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terça-feira, 1 de junho de 2021

Mais circo que pão - Merval Pereira

O Globo

Aglomerações - Trazer a Copa América para o Brasil, uma jogada política diabólica de Bolsonaro

Aparentemente, não foi preciso subornar ninguém para trazer a Copa América para o Brasil, depois que países vizinhos, todos envolvidos em crises sanitárias e políticas, ficaram inviabilizados como sede de um torneio de futebol que pode não ter importância maior, mas que, na hora do vamos ver, fará com que os torcedores esqueçam a irresponsabilidade que é organizá-la num país às vésperas de uma terceira onda da Covid-19, com 463 mil mortes nas costas e 14 milhões de desempregados.
 
[para não perder o hábito, intercalamos alguns comentários - mas o desmonte total incluindo  informações importantes e que devem ser divulgadas, pode, e até deve, ser lido no artigo A hipocrisia sobre a Copa América no Brasil, publicado no Alerta Total, Jorge Serrão, link ao  final.]

Uma jogada diabólica de Bolsonaro, em sentido político, mas também quase literal, dado o perigo de disseminação do vírus. A camisa verde e amarela da seleção brasileira, apropriada indevidamente pelos bolsonaristas, estará espalhada pelo país, dando a ilusão de que os adeptos do presidente são mais numerosos do que na realidade. Desde a Roma Antiga, pão e circo são fatores políticos fundamentais, aqui no Brasil temos hoje mais circo do que pão na mesa do cidadão comum, com a inflação e o desemprego em alta.
[a cada dia que passa e a certeza da reeleição do presidente Bolsonaro - apesar de pesquisas fajutas,  tentarem mostrar o contrário (saibam mais, lendo: Por que as pesquisas erram tanto, publicação da  Revista Oeste) o desespero dos inimigos  do Brasil e dos brasileiros aumenta e vale acusar Bolsonaro de tudo. Até praticar o suicídio já foi sugerido ao presidente. 
Por falar em  sugestões estúpidas e descabidas, os que não aceitam o capitão reeleito em 2022, poderiam começar a acusá-lo de ter se auto esfaqueado.

O Brasil ganhou [ganhou? ou comprou? neste caso utilizando uma fração dos milhões e milhões roubados pelo governo do criminoso condenado e que agora virou ídolo dos inimigos do Brasil]  o direito de sediar a Copa do Mundo de Futebol de 2014 sete anos antes, no governo Lula, e teve um longo e tortuoso caminho até o momento decisivo. Dilma, que fora eleita com tranquilidade em 2010, chegou à Copa já capengando graças aos escândalos de corrupção que voltavam a atingir o PT com o petrolão e a Operação Lava-Jato. A vaia que a presidente petista recebeu na abertura da Copa do Mundo, a crise econômica e os desvios de dinheiro público nas obras de construções de estádios pelo Brasil afora — hoje, muitos elefantes brancos sem utilidade prática que poderão ser aproveitados agora na Copa América — levou-a fragilizada à campanha presidencial, vencida por uma vantagem mínima que já previa o desastre que encerraria prematuramente seu segundo mandato.
 
Perderam o rumo de tal forma que apesar da defesa cega feita ao isolamento e distanciamento sociais - como soluções para o fim da pandemia - já apontam que se na final for proibida a presença de público no Maracanã, o objetivo será evitar vaias ao presidente Bolsonaro.]
. [qualquer que seja o número de mortes, é e sempre será para motivos de lamentações; 
só que pior, muito pior,  é veicular como certeza o que está sendo cogitado e desejado pelos (inimigos do Brasil e dos brasileiros = adeptos do 'quanto pior,melhor'+ inimigos do presidente Bolsonaro + arautos do pessimismo + traidores da Pátria + cultores das desgraças) de, ou seja, uma terceira onda = graças a DEUS, enquanto os arautos do pessimismo expelem seus augúrios negativos, os números caem.]


