Maior controle das visitas diminui riscos à
segurança pública. Ministro quer nova lei
Experiências internacionais bem-sucedidas mostram que o aumento na segurança
dos sistemas prisionais passa por um controle mais rígido das visitas, ainda
que aplicado apenas aos presos de maior periculosidade, e por uma melhora da
estrutura das cadeias, o que facilita a vigilância e dificulta a corrupção de agentes
penitenciários. De acordo com investigações, episódios recentes de violência no
Rio foram deflagrados dentro de presídios.
É o caso da invasão da Rocinha por uma quadrilha, ocorrida
no último dia 17. A ação teria sido planejada pelo traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem,
que cumpre pena na penitenciária federal de Rondônia, tida como uma das mais
seguras do país. Suspeita-se que a ordem que detonou a guerra na favela tenha
sido transmitida por meio de parentes ou advogados que o visitaram.
As regras
dos presídios variam bastante nos países com grandes populações carcerárias,
mas, embora existam problemas, em todos os casos estudados pelo GLOBO o sistema
se mostra mais seguro. Na França, por exemplo, o Judiciário controla as visitas
e pode vetá-las. Nos EUA, apesar de existirem regras diferentes entre os
estados, aplica-se quase sempre um trabalho de inteligência para evitar que as
visitas se tornem uma ameaça à segurança pública.
Nas
unidades consideradas mais seguras mundo afora, há alguns pontos em comum:
equipamentos de vigilância de ponta, celas individuais ou com poucos presos e a
exigência de que os detentos trabalhem. [aqui no Brasil, a 'constituição cidadã' proíbe que os presos trabalhem - cláusula pétrea;
no Brasil, mesmo sem que os bandidos trabalhem, os familiares deles - esposa e filhos - recebem auxílio-reclusão cujo valor é superior a um salário mínimo.
Milhões de brasileiros decentes e honestos, ralam um mês inteiro para ganhar um salário mínimo.
Para a família de muitos bandidos eles ganham mais presos, sem trabalhar, do que se trabalhassem em uma atividade honesta.]
Jungmann: cadeias do país são ‘peneiras’
O
ministro da Defesa, Raul Jungmann, que vem fazendo uma campanha por regras mais
rígidas nos presídios brasileiros, elevou ontem o tom das críticas aos métodos
de controle de acesso às cadeias. Em entrevista ao GLOBO, ele disse existir “um
acordo tácito entre determinados sistemas penitenciários, governos e grandes
quadrilhas que dominam o interior desses aparelhos penitenciários”.
— Muitos
presídios do país são verdadeiras peneiras. Essa é a nossa realidade, que
precisa ser enfrentada com urgência. O que vemos são pessoas presas
fisicamente, mas livres em termos de comunicação com o mundo exterior. Como
isso se dá? Como é possível que isso aconteça? É evidente que existe um acordo
tácito, mais ou menos no seguinte termo: “não mexe comigo que eu não crio problemas
para vocês” — afirmou Jungmann.
O
ministro vem conversando com representantes da sociedade civil e do Judiciário
sobre uma proposta para restringir o contato físico entre visitantes e detentos
no sistema penitenciário federal: eles se encontrariam apenas em espaços
conhecidos como parlatórios, onde ficariam separados por um vidro. Além disso,
Jungmann propõe a gravação das conversas — ideia que recebeu o apoio da procuradora-geral da República,
Raquel Dodge, e do juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba,
mas que é contestada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). [o Governo tem que ter coragem e simplesmente ignorar a OAB.]
— A comunicação
precisa ser registrada. Situações extraordinárias, como a que a gente está
vivendo no Rio, exige medidas extraordinárias. O Congresso deve ser sensível ao
nosso momento, para aprovar uma legislação mais rígida — disse o ministro. — As
Forças Armadas fizeram mais de 30 varreduras em cadeias do país e constataram
que um em cada três presos tem alguma arma branca consigo.
No mês
passado, Jungmann ofereceu o apoio das Forças Armadas para varreduras nos
presídios do Rio, mas o governador Luiz Fernando Pezão recusou a oferta.
Celulares, dinheiro, drogas e até pistola
Reportagens
publicadas pelo GLOBO semana passada mostraram o alto grau de vulnerabilidade
de presídios do Rio. Em fiscalizações de rotina realizadas este ano pelo
Ministério Público estadual, foram encontrados telefones, drogas e armas, além
de grandes quantidades de dinheiro dentro de cadeias. Na mais recente, realizada em 30 de setembro no Instituto
Penal Benjamin de Moraes Filho, no Complexo Penitenciário de Gericinó,
promotores acharam cocaína, maconha, nove celulares e dezenas de chips de
operadoras.
E, na última segunda-feira, agentes penitenciários
apreenderam uma pistola com munição no Presídio Jonas Lopes de Carvalho, o
Bangu 4, onde está preso o traficante Celso Luís Rodrigues, o Celsinho da Vila
Vintém. De acordo com investigadores, ele é suspeito de dar uma ordem para uma
quadrilha participar da invasão da Rocinha, em apoio a um bando que seria
comandado por Nem.
Estados Unidos. Videoconferência é opção
A política prisional americana, como muitas coisas no país, varia de estado
para estado, mas em geral recebe críticas da organização de direitos humanos.
Se por um lado há um controle melhor das visitas, inclusive com o uso de
tecnologia e inteligência, por outro há denúncias sobre o abuso do isolamento
dos detentos e falta de contato humano. Em alguns locais, familiares sequer
podem ter contato com presos, separados por grades ou vidros, dependendo do
nível de periculosidade do detento.
Na maior
parte dos estados, a estrutura é melhor que no Brasil: os presídios são mais
seguros e os visitantes passam por controles iguais aos de aeroporto para
entrar nas cadeias. Parentes dos presidiários têm histórico criminal analisado
e, em muitos casos, há um acompanhamento policial dos visitantes. Mas muitos
presidiários ficam desnecessariamente em solitárias, sem acesso às visitas.
Alguns estados têm preferido o uso de videoconferência para as famílias em
troca da visita, gerando críticas pela falta de contato humano com os presos. [enquanto houver preocupação com DIREITOS HUMANOS de bandidos o sistema penitenciária do Brasil será a droga que é;
tem que colocar na cabeça do bandido e familiares que bandido condenado perde a condição que lhe dá acesso aos tais de DIREITOS HUMANOS.]
"Prisioneiros em solitária têm frequentemente negado seu o direito a
chamadas de telefone e visitas. Desde que o sistema de solitária entrou em
vigor, ele tem sido usado como uma ferramenta de repressão", informou em
relatório o Centro de Direitos Constitucionais, ONG que fiscaliza a situação prisional
americana, afirmando que o isolamento excessivo atinge mais os negros. Além
disso, pode gerar danos graves para os detentos, inclusive dificultando sua
reinserção na sociedade e um alto índice de suicídio entre presos e ex-presos.
Em alguns casos, entidades afirmam que esse isolamento pode ser comparável a um
tipo de tortura.
O excesso de encarceramento - há cerca de 2,3 milhões de pessoas presas nos
Estados Unidos, ou 25% de toda a população carcerária do mundo, no país que tem
apenas 5% da população mundial - também faz parte dos debates. O governo de
Barack Obama tentou reduzir o número de prisões por crimes de menor potencial
ofensivo, sobretudo para o caso de menores, mas este tipo de programa foi
parado no governo de Donald Trump. Fontes do próprio governo admitem, sob
sigilo, que o país está longe de ser um modelo para o mundo nesse tema, apesar
da segurança de seus presídios.
Por outro lado, assim como no Brasil, o contato de advogados é permitido, e o
sigilo da conversa é garantido por lei. Desta maneira, em tese, pode ocorrer o
controle de atividades criminosas a partir de presídios com o uso de advogados
que se sujeitam a isso, porém é mais difícil o controle direto, por celular.
- Isso varia em cada estado, mas nos presídios que frequento como advogada aqui
em Massachusetts vejo um uso melhor da tecnologia, da inteligência, uma
estrutura muito diferente no Brasil. Como aqui em geral a corrupção e a lotação
dos presidios é menor, o controle tende a ser mais efetivo - afirmou a advogada
carioca Rafaela Garrett Prats Serrano, que há mais de uma década atua em
Cambridge. - Nunca vi, por exemplo, histórias de celulares dentro da prisão.
Alemanha. No xadrez, todos são iguais
-
Existem na Alemanha 68 mil detentos em tempo integral e 11.500 em regime
semiaberto. E a regra é clara: todos são iguais na cadeia. Por isso, os
presídios não têm tratamento especial para acadêmicos, políticos nem
executivos. Todos encontram na cadeia a mesma cela minúscula, o sanitário perto
da cama e tempo de sobra para pensar.
Para
combater a violência, os estados alemães deram a cada prisioneiro uma cela
própria, mas dois terços ainda vivem em unidades com mais de uma cama.
Visitantes são controlados rigorosamente e não podem levar celulares, dinheiro
ou bebidas alcoólicas. O encontro com os presos ocorre em uma sala com mesas e
cadeiras, sem isolamento de parede de vidro, mas com a presença de guardas. A
rotina também é a mesma para todos: os detentos acordam às 6h e têm as celas fechadas
às 21h30m.
