Vozes - Polzonoff
"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.
Crônica do block anunciado
Flávio Dino pensando: “Quer saber? Acho que vou bloquear aquele tal de Polzonoff”.| Foto: Lula Marques/ Agência Brasil
Era um dia como outro qualquer, exceto pela temperatura aqui no primeiro planalto paranaense: 33 insalubres graus. Apesar do calor, da pressão baixa e da fome, confesso que estava todo saltitante, alegre e contente (mas de um jeito muito másculo!). Foi então que consultei o relógio e vi que estava atrasado para ela: a crônica diária. Que é sempre um prazer, menos quando tenho que falar de Flávio Dino – como era e é o caso de hoje.
É que eu não sei se você viu, mas quem é que eu tô querendo enganar?, é claro que você, assinante da Gazeta do Povo bem-informado que é, viu: funcionários do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, comandado por ninguém menos do que Flávio Dino, se reuniram nas suntuosas instalações da repartição com a esposa de um traficante divertidamente alcunhado Tio Patinhas – até hoje meu personagem preferido nos gibis da Disney (nos desenhos animados continua sendo o Pateta). O casal, de acordo com a polícia e a concorrência, é ligado ao Comando Vermelho.
Oquei, disse para mim mesmo, enrolando um pano gelado no pescoço, me recostando na cadeira e fazendo aquela cara séria do idiota que se identifica como inteligente. Mais ou menos como a foto do sujeito que escreve neste espaço. O texto saiu fácil. Pelo menos os primeiro parágrafos. Comecei contando a história, floreando aqui e ali, abusando dos neologismos e fazendo aquelas firulas que agradam a uns e desagradam a outros tantos. Depois, acrescentei umas piadinhas de altíssimo nível (de colesterol) à forma física do ministro e da dona Luciene Barbosa Farias. Ali pelo meio do texto, porém, mudei de tom e falei de narcoestado e que tudo é absurdo & inaceitável e citei Guilherme Boulos e André Janones e.
Estava já no penúltimo parágrafo, aquele que antecede a fatídica conclusão de que vivemos num Walking Dead de velhos zumbis comunistas, quando achei por bem consultar o que o ministro Flávio Dino estava dizendo sobre o caso da mulher do traficante habitué do MJ. É que de vez em quando ainda me lembro de que sou um jornalista sério – ou coisa parecida. Ao entrar no Twitter para pegar uma declaração da otoridade máuxima da segurança pública brasileira, porém, descobri que Flávio Dino tinha me bloqueado no Twitter. O sino da igreja tocou. Dezoito horas em ponto.
Galvão? Diga, Tino
Sim, Flávio Dino me bloqueou no Twitter. E, com esse gesto autoritário, além de inútil, me impediu sumariamente de ter acesso direto à sua sabedoria jurídica, sua esperteza política e até seu senso de humor, digamos, sui generis. Na condição de cidadão, me impediu de conhecer as incríveis realizações de seu trabalho frente à pasta. Se ele tivesse alguma, claro. Na condição de jornalista, atravancou meu acesso, ainda que distante, a uma autoridade do governo federal que não ajudei a eleger (tá louco?!), mas cujo governo eu deveria fiscalizar ou analisar. E na condição de palhaço bissexto, calou meu riso. ÓÓÓÓÓÓÓÓÓÓÓÓ!
Depois de chorar como uma criança que perde seu elefantinho de pelúcia, liguei para minha mulher. Que odeia ser interrompida no meio do expediente. “Você não vai acreditar no que me aconteceu!”, disse. Ela, acostumada aos meus exageros, não deu a menor bola. Porque gosto de brincar com o perigo e a fim de aumentar o suspense, fiquei em silêncio. Ao ouvir perigosas bufadas do outro lado da linha, no entanto, achei melhor desembuchar. “O Flávio Dino me bloqueou”, anunciei com pompa.
“Como assim, meu amor?”, perguntou minha mulher com voz de calma falsa. Eu sabia que, na verdade, ela estava querendo me dizer que a partir de agora é melhor eu dormir com uma malinha pronta, para o caso de [BATE NA MADEIRA]. “Me bloqueando, oras bolas! No Twitter”, respondi. Será que fui grosseiro com ela? Tadinha. Não merece. Melhor pedir desculpas, levar para jantar, fazer massagem nos pés e tal.
A isso se seguiu um breve e divertido entrevero em que ela me aconselhou enfaticamente a NUNCA MAIS ESCREVA NADA SOBRE ESSE CARA, VIU! SENÃO VOCÊ VAI SE VER COMIGO!. Ao que respondi pedindo calma, muita calma nesta hora, e dizendo que, no fundo, estava emocionado com o block. Afinal eu, um mero cronista de província, estava sendo bloqueado não só por uma autoridade federal do primeiro escalão. Não só por um ministro de Estado. Não só por um comunista linha-dura. Não. Eu estava sendo bloqueado por um futuro ministro do Supremo Tribunal Federal. Olha só que honra!
Se bem que, depois dessas visitinhas da dona Luciene Barbosa Farias ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública, já tem gente dizendo por aí e corre que eu sei certo zunzum de que a compra da poltrona extra large de Dino no STF terá de ser adiada indefinidamente. Enquanto isso... Galvão? Diga, Tino. Bruno Dantas no aquecimento.
Paulo Polzonoff Jr., colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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