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domingo, 6 de março de 2022

Putin, a Mãe Rússia e o Ocidente - Revista Oeste

Rodrigo Constantino

Os russos permitiram a concentração de poder num só homem, que se despiu de ideologias e adotou um pragmatismo nacionalista cuja meta era tornar a Rússia um país temido novamente 

Vladimir Putin, presidente da Rússia | Foto: Asatur Yesayants/Shutterstock
Vladimir Putin, presidente da Rússia -  Foto: Asatur Yesayants/Shutterstock 
 
Com a invasão da Ucrânia pela Rússia, o mundo se voltou para Vladimir Putin, aquele que comanda com mão de ferro o país desde 1999. Todos querem entender a cabeça daquele que ameaça levar o mundo a uma guerra nuclear. 
Será que ele está blefando? 
Seria Putin capaz de apertar o botão vermelho? 
Como as sanções econômicas impostas pelo Ocidente podem frear as pretensões imperialistas da Rússia? 
Putin é comunista ou nacionalista? E por aí vai.

Naturalmente, a psicologia de alguém como Putin é algo complexo. Sabemos de seu passado, do fato de que seu avô foi cozinheiro de Lenin e também de Stalin, que seu pai, um operário, foi ferido na Segunda Guerra Mundial, que ele foi agente secreto na KGB, e que considerou o debacle da União Soviética uma “catástrofe geopolítica”. Ou seja, seus laços com o imperialismo soviético são evidentes. Mas Putin também é um nacionalista, e em muitos aspectos se parece com um novo czar, lutando para resgatar a grandeza da “Mãe Rússia”. É aqui que atrai, além de comunistas, reacionários.

O Ocidente está em crise de identidade, submetido ao globalismo de elites “progressistas”, materialistas e cosmopolitas
Os conservadores estão absolutamente certos quando apontam para a doença. 
Erra na receita, porém, quem acha que alguém como Putin pode ser parte da resposta. 
Basta conhecer um pouco do perfil do autocrata russo para compreender que ele está longe de ser a solução para as mazelas ocidentais. 
Ao contrário: a civilização ocidental precisa ser defendida justamente por representar valores que alguém como Putin, no fundo, repudia com veemência.

Putin nunca demonstrou qualquer apreço pelas instituições democráticas. Se o império das leis é um dos pilares mais importantes no Ocidente, ainda que em crise pelo abuso de poder arbitrário de hoje sob o pretexto da ciência, Putin simboliza seu oposto, a concentração de poder num só indivíduo, que tudo pode. Ele assumiu o poder quando havia um vácuo deixado pela crise de 1998 e a liderança frágil do bêbado Yeltsin. Oligarcas sem escrúpulos que conquistaram muito dinheiro e poder após a queda do regime soviético ajudaram a criar Putin como político, e logo em seguida o ex-espião destruiu um a um de seus “criadores”.

No livro The Oligarchs, de David Hoffman, essa história é contada em detalhes. É preciso entender que Yeltsin colocou alguns liberais no comando da economia, mas faltavam à Rússia instituições básicas para o funcionamento do livre mercado. O que tivemos em seu lugar foi uma “lei da selva”, um “vale-tudo” em que os tais oligarcas exploraram com maestria à custa do povo. Quando veio a crise, ela foi associada de maneira equivocada ao capitalismo. E foi nesse contexto que Putin chegou ao poder. Sim, ele foi pragmático para não matar a galinha dos ovos de ouro. Mas ele jamais depositou esperança no mecanismo de mercado para levar prosperidade aos russos.

Não se tratava, portanto, de um modelo de meritocracia, e sim um de conexões. Após utilizar os oligarcas para sua ascensão, Putin percebeu que era arriscado demais depender deles, e por isso passou a perseguir cada um deles. O dono da Yukos, Khodorkowsky, então o homem mais rico do mundo emergente, foi preso e esmagado como uma barata em poucas semanas. Os dois barões da mídia tiveram de fugir. O recado era claro: ou se submetia ao conceito de tirania de um homem só ou seria destruído. Putin não se importava com a riqueza desses oligarcas, desde que isso não significasse poder político. Esse seria todo dele, apenas dele.

O capitalismo russo floresceu sem qualquer transparência, por meio de propinas, tudo feito às sombras, com conexões e influência, com golpes escancarados, sem qualquer instituição sólida para proteger a propriedade privada. O liberal Yegor Gaidar, reformista convocado por Yeltsin, temia justamente isso: que os russos fossem se sentir traídos pelo capitalismo. Eu estive num jantar com Gaidar, um admirador de Hayek, e ele parecia alguém sem interesses materiais. Era alguém que realmente acreditava num caminho alternativo para a Rússia, similar ao traçado pelo Ocidente. Na era Putin, figuras como Gaidar não tinham qualquer espaço no governo.

