Sob Toffoli, tribunal dificilmente voltará a ser poder moderador
O ministro Dias Toffoli conseguiu algo que nem o presidente da República
vinha se mostrando capaz, reacender a militância bolsonarista na defesa
da revolução justiceira representada por sua eleição. Nem mesmo a decisão do Supremo de remeter inquéritos de corrupção de
políticos para a justiça eleitoral havia sido capaz de tamanho feito.
Caíra a ficha, para uma parte da República de Curitiba, que o apoio da
população à Lava-Jato era movido, na verdade, pelo antipetismo.
Com a censura à revista "Crusoé", o "amigo do amigo do meu pai", junto
com seu colega togado, Alexandre de Moraes, acordaram o antipetismo e o
colocaram no mesmo palanque daqueles que, estejam à direita ou à
esquerda, simplesmente não aceitam uma imprensa censurada. O presidente
do Supremo contra quem no processo nenhuma prova de malfeito há, deu
ainda ao presidente Jair Bolsonaro a oportunidade de posar em defesa da
liberdade da mesma imprensa com a qual tem tido litigiosa convivência.
Ainda foi capaz de unir toda a imprensa em defesa de uma publicação
digital cuja antipatia pelo mercado da informação é traduzido pelo
slogan "ilha de jornalismo", sugerindo que todo o entorno é pântano. Dos
processos que o site "O Antagonista", costela que deu origem à
"Crusoé", acumula, alguns são movidos por jornalistas, caminho que pode
ser seguido por qualquer um, até pelo presidente do Supremo. Isso não
impediu que a imprensa e suas entidades de classe saíssem em defesa da
revista e da liberdade de expressão.
Toffoli e Moraes foram além. Ressuscitaram, no Senado, as articulações
por uma CPI da Toga, ou mesmo pelo impeachment de ministros. Com uma
composição mais renovada que a da Câmara, a Casa se move, em grande
parte, por redes sociais. Nas 24 primeiras horas depois da censura, a
Bytes identificou a publicação de mais de meio milhão de tuítes em
reação ao Supremo, liderados pela #ditatoga.
Na sua cruzada, a dupla de ministros confrontou-se ainda com a farda ao
apreender o computador de um general da reserva, candidato derrotado ao
governo do Distrito Federal, titular de grande audiência em redes
sociais e amigo do ex-comandante do Exército, o general Villas-Boas,
aquele que chegou a ameaçar intervenção se o Supremo acatasse o habeas
corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Já começaram a chegar às mãos de dois generais, o titular da Secretaria
de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, e de seu auxiliar, Antonio
Luiz da Costa Burgos, currículos de pré-candidatos ao Supremo. A próxima
vaga, a rigor, só se abre em novembro de 2020, quando o ministro Celso
de Mello completa 75 anos. Nove meses depois, vem a segunda, do ministro
Marco Aurélio Mello. Nenhum dos nomes que povoam as listas do Palácio do Planalto é hostil à
Lava-Jato, do tributarista paulista, Heleno Torres, ex-tenente do
Exército, ao desembargador do TRF-4, João Pedro Gebran, passando pelo
próprio ministro Sérgio Moro, pule de dez para uma vaga caso naufraguem
suas pretensões políticas.
A filtragem tão antecipada de currículos sugere que o Palácio do
Planalto não pretende ser pego de surpresa se prosperarem as
articulações para ressuscitar a CPI da Lava Toga ou mesmo o impeachment
dos ministros do Supremo. Com a desatinada censura, ao rol de ministros
visados por impeachment, encabeçado por Gilmar Mendes e Ricardo
Lewandowski, somaram-se Dias Toffoli e Alexandre de Moraes. Tem senador
querendo obstruir votações de interesse do governo se a pauta não andar. O presidente do Supremo parece se guiar pela aposta de que será capaz de
acuar o grupo Crusoé-Antagonista na tramitação dos processos que se
acumulam contra seus jornalistas. Quase todos os ministros, porém,
acumulam votos em defesa da liberdade de imprensa. Para cerrarem
fileiras ao lado de Toffoli, os ministros teriam que rever votos, alguns
deles paradigmáticos, como o "cala a boca já morreu", da ministra
Cármen Lúcia, ao liberar biografias não autorizadas.
Ante as dificuldades no plenário para confirmar a censura, a saída foi
deslocar o jogo para o confronto com o Ministério Público. Apela ao
espírito de corpo do tribunal contra a parceria entre procuradores e
redes sociais que tenta empurrar o Supremo para fora da vala
contramajoritária no aval a tudo o que vem da Lava-Jato. Toffoli já havia confrontado o MP colocando Moraes para presidir o
inquérito contra as 'fake news', atribuição dos procuradores. Voltou ao
embate ao contrariar a decisão da procuradora-geral da República, Raquel
Dodge, pelo arquivamento.
Em Curitiba, juízes e procuradores atuam em tamanha consonância que a
força-tarefa da Lava-Jato já foi tida como um simulacro da justiça
italiana, em que a magistratura e a procuradoria são uma única carreira.
Toffoli foi além. A pretexto de combater a sanha punitiva da Lava-Jato,
o presidente do Supremo Tribunal Federal fundiu as prerrogativas, em
detrimento do MP, num só poder, o seu. E deixou poucas esperanças de que
o tribunal recupere sua condição de poder moderador enquanto estiver na
presidência.
Petrobras
Antes de completar seu primeiro mês no cargo, o presidente da Petrobras,
Roberto Castello Branco, disse, durante evento promovido por um banco
de investimentos, que não queria mais ouvir falar na expressão 'política
de preço'. O executivo encantou a plateia ao resumir sua visão sobre os
preços dos combustíveis: "Vocês já ouviram falar de política de preço
de iPhone? Política de preço do feijão? Não existe política de preço.
Existe mercado".
Na cola do câmbio, o iPhone variou 5% do mais recente modelo em relação
ao anterior. O feijão, chegou a subir quase 100% este ano, antes de
começar a cair. Um está no bolso dos ricos. E o outro, até na mesa dos
pobres. O combustível está na vida do país inteiro. O controle de seus
preços quebrou a Petrobras. Seu descontrole elegeu Jair Bolsonaro.
Maria Cristina Fernandes - Valor Econômico
O ministro Paulo Guedes garantiu que não haverá intervenção na política
de preços mas, ao dizer que a Petrobras terá que dar mais transparência e
previsibilidade à definição dos seus preços, fincou as duas estacas de
uma política de preços que amarrará o presidente da República até o
último dia de seu mandato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário