Mais uma etapa da
desconstrução da hegemonia petista foi
cumprida na noite
de domingo com o alijamento do partido das principais
funções da Câmara, como presidências de comissões ou postos na nova
direção da Mesa, que será presidida, contra a vontade do Palácio do Planalto,
pelo peemedebista Eduardo Cunha, que transformou a
maioria megalômana que o governo teria teoricamente na Câmara em minoria de 136
votos, menos de 1/3 do plenário.
O governo, em uma só eleição,
perdeu o controle que
sempre tentou manter sobre o Legislativo e já não é possível garantir que CPIs
perigosas para ele, como a da Petrobras, deixarão de funcionar, ou terão sua
constituição controlada pelo governo. Mesmo por que já não se sabe mais quem é governo e quem é oposição na Câmara,
e tudo terá que ser negociado ponto a ponto, com ministros responsáveis pela
articulação política tendo saído desgastados desse embate para a presidência da
Câmara.
O
ministro em teoria responsável maior pelas relações institucionais, o petista Pepe Vargas, que já não tinha o apoio do
próprio PT, mostrou que não se sai bem também com os demais aliados. Ainda
provocou Cunha ao dizer que o presidente da Câmara "pode muito, mas não pode tudo", o que é uma verdade, mas
o muito que ele pode é mais do que Pepe parece perceber.
Não se saiu melhor o Chefe do
Gabinete Civil Aloísio Mercadante em sua primeira prova de fogo como o mais
importante ministro do segundo governo Dilma, e potencial candidato à sua
sucessão. O PT mal começa o governo já parece sem capacidade para comandar uma
base aliada que desde a eleição presidencial dava sinais de que não caminharia
unida nesse segundo mandato, conseguido às custas de desgastes institucionais
que cobrarão seu custo ao longo dele.
A presidente Dilma, por sua vez, ampliou a distância que a separa do
ex-presidente Lula, que tentou um acordo com o PMDB temendo a derrota, que
afinal veio no primeiro turno, maior do que previam os articuladores
governistas. O que separa Lula de Dilma não são princípios e valores [os dois jamais poderão ser separados ou unidos por algo
características que não possuem e sequer sabem o que significam.] mas o pragmatismo, que o ex-presidente tem de
sobra e a atual, não.
A disputa
com o PMDB, que volta a ocupar as presidências da Câmara e do Senado, leva o
Palácio do Planalto a uma situação de confronto que não serve aos seus
interesses imediatos e, ao contrário, serve aos do PMDB, que se prepara para
apresentar candidatura própria em 2018 ou, no limite,
pode ter a presidência da República no seu colo caso as trapaças da sorte
encaminhem o processo de desgaste petista para um desfecho político provocado
pelo julgamento do petrolão.
A
presidente Dilma tem horror a Eduardo Cunha, dizem, por sua característica
marcadamente fisiológica, e teria razão se fosse esse o motivo. Mas, na
presidência da República, e dirigindo um
governo montado na base do fisiologismo, Dilma não tem mais o direito de
alegar questões éticas para tomar decisões políticas.
Desde
quando era a chefe do Gabinete Civil de Lula, pelo menos, ela sabe como o jogo do poder é jogado e já teve a experiência dolorosa
no seu primeiro governo de ter que chamar de volta ao ministério partidos que haviam sido expulsos por questões
éticas. Ganhou
as duas eleições a bordo de uma aliança política construída à base de mensalões
e petrolões, e já não tem mais condições de convencer ninguém de que
é contra esses métodos.
Eduardo Cunha de um lado, potencialmente de
oposição, e Renan Calheiros de
outro, potencialmente de situação, podem
trocar de lado com a maior tranquilidade, e representam a maneira de fazer
política do PMDB. No embate entre correntes dissidentes nas duas eleições, o DEM assumiu sua vontade de derrotar o
PT e foi com Cunha já no primeiro turno.
O PSDB iria com ele no segundo
turno, mas
seguiu a máxima expressa pelo senador José Serra de que para derrotar o PT não
vale qualquer coisa. [exatamente
por pensar assim é que o PSDB perdeu, por ouvir opiniões de FHC, a oportunidade
de detonar o Lula em 2005.] Arlindo Chinaglia achou que era apoio à sua
candidatura, mas na realidade Serra estava acompanhando a orientação do
presidente do partido, o senador Aécio Neves, que levou os tucanos a apoiar
Julio Delgado para dificultar a volta do PSB ao seio governista.
PSDB e
PSB fizeram a coisa certa, apresentaram
alternativas às candidaturas favoritas, e ajudaram a derrotar o governo,
que agora tem uma base de apoio imprevisível para anos políticos imprevisíveis.
Fonte: O Globo –
Merval Pereira
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