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domingo, 29 de janeiro de 2023

O gato escaldado - Alon Feuerwerker

Análise Política

Pouco a pouco, nota-se o surgimento de algum desconforto com Luiz Inácio Lula da Silva estar, essencialmente, governando [governando? ou ainda planejando, em transição?] com os dele e com as ideias dele e dos dele. O motivo da linha de Lula parece relativamente singelo e foi antevisto em meados do ano passado.

“Ao contrário do que propõe a sabedoria convencional, o ex-presidente evita (...) inclinar-se programaticamente ao centro. Uma hipótese é o petista querer atrasar esse movimento o máximo possível, para reduzir o alcance das inevitáveis concessões. Mas há outra explicação, pragmática: Lula não modera o discurso e o PT não lipoaspira seu programa porque, simplesmente, não precisam fazer isso.” (“Todos trabalham por Lula”, de 17 de junho de 2022).

A tática política costuma ser a expressão concentrada da correlação de forças. É verdade que Lula venceu as eleições por margem pequena e para isso dependeu dos minguados, ainda que decisivos na ocasião, votos do autonomeado centro democrático. O que poderia levar a duas conclusões opostas:  

1) fazer de tudo para reter esses votos, portanto guinar ao centro; ou 
2) buscar ampliar a base própria, para não depender desse pessoal nas próximas empreitadas.

Vale a pena ficar de olho na segunda hipótese.

Desde o último debate no segundo turno, Lula tem insistido na interpretação de que o impeachment de Dilma Rousseff foi um golpe de estado. Isso tem o potencial de alienar hoje apoiadores, mas simultaneamente coloca o segmento na desconfortável posição de identificados com o hoje demonizado Jair Bolsonaro.

Pois o jogo da deposição de Dilma só foi decidido mesmo quando PSDB e o então PMDB se juntaram à direita raiz para alçar Michel Temer ao Planalto. Na época, o centro democrático deu o número parlamentar para a operação, mas, como se verificaria depois, era a direita raiz quem já oferecia ao movimento a base de massas e o coração da narrativa. Não existe “inevitabilidade” política, mas essa associação permitiu a Bolsonaro arrastar por gravidade a esmagadora maioria dos votos do centro democrático em 2018 e, com isso, suplantar Fernando Haddad cavalgando o antipetismo.

Assim como Lula surfou na onda anti-Bolsonaro para atrair, também por gravidade, um contingente centrista quatro anos depois. Verificou-se, portanto, que se trata de um grupo pendular e instável. O raciocínio cartesiano recomendaria adulá-lo para retê-lo. Mas a política nem sempre é cartesiana, e às vezes vale a pena procurar desenvolver musculatura própria para não depender, ou depender menos, de companheiros de viagem.

Se com essas ações Lula vai colher hegemonia própria ou crise, os fatos dirão. Vai depender, na última linha da planilha, dos rumos da economia, se o petismo econômico “puro” conseguirá produzir bem-estar ou assistirá à desaceleração do crescimento e à perda de tração da queda do desemprego. Sobre a economia, aliás, um detalhe que não ajuda na estabilidade das relações entre o petismo e o centrismo é exatamente o fator econômico na história da derrubada de Dilma.

Ao assumir, ela aceitou nomear um ministro da Fazenda liberal e adotar medidas econômicas que teoricamente lhe trariam apoio fora da esquerda. Aconteceu o contrário: os adversários centristas aproveitaram o choque político do “estelionato eleitoral” para acelerar o processo político desencadeado em junho de 2013, de que Dilma conseguira escapar na reeleição. O ditado é antigo mas vale: gato escaldado tem medo de água fria. 

Alon Feuerwerker, jornalista e analista politico


domingo, 14 de agosto de 2022

Uma armadilha nas pesquisas - Alon Feuerwerker

Análise Política

Há um detalhe delicado nas pesquisas eleitorais: a diferença entre o não voto (brancos, nulos e abstenção) que será verificado na urna e os que, em pesquisas estimuladas, não escolhem nenhum candidato quando a lista é apresentada. No dia da eleição, o não voto tem rondado os 30%, mas nas pesquisas estimuladas esse contingente é apenas um terço disso.  
Cerca de 20% dos pesquisados indicam candidato na estimulada mas provavelmente não votarão em ninguém.

Daí a necessidade de prestar muita atenção ao cenário espontâneo, em que o pesquisado não é apresentado à lista. Aqui, o não voto costuma estar bem mais próximo do que será no dia da eleição. Até porque em 2 de outubro (e talvez dali a quatro semanas) a escolha do eleitor terá de ser espontânea, ele precisará decidir sem ter diante dele as opções disponíveis para os diversos cargos em disputa.

Num cenário ideal, a “quebra” entre a intenção de voto na pesquisa estimulada e a realidade na urna deveria distribuir-se proporcionalmente entre os candidatos, mas é preciso ter alguma cautela na projeção. O absenteísmo eleitoral não é homogêneo nos diversos grupos sociais, nem nas diferentes áreas territoriais. Essa é uma das explicações frequentes para quando os institutos precisam justificar por que a pesquisa disse uma coisa, e a urna disse outra.

Uma maneira razoável de buscar reduzir essa “margem de erro” é esmiuçar com o eleitor 
1) quanto está interessado na eleição; 
2) se vai ou não votar em outubro; 
e 3) se votou em 2018. 
Claro que isso não é ciência exata, o pesquisado pode ter se esquecido se compareceu quatro anos atrás (ou mentir), pode dizer, por conveniência (voto obrigatório), que vai votar agora (e no dia não votar). E “grau de interesse” é variável algo subjetiva.

Mas, mesmo com as limitações, o cruzamento entre a intenção de voto e essa aproximação à “probabilidade real” de o entrevistado/eleitor ir votar costuma ser útil. E o que o cruzamento nos diz hoje? Quando o número é depurado, a distância entre Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro reduz-se em algo da ordem de 30%. Portanto, hoje, o eleitor do presidente está algo mais mobilizado para votar que o eleitor do ex-presidente.

Isso tem consistência com a diferença das rejeições. Se Bolsonaro é mais rejeitado que Lula, é razoável supor que Lula tem proporcionalmente mais gente tendendo a votar nele por puro antibolsonarismo do que Bolsonaro atrai simpatizantes por puro antipetismo ou antilulismo. Essa hipótese também é consistente com outro achado das pesquisas: ainda que na margem de erro, no momento, Bolsonaro tem proporcionalmente mais eleitores convictos que Lula.

A partir dessas hipóteses e constatações, é possível deduzir numericamente que hoje a diferença real entre Lula e Bolsonaro está entre 5 e 10 pontos percentuais e tem tido certa resiliência. Esse parece ser o estado real da corrida. Daqui em diante, será preciso acompanhar quem terá mais sucesso em elevar a rejeição ao adversário e em motivar seu eleitor potencial a ir votar. [COMENTÁRIO: NÃO ACREDITAMOS EM PESQUISAS, os sucessivos 'enganos',  ocorridos em eleições anteriores,  só consolidam nosso entendimento; 
O descondenado petista está morto,  politicamente [destacamos o politicamente para evitar que nos acusem de fake news] só falta cair e certamente ele não quer que tal queda ocorra por um chute do 'capitão do povo'.  
Temos a convicção que no próximo mês ele inventa uma desculpa de doença, ou algo assim - só não vale dizer por medo da covid-19, que graças a DEUS está indo embora - e privilegia o Brasil e os brasileiros com sua renúncia. 
Doença inventada, boa desculpa para ele, um mentiroso nato.
A conferir.]

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político
 

domingo, 19 de setembro de 2021

No horizonte, a eleição e as nuvens - Alon Feuerwerker

Análise Política

As placas tectônicas vinham movendo-se uma contra a outra, mas o choque não aconteceu. Pois nenhum dos lados avaliou ter força para prevalecer na base da... força.  
Nem os desejosos do impeachment reuniram massa crítica, na rua e na política, para o desfecho, nem Jair Bolsonaro teve como simplesmente tratorar o Supremo Tribunal Federal. 
O equilíbrio continua estruturalmente instável, dado o cenário eleitoral hoje desfavorável à continuidade do governo, mas vivemos um momento de calmaria.

Quanto vai durar? Há uma possibilidade razoável de que dure até o início da campanha eleitoral, daqui a pouco menos de um ano. Pois os três blocos principais veem uma janela para prevalecer na urna. Luiz Inácio Lula da Silva e o PT acreditam estar com a mão na taça. Bolsonaro confia na fidelidade dos dele e no apelo ao antipetismo. E o “centro” olha para a confluência do piso e do teto eleitorais do presidente. E daí começa a ensaiar o discurso de que se querem evitar a volta do PT e de Lula primeiro é preciso tirar Bolsonaro da frente.

Na oposição de esquerda não há muito de original a fazer, além de criticar o governo, conversar nos bastidores e tentar subir o tônus da mobilização. O desafio dos organizadores do protesto  de outubro é rivalizar com os expressivos atos pró-Bolsonaro de 7 de setembro. 
Precisarão mobilizar mais que a militância, precisarão colocar povo na rua. Os atos de 12 de setembro foram surpreendidos no contrafluxo, depois da distensão momentânea em Brasília. Como estará o clima político daqui a 15 dias?
No dito centro há dois enigmas a decifrar. Como acelerar a convergência em torno de menos nomes, para juntar alguma massa crítica e criar expectativa de poder? Pois o principal problema da “terceira via” hoje é a falta da expectativa de poder. [insistimos que não existe terceira via; temos a PRIMEIRA VIA, quiçá, a única, e o resto. 
Resto que chamam de terceira via, só que inexiste a segunda - o que chamam de segunda é Lula = nada x zero. 
Assim, o resto deve assumir que é um esboço falido de segunda via.
Ainda que assuma tal condição, terá que escolher  porta-voz único para comunicar que subiu meio degrau.] Um caminho para esse objetivo é tentar esvaziar radicalmente Bolsonaro, daí que a oposição mais feroz a ele no momento venha desse campo político. Mas o presidente resiste. A cada pesquisa que anuncia o derretimento dele, nota-se que Bolsonaro mantém o market share eleitoral.
E o governo? Precisa governar. Enfrentar o desafio de aumentar o Bolsa Família, combater a inflação, resolver o rolo dos precatórios, ver o que faz com a crise hídrica, tourear a Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado da Covid, aprovar seu candidato ao STF e administrar o cessar-fogo com o tribunal. [tourear a CPI da Covid-19 é o mais fácil = a cada semana a dita cuja se afunda e prova que não possui prova de nada que pretendia provar.  
O Supremo é fácil de administrar, desde que Bolsonaro atue como estadista, aja como Presidente da República. 
São os vacilos ocasionais de capitão que fornecem munição aos seus inimigos.] Devo ter esquecido de alguma coisa, mas só que aí está já compõe um portfólio respeitável. E, mais que tudo, precisa transmitir a sensação de estar governando. Sabe-se que a política tem horror ao vácuo.

Bolsonaro está tendo o mérito de resistir até chegar tão perto da eleição que os adversários começam a pensar mais nela e menos em derrubá-lo. Qual é a dúvida? São duas. Como reagirá o presidente quando, e se, a situação eleitoral dele prenunciar a possibilidade real de derrota? E como reagirá a oposição “de centro” se o campo dela continuar disperso mais tempo do que seria saudável?

O céu deu uma acalmada, mas as nuvens estão ali no horizonte.

Alon Feuerwerker,  jornalista e analista político


 

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Impeachment de Bolsonaro será o triunfo da República [perderam a noção???] - O Estado de S. Paulo

Itamar Montalvão

Mantê-lo no cargo sinaliza que tudo é permitido no exercício da Presidência...

Há poucos dias se noticiou que líderes de partidos políticos que compõem o chamado “centro democrático” passaram a discutir a conveniência de aderir à campanha pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro, incluindo o endosso público às crescentes manifestações de rua contra a periclitante administração federal, das quais, até o momento, essas legendas têm mantido prudencial distância.
 
