Vozes - J.R. Guzzo
Até a OAB? Até a OAB. É um sintoma revelador da situação de desordem em que vive hoje o Sistema Judiciário no Brasil.
Alguma coisa, definitivamente, tem de estar ainda mais errada do que se imagina, quando até a Ordem dos Advogados do Brasil começa a achar que a situação não está certa.
A entidade ficou calada como um túmulo, durante os últimos quatro anos, diante da violação serial do direito de defesa, das garantias do processo penal e das prerrogativas legais dos próprios advogados por parte do STF.
A justificativa da OAB para apoiar a ilegalidade com o seu silêncio era a mesma de tantas outras estrelas da “sociedade civil”. O Supremo, no seu entender, estava em guerra para salvar a democracia no Brasil;
- diante desse propósito superior para os interesses da nação, e da imensidão da tarefa a realizar, não se podia ficar querendo que o STF respeitasse todas as leis.
Não ocorreu à direção nacional da OAB, aparentemente, a conexão entre democracia e respeito à lei; uma coisa não existe sem a outra.
Agora, enfim, parece que caiu algum tipo de ficha.
Quem usa a força armada para violar a lei, e recebe aplausos, não tem muito interesse em mudar de conduta; tende a violar cada vez mais, e não menos.
A OAB protestou, em nota oficial assinada por seu presidente, contra decisão do STF que proibiu os advogados de fazerem sustentação oral na defesa dos réus envolvidos nos distúrbios do dia 8 de janeiro em Brasília.
Isso, de acordo com a Ordem, significa a supressão de direitos legais dos acusados; os advogados não podem falar de viva voz diante dos juízes, o que viola garantias constitucionais explícitas dos seus clientes.
A OAB poderia fazer outras reclamações. Na verdade, quase nada é legal ou lícito nesses processos, desde o seu primeiro minuto. Decidiu ficar só no veto à sustentação oral, que considera uma aberração particularmente perversa – para ficar apenas no aspecto mais chocante desse tipo de julgamento, o advogado tem de mandar a sua defesa por computador e a sentença pode sair minutos depois, com o mesmo texto de decisões já tomadas para outros réus.
Alguém está lendo o que a defesa escreve? Não se entende, também, porque o sistema do “plenário virtual”, adotado para enfrentar a emergência da Covid, está sendo utilizado para um julgamento que não tem nada a ver com a situação existente durante a epidemia.
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O protesto pode acabar sem nenhum efeito prático; os ministros do STF se acostumaram em ver os dirigentes da OAB de joelhos, e não entendem agora do que estão se queixando.
Quem usa a força armada para violar a lei, e recebe aplausos, não tem muito interesse em mudar de conduta; tende a violar cada vez mais, e não menos.
Os réus não poderiam estar sendo julgados no STF, pois não têm foro especial.
Não poderiam estar sendo condenados a até 17 anos de cadeia por participarem de um quebra-quebra.
Não poderiam ser punidos sem que a acusação apresentasse provas de que cometeram os crimes dos quais são acusados – muitos nem sequer estavam no local geográfico dos distúrbios.
Não poderiam estar presos quando são réus primários.
Não poderiam ser condenados por cometerem ao mesmo tempo os crimes de “golpe de Estado” e de “abolição violenta do Estado de direito” – e não poderiam receber penas somadas por um e pelo outro.
Não poderiam, obviamente, estar sendo julgados pela prática de um crime impossível de ser praticado.
Como alguém pode dar um golpe de Estado sem ter sequer um canivete no bolso?
A OAB, apesar dos frequentes protestos dos seus próprios filiados, está engolindo tudo isso em silêncio.
Fica difícil, agora, impressionar os ministros do Supremo.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos
J.R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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