Bolsonaro, como na campanha em que não precisou participar dos debates devido ao atentado que sofreu, não passará pelo teste de popularidade do Maracanã devido à pandemia. Duvido que seja autorizada a presença do público na final. Aglomeração, seja de esquerda ou de direita, não pode ser considerada uma atitude correta, por melhores que sejam os objetivos. O direito à vida deve superar as disputas políticas. Não compro a ideia de que “ir ao espaço público sempre comporta riscos, mas deixar as ruas — grande motor das transformações sociais ao longo da nossa História — como monopólio da extrema-direita, de viés neofascista, é risco maior”, como me mandou dizer numa mensagem o vereador Chico Alencar, criticando minha coluna de domingo, em que lamentava as manifestações da esquerda, por considerar que tiravam da oposição o peso moral de condenar as atitudes do presidente Bolsonaro e de seus seguidores na pandemia. Pelo jeito, Lula também concorda. Segundo Bela Megale, ele não compareceu às manifestações para preservar sua capacidade de criticar as aglomerações bolsonaristas.

Com relação ao futebol, as infecções de jogadores pela Covid-19 falam por si contra a normalização dos jogos, mesmo com protocolos de segurança rígidos e sem a presença de público. Copa América no Brasil, a esta altura do campeonato ( perdão pelo trocadilho), é uma maluquice total, um absurdo que confirma o descaso do governo Bolsonaro com a pandemia.

O Brasil está na iminência de uma terceira onda, [será que teremos  uma terceira onda? se houver, Bolsonaro será o acusado;  caso não haja o herói será
relator Calheiros, pelo discurso em cangacês castiço  proferido pelo no picadeiro da Covidão, ameaçando levar o coronavírus ao Tribunal de Nuremberg.]  quando começar a Copa América devemos estar com cerca de 500 mil mortos. É um desrespeito completo marcar um evento esportivo desse tamanho no Brasil agora, neste momento. O Japão está com dificuldade de confirmar as Olimpíadas em julho, e nós agora vamos fazer um evento dessa magnitude no Brasil... É mais uma tentativa de fingir que está tudo bem entre nós. Foi uma decisão claramente política, que a CBF ajudou a montar.

Um populismo irresponsável, quase suicida. Não há nenhum sentido, o Brasil é atualmente um pária mundial. Os brasileiros estão impedidos de viajar ao exterior, porque somos considerados uma fonte de grande disseminação do coronavírus, e vamos trazer gente de fora para fazer uma grande manifestação esportiva. Com direito a espalhar novas cepas. Acredito até que algumas seleções não venham porque a imagem sanitária do Brasil não favorece a realização de nada internacional por aqui.

NÃO DEIXE DE LER:  A hipocrisia sobre a Copa América no Brasil,

Merval Pereira, colunista - O Globo


quarta-feira, 12 de maio de 2021

"Início de CPI não surpreendeu. Recebemos o já ouvido, já visto, já sabido"

Alexandre Garcia

Com o objetivo de desgastar o candidato à reeleição, a CPI corre o risco de desgastar ela própria a cada sessão espetaculosa

[o ridículo de cada sessão espetaculosa consegue superar e antecipar  o mais cômico esperado - aquela do senador Calheiros, o relator imposto, ocupar tempo questionando o presidente da Anvisa por não ter usado máscara em março 2020, impõe que as demais sessões da  CPI se realizem no picadeiro de um circo mambembe e nos deixa tentado, não fosse pelo respeito que dedicamos aos nossos dois leitores, a perguntar: "o que tem ...?"] 
 
Este início de CPI não surpreendeu. Os senadores da comissão agiram como era esperado. E os depoentes, também. Muitas intenções, suposições e, ainda, sem revelações
Recebemos o já ouvido, já visto, já sabido. 
Como no Senado da Roma antiga, agitaram-se questores e catilinas e até catões a repetir delenda Bolsonaro, delenda Bolsonaro. Não fingem isenção e deixam claro o objetivo, conhecido por gregos e troianos, de enfraquecer o presidente para evitar reeleição. Depois dos interrogatórios, há entrevista para acertar a versão do acontecido, uma espécie de extensão do palanque.
 