[os inimigos do Brasil perderam a noção, o senso do ridículo, o prumo, o rumo, etc... Como pensam  impedir o presidente? vocês não tem o povo nas ruas ... vocês não tem votos... - para começar a pensar em impedir o presidente da República vocês precisam no mínimo de 342 votos de deputados favoráveis à abertura de processo de impeachment contra o presidente... 
Quando, e se, os tiverem, por favor,  nos avisem. 
A mídia militante por mais que se esforce, por mais que manipule as notícias, não tem um único, um miserável voto...]

O impeachment de Bolsonaro, na visão dessas lideranças, seria uma forma de romper a polarização entre o incumbente e o ex-presidente Lula da Silva. De fato, em que pese o tempo que falta para a eleição, recentes pesquisas de intenção de voto indicam que o cenário mais provável de um eventual segundo turno em 2022 é o que consagra o mutualismo entre os dois pré-candidatos. Há projeções que indicam até mesmo a vitória de Lula já no primeiro turno, a ser mantida, é evidente, a atual conjuntura política, claramente desfavorável a Bolsonaro.[a conjuntura atual tem a solidez das nuvens... ainda que de forma lenta, Bolsonaro começa a ter os meios para retomar o controle da situação... as acusações feitas contra ele, não passarão de acusações sem provas e serão desmontadas uma a uma... o fim da pandemia... a recuperação da economia, ainda que lenta, consolidará a popularidade do presidente....  pesquisas encomendadas, realizadas consultando algumas centenas de pessoas nada valem - não são confiáveis ainda que realizadas às vésperas das eleições, possuem VALOR ZERO.]

No cálculo eleitoral de algumas lideranças de partidos de centro, centro-direita e direita, o impeachment teria o condão de tornar Bolsonaro inelegível por oito anos, tirando-o da corrida presidencial do ano que vem. E entre Lula e um candidato da que se convencionou chamar de “terceira via”, apostam essas lideranças, o antipetismo – que embora tenha arrefecido ainda é forte em segmentos expressivos da sociedade – mais uma vez definiria o resultado da eleição, mas agora em favor de um candidato moderado, ligado à política tradicional, [que tal o relator Calheiros? o presidente Omar? e outros do mesmo naipe?] na melhor de suas acepções.

Do ponto de vista tático, a avaliação não é de todo descabida. Ao analisar o atual quadro político para o Estado, o cientista político Fernando Abrucio, professor da FGV-EAESP e um dos mais argutos observadores da conjuntura nacional, ressaltou que, “se os partidários de um candidato centrista não abraçarem logo o impeachment, perderão a relevância política na eleição de 2022”.

Decerto o tempo é inimigo da viabilidade eleitoral de uma candidatura do chamado “centro democrático”. Quanto maior for a demora na definição de uma ou mais chapas que congreguem agendas minimamente comuns – notadamente a inarredável defesa da democracia e dos valores republicanos, a retomada do crescimento econômico, a eficiência do Estado, o aprimoramento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a valorização da educação pública como política de desenvolvimento humano –, menor será a competitividade dessas candidaturas, tão ansiadas que são por milhões de brasileiros que não querem ser reféns de duas opções conhecidas e sabidamente ruins para o País, ainda que em diferentes graus.

Enquanto Bolsonaro e Lula já estão em franca campanha eleitoral, pré-candidatos afastados desses dois polos patinam para conquistar os eleitores. De acordo com uma pesquisa do Ipec realizada recentemente, a soma das intenções de voto em Lula e Bolsonaro, hoje, é quase cinco vezes maior do que a soma das intenções de votos em Ciro Gomes, João Doria e Luiz Henrique Mandetta, os “centristas” mais bem colocados. Como se vê, a missão do centro não é trivial e, de fato, o impeachment de Bolsonaro aliviaria a faina.

A grande questão é que a cassação do pior presidente da História do Brasil deve ser abertamente discutida pelas forças representativas da sociedade não por mera tática eleitoral, mas porque o governo de Jair Bolsonaro, em todas as suas expressões, representa a subversão dos próprios ideais da República Federativa consagrada desde o preâmbulo da nossa Constituição. Vale dizer, não apear Bolsonaro do poder diante das imoralidades e da profusão de crimes de responsabilidade que ele comete dia sim e outro também, além de desmoralizar o instituto do impeachment, emite um perigoso sinal para as gerações futuras. Mantê-lo no cargo diante desse rol de infâmias sinaliza que tudo é permitido no exercício da Presidência da República a depender das acomodações políticas de ocasião, das quais a Nação seria nada mais que reles prisioneira.

A República está fundada no princípio da isonomia, que significa que todos os cidadãos são iguais perante as leis. Para Bolsonaro, no entanto, uns são mais iguais do que os outros, sobretudo quando trazem vínculos de sangue, próprios do regime monárquico, em boa hora superado. Bolsonaro já deu incansáveis mostras de que não respeita a alternância de poder. Não concebe a Presidência como o exercício temporário do poder. Em seus obtusos devaneios, uma eventual derrota eleitoral só pode ser explicada por fraude.

[este parágrafo e os dois anteriores deveriam ser lidos por integrantes de outros poderes da República, especialmente o Poder Judiciário - especialmente no tocante aos principios da isonomia, da independência entre os poderes da República.]  A independência entre os Poderes e a autonomia dos entes federativos são outros pilares de nossa República que Bolsonaro tenta dinamitar. A deliberada confusão entre questões de Estado, perenes, e de governo, transitórias, também é parte de seu plano malévolo para subverter os valores republicanos. Por fim, Bolsonaro promove a discórdia entre os brasileiros. Não admite contraditório. Os que não comungam de seu credo nem brasileiros, a rigor, podem ser considerados. Em sua torpeza, todos são livres para concordar com suas ideias.

O impeachment, pois, impõe-se como linha de corte civilizatória, um marco do triunfo da República sobre um de seus mais perigosos agressores.