Putin claramente desprezava os oligarcas que só pensavam em enriquecer por meio de esquemas fraudulentos e, eventualmente, mandar o dinheiro para fora do país. Os reformistas liberais tentaram oferecer o máximo de liberdade antes de criar regras claras do jogo, e no vácuo dessas regras vieram forças caóticas do mal, como charlatães, brutamontes, gangues criminosas, políticos corruptos, burocratas espertos, mafiosos etc. Foi nesse ambiente que o ex-espião da KGB concentrou boa parte do poder político. A Rússia nunca desenvolveu qualquer respeito pelo império das leis, pelo estado de direito.

Vale notar que Putin foi catapultado ao papel de líder logo no começo de sua gestão como primeiro-ministro, quando uma série de bombas aterrorizaram Moscou. Os supostos terroristas nunca foram encontrados, o que alimentava a suspeita de se tratar de um trabalho interno do serviço secreto russo, ligado a Putin. O prefeito Luzhkov, seu adversário político, teve sua imagem muito desgastada, enquanto Putin culpou os chechenos e lançou uma ofensiva militar em larga escala, fazendo sua taxa de aprovação disparar.

Ninguém conhecia direito o pensamento político de Putin, ou o que ele fizera na KGB. Os próprios oligarcas ainda o encaravam como uma marionete em suas mãos. Mas, após os anos de fraqueza de Yeltsin, os russos pareciam apreciar o estilo firme de Putin, e muitos compartilhavam de seu ódio pelos chechenos. Mesmo os “liberais”, cansados do caos econômico, pediam que Putin fosse o “Pinochet russo”, acreditando que apenas uma ditadura política poderia viabilizar as reformas econômicas de mercado. Putin soube usar isso a seu favor.

Os russos, sem tradição de liberdade, parecem ter chegado à conclusão de que uma “democracia” controlada de cima é a única alternativa viável no país

Fechado, discreto, sisudo, Putin nunca participara de competições políticas reais, apenas de jogos de bastidores. Ele era extremamente disciplinado, inclusive a ponto de não demonstrar muita ambição no começo e sinalizar lealdade àqueles que o alçaram ao poder. Ele temia a imprensa, em especial a televisão, e por isso seus primeiros alvos foram os oligarcas da mídia. A censura foi imposta durante a guerra, e nunca mais abandonou a Rússia. Putin não queria destruir o sistema, apenas controlá-lo. Ao destruir Gusinsky e Berezovsky, os dois barões da mídia, o caminho ficou livre para o restante do trabalho.

O caso envolvendo Berezovsky, seu principal “criador”, merece maior atenção. Berezovsky passou a discordar de Putin sobre a guerra na Chechênia, e cometeu o erro de externar sua opinião em público. Putin não tolera isso. Berezovsky chegou a enviar uma carta a Putin alertando para seus erros ao escalar o conflito, impor sua vontade aos governadores e tentar controlar a mídia. Mas o magnata não tinha chance nessa batalha, e acabou vendendo seu canal de TV para Roman Abramovich, aliado de Putin, e fugiu do país.

Como coloca Lilia Shevtsova em Putin’s Russia, o desejo avassalador entre a classe política e os russos em geral era que Putin se mostrasse um líder que poderia trazer ordem ao caos de Yeltsin e acabar com a imprevisibilidade do Kremlin. Ao apostar nisso, porém, os russos permitiram a quase absoluta concentração de poder num só homem, que se despiu de ideologias e adotou um pragmatismo nacionalista cuja meta era tornar a Mãe Rússia um país respeitado e temido novamente.

Enquanto o preço do petróleo continuar alto, Putin tem pouco a temer. Não é possível negar que ele conta com apoio popular. Os russos, sem tradição de liberdade, parecem ter chegado à conclusão de que uma “democracia” controlada de cima é a única alternativa viável no país. Muitos são inclusive nostálgicos dos tempos soviéticos, apesar de tudo, apenas por conta do papel geopolítico exercido pela Rússia. Não é uma nova dacha para as férias ou trocar de iPhone todo ano que os move, e sim um sentimento coletivista de pertencer a algo maior.

A economia russa é pequena, quase do tamanho do Estado da Flórida. Mas os russos que apoiam Putin estão preocupados com outras coisas. É um grave equívoco medir Putin pela régua “progressista” ocidental. Trata-se de um autocrata nacionalista obstinado, capaz de tudo para atingir seus fins, e que não vai descansar enquanto a Rússia não for, novamente, um adversário à altura do decadente Ocidente. Aqueles que acreditam que ele pode ser um bom substituto do Ocidente, porém, estão redondamente enganados. Putin é a antítese de tudo que a civilização ocidental representa.

