Estímulo monetário se transmite à economia da forma esperada
O Banco Central investiga as causas do baixo crescimento da economia. O
diagnóstico final não é para agora - dependerá do exame de dados que
serão divulgados ao longo do tempo. Quando ficar pronto, terá um peso
importante na definição da direção da taxa básica de juros, hoje fixada
em 6,5% ao ano. Para fins de entendimento, é útil dividir os estudos do Comitê de
Política Monetária (Copom) do BC em dois grupos. Um deles procura
verificar se os choques que atingiram a economia no ano passado levaram a
uma desaceleração temporária da atividade. O outro tema é observar se
os estímulos monetários injetados pelo BC entre 2016 e 2018 estão se
transmitindo à economia pelos canais esperados.
A expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 2018, de 1,1%, ficou abaixo
do 1,3% previsto pelo Banco Central. A autoridade monetária rebaixou a
sua projeção de expansão do PIB para 2019, de 2,4% para 2%. Além disso,
reconheceu em documentos oficiais que "indicadores recentes de atividade
econômica apontam ritmo aquém do esperado". A avaliação do BC, porém, é que, apesar de tudo, a economia segue se
recuperando num ritmo gradual. As projeções do BC e dos analistas
econômicos do mercado para a expansão do PIB de 2019 foram reduzidas
basicamente para se adequar ao fato de que, no ano de 2018, a economia
terminou em um nível mais baixo - o que se chama tecnicamente de efeito
carregamento. O Banco Central e o mercado, segundo essa linha de
raciocínio, teriam mantido suas previsões para a expansão da economia
trimestre a trimestre. Um dado ilustrativo é que, ao mesmo tempo em que
reduziu de 2,5% para 2% as projeções de crescimento para 2019, o mercado
financeiro elevou de 2,5% para 2,75% a projeção de expansão para 2020.
Apesar de ter ratificado que a economia segue se expandindo num ritmo
gradual, o Copom indicou que está aberto a mudar de opinião. Por isso
vai se dedicar, durante um período que extrapola o curto prazo, a fazer
estudos e observar as novas informações. Uma tese do BC que deverá ser testada é se, de fato, o crescimento
abaixo do esperado em fins de 2018 e começo de 2019 é reflexo de choques
e incertezas que atingiram a economia brasileira no ano passado. A
lista de fatores é imensa: o estresse no mercado provocado pela processo
de alta de juros nos Estados Unidos; a greve dos caminhoneiros; a crise
que afetou a Argentina; as incertezas das eleições presidenciais; e a
desaceleração da economia mundial.
Ao longo do tempo, o BC tem se empenhado em estimar, quantitativamente,
os efeitos de alguns desses eventos na economia. Há um ano, o Copom
divulgou um estudo no seu Relatório de Inflação tentando destrinchar
como episódios de incerteza econômica afetam a inflação. O modelo
econômico apresentado explora dois canais: a alta do dólar leva a uma
pressão inflacionária quase imediata; mas num prazo mais longo ocorre um
pequeno efeito desinflacionário, refletindo os impactos das incertezas
sobre a atividade.
Gráficos apresentados nesse estudo mostram uma relação inversa entre
dois indicadores, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) e
o Indicador de Incerteza Econômica (IIE-Br). A relação é a esperada e
um tanto óbvia - a incerteza leva a maior capacidade ociosa -, mas o
estudo ainda assim é relevante para explorar a intensidade e as
defasagens com que esses fenômenos ocorrem, dois aspectos importantes
para cálculos sobre como a política monetária deve reagir. A indústria foi, do lado da oferta, uma das maiores frustrações no
desempenho da economia em 2018. O ano começou bem, com um crescimento de
4,5% no primeiro trimestre, mas o quadro mudou em meados do ano. Um
evento importante foi a greve dos caminhoneiros, que levou a uma forte
queda na produção em maio, seguida de uma alta em junho. Mas, a partir
daí, o desempenho foi frustrante, chegando no ultimo trimestre com uma
expansão de 1,8%.
Outro estudo, publicado na edição do Relatório de Inflação divulgado há
duas semanas, tenta entender como dois fatores em especial prejudicaram o
desempenho da indústria em 2018 - a crise na Argentina e a decisão dos
produtores de destinar a cana-de-açúcar à produção de etanol em vez da
de açúcar. O BC estima que a queda das exportações para a Argentina teve
um impacto de 0,38 ponto percentual sobre a indústria; a destinação da
cana para o etanol em vez de açúcar teve um impacto de 0,58 ponto. O BC
diz que esse eventos não explicam toda a frustração da indústria, mas
têm um peso relevante.
Ao mesmo tempo em que junta indícios de que o baixo crescimento recente
pode estar influenciado por choques e incertezas, que tendem a afetar a
economia de forma temporária, o Banco Central tem colhido sinais
convincentes de que o estímulo monetário tem se transmitido. No Relatório de Inflação, o BC informa que aumentou a sua projeção para a
expansão do estoque de crédito em 2019, de 6% para 7,2%. A alta será
particularmente mais acentuada no segmento de crédito livre, com um
avanço de 12,5%, ante 10,5% estimados em dezembro. Essa é a parte do
mercado mais sensível aos estímulos monetários. As famílias passaram por
um processo de desalavancagem e suas dívidas são historicamente baixas.
O BC não divulga projeções sobre o crescimento das concessões de
crédito, cuja velocidade de crescimento tem oscilado mês a mês. Mas, na
apresentação do Relatório de Inflação, o diretor de política econômica
do BC, Carlos Viana de Carvalho, destacou a tendência de aumento das
concessões dessazonalizadas desde o começo de 2017. Outro fator de sustentação do PIB que tem sido citado pelo Banco Central
é o aumento da massa salarial real. Embora o crescimento do nível de
emprego tenha sido mais baixo, houve uma contribuição importante dos
baixos níveis de inflação.
O BC, porém, pode estar enganado no seu diagnóstico sobre a atividade.
Nessa hipótese, os sinais são de que cortará mais os juros, se os demais
condicionantes da política monetária permitirem: expectativas de
inflação, balanço de riscos (incluindo a reforma da Previdência e o
ambiente externo) e projeções de inflação.
Alex Ribeiro - Valor Econômico
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