Itamar Montalvão, jornalista - O Estado de S. Paulo

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Liberalismo desmoralizado - Carlos Alberto Sardenberg

Não há liberalismo sem imprensa, Congresso e liberdade individual 

Está em curso no país um meticuloso processo de desmoralização da agenda liberal. Os responsáveis são o presidente Bolsonaro e sua turma mais próxima. Não precisam me dizer que Bolsonaro nunca foi liberal. Ele tem desde sempre uma mentalidade autoritária e corporativista, na qual não cabe o respeito às mais amplas liberdades individuais.

Mas o fato é que foi colocada em andamento uma agenda econômica liberal. Por acaso, porém. Isso porque, não tendo a menor noção de política econômica, o candidato Bolsonaro precisou procurar alguém que preenchesse essa lacuna. A condição era que não tivesse nada a ver com os economistas ligados ao PT e ao PSDB.

Foi bater no Paulo Guedes, ao qual deu uma ampla e inédita autonomia, além de poder para executar as reformas e a abertura liberal da economia. Mas é preciso acrescentar outro fator ao quadro: havia uma ampla demanda nacional para uma política assim. Depois dos anos do PT, boa parte dos eleitores estava por aqui com o excesso de Estado a atrapalhar a vida das pessoas e empresas. E com a enorme roubalheira que só tinha sido possível devido à ampla dominância do governo sobre a economia. O Estado e as estatais foram assaltados meticulosamente.

Desconfio que a maioria do eleitorado procurava alguém do centro-direita, certamente mais liberal, mas não encontrou ninguém competente e limpo nesse campo. Todos os políticos que se apresentaram por aí tinham alguma ligação com as velhas práticas políticas.  Deu no Bolsonaro, com seu antipetismo, forte, mas que não seria suficiente para eleger se não tivesse agregado Paulo Guedes e Sérgio Moro.

Iniciado o governo, outro fator apareceu, um Congresso reformista – ou, se quiserem, muito mais reformista que o anterior. E um presidente da Câmara, Rodrigo Maia, alinhado com o liberalismo econômico. [Maia com suas pretensões de ser o 'corregedor-geral dos Poderes da Republica e seus sonhos de ser presidente da República, faz lembrar um outro DEVANEIO - representado por um deputado,acho que um tal de Devanir, amigo do ex-presidente  multicondenado e  que alimentava o devaneio do petista ter um terceiro mandato.] Tudo isso somado, deu, por exemplo, na reforma da previdência e numa gestão fiscal que efetivamente reduz o déficit e a dívida via controle de gastos e privatizações.

Mas por que o país não decola? Por que não consegue ir além de um crescimento pífio, na base de 1% ao ano?
Só pode ser falta de confiança no governo. Algo assim: a agenda liberal de Guedes e a agenda anticorrupção de Moro podem sobreviver a um presidente autoritário, que ofende da pior maneira possível a imprensa e seus adversários (ou, inimigos, como Bolsonaro considera todos os que não o bajulam)? [uma economia que tenha o crescimento vinculado à forma como o presidente trata a imprensa e os seus adversários, é um indicador seguro de que as coisas estão erradas há décadas,  bem antes do presidente 'autoritário'.]
Além disso, temos um presidente e sua família enrolados em casos de prática da velha política (as rachadinhas, por exemplo) e com ligações perigosas com as milícias. Também um presidente, sua família e seus colaboradores militares que desconfiam do Congresso e dos “outros” políticos, tidos como conspiradores.

Ora, não pode haver liberalismo sem liberdade de imprensa, sem Congresso e, sobretudo, sem as liberdades individuais. Liberalismo não pode [pode e deve ter como principal 'norte'; 
por ter o Brasil uma Constituição que prima pelo exagero nas liberdades, nos direitos, é que temos uma economia tão sensível.]  ser apenas a liberdade de empreender. Tem que ser a liberdade do indivíduo de pensar e viver como bem entende, sempre, é claro, com a ressalva de que não pode ferir a liberdade e a dignidade dos outros.

Além disso, uma política econômica liberal não significa a eliminação do Estado. Significa um Estado menor e, sobretudo, mais eficiente. Ora, o governo Bolsonaro dá um show de ineficiência em áreas cruciais – nas filas do INSS e do Bolsa Família, na bagunça da educação, na demora em colocar em funcionamento programas e na destruição da cultura de proteção do meio ambiente que afeta a imagem da economia brasileira, especialmente do agronegócio. [ainda que seja difícil o reconhecimento por muitos que o aqui chamado show de ineficiência dado pelo governo  é a tentativa de consertar o desastre que recebeu, cujo conserto está lento seja por o primeiro ano foi mais para conhecer os problemas e sua causa, sem esquecer,que o Congresso está sempre pronto a bloquear medidas corretivas e muitas vezes conta com o referendo do Poder Judiciário.
Que as filas do INSS sirvam de exemplo aos que consideram os funcionários públicos parasitas - existe uma minoria, cuja maioria  na verdade não são da categoria servidor público.
Foi a política de  não reposição dos funcionários públicos que aposentaram, deixaram o Serviço Público, política que vem desde o governo FHC, portanto, anterior ao governo Bolsonaro, que gerou o CAOS do INSS e, que  se mantida, estenderá o CAOS por todo o Brasil. ]   

Eis outro exemplo: a política liberal supõe a realização de acordos de livre comércio com o mundo todo. Ora, como fazer isso com um alinhamento escandaloso com os Estados Unidos e com um presidente que arranja inimigos entre os governantes não-direitistas.  Já saíram rumores sobre a saída de Paulo Guedes. Rumores, mas … E a paciência e a habilidade Moro são  constantemente postos à prova.

