A estatal foi exaurida pela MP de Dilma, e não há outra
alternativa para o setor receber investimentos
Segundo
Millôr Fernandes, “quando uma ideologia fica bem
velhinha, ela vem morar no Brasil”. Pois nos aproximamos da segunda
década do século XXI e a visão do nacionalismo, mesmo num mundo globalizado,
ainda atrai brasileiros, à esquerda e à direita. Como certas
ideologias são uma forma de religião sectária, não importa os estragos que
o nacionalismo fez e faz no mundo, nos aspectos político e econômico. Trump e
Putin são dois exemplares desta visão estreita e que, no extremo, costuma levar
a catástrofes. Na economia, não basta o atraso que o Brasil demorou a superar
no petróleo, e que começou a ser eliminado quando a Petrobras se abriu a
contratos de exploração com empresas estrangeiras. Mas os religiosos continuam
fieis.
A miopia
nacionalista continua sem enxergar o que dizia Deng Xiao-Ping com sua frase: “não importa a cor do
gato, contanto que cace o rato”. Ele não escapou de ser uma vítima da Revolução
Cultural, reação do maoismo a tentativas de abrir a China, mas sobreviveu para
construir bases sobre as quais o país se modernizou no aspecto econômico,
usando para isso instrumentos do capitalismo. Como resultado, a China se
tornou a segunda economia do mundo. Tem um encontro marcado com a
contradição de se modernizar, gerar milionários e uma enorme classe média, e
continuar uma ditadura política de partido único. Mas esta é outra
questão. No Brasil o velho nacionalismo volta a ser brandido contra a
intenção do governo de privatizar o controle da Eletrobras, pulverizando-o
no mercado. Voltam os antigos jargões que fazem pouco caso da racionalidade.
O
problema é fácil de entender: a estatal, holding do setor elétrico,
foi quebrada pela política voluntarista da presidente Dilma Rousseff, considerada grande especialista
no setor. E sem condições mínimas de liderar os pesados investimentos que o
país precisa na geração e de energia, o sensato é repassá-la ao setor privado,
o que não significa perder o controle do planejamento na atividade. Além de
haver formas de assegurar a palavra final em assuntos estratégicos na empresa.
Vide a Embraer.
A
bomba que implodiu o setor elétrico chama-se MP 579, de 2012, cuja intenção era
reduzir as tarifas em 20% — objetivo também de interesse político-eleitoral. A varinha mágica da operação era
antecipar a renovação de concessões de usinas a vencer entre 2015 e 2017.
Hidrelétricas de estados (Minas, São Paulo e Paraná) não aceitaram e
ainda um grave período de seca forçou o uso intensivo de termelétricas, de
custo superior às usinas hidrelétricas. Mágicas foram tentadas com subsídios,
empréstimos do Tesouro, e tudo somado não apenas não reduziu de forma
consistente as tarifas, como abriu rombos bilionários na contabilidade de todo
o sistema Eletrobras. A reação pavloviana do nacionalista é usar o Tesouro.
Mas este tem acumulado gigantesco déficits anuais de 8% a 9% do PIB. A
racionalidade de um comunista como Deng-Xiao Ping aconselha se escolher a
melhor solução: a privatização, o gato para caçar o rato.
Editorial:
O Globo
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