França. Sem telefone nem internet
Toda
pessoa detida em uma prisão francesa pode receber visitas. Em determinados
casos, o diretor pode impor um elemento de separação entre o visitante e o
preso. Um decreto de 2003 autorizou o uso de um sistema de reconhecimento
biométrico, acompanhado de uma carteira de identidade para as visitas, que
podem ser submetidos a instrumentos como o detector de metais.
Durante
as visitas, é obrigatória a presença de um agente. Se a visita ocorre em uma
cabine, é corrente usar um dispositivo de escuta. Em alguns estabelecimentos, o
dispositivo de controle é reforçado por uma câmera. São
proibidos produtos alimentares, bebidas ou cigarros. Os presos não podem ter
telefone, mas são autorizados a possuir um rádio e uma televisão em sua cela,
bem como um computador sem acesso à internet.
Colômbia. Autoridades no controle
Há 20
anos, as forças de segurança colombianas não se atreviam a entrar nos presídios
do país, à época controlados por cartéis do narcotráfico e, também, grupos
paramilitares. Desde então, a situação mudou bastante, a segurança foi
recuperada nas ruas das principais cidades colombianas e, dentro das prisões,
as autoridades retomaram grande parte do controle perdido no passado. As regras
nacionais (não existe uma lei) sobre o que está permitido dentro dos presídios
continuam sendo violadas, mas, segundo jornalistas que acompanham o assunto
diariamente, as ações planejadas e executadas por presos colombianos já não têm
grande impacto do lado de fora porque os grandes grupos criminais perderam
poder.
As normas
variam de acordo ao tipo de presídio. Os de máxima segurança são mais
rigorosos, por exemplo, em relação às visitas. Mas, em termos gerais, está
proibida a utilização de celulares, a circulação de dinheiro, o consumo de
drogas e bebidas alcoólicas e as visitas são apenas nos fins de semana.Os
advogados podem ter acesso aos presos durante a semana e o contato, como no
caso dos familiares, é direto. Não existem vidros nem telefones para os
encontros nos presídios colombianos. As conversas, a menos que exista uma ordem
judicial, não são gravadas.
No caso dos
médicos, eles não podem ingressar às prisões, a menos que exista um pedido
especial, autorizado por um juiz. Os detentos são tratados por médicos do
sistema penitenciário ou levados para hospitais públicos. Mais uma vez, em
casos excepcionais, liberados pela Justiça, os presos podem ir a uma clínica ou
consultório privados. As visitas íntimas são um direito constitucional na
Colômbia, explicou ao GLOBO o jornalista Jhon Torres, editor de notícias
judiciais do “El Tiempo”. - Algumas
dessas normas não são respeitadas e existe, por exemplo, um grande mercado de
celulares dentro das prisões. As autoridades tentam bloquear o sinal, mas, como
muitas prisões estão em regiões centrais das cidades, os moradores se queixam e
não é tão simples fazer esse bloqueio - disse Torres.
A grande
conquista dos últimos governos colombianos foi a segurança e o fortíssimo golpe
aos cartéis do narcotráfico (como Medellín e Cáli), grupos paramilitares e,
mais recentemente, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), hoje
um partido político. Continuam existindo grupos criminosos, mas seu poder,
enfatizou o editor do “El Tiempo”, “reduziu-se drasticamente”.
- Ainda
existem caciques dentro das prisões que administram as vendas de celulares e a violência
entre os presos. Mas como seus chefes do lado de fora já não são tão poderosos,
eles também têm menos influência - comentou Torres.
O grande
drama da Colômbia hoje é a superlotação das prisões. O país tem 138 presídios,
com capacidade para 76.553 pessoas. Em junho passado, de acordo com dados
oficiais, o número de presos colombianos alcançava 117.018. Isso soma-se a
denúncias de violações dos direitos humanos dentro das prisões. No caso da
Argentina, existem três leis que regem o Serviço Penitenciário Federal. A mais
antiga delas, número 20.416, foi aprovada em 1973.
As mais
recentes em 1994 e 1996. A lei 24.660, votada pelo Congresso nacional argentino
há 21 anos, estabelece as regras de relacionamento com familiares e advogados.
De acordo com o artigo 158 da lei, o detento tem direito a comunicar-se
“periodicamente, em forma oral ou escrita, com sua família, amigos, pessoas
próximas ou advogados, assim como com representantes de organismos oficiais e
instituições privadas”. Já o artigo 160, da mesma lei, diz que “as visitas,
correspondências e comunicações telefônicas que os detentos recebam deverão se
ajustar às condições, oportunidades e supervisão determinadas pelo regulamento.
Ficam proibidas as comunicações telefônicas através de equipamentos móveis”.