Leia também “A fraqueza ocidental”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste


domingo, 1 de março de 2020

O Mito e seu lugar de fala - Nas entrelinhas

”Diariamente, Bolsonaro se relaciona com os jornalistas tratando-os como ‘párias’. Suportar essa situação para qualquer um humilhante faz parte das agruras da profissão

A relação entre o discurso e a verdade é cada vez mais complexa. Na teoria, trabalha-se com três conceitos fundamentais: 
- condições de validade (ou seja, se a afirmação é válida ou corresponde aos fatos)
- pretensões de validade (a narrativa ou os argumentos utilizados para o convencimento); 
- e o resgate das condições de validade (quando o discurso é legitimado pelo ideal de fala e como tal, apesar de imposto unilateralmente, obtém certo consenso). Se na filosofia lidar com a verdade é um assunto complexo, nas redes sociais então nem se fala. A verdade morre e ressuscita todos os dias, de diferentes maneiras, num embate cujo desfecho nem sempre é o melhor para a sociedade. A opinião pública se forma a partir do choque de versões, no qual o contraditório acaba sendo o meio mais eficaz de aproximação da realidade.

Nessa guerra de informação, a tropa de elite é formada pelos jornalistas profissionais, cuja relação com a política é quase inseparável. Há cerca de 100 anos, numa palestra antológica (“A política como vocação”), o sociólogo alemão Max Weber destacou que os jornalistas pertencem a uma espécie de “casta de párias” e que “as mais estranhas representações sobre os jornalistas e seu trabalho são, por isso, correntes”. Ao discorrer sobre o mundo da política, o papel da imprensa e as vicissitudes do jornalismo, dizia a que a vida do jornalista é muitas vezes “marcada pela pura sorte” e sob condições que “colocam à prova constantemente a segurança interior, de um modo que muito dificilmente pode ser encontrado em outras situações”: “A experiência com frequência amarga na vida profissional talvez não seja nem mesmo o mais terrível. Precisamente no caso dos jornalistas exitosos, exigências internas particularmente difíceis lhe são apresentadas. Não é de maneira alguma uma iniquidade lidar nos salões dos poderosos da terra aparentemente no mesmo pé de igualdade (…) Espantoso não é o fato de que há muitos jornalistas humanamente disparatados ou desvalorizados, mas o fato de, apesar de tudo, precisamente essa classe encerra em si um número tão grande de homens valiosos e completamente autênticos, algo que os outsiders  não suporiam facilmente”.

Grandes mulheres também, diria Max Weber, nos dias de hoje, porque há 100 anos o jornalismo não era uma profissão majoritariamente feminina, como agora acontece; muito pelo contrário, havia poucas mulheres nas redações. Mesmo assim, sobrevivem ainda o machismo, a misoginia e o assédio sexual e/ou moral, em todos os níveis de relações de poder, às vezes até nas redações. É óbvio que estou contextualizando o embate entre o presidente Jair Bolsonaro e a jornalista Vera Magalhães, colunista do Estado de São Paulo que divulgou mensagens de WhatSApp do presidente da República em apoio às manifestações contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), convocadas para 15 de março.

Comportamento
Diariamente, Bolsonaro se relaciona com os jornalistas tratando-os como “párias”, ao sair do Palácio do Alvorada. Suportar essa situação para qualquer um humilhante faz parte das agruras da profissão, da mesma forma como aspirar gás lacrimogêneo na cobertura de manifestações e correr o risco de ser vítima de uma bala perdida nas reportagens policiais. Bolsonaro coleciona agressões verbais a jornalistas, como as recentes declarações misóginas contra Patrícia Campos Mello. Volte e meia, ofende um colega numa coletiva. Suportar esse tipo de agressão não faz parte dos manuais de redação. Não existe um comportamento padrão para isso, a reação depende de cada um. No caso mais recente, porém, Bolsonaro colidiu com “Sua Excelência, o fato”, como diria Ulysses Guimarães, numa situação na qual se contrapôs ao Congresso, ao Supremo e à Constituição de 1988. Perdeu! Vera validou o que disse com três vídeos compartilhados pelo próprio Bolsonaro.

A “mimesi” de Bolsonaro nas redes sociais faz parte da construção do “Mito”. É uma imitação da realidade, não uma reprodução. A mimesi ocorre quando a ação humana é representada de forma melhor (tragédia e epopeia) ou pior (comédia) do que a realidade. É uma representação em torno do mito, ou seja, da ação, que deve seguir sempre os critérios da verossimilhança. O mito é caracterizado por um conjunto de ações escolhidas e organizadas, sua construção se remete a algo que poderia acontecer e não ao que aconteceu.

Bolsonaro construiu o Mito a partir de um “lugar de fala” que não é a Presidência da República, mas o universo de origem de sua candidatura. Procura manter um eleitorado cativo, com perfil originário de suas eleições para a Câmara, mas agora nacionalizado: militares, policiais, milicianos, caminhoneiros, taxistas, ruralistas, pentecostais, ultraconservadores e reacionários. [todos, possuidores individuais de um voto = ao de qualquer eleitor, seja ele quem for.] Em consequência, aparta a autoridade constituída — a Presidência — do carisma do “Mito” e se isola politicamente. Ocorre que um determinado mito pode ser episódico (são os piores) e fruto da surpresa (emoção causada por fatos inesperados). Isso depende da percepção do espectador, não depende, por exemplo, de haver um único herói na trama. Na tragédia, como na sua campanha eleitoral, o mito se forma pela peripécia e o reconhecimento; na comédia, porém, acaba desconstruído. É o que pode acontecer com Bolsonaro na Presidência quando briga com os fatos.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense


domingo, 15 de setembro de 2019

Sob o signo de Jano - Nas entrelinhas

Correio Braziliense

É preciso defender uma sociedade na qual a comunicação cotidiana e o discurso da vontade possibilitem uma vida melhor e mais segura, num ambiente de plena liberdade

O mito romano de Jano (do latim Janus ou Ianus) era representado com duas cabeças, simbolizando os términos e os começos, o passado e o futuro, o dualismo relativo de todas as coisas. No seu templo, as portas principais ficavam abertas em tempos de guerra e eram fechadas durante a paz. Era o deus tutelar de todos os começos, patrono de todos os finais. O principal monumento em sua glória se encontra em Roma, no Museu do Vaticano: o busto Ianus Geminus. Não à toa, Jano acabou escolhido para representar o primeiro mês do ano do calendário romano (janeiro, do latim januarius), pelo imperador Numa Pompílio (715-672 a.C.).

Sua representação de caras opostas, uma olha para frente e outra olha para trás, pode ser entendida como se examinasse as questões por todos os seus aspectos. O filósofo e sociólogo alemão Jüngen Habermas, um dos expoentes da famosa Escola de Frankfurt e da tradição da teoria crítica e do pragmatismo, em novembro de 1984, numa palestra no parlamento espanhol, invocou a imagem de Jano para falar sobre o caráter inacabado da modernidade. Habermas dedicou a vida ao estudo da democracia, especialmente por meio de suas teorias do agir comunicativo, da política deliberativa e da esfera pública.

Àquela época, estudava a crise do Estado de bem-estar social e o esgotamento das energias utópicas, tema que abordou no seu discurso, intitulado a Nova obscuridade, cujas notas estão reunidas numa coletânea de textos publicada com o mesmo nome no Brasil, pela Editora Unesp (2011). Passaram-se quase 35 anos, desde então, suas previsões se consolidaram em muitos aspectos. De fato, houve uma mudança de paradigma da sociedade do trabalho para a sociedade da comunicação. Essa mudança explica muito do que está acontecendo hoje no Brasil, principalmente na política.

As utopias
Nas utopias da ordem, entre as quais estão o velho “socialismo real” comunista e o Estado de bem-estar social-democrata, as dimensões de felicidade e da emancipação se confluíam com aquelas da intensificação do poder e da produção de riqueza social. Segundo Habermas, os projetos de forma de vida racionais entravam em uma simbiose ilusória com a dominação racional da natureza e com a mobilização das energias sociais: “A razão instrumental desencadeada em forças produtivas e a razão funcionalista desdobrando-se em capacidades de organização e planejamento deveriam abrir caminho para a vida humana digna, igualitária e ao mesmo tempo libertária”. Essa foi a grande ilusão da sociedade do trabalho.

A esquerda brasileira sempre pautou a atuação na centralidade do trabalho. De certa forma, a eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a chegada do PT ao poder, erroneamente, simbolizaram o coroamento dessa concepção, mas ela já estava ultrapassada pela sociedade da comunicação e a economia do conhecimento. Além disso, o transformismo e a degeneração no poder deixaram de lado essas utopias. A esquerda que não se corrompeu dispõe de ferramentas teóricas para fazer esse diagnóstico, mas não consegue, porque é prisioneira de velhos dogmas em relação à antiga sociedade industrial e ao valor do trabalho na geração de riquezas.

Não foi à toa que se viu surpreendida nas últimas eleições pelo surgimento de novos atores políticos, com ideias diametralmente opostas, alguns dos quais até obscurantistas e reacionários, mas que souberam ocupar o vácuo político criado pela ultrapassagem da sociedade do trabalho e suas formas de representação (sindicatos, partidos operários etc.) e operar no âmbito da nova sociedade da comunicação, numa disputa que se assemelha muito à guerra entre os taxistas e os motoristas do Uber (perdão pela simplória comparação). A eleição do presidente Jair Bolsonaro não deixa de ser, no plano da disputa pelo poder, um fenômeno associado a essas mudanças.

Condição humana
A despedida dos conteúdos utópicos da sociedade do trabalho, porém, não fecha a dimensão utópica da consciência histórica e da confrontação política, mas exige uma mudança de eixo: a centralidade está na defesa da democracia. Nesse aspecto, é sempre bom lembrar a crítica de Hannah Arendt às ideias centradas no trabalho, porque levaram e ainda levam a soluções autoritárias para a sociedade. Segundo ela, a condição humana está relacionada a três atividades fundamentais que caracterizam a vida: “labor” (o processo biológico do corpo humano), “trabalho” (a criação de objetos e transformação da natureza) e “ação” (a única atividade que independe da medição da matéria e se correlaciona com a condição humana da pluralidade). O que determina a condição humana é o agir e pensar politicamente, daí a importância vital do espaço público e das liberdades.

Eis uma chave para olhar o passado e o futuro, como Jano. É preciso defender uma sociedade na qual a comunicação cotidiana e o discurso da vontade possibilitem uma vida melhor e mais segura, num ambiente de plena liberdade, no qual todos possam dar sua efetiva contribuição. O “lugar de fala” não basta como conteúdo utópico da sociedade da comunicação. É por meio da ação que os homens são capazes de demonstrar quem são.


Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB


sexta-feira, 17 de maio de 2019

Impeachment de Bolsonaro entra no radar


Assistimos a um filme previsível, com roteiro desconjuntado e bufões da pior espécie

[se impõe o registro que a matéria adiante apresenta um evidente exagero quando cogita da possibilidade de impeachment.

Bolsonaro não cometeu nenhum ato que sustente uma acusação de crime de responsabilidade - acusação, interpretação é bem mais fácil fazer, inclusive por dispensar provas.

 

O governo Bolsonaro tem cometido alguns erros,  mas nada que ponha dúvidas fundamentadas, sobre a honestidade e/ou  outros pontos que teriam que ser violados para caracterizar os crimes em comento.

 

Collor, além de acusado da prática de atos desonestos - apesar de ter sido posteriormente absolvido pelo STF de tais acusações - tentou criar  uma 'nova política' para governar e com isso contrariou os 'donos do poder'. Hoje ele é acusado da prática de novos delitos, mas, comentar sobre os mesmos não foi o objeto que nos motivou trazer seu nome à baila.

 

Bolsonaro, tudo indica começa a conter o 'aiatolá de Virgínia' e também os seus pimpolhos. Agindo dessa forma começa a dar rumos ao seu governo. Até agora, apesar das aparências, faltam condições políticas, e fatos, para que os anti Bolsonaro reúnam elementos para colocar no Plenário da Câmara dos Deputados 342 deputados - número mínimo de votos contra Bolsonaro, necessários para que eventual pedido de impeachment seja aceito - e sobram motivos para que 172 deputados decidam que o pedido deve ser rejeitado, o que encerra o assunto.]



Se o presidente Jair Bolsonaro continuar a ouvir apenas a horda de malucos que o cerca, não conclui o seu mandato. Já cometeu, e deixei isto claro há algum tempo nesta coluna, uma penca de crimes de responsabilidade. Aliás, ele falou nesta quinta (16) a palavra "impeachment" pela primeira vez.  Falta que o ambiente político degenere o suficiente para que perca o apoio de ao menos um terço da Câmara. Os dois terços do Senado viriam por gravidade. Observem que falo em conclusão do "mandato", não do "governo". Este ainda não começou. Nem vai.

Aquele que ocupa a cadeira de presidente da República nunca soube por que queria o mandato. Ou por outra: não tinha uma prefiguração afirmativa de razões para comandar o país. O cargo lhe serve apenas para se vingar de seus inimigos ideológicos ou do fiscal do Ibama que um dia o multou. É raso e mesquinho, no sentido original dessa palavra. A mistura de ignorância com poder é sempre perigosa porque torna as pessoas arrogantes e destrutivas. Uma imagem: o sujeito chega diante de um quadro de Picasso e diz: "Isso eu também faço".

A estupidez não reconhece competências, história, técnica, saber acumulado. Lembrando tirada do jornalista H. L. Mencken, tornada já quase um clichê, figuras com essas características têm sempre na ponta da língua uma resposta simples e errada para problemas difíceis. Converso com muita gente que está surpresa com a ruindade do governo. Quem acompanha o que escrevo nesta Folha e em meu blog ou o que falo em meu programa de rádio sabe que estou assistindo a um filme previsível —e daqueles ruins, com roteiro desconjuntado, tiradas momescas e bufões da pior espécie.

Se muitos recorreram a seu pretenso liberalismo para votar em Bolsonaro em nome do mal menor, afastei de mim esse cálice. O conjunto das minhas convicções liberais sempre me blindou de tipos como esse. Há muitos anos, escrevi em minha página, no auge dos embates com o petismo, que "nem tudo o que não é PT me serve".  Ora, não há como ser "mal menor" uma personagem que não entende os fundamentos da democracia e que demonstra, desde sempre, a clara intenção de recorrer às licenças civilizatórias que o regime oferece para solapar as suas bases. Não! Ele nunca me serviu! Nem em nome do antipetismo.

Ademais, convenham, e disto também já tratei aqui antes ainda de ele ser eleito: quem o escolheu queria consagrar aquelas boçalidades que dizia. Havia outros meios de ser antipetista: Henrique Meirelles, Geraldo Alckmin, até João Amoêdo, que exercita, assim, um bolsonarismo mais light —sem o trabuco na mão ao menos.
Bolsonaro serviu como uma espécie de prova dos noves para testar convicções realmente liberais. Havia muitos que disfarçavam a condição de reacionários delirantes vestindo esse uniforme. Nesse particular sentido, ele serviu para tirar muita gente do armário.  Meu senso moral impediu-me de escolher, ainda que como instrumento de uma luta contra um suposto mal maior, aquele que fez, por exemplo, a apologia do estupro e da tortura sob o pretexto de exercer as garantias previstas no artigo 53 da Constituição. Eis o exemplo escancarado do uso de uma prerrogativa da democracia para agredir seus fundamentos.


