Estamos
todos prestigiando o que se vê e se ouve nas delações de Sérgio
Machado, mas desprezando algo que é igualmente importante: o que não se
vê e não se ouve nessas mesmas delações. Juntando as duas pontas – o que
ele disse e o que ele não disse –, chegaremos às possíveis
consequências desse tsunami que se abate não apenas sobre o governo
interino, nem só sobre Brasília, mas sobre todo um sistema de
financiamento de campanhas que se embola com a roubalheira pura e
simples.
O que se vê e se ouve quanto ao presidente interino
Michel Temer na versão de Machado, que presidiu a Transpetro de 2003 a
2014, é que Temer, como vice, teria pedido a intermediação de Machado
para obter doações de R$ 1,5 milhão para a campanha de Gabriel Chalita à
Prefeitura de São Paulo em 2012.
O que não se vê nem se ouve é
que, apesar de Machado dizer que desviou mais de R$ 100 milhões para a
cúpula do PMDB, ele citou Renan (R$ 32 milhões!), Sarney, Jucá e o
insaciável Edison Lobão, mas excluiu desse bolo justamente o próprio
presidente do partido, que era Temer. Não disse que despejou dinheiro em
campanhas, em contas ou no bolso de Temer. No máximo, disse que ele
voltou a presidir a sigla para desempatar a disputa entre deputados e
senadores peemedebistas por dinheiro. Se a cúpula toda do PMDB estava no
“rachuncho”, o presidente não deveria estar? Pela delação, não estava.
Tem-se
que, pelo que se tem até agora, a situação de Temer no caso Machado
está menos para a de Renan, Sarney, Jucá e Lobão, que recebiam boladas
milionárias e até mesadas, e mais para, por exemplo, a de Jandira
Feghali (PC do B), Cândido Vaccarezza, Jorge Bittar e Luiz Sérgio (PT) e
José Agripino Maia (DEM), citados por receberem doações registradas
como legais por empreiteiras. Detalhe: eles teriam pedido para eles
próprios, enquanto Temer teria pedido para terceiros, ou seja, Chalita.
Nunca
se sabe o que ainda pode vir de delações, gravações e versões atingindo
o presidente interino e, além disso, foi temerário (sem trocadilho)
Temer dizer que “alguém que tivesse cometido esses delitos
irresponsáveis não teria condições de presidir o País”, referindo-se à
acusação de Machado. E se, amanhã ou depois, surgirem evidências de que
os dois se encontraram na Base Aérea e discutiram financiamento de
Chalita às vésperas da eleição de 2012? [Temer agiu corretamente ao dizer "“alguém que tivesse cometido esses delitos
irresponsáveis não teria condições de presidir o País”,; caso surjam provas que ele Temer pediu dinheiro para Chalita ou qualquer outro candidato, cabe a Temer renunciar ao cargo de presidente da República.
Com sua declaração o presidente demonstrou a todos a improcedência da acusação - inaceitável é considerar eventual encontro entre ele e Machado na Base Aérea prova de que a acusação de Machado seja verdadeira. Tem que provado o teor da conversa.]
“Você acha que eu preciso
de intermediários para falar com empresário, para pedir doação de
campanha para a empresa X, Y ou Z? Ainda mais de um sujeitinho (Machado)
como esse?”, me disse Temer ontem, relatando que recebeu Machado, pelo
menos uma vez, no gabinete de vice-presidente e na residência do Jaburu e
que, de fato, vez ou outra, para ganhar tempo, mantém conversas na Base
Aérea, mas não se lembra desse encontro de 2012.
De qualquer
forma, a metralhadora giratória de Sérgio Machado é muitíssimo grave,
atinge o coração do PMDB, alveja sete partidos, inclusive o PSDB, e
reforça duas questões muito delicadas: 1) qual a alternativa ao governo
Temer agora?; 2) se não sobra ninguém e nenhum partido, que candidatos
teremos em 2018?
O bloco PSDB/PMDB/PPS/DEM ameaça incluir na
acusação contra Dilma Rousseff, no processo de impeachment, o relatório
preliminar do TCU apontando 23 irregularidades e/ou crimes de
responsabilidade nas contas dela em 2015. Já a turma PT/PC do B/PDT
contra-ataca tentando anexar as gravações e delações de Machado na
defesa dela. Nada disso deve ter efeito prático, mas aumenta o
descrédito geral. [O bloco PSDB & Cia age corretamente; vale tudo para destruir politicamente a Afastada.]
Aliás, bastou a Dilma botar o pé fora do
Planalto para o PT trocar de posição com o PMDB: era alvo principal
desde o mensalão, agora cedeu a vez ao PMDB de Temer. Confirmando que a
munição mais pesada e a maior publicidade (para o bem e para o mal) são
sempre para quem está no poder. [devendo ser sempre considerada a possibilidade que Machado esteja a serviço do PT - afinal ele é uma mercadoria.]
Fonte: O Estado de S. Paulo - Eliane Cantanhêde
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