O presidente é um incontrolável rebelde
Basta apurar os sentidos para perceber que há uma nota acima do tom na orquestração política. O presidente é um incontrolável rebelde no uso de substantivos ácidos e adjetivos ferinos para animar suas galeras e atacar adversários. Magistrados, incluindo os de grande bagagem, extravasam e abrem polêmica. Dos políticos, situação ou oposição, o tiroteio virtual não arrefeceu como seria de se esperar durante a pandemia.Entremos nos temas. A retórica de conflitos se impregna de interesses estratégicos eleitorais. Bolsonaro estica a campanha até hoje. Os 30% de apoiadores montam na garupa do azarão. O PT, destroçado depois de afundar o país, só pensa em voltar ao primeiro plano. Basta ver Lula. Condenado em duas instâncias, defende agora a primazia do PT, negando-se a assinar manifestos em favor da democracia. Grandes partidos já apontam eventuais candidatos em 2022. Médios e pequenos se atrelam às recompensas, como entes do Centrão aboletados no governo.
A polarização política agita chefes e lideranças de todos os setores. Para acirrar, enfrentamos uma das maiores epidemias da história, tragédia expandida com a reversão da economia. Bolso vazio de milhões de pessoas e empobrecimento das classes sociais podem até gerar convulsões, abrindo caminho para o caos social.
Da mesma forma, é irrazoável a alternativa de intervenção militar. As Forças Armadas, graças ao profissionalismo, firmaram uma imagem de respeito, credibilidade e seriedade. Não entrariam numa aventura pela tomada do poder na marra. Excepcionalmente, podem ir às ruas para garantir a lei e a ordem. As Forças sabem que estão diante de uma sociedade mais atenta, crítica e solidária. Essa imensa classe média tende a rejeitar extremos ideológicos. Apenas um minúsculo grupo – nem 10% da população – apoiaria um golpe autoritário.
Portanto, baixem a bola, senhores guerreiros. O momento exige foco no combate ao coronavírus e não no tiroteio verbal, como a lenha que se joga nas redes sociais. Quanto aos magistrados, generais e mandatários, a mensagem vem dos romanos: homo loquax, homo mendax – homem falador é homem mentiroso. Ou acaba se transformando em mentiroso.
Blog do Noblat - VEJA - Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP e consultor político
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