Na análise da maioria dos políticos e dos
comentaristas, entre os quais me incluo, a provável saída da disputa
presidencial do ex-presidente Lula em decorrência da Lei da Ficha Limpa,
devido à condenação em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal
de Porto Alegre (TRF-4), vai afetar diretamente a candidatura do
deputado Jair Bolsonaro, que se mantém há meses em segundo lugar nas
pesquisas eleitorais.
Isso porque o apelo de Bolsonaro junto ao
eleitorado seria muito mais o de antilula, a radicalização de um
incentivando a do outro, polarizando a disputa entre os extremos, Lula
pela esquerda, Bolsonaro pela direita. Além de reviver uma divisão para
muitos superada na teoria política, a de direita e esquerda, as
pesquisas demonstram ser anacrônica não apenas na teoria, mas na
realidade, quando se analisa o eleitorado de um e outro. A
começar pelo fato de que uma parte dos eleitores de Lula se diz hoje
disposta a ir para Bolsonaro, e vice-versa. Nas simulações em que Lula
não aparece, 6% dos seus apoiadores afirmam que escolheriam o deputado
federal Jair Bolsonaro. No sentido oposto, a mudança é ainda maior: até
13% dos eleitores que votariam no parlamentar responderam que poderiam
apoiar o petista. É o voto Bolsolula, ou Lulanaro.
Mas o perfil
dos eleitores é diverso. A distribuição regional do eleitorado de
Bolsonaro mostra que não é um fenômeno restrito ao Sudeste. Com exceção
do Nordeste, onde Lula domina e ele tem apenas 10%, o deputado tem em um
patamar de 15% a 17% nas outras quatro regiões. Popular nas
redes sociais, Bolsonaro pontua melhor entre os jovens. No cenário em
que tem 15% no conjunto de eleitores, atinge 20% no grupo dos que têm
entre 16 e 24 anos, sua melhor faixa etária. Segundo o Datafolha, sua
popularidade decresce gradualmente conforme aumenta a idade do eleitor,
até chegar a 7% de intenção de voto quando considerado apenas o grupo
com 60 anos ou mais.
Bolsonaro tem 60% de eleitores até 34 anos,
30% têm menos de 24 anos. O percentual é significativo quando comparado
com a atração ao público jovem de seus principais concorrentes: 45% dos
que disseram votar em Lula têm menos de 34 anos. Entre os que
preferiram Marina, 49% estão nessa faixa etária. A atuação nas
redes sociais é a explicação mais provável. Bolsonaro tem no Facebook
4,7 milhões de seguidores. Entre seus adversários na corrida
presidencial, Lula tem 3 milhões, João Doria, 2,9 milhões. Marina tem
2,3 milhões. Levantamento do Ibope mostra que 68% dos eleitores
brasileiros têm acesso frequente à internet, mas entre os eleitores que
preferem Bolsonaro o índice é muito maior, chega a 90%.
Assim
como aconteceu com Trump nos Estrados Unidos, o eleitor de Bolsonaro
relativiza suas declarações polêmicas, ou mesmo em parte gosta delas, como uma maneira de confrontar os políticos tradicionais, embora
Bolsonaro esteja em seu sétimo mandato parlamentar. Como
aconteceu com Trump, que não sofreu grandes abalos durante a campanha
mesmo quando um vídeo o mostrou na própria voz gabando-se de avanços
sexuais explícitos, também Bolsonaro não se abala, mesmo condenado,
quando surge declarando que não "estupraria" a deputada petista Maria do
Rosário porque ela "não merecia". Prevalece a argumentação de que foi
provocado. Seus eleitores alegam que as declarações estavam fora
contexto e que há perseguição por parte de movimentos de esquerda e de
grupos feministas e LGBT.
Segundo a análise presente entre seus
assessores e apoiadores, Bolsonaro representaria um pensamento
conservador típico do "cidadão de bem" brasileiro, que seria religioso,
pai ou mãe de família que quer criar seus filhos em paz e em segurança,
que é simples, mas honesto, que não concorda com os exageros do
politicamente correto, com a liberdade exagerada nos costumes, que não
suporta mais a violência desenfreada e a impunidade e que está pouco se
lixando se o governo é civil, militar, de esquerda ou de direita, desde
que seja honesto e que impeça a bagunça em que o pais está. [Bolsonaro é honesto e tem condições de impedir a bagunça que impera no Brasil.
Se Lula fosse eleito - não será sequer candidato e caso fosse não seria eleito - o atraso e a bagunça seria de tal ordem no Brasil, que o lema da Bandeira Nacional teria que ser substituído por: DESORDEM e ATRASO.]
Na
minha opinião, estão completamente equivocados na escolha de quem os
representa. De qualquer maneira, dada a resiliência de seu apoio até o
momento, talvez seus adversários devessem prestar mais atenção à
motivação de seus eleitores, que em boa parte podem estar nessa posição
por falta de um candidato de centro-direita que os represente.
Merval Pereira - O Globo
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