Sim, chegou a hora de fazer esse debate no Brasil. E vem com atraso. Há muito estamos confundindo um modo de escolher go
vernos —por meio de eleições— com a democracia, que, com efeito, vive uma crise mundo afora. Esta é mais do que o sufrágio, por mais livre que seja.  Esse regime também compreende um conjunto de valores. Se uma maioria se estabelece para sufocar liberdades e para discriminar e silenciar minorias, receba um outro nome qualquer. Democracia nunca! Ou teríamos de conferir o diploma de heróis da liberdade a Erdogan, a Putin e aos aiatolás do Irã.

Volto lá ao começo. Não estou me oferecendo para ser o conselheiro de Bolsonaro em lugar de Olavo de Carvalho. Estou a fazer um registro. Por estupidez política, a reforma da Previdência, que até há um mês poderia servir de correia de transmissão para um segundo mandato, agora vai atuar, ainda que necessária, para corroer o que resta de popularidade ao governo.

O Planalto, por intermédio dos seus incendiários, acordou as muitas e justas insatisfações de brasileiros das mais diversas extrações. O próprio Bolsonaro, seus filhos, Carvalho, este espantoso Abraham Weintraub... Essa gente toda é, para esse governo, o que o esquerdista Movimento Passe Livre foi para o governo Dilma. Tentando animar seus fanáticos, deu unidade ao coro dos contrários. Lembro-me de um post que escrevi no dia 10 de março de 2015. A então presidente Dilma falava "impeachment" pela primeira vez.

Reinaldo Azevedo - Folha de S. Paulo



Se o presidente Jair Bolsonaro continuar a ouvir apenas a horda de malucos que o cerca, não conclui o seu mandato.... - Veja mais em https://reinaldoazevedo.blogosfera.uol.com.br/2019/05/17/minha-coluna-na-folha-o-impeachment-de-bolsonaro-entra-no-radar/?cmpid=copiaecola

sábado, 16 de março de 2019

O colapso da moderação

Não surpreende a decisão do STF



O STF é a última cidadela de um establishment político-institucional que, embora moralmente arruinado, luta para sobreviver mais que isso, manter seu status quo e as regras que o sustentam.  Esse establishment, sem a exceção de nenhum dos poderes, foi gradualmente desmascarado pela operação Lava Jato, que levou à cadeia figurões da política e do meio empresarial. Os maiorais. Expôs as relações incestuosas entre o público e o privado e a transgressão contínua, quase rotineira, a uma cláusula pétrea constitucional segundo a qual “todos são iguais perante a lei”.

Millôr Fernandes, décadas atrás, dizia que alguns são mais iguais. Atualizando-o, pode-se dizer que lutam – e o STF é a trincheira final – para que essa igualdade desigual seja preservada.  A Lava Jato expôs as vísceras desse sistema e, ao fazê-lo, despertou o ânimo da população, que se insurgiu em sucessivas manifestações de rua – as maiores da história – denunciando sua índole corrupta e subversiva, clamando por sua remoção.  O impeachment de Dilma Roussef foi a consequência inicial e a eleição de Bolsonaro a continuidade desse processo (que não cessou). A população, em sua maioria, viu nele o candidato que melhor expressava o sentimento anti-establishment. A hostilidade da mídia e do coronelato cultural a seu nome, que precede a posse e acompanha cada um de seus atos, apenas os inclui, na percepção do público, entre os que resistem às mudanças, merecedores, eles sim, do estigmatizado rótulo de reacionários.

Nada simboliza mais essa degradação institucional que o encarceramento, a partir de juízes de primeira instância, de um ex-presidente da República, Lula, ao lado de ex-governadores (quatro do Rio de Janeiro e um do Paraná), ex-deputados (inclusive um ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha), ex-senadores, ex-ministros. Ao lado deles, os donos das maiores empreiteiras do país, algumas ostentando o rótulo de multinacionais, com tentáculos estendidos a outras nações e continentes. E a fila não acabou.

Aguardam nela, em face dos mesmos delitos, outros figurões, entre os quais, dois ex-presidentes Dilma Roussef e Michel Temer -, parlamentares com mandato, banqueiros e… juízes.  O ex-governador Sérgio Cabral, condenado (até aqui) a mais de um século de cadeia (o que o obrigará a retornar a Bangu na próxima encarnação), resolveu abrir o bico e chegar ao pessoal da toga.  No Senado, prepara-se uma CPI para investigar o Judiciário e acaba de ser impetrado mais um pedido de impeachment contra Gilmar Mendes (há outros, contra Dias Toffolli, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski). No Congresso, há ainda um pacote anticrime, do ministro Sérgio Moro, que, entre outras coisas, fortalece o combate à corrupção nos altos escalões do Estado.