Resumindo, sem Guedes, Moro e Maia, lá se vão as reformas liberais e o combate à corrupção.  E ainda: o presidente avança cada vez mais nos atos lamentáveis de agredir e ofender a imprensa e adversários, abrindo flancos para a oposição. Já se fala em impeachment.  [quando o presidente Bolsonaro começou a pensar em ser candidato ao cargo de presidente da República, seus inimigos já começaram a pensar no seu impeachment.] 
Faz sentido desconfiar que essa estranha combinação do governo é isso mesmo … muito estranha. Por isso já se fala tanto de 2022. [ocasião em que o estilo Bolsonaro de governar será corroborado pela maioria esmagadora do eleitorado.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

Coluna publicada em O Globo - Economia 20 de fevereiro de 2020

domingo, 10 de novembro de 2019

Lula livre - Elio Gaspari


Folha de S.Paulo - O Globo

Há uma pergunta no ar: o que ele fará? Isso só ele sabe

Ideia de vida política sem ex-presidente foi eterna enquanto durou


Desde o dia do seu encarceramento e da derrota do candidato petista à Presidência, seus adversários tiveram uma oportunidade para demonstrar seu anacronismo. Jogaram o tempo fora.  Jair Bolsonaro, o cavaleiro do antipetismo, governa o Brasil há quase um ano testando uma agenda desnecessariamente radical. Sergio Moro, o Justiceiro de Curitiba, tornou-se um ministro subserviente e inócuo. Os procuradores da Lava-Jato enredaram-se nas próprias armações, reveladas pelo The Intercept Brasil. [os que ainda acreditam nas lorotas do intercePTação, deveriam se ater a um pequeno trecho do voto do ministro Celso de Mello - decano do STF e  o mais radical antibolsonarista da Corte Suprema  - na sessão de quinta passada = chamado de voto estilo discurso do falecido Fidel Castro;

em um trecho ele diz 'Constituição que não aceita provas ilícitas' . Ou o ministro Celso de Mello só tem suas opiniões levadas em conta quando são contra o presidente JAIR BOLSONARO?]

Disso resultou que Lula saiu de Curitiba maior do que entrou. [o cara estava preso; uma prisão estilo resort - desperdiçando os já parcos recursos da PF - mas, de qualquer forma preso. 
Tentou radicalizar - só que faltou seguidores.
Aliás, os devotos de Lula minguam desde aquela caravana que ele tentou realizar, faltou audiência, tentaram simular um atentado e faltou credibilidade e desistiram.] Desde que ele foi para a cadeia, muitas foram as radicalizações surgidas na política nacional. Nenhuma partiu dele. 

Há uma pergunta no ar: o que ele fará? Isso só ele sabe. Recuando-se no tempo, sabe-seue a última cadeia de Lula deu-se em 1980, quando ele era visto pelo governo como um líder sindical incendiário. O barbudo entrou na cela do Dops paulista no dia 18 de abril. 

(...)  

O feitiço de Trump Donald Trump é um craque da desinformação. Em abril, com jeito de quem não queria nada, ele disse que o procurador-geral da Ucrânia precisava ir fundo nas investigações sobre corrupção em seu país. Em junho, numa entrevista à rede ABC, revelou que aceitaria informações de outros países contra seus rivais, Não disse quais países.
Teatro, do bom. Rudolph Giuliani, seu advogado pessoal, conversava com os ucranianos desde janeiro, pedindo-lhes que investigassem as atividades do ex-vice-presidente Joe Biden e de seu filho. Em maio assessores de Giuliani estiveram na Ucrânia e em junho a embaixadora americana em Kiev foi demitida, porque estava atrapalhando. 

Para mostrar que falava sério, Trump congelou o projeto de ajuda militar à Ucrânia e em julho deu o fatídico telefonema apertando seu colega Volodymyr Zelensky.Em setembro conheceu-se o teor da conversa e deu no que deu. 

Para quem acompanha esse filme, na quarta-feira o embaixador William Taylor, que substituiu a colega demitida, fará seu depoimento público na Câmara.Taylor tem biografia. Serviu no Exército, combateu no Vietnã e ocupou a embaixada em Kiev durante o governo de George Bush. Ele já denunciou o toma lá dá cá.

Bloomberg

Para alegria da banca e tristeza de Trump, Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York, sinalizou que disputará a indicação pelo partido Democrata. Ele tem uma fortuna de US$ 53 bilhões e não herdou um só centavo do pai. Trump é filho de milionário.
Bloomberg construiu um império e nunca faliu. Seis empresas de Trump faliram. 

Depois de governar Nova York durante 12 anos, de 2002 a 2013, saiu limpo e aplaudido. Durante a convenção democrata de 2016, quando se sabia que Trump seria o candidato republicano, ele avisou:
“Como novaiorquino, quando eu vejo um vigarista, reconheço-o.” 

Matéria completa Folha de S. Paulo e em  O Globo- Elio Gaspari, jornalista



sexta-feira, 8 de novembro de 2019

Em Curitiba, tensão sobre soltura do ex-presidente - O Globo


Bela Megale

Lula em liberdade: comemoração, raiva e tensão na soltura do ex-presidente

por Bela Megale

A saída de Lula da superintendência da Polícia Federal do Paraná, onde ele está preso há um ano e meio, é motivo de comemoração, mas também de muita preocupação de aliados do ex-presidente. Na avaliação de advogados e integrantes do PT, Lula corre riscos de ser alvo de um atentado devido ao clima de polarização do país. O fato dele estar detido em Curitiba, onde o antipetismo é grande, é tido como um agravante de risco.

Há um mês, a PF vem estudando o melhor plano para tirar Lula da prisão sem ele correr riscos. A Polícia Militar também será mobilizada para atuar no entorno do prédio no dia de sua saída. E Lula promete dar trabalho. Já disse que não volta para São Paulo sem se jogar nos braços da vigília montada em frente à PF.