A CPI se instalou por ordem de um juiz do Supremo o que, certamente, não teria acontecido se o presidente do Senado fosse Antônio Carlos Magalhães. [eles sabem a quem mandar - ACM jamais cumpriria a ordem e ainda esculacharia a pretensão.] O presidente Pacheco curvou-se e considerou dois requerimentos: o primeiro, do senador Randolfe Rodrigues(Rede-AP), com 31 assinaturas, e o do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), com 45 assinaturas. O das 31 assinaturas, tornou-se vice-presidente da comissão e seu objetivo de investigar o presidente prevalece sobre o do senador de 45 assinaturas, que é investigar o destino dos bilhões federais aos estados e municípios.


Com isso, a CPI investiga o provedor dos recursos e não os executores dos gastos.
O senador Girão citou em seu requerimento o fato de a Polícia Federal conduzir 61 investigações sobre fraudes diversas com dinheiro federal, mas isso não motivou, até agora, os inquisidores da comissão. Mesmo porque, nela há dois pais de governadores — um deles o próprio relator e um ex-governador, com a família investigada em desvios da saúde o próprio presidente da comissão. [além do que sabem que se for investigar as fraudes diversas 'autoridades locais' estarão enroladas e estas autoridades locais podem envolver e com certeza certeza envolverão,  outras e outras autoridades.]
As lideranças partidárias que indicaram os integrantes da CPI desafiaram a memória popular sobre a ficha dos inquisidores.  
A CPI ainda não se deu conta do que isso representa. 
Vai se expor por 90 dias. 
Com o objetivo de desgastar o candidato à reeleição, a CPI corre o risco de desgastar ela própria a cada sessão espetaculosa. 
Por enquanto, a inquisição pouco santa já condenou a cloroquina. O articulista gaúcho Percival Puggina previu, esta semana, que a CPI vai inocentar o vírus.
 
Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

O gesto autorracista e infame do vereador do Psol em Porto Alegre - Sérgio Alves de Oliveira

Se o objetivo do vereador afrodescendente Matheus Gomes, do Psol, durante a cerimônia de posse dos novos vereadores de Porto Alegre, na 6ª feira, 1º de janeiro de 2021, era o de “aparecer”, esteja  Sua Excelência seguro que conseguiu o seu objetivo plenamente, com “juros e correção monetária”, especialmente na grande mídia que está em plena lua de mel com a esquerda, na tentativa de recuperar as “perdas” que teve com o fechamento dos cofres governamentais que alimentavam a sua ganância, desde 1º de janeiro de 2019.                                                             

Não há grande jornal do Brasil que não tenha dado destaque ao seu estúpido, ignorante  e “antipatriótico “  gesto de menosprezo ao Hino Riograndense, um dos símbolos oficiais do Estado ,que constava da programação da solenidade de posse, ao permanecer, acintosamente,“sentado” durante a sua  execução, juntamente com outros “colegas”.

Mas o que mais surpreende é que o dito vereador se intitula “historiador”, e no seu discurso  de “protesto” e revolta descabida  contra o Hino Riograndense cometeu uma “heresia” histórica sem precedentes na historiografia do Rio Grande do Sul e  da Revolução Farroupilha, de  1835.  O protesto “imbecil” do vereador esquerdista,”historiador” de “meia tigela”s e  liga a um dos versos do Hino Riograndense, onde consta: “ POVO SEM VIRTUDE/ACABA POR SER ESCRAVO”.

Ridiculamente,”Sua Excelência” dá a entender que esse trecho do Hino Riograndense  estaria se referindo especificamente à escravidão  de negros no Brasil, e que  por serem estes na época os escravos, os negros não teriam “virtudes”. Em primeiro lugar, como “historiador”,Sua Excelência deveria  estudar melhor o Hino Riograndense,e perceberia então que os valores ali preconizados  são fundamentalmente valores e ideias universais,que só podem ser concebidos por grandes espíritos, jamais por políticos vulgares.

Parece que Sua Excelência não tem a mínima ideia, mesmo como “historiador”, que a escravidão não foi nenhuma invenção brasileira, muito menos gaúcha, e que nada tem a ver com a “propriedade” de negros,pelos “brancos”. No Egito Antigo ela já existia,mas o escravismo se resumia ao trabalho doméstico e militar. Também na Roma Antiga ele existiu,usado na produção das fazendas e nas obras públicas. No Oriente idem, onde as concubinas do Grande Sultão, Xeque, ou Xá, eram escravas. Não havia nenhuma “etnia” envolvida. [Reforçando um fato histórico: a escravidão existe desde antes de Cristo e seu principal fundamento era que os vencidos em uma guerra passavam a ser propriedade dos  vencedores, que tinham o poder de vendê-los na condição de escravos.