Diante disso, não surpreende a decisão do STF de remeter ao TSE os crimes de corrupção que possam, de algum modo, apresentar um viés eleitoral. Nocaute à Lava Jato: quase todos os enquadrados por ela alegam caixa dois para justificar propinas e superfaturamento de obras. Reduz-se assim (ou mesmo elimina-se) a fila dos réus e viabiliza-se a liberação dos já encarcerados, a começar por Lula.

Achou ruim? Cuidado: o presidente do STF, Dias Toffolli, anunciou que irá punir os que, inconformados, protestem contra esses atos. Em gesto inédito (quase tudo neste momento é inédito), o STF julgará em causa própria os que achar que o ofenderam.

Eis que o autointitulado Poder Moderador da República perdeu de vez a moderação. 



[o curioso de todo o supremo abuso do atual presidente do STF é que de uma canetada só,  ele transformou o STF ( ao determinar um inquérito em que o Supremo será o investigador), instância máxima do Poder Judiciário, UM dos TRÊS PODERES da República - art. 2º da Constituição Federal - em QUATRO PODERES:
Confiram: o Supremo investiga, denuncia, acusa, se defende, julga e sentencia. 

Permanece PODER JUDICIÁRIO e quando necessário legisla, acumulando funções privativas do PODER LEGISLATIVO (há exemplos recentes em que ministros do Supremo tomaram decisões, apesar da inexistência de leis que as sustentassem, que, por assim dizer, criaram monocraticamente), se necessário expedem uma liminar e interferem nas funções executivas do governo - PODER EXECUTIVO e dando sequência ao controle total assumem funções típicas do Ministério Público, elevando o MP à condição de QUARTO PODER. 

O presidente do STF alega que a condição necessária à existência da democracia é um Judiciário independente = só que com o decreto de investigação ele tornou o JUDICIÁRIO o PODER dos Poderes.

Estará institucionalizada  ditadura da toga?

Só que uma ditadura pode ser a porta para entrada de outra mais forte.

Para encerrar, transcrevemos adiante parte dos argumentos expedidos pelo ministro Barroso e que provam a impossibilidade da Justiça Eleitoral assumir o julgamento de crimes que costumam ser julgados pela Justiça Federal:
"Barroso não questiona a competência da Justiça Eleitoral. Apenas realça que ela não foi equipada para lidar com crimes comuns. Manuseando os dados comparativos do Paraná, Barroso disse durante a sessão do Supremo que "existem no Estado 70 varas federais —14 são varas exclusivas para matéria criminal." A 13ª vara federal de Curitiba, "atua nos crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro cometidos por organizações criminosas."
"Cada vara da Justiça criminal tem a lotação de 14 servidores ocupantes dos cargos de analistas judiciários e de técnicos judiciários", declarou o ministro, antes de empilhar as atribuições dessas varas federais: "Além da parte jurisdicional propriamente dita, exercem inúmeras atribuições de ordem administrativa ou de apoio. Por exemplo: controle de bens apreendidos, armazenamento e encaminhamento dos instrumentos de produtos do crime, prestação de informações ao Conselho Nacional de Justiça sobre interceptações telefônicas e mandados de prisão e controle do cumprimento de penas substitutivas das penas privativas de liberdade"
Na sequência, Barroso comparou: "A Justiça Eleitoral de primeiro grau é organizada em zonas eleitorais. A imensa maioria das zonas eleitorais no Brasil tem lotação de um técnico judiciário e um analista judiciário. Portanto, nós vamos transferir para essa estrutura inexistente a competência para enfrentar a criminalidade institucionalizada no Brasil, quando associada a delitos eleitorais. Não será uma transformação para melhor." ]

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Ajuste fiscal para, mas Câmara adianta votação de pautas conservadoras - este ajuste fiscal é inócuo e tem que parar. Só aumenta impostos, traz mais inflação com recessão = estagflação

Em meio à crise, Congresso vive entre a ‘lebre’ e a ‘tartaruga’

Impasse deixa ajuste fiscal estacionado, mas pautas conservadoras seguem céleres

Redução da maioridade penal e facilidade de acesso do cidadão às armas estão entre os projetos que seguem acelerados 
 A proximidade do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com pautas mais conservadoras e com algumas bancadas temáticas ruralistas, religiosos e segurança pública — tem feito prosperar na Casa projetos como a redução da maioridade penal, a dificuldade de demarcação de terras indígenas, a exigência de boletim de ocorrência para uma mulher vítima de estupro se submeter a aborto e a facilidade de acesso do cidadão às armas. Mas o risco de Cunha deixar a presidência de forma prematura por conta de seu envolvimento em escândalos de corrupção faz com que os deputados acelerem a tramitação das propostas. Sabem que, com Cunha, suas ideias vão longe. 
 Por outro lado, a pauta econômica, que o governo implora para ser votada, vai a passos lentos e está longe de ser prioridade de Cunha, envolto numa queda de braço com a presidente Dilma Rousseff. É o caso da CPMF. Cunha já se posicionou contra e disse que dificilmente a proposta vai passar. A segunda fase do ajuste fiscal está “empacada” no Congresso e foi substituída nas pautas da Câmara e do Senado por uma agenda de propostas bem mais conservadoras e sem relação com a crise econômica. O governo não conseguiu fazer deslanchar a discussão e votação de medidas cruciais para reduzir o rombo fiscal de 2015 e até o de 2016. A votação do projeto que trata da repatriação de recursos, por exemplo, ficou para a próxima semana.