Até ontem, porém, Lula vinha sendo econômico quando o assunto era deixar a prisão. Afirmava que busca sua inocência e que o julgamento sobre a segunda instância era importante para mostrar respeito à Constituição. [a dedução com certeza não foi descoberta por Lula; 
algum dos raros petistas capazes de pensar - são pouco, talvez meia dúzia - deve ter alertado o presidiário que ele está saindo na condição de CONDENADO pelos crimes de corrupção ativa, passiva, lavagem de dinheiro.
Concordar em sair assim é desmoralizador para quem dizia que só sairia da prisão com a inocência comprovada.]
Bela Megale, jornalista - coluna em O Globo
 

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Nuvens mudam de forma - Merval Pereira

Situação do governo é pior que a de Collor nos mesmos períodos 



O quadro de polarização que o presidente Bolsonaro alimenta com suas agressões e polêmicas quase diárias não o está favorecendo, se levarmos em conta pesquisas de popularidade do DataFolha. Não é apenas a queda, mas o aumento da rejeição do eleitorado que indica, segundo analistas, que a sua situação neste momento do governo é pior, por exemplo, do que a do então presidente Fernando Collor nos mesmos períodos. [dois aspectos diferenciam a situação atual do presidente Bolsonaro da vivida por Collor, apesar de Bolsonaro estar sofrendo perseguição pior que Collor - até os recursos dos perseguidores de agora são mais eficazes:
- as pesquisas pouco significam, por estarmos a mais de três anos das eleições presidenciais, com tempo mais que suficiente para o presidente do Brasil most5ar a que veio, implantar as medidas necessárias e recuperar a popularidade; e,
-  o mais importante: Collor já estava sendo acusado de atos desonestos - posteriormente foi absolvido no STF,mas, na ocasião era acusado - já o presidente Bolsonaro apesar do esforço de todos seus inimigos, também inimigos do Brasil, não está sendo acusado de corrupção - nada foi encontrado contra ele.
De ser autoritário não chega a ser uma acusação, visto que o presidente Bolsonaro nunca escondeu essa característica e outras que hoje criticam.]

A avaliação da esquerda é que essa queda se dá devido à polarização politica. Mas o  erro da estratégia de Bolsonaro, e da avaliação da esquerda, é que eles estão jogando na perpetuação da disputa com o PT, esquecendo-se de que o momento político do país é outro e, se é verdade que o antipetismo continua forte, ainda não há a necessidade de se escolher entre ele e o PT,  ao contrário do que aconteceu na eleição de 2018. O centro volta a ser um espaço politico possível, embora não concretizado.

Existe um campo para especulações de alternativas políticas, e, portanto, amplo espaço para que se explicite a recusa a seu modo de pensar e agir. Na campanha presidencial, enquanto o centro não se mostrou incompetente para derrotar o PT, havia expectativa de uma fusão de candidaturas, ou duas ou três alternativas, que, no final, não se confirmaram viáveis. E Bolsonaro saiu de cerca de 20% para vencer no segundo turno com mais de 60% dos votos.  Havia outra diferença fundamental: Bolsonaro encarava a nova política e o combate à corrupção. A maioria que queria mudar a situação do país via nele a única alternativa competitiva diante de candidatos do PSDB, do PT, ou apoiados pelo MDB, representantes da “velha política”, que foram ficando pelo caminho. Com exceção de Lula, que liderava as pesquisas e, certamente, levaria Bolsonaro para um segundo turno. Hoje já existe a percepção dos que se enganaram de que o presidente Bolsonaro não é aquele que parecia ser, nem no combate à corrupção, nem na confrontação com a “velha política”

Depois que seu filho Flavio começou a ser investigado pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, acusado de praticas ilegais em seu gabinete de deputado estadual na Assembléia do Rio de Janeiro, Bolsonaro dedicou-se à mais antiga das práticas políticas: aparelhar os órgãos de investigação para controlá-las, boicotar a Operação Lava-Jato, constrangendo seu ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, fazer acordos dentro do Congresso para conseguir aprovar o mesmo Flavio como embaixador nos Estados Unidos, indicação, aliás, que desagradou boa parte de seus seguidores.

Os interesses pessoais da família Bolsonaro passaram a ser prioritários em relação aos supostos projetos de governo. Nomeações de autoridades com o beneplácito dos filhos, e de amigos deles, passaram a ser corriqueiras. O presidente do BNDES é amigo de infância, o delegado escalado para substituir o superintendente da Polícia Federal também é bem relacionado com eles. Por tudo isso, a polarização, embora exista, não encontra o mesmo terreno fértil da campanha presidencial.
Comparando-se pesquisas de popularidade do Datafolha sobre os governos Collor e Bolsonaro em três períodos (expectativa antes da posse, após três meses de governo, e depois de seis meses), vê-se que a avaliação de “ótimo e bom” é a mesma, dentro da margem de erro. 

O problema começa quando se analisa o regular de Bolsonaro, que é muito menor do que o de Collor na mesma época. Em decorrência, o ruim e péssimo de Bolsonaro é muito maior do que o de Collor.  Na politica, as nuvens mudam de forma rapidamente, como ensinava Magalhães Pinto. Analistas admitem que não é possível dizer que a popularidade de Bolsonaro terá a mesma trajetória da de Collor daqui para frente, mas, sem dúvida, a recuperação, caso ocorra, tende a ser mais difícil.

Merval Pereira, jornalista - MATÉRIA COMPLETA, em O Globo

 

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

A delícia e a dor de apostar no “anti”. E os números que deveriam acender a luz amarela - Alon Feuerwerker

1) Eleições em dois turnos oferecem a oportunidade de o eleitor não só eleger alguém, mas principalmente derrotar alguém. Isso vale inclusive para ondas já no primeiro turno, o voto útil antecipado, como se viu na sucessão presidencial. É frequente eleições decidirem-se não no confronto entre amores, mas na guerra entre ódios. E é inevitável que governantes construam a rejeição e o ódio a eles mesmos quando decidem, ou falam, qualquer coisa.

2) Também e principalmente por isso, tão ou mais importante que escolher aliados é escolher adversários. É inteligente preferir um adversário cuja rejeição, real ou potencial, permita ao político atravessar barreiras eleitorais mesmo se o amor que este político provoca não é tão intenso assim. Muitas vezes a solução à mão é apresentar-se como mal menor. Daí a utilidade do antipetismo, do antibolsonarimo e dos antis em geral. E costuma funcionar.

3) Em 2014, por exemplo, Dilma e Aécio escolheram-se como adversários, o que permitiu à candidata do PT reeleger-se mesmo naquele ambiente deteriorado que resultou das manifestações de junho de 2013. O antitucanismo acabou derrotando o antipetismo. Depois, na largada do governo, Dilma cometeu o erro de ensaiar um afastamento do petismo/lulismo, com as consequências conhecidas. Mas isso agora é para os historiadores.