Os escravos que vieram da África para o Brasil não foram capturados por portugueses ou brasileiros - eram derrotados em guerras, se tornavam propriedade dos vencedores - também africanos - que os vendiam a quem melhor preço oferecesse. Aí é que entraram os navios negreiros - que cuidavam do transporte dos cativos.]

A escravidão esteve presente na Ásia, na Europa, nas Américas e na África. E paradoxalmente neste último continente (África) foi a mais forte de todas. O comércio  de escravos era absolutamente normal e intenso  entre as diversas “nações” e  tribos.

Com os portugueses, o  tráfico de escravos se acentuou na África, calculando-se a “comercialização” entre 8 a 100 milhões de negros,para abastecer de “mão de obra”  escrava  as “colônias” da Espanha e Portugal, na América. Sabe-se que no início os portugueses “capturavam” ,”caçavam” os negros para vendê-los  como escravos. Mas depois passaram a comprá-los no mercado interno africano,que saía “mais barato”, para depois revendê-los. Na Senengâmbia, os portugueses chegavam a trocar um cavalo por 15 ou 20  escravos.

Tudo leva a crer que o distinto vereador está apresentando toda a conta do escravismo negro do Brasil aos guerreiros  farroupilhas e ao seu hino. Além do mais,o trecho do hino considerado equivocadamente uma ofensa aos povos negros,prega uma verdade universal absolutamente incontestável. Nenhum povo dotado da virtude da liberdade permitiu-se escravizar durante toda a marcha da civilização, em qualquer tempo ou lugar. E a liberdade deve ser buscada com muita luta. Ela nunca vem “de graça”.

Mas por outro lado esse trecho do Hino Riograndense reproduz com absoluta fidelidade e pode ser considerado, i-n-f-e-l-i-z-m-e-n-t-e, um AUTORRETRATO “moderno”  do Povo Gaúcho , que não teve a capacidade ,a coragem,nem  a “virtude” , de manter a sua independência, declarada em 11 de setembro de 1836,decorrente da Revolução Farroupilha,de 1835,através da famigerada “Convenção”,”Tratado”,ou “Acordo” de Poncho Verde, de 1845, assinado entre o representante  do “Império”, o então Barão de Caxias,e o “traidor” da Revolução  Farroupilha,o General David Canabarro, que assinou o pacto apesar de não ser o representante legal legítimo do então Estado Independente  República Riograndense.

É por isso  que Sua Excelência, o vereador  Matheus Gomes,do PSOL, acabou batendo na porta errada ao fazer a sua acintosa crítica à escravidão. Não são os brancos ou negros farroupilhas dos anos 1835 a 1845 os “alvos” do  Hino Riograndense. Os alvos são os “sem virtude”,independentemente de etnia,raça,ou cor, que acabam ou permanecem  escravos. E isso em  todos os tempos e lugares.

Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e sociólogo

Presidente do Partido da República Farroupilha - PRF

(proscrito pelas autoridades judiciárias)

 

terça-feira, 29 de setembro de 2020

A “vara” da Justiça, por Luiz Holanda

Para se entender o que significa o termo “vara” no Judiciário pátrio, faz-se necessário saber a diferença entre comarcas, varas e entrâncias.

As primeiras correspondem ao território em que o juiz de primeiro grau exerce sua jurisdição, podendo abranger mais de um município. São fixadas de acordo com o número de habitantes ou de eleitores, bem como o movimento forense e a extensão territorial dos municípios do estado. Cada comarca pode contar com vários juízes ou apenas um, exercitando as competências destinadas ao órgão de primeiro grau.

A palavra “entrância” significa a classificação administrativa das comarcas. Quanto maior a cidade, mais elevada será a entrância. As comarcas são classificadas como de primeira ou segunda entrância, além da comarca de entrância especial. A de primeira entrância é aquela de menor porte, que tem apenas uma vara instalada. Já a comarca de segunda entrância é a de tamanho intermediário, enquanto a de entrância especial (ou de terceira entrância) é aquela situada na capital ou nas grandes cidades.