No Senado, o ritmo das votações caiu, até porque as medidas do ajuste estão agora na Câmara, como destaque para as Propostas de Emenda Constitucional (PECs) da própria CPMF e da prorrogação da chamada DRU (Desvinculação de Receitas da União), mecanismo que permite ao governo mexer livremente em parte de suas receitas. 

Os parlamentares ligados aos direitos humanos formam uma minoria aflitiva. Colecionam derrotas atrás de derrotas. Na última terça, foram duas fragorosas, num dia só. À tarde, a turma da “bancada da bala” aprovou, com sobras (19 votos a 8), mudanças no Estatuto do Desarmamento: reduziu de 25 para 21 anos a idade mínima para se comprar arma, a posse agora é definitiva e o porte só será renovado a cada dez anos (antes eram três). À noite, a “bancada ruralista”, com mais sobras ainda (21 a 0), transferiu do Executivo para o Congresso a demarcação de terras indígenas.  — O Congresso é conservador, e essas bancadas se uniram. A nós, resta as armas que não ferem: a palavra, a coragem e a firmeza — disse o padre Luiz Couto (PT-PB).

Relator do Estatuto da Família — que prevê conceito de família apenas com homem e mulher, Diego Garcia (PHS-PR) disse, após protesto dos contrários à PEC que mexeu na demarcação de terras indígenas, que esse grupo sempre tumultua. São sempre os mesmos, que obstruem e não deixam votar projetos que não lhes interessam. Fizeram o mesmo na votação do Estatuto da Família. Não sabem perder — disse Garcia.

O presidente da comissão das terras indígenas, Nilson Leitão (PSDB-MS), também criticou.

— Fazem o jogo de cena de sempre.

Na economia, a especialista em Orçamento e professora da UFRJ Margarida Gutierrez disse que as medidas do ajuste estão paradas no Congresso. Ela não acredita na aprovação da CPMF e afirma que o governo precisa, pelo menos, obter a DRU e os recursos da repatriação. — Está tudo parado. Não tem essa segunda fase do ajuste. Essa fase não foi implementada, e o ministro Joaquim Levy (Fazenda) não vai ter as receitas adicionais que ele previa. Sem a DRU, será uma paulada para o governo. E acredito que a CPMF não vai sair e o governo terá que aumentar a Cide. O Congresso está em compasso de espera total. Do ponto de vista fiscal, é uma tragédia — afirmou Margarida.

CHAPAS SÃO CONTRADITÓRIAS
O diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, diz que a atual composição da Câmara é a mais conservadora desde a redemocratização do país, em 1985. — Temos uma Câmara conservadora na área social, liberal na economia e atrasada na pauta dos direitos humanos. E muitos desses conservadores foram eleitos em chapas encabeçadas por partido de esquerda. É uma contradição do jogo político — disse Queiroz.

A líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), destaca que, apesar da resistência, matérias conservadoras têm avançado na Câmara, ameaçando direitos de minorias adquiridos ao longo do tempo. — Com Eduardo Cunha na presidência da Câmara, vemos uma pauta com temas absolutamente conservadores. Com um Congresso rico em termos patrimoniais e o crescimento de bancadas de mentalidade atrasada, predominou a pauta conservadora. Ficamos na política de resistência para evitar o retrocesso e perdas de direitos, mas não está fácil. A sociedade precisa se mobilizar mais — diz Jandira.

Líder da Rede, o deputado Alessandro Molon (RJ) também vê com preocupação a tramitação dessas matérias e nota que, nas últimas semanas, a “onda reacionária” tornou-se mais forte.

O que temos visto nesta Legislatura é uma pressa atípica para votar pautas como a PEC 215 (demarcação de terras indígenas), a revogação do Estatuto do Desarmamento e a redução da maioridade penal, que representam graves retrocessos em conquistas civilizatórias do país. Nas últimas semanas, essa onda reacionária se tornou ainda mais forte — pontuou o deputado.

Para o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), a preferência por pautas conservadoras seria uma forma de Eduardo Cunha manter apoio de segmentos “reacionários”.
O conservadorismo político ganhou muita força no Parlamento com a extrema polarização e fulanização da política ocorrida em 2014 e chegou a níveis extremos e assustadores com a eleição de Eduardo Cunha como presidente da Câmara.

Fonte: O Globo