Marlice Pinto Vilela - Gazeta do Povo
STF
Juristas lembram que não cabe ao STF mudar a legislação e que o Congresso não tem sido omisso sobre o aborto.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
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A resolução 642 de 2019, que dispõe sobre os julgamentos em sessões presenciais e virtuais do STF, aponta que a única forma de levar o caso ao plenário presencial seria por um pedido de destaque, realizado por um ministro da corte ou uma das partes. Os mais prováveis em realizar o feito seriam os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, indicados do ex-presidente Bolsonaro.
Nos bastidores, os amici curiae contrários ao aborto, como a CNBB e a Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, já estão procurando todos os ministros para uma conversa.
Para Alessandro Chiarottino, professor de Direito Constitucional e doutor em Direito pela USP, o plenário virtual limita a discussão e a explicação dos argumentos de cada lado. “No plenário virtual acaba-se tendo uma cognição da questão toda que, por vezes, fica muito fragmentada. No plenário presencial, a própria maneira de expor e de emitir o voto é muito mais completa”, reforça.
O professor comenta que o pedido de destaque pode ser visto pelos ministros como um veto, já que aumenta o tempo e a necessidade de uma discussão mais detalhada. A solicitação não é vista com muita simpatia pelos colegas, mas também não chega a ser considerada uma ofensa.
O Instituto Brasileiro de Direito e Religião, amicus curiae da ADPF 442, apresentou uma petição para fazer sustentação oral e que a ação seja julgada no ambiente presencial. Em vídeo, Thiago Rafael Vieira, presidente do instituto, falou que “o IBDR não concorda que essa ação seja julgada em ambiente virtual, trata-se de uma das ações mais importantes do século, que tem como objeto uma situação muito complexa que é a vida da mãe e a vida da criança que está no ventre”.
As sessões virtuais realizadas possuem duração de seis dias úteis, mas as de caráter extraordinário podem ter uma duração ainda menor. Primeiro, o relator publica o relatório e o voto e, em seguida, os outros ministros se manifestam com quatro opções de voto. São elas: acompanhar o relator, acompanhar com ressalva de entendimentos, divergir do relator ou acompanhar a divergência.
“Dada a importância dos temas tratados, eu acho que merecia uma maior deferência da parte dos ministros e deveria ser colocado em julgamento presencial”, pondera o professor. O plenário presencial também possibilita presença do público, o que para Chiarottino tem um efeito positivo. “Um dos princípios que foi colocado na Constituição é o da publicidade. Poderiam dizer que o plenário virtual também é público, mas eu diria que é menos público do que o plenário presencial”, compara.
Juristas afirmam que matéria cabe ao Congresso Nacional
O tema do aborto também não tem sido ignorado pelo Congresso. O projeto de lei 1.335/1991, que propunha a legalização do aborto ao suprimir os artigos do Código Penal que tratam sobre o tema (o mesmo que solicitou o PSOL na petição da ADPF 442), por exemplo, foi arquivado em 2012 por ter sido rejeitado nas comissões que passou. O texto, apresentado pelo ex-deputado federal Eduardo Jorge, na época integrante do PT, teve pareceres pela rejeição aprovados na Comissão de Seguridade Social e Família e na Comissão e Justiça e de Cidadania em 2008.
Lília Nunes comenta a atuação do parlamento sobre o tema: “o Congresso vem atuando constantemente para impedir e frear qualquer de tentativa de legalização do aborto no Brasil”. Para ela, ao longo desses anos não há o que falar sobre omissão do parlamento, que procura rechaçar projetos de lei que tentam descriminalizar o aborto.
O professor Chiarottino também acredita que a matéria cabe ao Congresso Nacional. “Eu diria que é uma matéria que é tipicamente ao Congresso. É possível que até tenha uma movimentação entre os parlamentares, especialmente no Senado, de descontentamento caso haja uma decisão pelo Supremo”, detalha.
Durante um seminário do STF sobre Combate à Desinformação e Defesa da Democracia, o ministro Luiz Fux justificou as últimas decisões do órgão dizendo que a Constituição Federal impediria o Supremo de “dizer não julgo”. Fux citou um dispositivo da Carta Magna que assegura que nenhuma lesão ou ameaça a direito escape da apreciação do Judiciário. “Eles poderiam receber a ação e julgar dizendo que o STF decide que cabe ao Poder Legislativo decidir sobre aquela questão. Isso é um julgamento”, explica Chiarottino. Ele esclarece que apesar de não ser possível o non liquet, que impossibilita o Judiciário de não apreciar alguma questão, isso não impede um exame que aponte o poder ao qual compete.
Lília Nunes elucida que, ainda que houvesse omissão do parlamento, a ação cabível para provocar o Congresso Nacional a exercer a competência de enfrentar a matéria seria a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. “É por meio dessa ação que o requerente propõe ao STF que, analisando a questão apresentada, possa provocar o Congresso a atuar nas situações que existem omissão ou brechas na legislação”, conclui Nunes.
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Marlice Pinto - Gazeta do Povo - VIDA E CIDADANIA