Fórum significa o espaço físico onde funcionam os órgãos do Poder Judiciário. A vara tem sua origem na Roma Antiga, simbolizada por um bastão (faces) utilizado para dar passagem aos magistrados. Com o tempo passou a ser uma insígnia do juiz, a exemplo do juiz ordinário do império, que devia sempre levá-la consigo, sob pena de multa. O juiz ordinário era eleito anualmente pelo povo e pelas câmaras, atuando com independência da realeza. Tinha jurisdição nas comarcas onde obrigatoriamente residia, além de presidir as Câmaras municipais.

Existia também o juiz de fora, magistrado imposto pelo imperador sob o pretexto de administrar melhor a justiça, pois os juízes ordinários, em razão de suas afeições ou inimizades com o povo das vilas, poderiam falhar em suas decisões. A criação do juiz de fora foi uma espécie de usurpação da jurisdição pelo o poder régio. Estes eram impostos a todas as Vilas, restringindo, paulatinamente, a jurisdição dos juízes ordinários. O símbolo de sua autoridade e dos juízes ordinários era justamente a vara, que deviam portar obrigatoriamente ao se deslocar pelas Vilas. A vara simbolizava poder e autoridade, impondo imediata e irrestrita obediência. Até hoje essa simbologia permanece, pois quando alguém se recusa a comparecer perante o juiz este poderá determinar que o infrator seja conduzido “debaixo de vara”, significando que a pessoa deve comparecer “forçada pela autoridade judicial”.

O juiz ordinário carregando uma vara vermelha e o juiz de fora uma vara branca. O termo mereceu inúmeros comentários, alguns jocosos, como o de uma renomada advogada trabalhista que renunciou a um mandato por não aceitar dizer que “estava entrando na vara”, em vez de dizer que “estava entrando na junta”.

Ironias à parte, o termo latino “fasces” referia-se a um símbolo de origem etrusca usado pelo império Romano para demonstrar o poder da autoridade em cerimônias oficiais. Segundo Bluteau, a etimologia da palavra vereador vem da variante “vareador”, da palavra vara. Seja como for, o fato é que alguns autores afirmam que, à época, quando um juiz assumia o lugar do outro, este, para transferir-lhe a jurisdição, passava-lhe - no bom sentido -, a vara.

Jornal da Cidade 

Transcrito do Rota 2014, Blog do José Tomaz - Luiz Holanda 

terça-feira, 10 de março de 2020

Suzy, Drauzio Varella e o sensacionalismo - Gazeta do Povo

Madeleine Lacsko

Numa semana as pessoas se comovem e na outra se sentem traídas. 
Que tal se sentirem adultas e responsáveis?

Desde a semana passada venho tentando entender o furor nas redes com a história de Suzy e o abraço dado pelo médico Drauzio Varella, que há mais de 30 anos atua no sistema penitenciário. Num primeiro momento, havia uma multidão comovida e agora, após saber do crime, há uma multidão que se sente traída. O cachimbo do Estado-babá entortou a boca do brasileiro, que abdica de ser adulto e pensar por si, quer que alguém se encarregue sempre das decisões que deveria tomar. 

Tenho muitos irmãos evangélicos e católicos que atuam em ministérios e pastorais em presídios. Eu até faço trabalhos em instituições que abrigam adolescentes infratores, mas é uma falha da minha alma não conseguir me comover com história de adulto criminoso. Não é porque me acho esperta nem se trata de decisão racional: apenas, por algum motivo, não me toca o coração. [a criminosa apesar do crime horrível que cometeu - que a torna merecedora de pena mais severa do que a em cumprimento - merecendo todo o repúdio da sociedade, na entrevista se valeu da omissão do entrevistador e não informou seu horrível crime = o condenado estuprou e  matou por estrangulamento uma criança de 9 anos.

Oportuno lembrar que o entrevistador está correto quanto a não emitir julgamento sobre os crimes dos seus entrevistados. mas, tem o DEVER, em nome da clareza da informação de mencionar que o aquele entrevistado cometeu um crime hediondo.
Sua conduta nesse aspecto foi deplorável, lamentável, reprovável. E até motiva a pergunta: quantos criminosos repugnantes ele entrevistou e deixou, com sua omissão, que fosse passada a imagem de ser um pobre coitado.
No caso em questão a COITADA é a vítima da sanha assassina e doentia do entrevistado.]