4) Ao cultivar diariamente o antipetismo. Bolsonaro dá um gás no bolsonarismo e, de quebra, escolhe um adversário que lhe parece mais conveniente. Vale igualmente para o PT, quando bate 24x7 no bolsonarismo/lavajatismo, ação agora anabolizada pelas revelações sobre os intestinos da operação curitibana. Na guerra de narrativas, o petismo está retomando algum fôlego. Mas não convém subestimar a LavaJato e suas conexões, como se viu nos últimos dias.

5) Qual é o problema do governo, então? É que governar só com os fiéis, e tocando gasolina na polarização, é perigoso quando faltam resultados no bem-estar. O que confere imunidade a qualquer governo, descontada a repressão política, é as pessoas acharem que a vida está melhorando ou vai melhorar. E neste quesito os últimos números deveriam acender a luz amarela no Palácio do Planalto. Pois a falta de resultados vem alimentando o antibolsonarismo.

6) A pesquisa XP/Ipespe divulgada esta semana diz que o ruim/péssimo do governo bateu em 38%, cresceu 21 pontos desde fevereiro. O bom/ótimo caiu menos, sete pontos, de 40% para 33%. O bolsonarismo mostra alguma resiliência no cenário de falta de resultados para entregar. Mas há um deslocamento para o polo negativo entre quem antes avaliava o governo como regular, ou dizia não ter opinião, ou não queria responder.

7) O levantamento também mostrou alguma deterioração quanto ao que se espera do futuro. A expectativa de um governo Bolsonaro ótimo ou bom recuou 19 pontos, de 63% para 44% desde janeiro. E a visão de um futuro ruim ou péssimo cresceu 16 pontos, de 15% para 31%. A maioria simples continua otimista, mas a curva é clara e o otimismo perdeu a maioria absoluta. Se a fotografia não é ruim, o filme, mantida a tendência, não faz antever um final tão feliz assim.

8) E é revelador que a certa deterioração de expectativas sociais venha exatamente quando o Congresso engrena bem a marcha das reformas econômicas liberais. Resta saber se aumentou o otimismo e a vontade de investir dos investidores, o que poderá ser verificado nos números da economia. Mas no povão não é fulgurante o entusiasmo com o deslanchar das mexidas econômicas propostas pelo governo.

9) O governo diz que vai apresentar uma PEC para implantar o sistema de capitalização na previdência. Tem uma arma poderosa para pressionar os parlamentares. Ou aprovam, ou não recebem os recursos de emendas prometidos para suas bases quando aceitaram votar a reforma da previdência. Se vai funcionar, vamos esperar para ver. 

 Alon Feuerwerker - Análise Política

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Um Supremo fake

Sob Toffoli, tribunal dificilmente voltará a ser poder moderador

O ministro Dias Toffoli conseguiu algo que nem o presidente da República vinha se mostrando capaz, reacender a militância bolsonarista na defesa da revolução justiceira representada por sua eleição. Nem mesmo a decisão do Supremo de remeter inquéritos de corrupção de políticos para a justiça eleitoral havia sido capaz de tamanho feito. Caíra a ficha, para uma parte da República de Curitiba, que o apoio da população à Lava-Jato era movido, na verdade, pelo antipetismo.

Com a censura à revista "Crusoé", o "amigo do amigo do meu pai", junto com seu colega togado, Alexandre de Moraes, acordaram o antipetismo e o colocaram no mesmo palanque daqueles que, estejam à direita ou à esquerda, simplesmente não aceitam uma imprensa censurada. O presidente do Supremo contra quem no processo nenhuma prova de malfeito há, deu ainda ao presidente Jair Bolsonaro a oportunidade de posar em defesa da liberdade da mesma imprensa com a qual tem tido litigiosa convivência.

Ainda foi capaz de unir toda a imprensa em defesa de uma publicação digital cuja antipatia pelo mercado da informação é traduzido pelo slogan "ilha de jornalismo", sugerindo que todo o entorno é pântano. Dos processos que o site "O Antagonista", costela que deu origem à "Crusoé", acumula, alguns são movidos por jornalistas, caminho que pode ser seguido por qualquer um, até pelo presidente do Supremo. Isso não impediu que a imprensa e suas entidades de classe saíssem em defesa da revista e da liberdade de expressão.

Toffoli e Moraes foram além. Ressuscitaram, no Senado, as articulações por uma CPI da Toga, ou mesmo pelo impeachment de ministros. Com uma composição mais renovada que a da Câmara, a Casa se move, em grande parte, por redes sociais. Nas 24 primeiras horas depois da censura, a Bytes identificou a publicação de mais de meio milhão de tuítes em reação ao Supremo, liderados pela #ditatoga.
Na sua cruzada, a dupla de ministros confrontou-se ainda com a farda ao apreender o computador de um general da reserva, candidato derrotado ao governo do Distrito Federal, titular de grande audiência em redes sociais e amigo do ex-comandante do Exército, o general Villas-Boas, aquele que chegou a ameaçar intervenção se o Supremo acatasse o habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Já começaram a chegar às mãos de dois generais, o titular da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, e de seu auxiliar, Antonio Luiz da Costa Burgos, currículos de pré-candidatos ao Supremo. A próxima vaga, a rigor, só se abre em novembro de 2020, quando o ministro Celso de Mello completa 75 anos. Nove meses depois, vem a segunda, do ministro Marco Aurélio Mello. Nenhum dos nomes que povoam as listas do Palácio do Planalto é hostil à Lava-Jato, do tributarista paulista, Heleno Torres, ex-tenente do Exército, ao desembargador do TRF-4, João Pedro Gebran, passando pelo próprio ministro Sérgio Moro, pule de dez para uma vaga caso naufraguem suas pretensões políticas.

