a retirada. A instalação vai contra as normas
estabelecidas para a área tombada de Brasília
As grades que cercam os pilotis dos prédios do Cruzeiro Novo terão
de ser retiradas. Colocando fim à polêmica que se arrasta há 23 anos, o
Supremo Tribunal Federal (STF) manteve o julgamento do Superior Tribunal
de Justiça (STJ) que determina a remoção. Não cabe mais recurso da
decisão do ministro Celso de Melo. Ela, porém, não fala em prazo para o
cumprimento. Juristas ouvidos pelo Correio afirmaram que o GDF tem que
iniciar as derrubadas logo após ser notificado.
Por
integrar área tombada, os edifícios da região administrativa deveriam
respeitar as regras estabelecidas no plano do urbanista Lucio Costa para
as superquadras do Plano Piloto: a livre circulação sob os prédios
erguidos em pilotis nas áreas residenciais (Leia Para saber mais). Mas
os moradores cercaram todos os prédios com a alegação de que as grades
lhes dariam segurança. A Justiça, no entanto, considerou que elas são
uma “mutilação”. [parece que a opção da Justiça é que as pessoas sejam mutiladas; as grades impedem que marginais passem por baixo dos prédios, abordem moradores, cometam assaltos, sem que nada possa ser feito.
Sem as grades, um assaltante pode se aproximar da cabine de porteiro e obrigar que ele abra todo um Bloco e outros bandidos façam um arrastão.
Com as grades a portaria fica menos vulnerável, a ação dos bandidos chama atenção = torna mais dificil a ação de marginais.
O cercamento com grades deveria ser permit6ido em todos os prédios residenciais do DF.]
O Cruzeiro Novo tem 78 quadras
e 324 prédios. Os moradores da cidade prometem resistir contra a
retirada das grades. Eles defendem o cercamento por uma questão de
segurança. Segundo estatísticas da Secretaria de Segurança Pública do
DF, desde 2015 não ocorre assalto a residência na localidade. Naquele
ano, houve duas ocorrências de roubo a residência e apenas uma em 2014.
Para os moradores, isso é fruto também do cercamento.
Circulação
O
prefeito comunitário do Cruzeiro Novo, Ênio Ferreira da Silva, ressalta
que os crimes no Cruzeiro são menores, se comparados às outras regiões
do DF, justamente por causa das grades. “Somos cumpridores das leis, mas
não vamos aceitar a remoção”, afirma. “Nas Asas Norte e Sul, as quadras
são em semicírculos, não circulam muitos carros. Aqui, temos vias de
circulação, ou seja, temos muita circulação de pessoas. Com a retirada,
os bandidos teriam maior facilidade”, pondera. Ele pretende mobilizar os
moradores, mas não sabe como reverter a decisão.
Moradora
há 30 anos do bloco E da 911 do Cruzeiro Novo, Rosemar Araújo, 58 anos,
usa o pilotis para brincar com o neto, Nathan Magalhães, 4. “Não terei
tranquilidade para deixar ele aqui”, diz, por acreditar que a remoção
vai favorecer a ação de bandidos. “Com grade, já conseguiram entrar no
prédio e levar a bicicleta do meu filho. Imagine sem.”
O
aposentado Manoel Neto, 54 anos, mora no Cruzeiro Novo desde os 7.
Quando chegou, havia poucos prédios e nenhuma grade. “Era uma outra
época, se podia andar com segurança por toda Brasília”, lembra. Na
quadra onde mora há becos. Com a retirada das grades, ele teme a
violência. “A grade é para garantir que nossas casas não sejam invadidas
pelos bandidos. Seriam necessário o policiamento 24 horas por dia, o
que é algo difícil.”
Entenda o caso
Vai e vem que dura 23 anos
A
Lei Distrital nº 1.063, de 1996, permitiu o cercamento das residências
do Cruzeiro. Mas, em 2005, o Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios (MPDFT) entrou com ação direta de inconstitucionalidade,
argumentando que só o Poder Executivo poderia propor leis sobre o
fechamento de áreas públicas. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios (TJDFT) acatou o pedido e suspendeu o efeito da lei.
Em
2008, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) colocou em pauta uma ação do
Iphan e decidiu pela retirada das cercas do Cruzeiro Novo, em respeito
ao tombamento de Brasília, mas não estipulou prazos. Um ano depois, a
Agência de Fiscalização do DF (Agefis) exigiu que os moradores
derrubassem muros e grades, além de pagar multas. Mas, em 4 de setembro
de 2009, atendendo a apelos da comunidade, o então governador José
Roberto Arruda sancionou a Lei Complementar nº 813, que normatizava o
uso de grades no Cruzeiro Novo. Pela norma, as cercas frontais, laterais
e de fundos deveriam ficar afastadas 1,2m do meio-fio e 2,5m de outras
barreiras. O cercamento também é permitido pelo Plano de Preservação do
Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB).
Para saber mais
Três décadas de tombamento
Brasília
detém o título de Patrimônio da Humanidade, concedido pela Organização
das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), em 1987. No
mesmo ano, o Governo do Distrito Federal baixou um decreto para
regulamentar o tombamento. Em 1990, o Governo Federal também sancionou
uma lei para definir as escalas urbanísticas do tombamento: monumental,
residencial, gregária e bucólica.
A
área de preservação de Brasília tem cerca de 112km² e é delimitada a
leste pela orla do lago Paranoá, a oeste pela Estrada Parque Indústria e
Abastecimento (Epia), ao sul pelo córrego Vicente Pires e ao norte pelo
córrego Bananal. Fazem parte da área tombada a Candangolândia, o
Sudoeste, a Octogonal, o Cruzeiro, além dos setores de clubes. Isso
significa que todos eles têm de seguir a escala urbanística e o plano
diretor definidos há 30 anos. Portanto, é proibido colocar grades que
impeçam a circulação de pessoas através de pilotis de prédios dessas
áreas.
Pouca criminalidade
No
Cruzeiro, os índices de criminalidade são menores do que em outras
regiões do Distrito Federal. De janeiro a setembro deste ano, as
ocorrências mais registradas foram de roubo a pedestre. Houve 89 casos
desse tipo nos nove primeiros meses do ano, seguido de 57 episódios de
furto em veículos, 36 registros de uso e porte de droga e 31 ocorrências
de roubo de veículo.
A
reportagem procurou a Secretaria de Segurança Pública e perguntou sobre
o que será feito sobre a sensação de segurança da população após a
retirada das grades, além de questionar como a polícia atua no endereço e
o cenário da violência no Cruzeiro. O órgão se limitou a dizer, por
meio de nota, que “não houve na região registros de homicídios,
latrocínios e de roubos a residência no período de janeiro a outubro
deste ano.”
Correio Braziliense