Agradeço a Deus por ter colocado no mundo pessoas como meus irmãos que trabalham na recuperação de detentos e o dr. Drauzio Varella, capazes de olhar para aquelas pessoas sem se deixar influenciar pelo peso dos horrores que fizeram. Agradeço principalmente porque, sempre que se fala em prisão, ecoa na minha cabeça a frase que meu professor de Psiquiatria Forense, Alvino Augusto de Sá, amava repetir: "hoje ele está contiDo, amanhã ele estará contiGo."  Acompanhei nas redes a empolgação das pessoas que se uniam em mutirões para escrever cartas para Suzy depois da cena comovente do abraço entre ela e o médico. Preferi calar porque, confesso, tive vergonha do que pensei e senti. Se a pessoa está há 8 anos sem visita, quer dizer que está há pelo menos esse tempo no regime fechado. O que ela fez para ficar tanto tempo?

Vi pessoas se mobilizando para mandar cartas ao presídio e até, ápice da loucura, mobilizando crianças para mandar cartas a uma pessoa presa. Sinceramente, que adulto em sã consciência manda uma carta para alguém cumprindo uma pena longa e coloca o próprio endereço sem se informar sobre essa pessoa? 
Quem coloca uma criança em contato com alguém cuja história e caráter desconhece? 
Adultos não têm o direito de fugir de suas responsabilidades.

É característica da alma humana se compadecer diante do sofrimento alheio, ainda que seja merecido, ainda que se trate de um monstro. O agir, no entanto, depende de decisões adultas e maduras. Nenhum adulto que se leva pela emoção tem o direito de botar a culpa em outra pessoa.

Após ser "revelado" que era realmente gravíssimo o crime que levou a uma pena sabidamente dada apenas a crimes gravíssimos, vi diversas pessoas íntegras que se sentiram traídas - e com toda razão. Ocorre que não foram traídas por uma rede de TV nem pelo médico, foram traídas pelo próprio coração. É decisão emocional - e não racional - se comover sem pensar no que a pessoa fez no verão passado. Não é admissível que um adulto acredite na conversa de alguém que está no regime fechado há pelo menos 8 anos e depois queira dividir a culpa.

Há uma discussão justa sobre se o crime cometido pela pessoa deveria ter sido dito ao público. Como jornalista, questiono em primeiro lugar se teria - como produtora ou editora - selecionado esse personagem específico. Muito provavelmente não, mas isso é porque tenho esse defeito do coração duro mesmo. O segundo ponto é, uma vez tomada a decisão de dar voz a essa pessoa, se informaria ao público o crime. Eu sou da confusão, colocaria a informação em letreiro na tela para aparecer bem na hora em que todo mundo estivesse chorando de pena de alguém que está no mínimo há 8 anos na cadeia.

A reação forte diante da revelação do crime, que incluiu até ameaças contra o dr. Drauzio Varella, mostra a incapacidade total de lidar com frustrações, a característica fundamentalmente adolescente da nossa sociedade.  Que o episódio sirva para que repensemos nossa postura diante do sensacionalismo, uma técnica poderosa utilizada desde a Roma Antiga. Trata-se de descrever um evento olhando pelo seu ângulo mais "sensacional", ou seja, pelo que mais causa sensações nas pessoas, mais puxa pelo emocional, sem ter a mesma preocupação com fatos e contextualização. Seja diante do sensacionalismo na grande mídia ou dos gafanhotos de redes sociais, a nossa postura é a de rendição total.

O sensacionalismo na mídia de massas é muito mais fácil de perceber do que nas redes sociais, onde tudo é triado por algoritmos e você só recebe o que mexe com as suas sensações em particular. Emoções são naturais da alma humana e é ótimo que possamos ter essa experiência, mas será que não estamos colocando emoção demais e cérebro de menos em diversos tipos de decisões no cotidiano? Não tenho resposta.

Madeleine Lacsko, jornalista - Vozes - Gazeta do Povo