A filtragem tão antecipada de currículos sugere que o Palácio do Planalto não pretende ser pego de surpresa se prosperarem as articulações para ressuscitar a CPI da Lava Toga ou mesmo o impeachment dos ministros do Supremo. Com a desatinada censura, ao rol de ministros visados por impeachment, encabeçado por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, somaram-se Dias Toffoli e Alexandre de Moraes. Tem senador querendo obstruir votações de interesse do governo se a pauta não andar. O presidente do Supremo parece se guiar pela aposta de que será capaz de acuar o grupo Crusoé-Antagonista na tramitação dos processos que se acumulam contra seus jornalistas. Quase todos os ministros, porém, acumulam votos em defesa da liberdade de imprensa. Para cerrarem fileiras ao lado de Toffoli, os ministros teriam que rever votos, alguns deles paradigmáticos, como o "cala a boca já morreu", da ministra Cármen Lúcia, ao liberar biografias não autorizadas.

Ante as dificuldades no plenário para confirmar a censura, a saída foi deslocar o jogo para o confronto com o Ministério Público. Apela ao espírito de corpo do tribunal contra a parceria entre procuradores e redes sociais que tenta empurrar o Supremo para fora da vala contramajoritária no aval a tudo o que vem da Lava-Jato. Toffoli já havia confrontado o MP colocando Moraes para presidir o inquérito contra as 'fake news', atribuição dos procuradores. Voltou ao embate ao contrariar a decisão da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pelo arquivamento.

Em Curitiba, juízes e procuradores atuam em tamanha consonância que a força-tarefa da Lava-Jato já foi tida como um simulacro da justiça italiana, em que a magistratura e a procuradoria são uma única carreira. Toffoli foi além. A pretexto de combater a sanha punitiva da Lava-Jato, o presidente do Supremo Tribunal Federal fundiu as prerrogativas, em detrimento do MP, num só poder, o seu. E deixou poucas esperanças de que o tribunal recupere sua condição de poder moderador enquanto estiver na presidência.

Petrobras
Antes de completar seu primeiro mês no cargo, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse, durante evento promovido por um banco de investimentos, que não queria mais ouvir falar na expressão 'política de preço'. O executivo encantou a plateia ao resumir sua visão sobre os preços dos combustíveis: "Vocês já ouviram falar de política de preço de iPhone? Política de preço do feijão? Não existe política de preço. Existe mercado".

Na cola do câmbio, o iPhone variou 5% do mais recente modelo em relação ao anterior. O feijão, chegou a subir quase 100% este ano, antes de começar a cair. Um está no bolso dos ricos. E o outro, até na mesa dos pobres. O combustível está na vida do país inteiro. O controle de seus preços quebrou a Petrobras. Seu descontrole elegeu Jair Bolsonaro.
 
Maria Cristina Fernandes - Valor Econômico
 

O ministro Paulo Guedes garantiu que não haverá intervenção na política de preços mas, ao dizer que a Petrobras terá que dar mais transparência e previsibilidade à definição dos seus preços, fincou as duas estacas de uma política de preços que amarrará o presidente da República até o último dia de seu mandato.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

Lula não aprendeu nada em um ano de cadeia


"Por que têm tanto medo de Lula Livre?", indaga o título de um artigo assinado por Lula na edição deste domingo da Folha. A interrogação indica que tudo mudou nos 12 meses de cadeia de Lula, exceto a empáfia da divindade do PT. Mesmo trancado numa cela de 15 m², o presidiário mais vistoso da Lava Jato continuou hospedado no mundo da fantasia. O próprio Lula —ou a pessoa que redigiu o artigo em seu nome— cuidou de responder à interrogação do título. "Na verdade, o que eles temem é a organização do povo que se identifica com nosso projeto de país. Temem ter de reconhecer as arbitrariedades que cometeram para eleger um presidente incapaz e que nos enche de vergonha."

Quer dizer: Lula ainda não enxerga um culpado no espelho do banheirinho da cela especial de Curitiba. Antes do encarceramento, considerava-se um mito. Isolado do convívio social, acha que virou um mártir. E continua dando de ombros para os fatos que o transformaram no avesso de tudo o que imagina ser. Aquilo que Lula chama de "nosso projeto de país" morreu no segundo mandato de Dilma, a "gerentona" que ele escolheu para pavimentar o caminho do petismo para o inferno. Arbitrários não foram os processos ou as sentenças, mas a decisão de romper as regras da moralidade para fazer do PT um aparelho arrecadador de fundos, com o beneplácito e o proveito pessoal do grande líder.

Quem elegeu Bolsonaro, esse "presidente incapaz que nos enche de vergonha", não foram Sergio Moro e a Lava Jato. O feito deve ser atribuído ao próprio Lula, autoconvertido em principal cabo eleitoral do capitão, e ao antipetismo, maior força política da sucessão de 2018. As urnas, não os algozes de Lula, decidiram que o PT não deveria receber um novo mandato presidencial. Há um ano, horas antes de ser preso, Lula discursou defronte do sindicato de São Bernardo. Disse que a tranca não iria silenciá-lo, pois sua imaculada figura transformara-se numa ideia e seus devotos fariam barulho por ele. "Vocês poderão queimar os pneus que vocês tanto queimam. Poderão fazer as passeatas que vocês queiram, fazer ocupações no campo e na cidade…" Desde então, Temer apodreceu no mandato que resultou do impeachment, o PT levou uma surra eleitoral, Dilma foi condenada pelo eleitorado mineiro à função de cuidadora perpétua dos netos, Bolsonaro subiu a rampa e a soma das condenações de Lula ultrapassou a marca de 20 anos. Tudo isso aconteceu sem pneus queimados, passeatas ou ocupações.
Lula planejara ganhar a liberdade e disputar a Presidência acuando juízes com a militância incendiária do PT e o "exército" de João Pedro Stédile, do MST. Entretanto, secaram as fontes de dinheiro público para sindicatos e movimentos sociais. Sem a condução e o sanduíche, a solidariedade preferiu ficar em casa. Hoje, ninguém tem medo do Lula livre. O que amedronta é a hipótese de que ele receba tratamento diferente do que é dispensado à bandidagem sem grife. O que assusta é a pose de vítima. O que apavora é a perspectiva de que o castigo talvez seja insuficiente para evitar a reencarnação do modelo corrupto que levou para a cadeia o maior líder popular da história.

Blog do Josias de Souza