Bruno Boghossian
Vítima da própria vacilação, STF produz decisões instáveis
Tribunal pode ser obrigado a revisitar prisão em segunda instância nos próximos anos
[Presidente
Bolsonaro escreve com caneta, ainda que uma Bic, já o Supremo escreve a lápis.]
Ao dar o voto que fechou o placar contra a prisão após condenação em segunda instância, Dias Toffoli deixou uma porta aberta. O presidente do STF contou ter dito a senadores que, apesar de interpretações em sentido contrário, eles poderiam mudar a lei para permitir a execução antecipada das penas. "Não vejo problema algum em alterar esse dispositivo", afirmou.
O Congresso já discute uma série de medidas que podem alterar o Código
de Processo Penal para escrever claramente que um réu pode, sim, ser
preso depois de condenação em segundo grau. Caso a lei mude, nenhum
ministro do Supremo tem dúvidas de que precisará discutir se esse novo
dispositivo estará de acordo com a Constituição. Se a sessão desta quinta (7) foi vendida como episódio final de uma
novela, é certo que o STF deve se preparar para uma série de remakes. As
hesitações e gambiarras empregadas pelos ministros nos últimos anos
transformaram o veto às prisões antes do esgotamento dos recursos em uma
solução provisória.
O terreno de instabilidade foi criado pelo próprio tribunal, que mudou
seu entendimento sobre o assunto pela primeira vez em 2009. Sete anos
depois, sob clima de festa pelo avanço da Lava Jato, autorizou as
prisões antecipadas. Nos últimos meses, os ministros se recusaram a
revisitar o tema para fugir das contaminações provocadas pelas
condenações do ex-presidente Lula.
A aparente fluidez alimenta a convicção de que as determinações da corte
são escritas a lápis. Além do desejo do Congresso de mudar as regras,
os ventos tendem a virar também quando a composição do plenário for
alterada, nos próximos anos.
Até meados de 2021, dois ministros que votaram contra a prisão em
segunda instância deixarão suas cadeiras. Os substitutos de Celso de
Mello e Marco Aurélio, que devem ser indicados por Jair Bolsonaro,
formarão novas maiorias de ocasião em torno do tema. O tribunal que
deveria ser o dono da palavra final se tornou vítima de suas próprias
vacilações.
Bruno Borghossian, colunista - Folha de S. Paulo
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