O dilema de Nelson Barbosa
O
ministro da Fazenda terá de optar entre o ajuste fiscal necessário e a gastança
– exigida pela ala radical do PT – que arrasta
todos à pobreza
Ao
assumir o Ministério do Planejamento, em 2 de janeiro de 2015, Nelson Barbosa fez um discurso formatado para agradar ao Planalto
e ao mercado. Defendeu a necessidade de ajuste fiscal para
equilibrar as contas públicas, mas também se esforçou para apontar saídas menos
ortodoxas para o país voltar a crescer. Ao final do texto, agradeceu, nesta
ordem, à presidente Dilma Rousseff e ao Instituto Lula.
No final do ano, ao assumir o cargo de ministro
da Fazenda, Barbosa evitou elogiar o Q.G. do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva. Esquecer um pouco o apoio de um de seus maiores patrocinadores
políticos desde que iniciou carreira no governo, há 12 anos, faz parte do
script para o novo cargo.
Há razões práticas para isso. Desde que seu nome foi dado como
certo para assumir o cargo de Joaquim Levy, os brasileiros que produzem e geram emprego
deram seus clássicos sinais de descrença: o dólar
voltou a passar dos R$ 4 e a Bolsa caiu. Ninguém esquece que Barbosa foi um dos formuladores da Nova Matriz Econômica,
com as piruetas contábeis que levaram o país à crise atual. Para ganhar
a confiança que está na base de qualquer recuperação econômica, Barbosa foi
instruído, nos últimos dias, a empreender um road show
para convencer que não é uma reedição de Guido Mantega.
Recentemente,
em teleconferência com jornalistas estrangeiros, descartou
socorrer a Petrobras com dinheiro do Tesouro. “Eu não acho que seja necessário injetar
capital na Petrobras”, disse. “As
soluções de mercado são as melhores. A reestruturação da companhia está em
curso e vai continuar assim no ano que vem.” Barbosa terá de fazer cada vez
mais isso no início do ano. Promover encontros com
empresários, gestores de bancos de investimento, sindicalistas. Se
possível, deverá comparecer a eventos internacionais, como o Fórum Econômico
Mundial, em Davos, na Suíça.
Outro gesto
significativo foi que, ao chegar à Fazenda, Barbosa fez
questão de manter a maior parte da equipe de Joaquim Levy. Trouxe
apenas dois secretários consigo: Dyogo Oliveira, investigado na Operação Zelotes, assumirá a
Secretaria-Executiva; e Manuel Pires comandará a Secretaria de Política
Econômica. Barbosa tentou, a todo custo, manter o secretário do Tesouro,
Marcelo Saintive – já demissionário antes da
definição da saída de Levy. Diante da negativa do secretário em
permanecer no governo, Barbosa acatou sua sugestão de manter no cargo um de
seus adjuntos, Otávio Ladeira de Medeiros.
A escolha suscitou, entre os
técnicos da Casa, um sentimento ambíguo: estavam aliviados por não avistarem a
chegada de alguém de perfil mais parecido ao da equipe de Mantega, mas
estranharam o sempre combativo Barbosa tentar, agora na Fazenda, manter a
estrutura criada por quem ele tanto criticou. Interlocutores da equipe
econômica, contudo, apostam que os indicados por Levy fiquem apenas durante o
período de transição.
Barbosa será cobrado a apresentar
propostas que deem continuidade ao ajuste. Dilma convocou reuniões
durante o recesso para tratar de temas relacionados à economia, como a reforma
da Previdência. O Brasil tem
sido rebaixado seguidamente pelas agências de classificação de risco por não
cortar gastos. A agência Moody’s é a única que ainda não tirou do Brasil o
grau de investimento – espécie de selo de bom pagador. A queda é dada como certa pelo mercado, mas, se as sinalizações do
novo ministro surtirem efeito, o rebaixamento poderá vir acompanhado de um
comentário sóbrio da agência, o que significaria uma trégua ao país, sobretudo
na especulação cambial que tem levado o dólar a patamares recordes. O real foi a moeda
que mais se desvalorizou em 2015.
A
se afastar a hipótese de impeachment, Barbosa e Dilma estão convencidos de que o governo só sobreviverá até 2018 se o equilíbrio das contas estiver minimamente equacionado. Se a missão já era difícil para
Levy, que contava com a chancela do mercado, mas não do governo, no caso de
Barbosa, o desafio é oposto. Entre os
fiadores políticos de Barbosa estão precisamente os que rejeitam o ajuste.
Como a cartilha da política prevê que nenhum apoio sai barato, Barbosa já sente
o preço da fatura. “A Fazenda tem de
liberar empréstimos para os Estados. Vários Estados estão precisando. Não tem
problema aumentar um pouquinho a dívida. Eles têm margem de endividamento”,
disse o líder do governo na Câmara, José Guimarães, em um arroubo intimidatório.
A frase gerou dúvidas sobre o
apoio que Barbosa terá se mantiver a rigidez fiscal necessária. Está claro: a
ala mais radical do PT quer dinheiro público na rua agora, mesmo que isso aprofunde a crise e prejudique justamente os que o partido diz defender, os
mais pobres – que são os que mais sofrem com os equívocos econômicos do governo Dilma
Rousseff. Mais sensato foi o ministro Armando Monteiro, do
Desenvolvimento, que descartou em entrevista a farra de dinheiro público que se
costuma chamar de “política industrial”.
A pressão sobre Barbosa
deverá se intensificar ainda mais quando a base aliada descobrir que seu poder
decisório é limitado
e que o ministro dificilmente
tomará qualquer decisão efetiva que contrarie a presidente Dilma Rousseff. “No final do dia, quem toma as decisões
continua sendo a presidente”, diz o deputado Ricardo Barros (PP-PR),
relator do Orçamento de 2016. “Nesse
aspecto, nada mudou. É ela no comando da economia.” O país só sairá da crise se a chefe e o subordinado – Dilma e Barbosa – enxergarem o óbvio. O Brasil precisa se concentrar,
nos próximos meses, na única política social efetiva, a única que pode gerar
crescimento no médio prazo, tirar os pobres da pobreza e o país da crise. Essa
política tem nome e sobrenome: ajuste fiscal. O resto é populismo.
Fonte: Revista Época
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