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domingo, 7 de junho de 2020

Uma nota acima do tom (por Gaudêncio Torquato) - VEJA

O presidente é um incontrolável rebelde

Basta apurar os sentidos para perceber que há uma nota acima do tom na orquestração política. O presidente é um incontrolável rebelde no uso de substantivos ácidos e adjetivos ferinos para animar suas galeras e atacar adversários. Magistrados, incluindo os de grande bagagem, extravasam e abrem polêmica. Dos políticos, situação ou oposição, o tiroteio virtual não arrefeceu como seria de se esperar durante a pandemia.

Tudo sinaliza para uma sobrecarga de energia acumulada, como se o alvo não fosse o Covid-19 e sim os interlocutores das nossas instituições. Até os generais, antes comedidos no uso do verbo, extrapolam os limites. [será que os generais não estão deixando o comedimento pelo fato dos magistrados, incluindo e especialmente os que exercem suas funções na Suprema Corte, extrapolarem suas funções, usarem termos inadequados?] Razoável pensar que esses comportamentos oxigenam nossa democracia, pois o debate desperta a sociedade. Mas há uma questão de fundo nesse jogo em temas como intervenção militar, golpe, impeachment, rebelião social, entre outros. É preciso cuidado com a banalização.

Entremos nos temas. A retórica de conflitos se impregna de interesses estratégicos eleitorais. Bolsonaro estica a campanha até hoje. Os 30% de apoiadores montam na garupa do azarão. O PT, destroçado depois de afundar o país, só pensa em voltar ao primeiro plano. Basta ver Lula. Condenado em duas instâncias, defende agora a primazia do PT, negando-se a assinar manifestos em favor da democracia. Grandes partidos já apontam eventuais candidatos em 2022. Médios e pequenos se atrelam às recompensas, como entes do Centrão aboletados no governo.

A polarização política agita chefes e lideranças de todos os setores. Para acirrar, enfrentamos uma das maiores epidemias da história, tragédia expandida com a reversão da economia. Bolso vazio de milhões de pessoas e empobrecimento das classes sociais podem até gerar convulsões, abrindo caminho para o caos social.

Sob esse risco, estariam criadas as condições para a arrebentação da maré política e eventos graves no Congresso Nacional. Portanto, a ideia de impeachment só se fundamenta na base da mobilização social. Improvável pensar em afastamento do presidente como ato unilateral do Parlamento. Só mesmo uma onda das margens para o centro poderia dar xeque mortal no tabuleiro da política.

Da mesma forma, é irrazoável a alternativa de intervenção militar. As Forças Armadas, graças ao profissionalismo, firmaram uma imagem de respeito, credibilidade e seriedade. Não entrariam numa aventura pela tomada do poder na marra. Excepcionalmente, podem ir às ruas para garantir a lei e a ordem. As Forças sabem que estão diante de uma sociedade mais atenta, crítica e solidária. Essa imensa classe média tende a rejeitar extremos ideológicos. Apenas um minúsculo grupo – nem 10% da população – apoiaria um golpe autoritário.

Portanto, baixem a bola, senhores guerreiros. O momento exige foco no combate ao coronavírus e não no tiroteio verbal, como a lenha que se joga nas redes sociais. Quanto aos magistrados, generais e mandatários, a mensagem vem dos romanos: homo loquax, homo mendax – homem falador é homem mentiroso. Ou acaba se transformando em mentiroso.

Blog do Noblat - VEJA - Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP e consultor político

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