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domingo, 9 de julho de 2023
Lula, a Venezuela e a vida real - J. R. Guzzo
Revista Oeste
O presidente veio com a história de que “a democracia é relativa”. Não existe isso. O que há, no mundo das realidades, são democracias e ditaduras
Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Nicolás Maduro, e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante reunião privada | Foto: Ricardo Stuckert/PR
O sonho do presidente Lula, pelo que se constata ouvindo os
desvarios cada vez mais agitados que ele não para de produzir todas as vezes
que abre a boca para falar em público, é ser o ditador Nicolás Maduro.
É isso,
no fundo: ele quer ser um Maduro, e quer que o Brasil seja uma Venezuela.
Como
passa as 24 horas do dia cercado pelo cordão de puxa-sacos mais tóxico que já
se viu na história brasileira, ninguém tem coragem, nem a decência mínima, de
lhe dizer que tanto uma coisa quanto a outra são mais complicadas do que ele
imagina.
O resultado é que Lula continua, com o gás todo, nessa viagem
perturbada rumo às suas miragens;
- deu para dizer agora que tem “orgulho” de ser
chamado de comunista, e que o Brasil precisa acabar com essa conversa de
família, religião e patriotismo.
Isso é coisa de “faxista”, como diz, e ele tem
horror ao “faxismo”. Imagina-se com o cartaz de um Nelson Mandela, pronto a
receber o Prêmio Nobel,e o cordão à sua volta se ajoelha e diz: “Isso mesmo,
presidente”. Está tão perto de Mandela como o Jabaquara do Real Madrid; o que
acaba acontecendo, na prática, é a sua transformação em mais um projeto de
ditador bananeiro, um misto de Pancho Villa com João de Deus, que dá nesse
sub-Maduro que se vê por aí.
O crescente tumulto mental de Lula coincide com os piores
momentos que a Justiça brasileira já teve desde que o governador Tomé de Sousa,
há quase 500 anos, colocou em funcionamento um sistema judicial neste país, com
a instalação do ouvidor-geral da Bahia.
Desses piores momentos, possivelmente
nenhum foi pior que o mais recente — a cassação dos direitos políticos do
ex-presidente Jair Bolsonaro,em quem os 140 milhões de eleitores brasileiros
estão agora proibidos de votar, por decisão da junta judicial que hoje governa
o Brasil em parceria com Lula e o seu sistema.
É uma dessas espetaculares
coincidências da vida.
No mesmo momento em que as Cortes Supremas do Brasil
cassaram Bolsonaro, as Cortes Supremas da Venezuela cassaram María Corina, a
candidata mais forte do que sobrou de oposição por ali para as próximas
eleições presidenciais.
Essa eleição é uma piada — na Venezuela também existe
um TSE, e também lá ganha quem o TSE deles diz que ganhou.
É uma farsa em
estado puro, segundo atestam as avaliações de todas as democracias sérias do
mundo e, até, dos órgãos de militância esquerdeira, como as ONUs, as OEAs e as
coisas parecidas.
Mas, assim como aqui, o governo não quer correr o menor risco
de algum acidente;é mais prático, logo de uma vez, proibir o adversário de
concorrer.
Como é que Lula, Janja, Flávio Dino e os outros imaginam
deixar o Brasil do mesmo tamanho? Se querem uma democracia venezuelana, vão
precisar de uma economia venezuelana
Venezuela e Brasil, ao estilo do consórcio STF-Lula — tudo
a ver? Há, sem dúvida, um imenso esforço para que tudo tenha cada vez mais a
ver. O presidente da República, justo neste momento, resolveu ter mais um dos
seus surtos madureiros — disse que a Venezuela é uma formosa democracia, porque
tem “mais eleições que o Brasil”.
A declaração foi um assombro — China, Cuba,
Coreia do Norte têm eleições; todas as ditaduras do mundo têm eleições.
De que
adianta a Venezuela ter eleições se a oposição não pode ter candidato?
Lula,
diante do despropósito que tinha acabado de dizer, quis fugir, como sempre faz
nessas ocasiões — e, como sempre, disparou um despropósito maior ainda. Veio
com a história de que “a democracia é relativa; cada um acha que é uma coisa”.
Não existe isso. Não há “democracia relativa”. Quem achava isso eram os
generais da ditadura militar do AI-5. O que há, no mundo das realidades, são
democracias e ditaduras. Se é democracia é democracia; se é ditadura é
ditadura. Até o ministro Gilmar Mendes (ele e Alexandre de Moraes são os únicos
que realmente contam no STF; os demais só cumprem a tabela, sem disputar o
campeonato) achou que assim também já era demais. Disse, e insistiu, que a
noção de democracia relativa é um completo disparate.
🚨NA
LATA
Porque o senhor e o seu governo tem tanta dificuldade em reconhecer a ditadura
na Venezuela? ✅ LULA tem alma de ditador! pic.twitter.com/o5Mik8Fu4f
Eis aí, então — há dificuldades, e não são poucas, com as
fantasias de Lula e dos extremistas que mandam em regiões inteiras do seu governo.
Ele pode querer ser um novo Maduro. Mais difícil é fazer com que o Brasil seja
uma nova Venezuela. Há, é claro, muita encenação, muito fingimento e muito
adereço de mão para exibir ao público — há o palavrório do “Foro de São Paulo”,
dos novos “empréstimos” para se somarem aos que a Venezuela nunca pagou e das
teorias sobre como seria bom juntar o Brasil com a miséria da América Latina.
Mas uma coisa é dizer bobagem. Fazer com que aconteça já são outros quinhentos.
Gilmar Mendes, por exemplo — Lula provavelmente não estava esperando levar uma
bronca, em público, dele. Democracia relativa? Só o STF tem o direito de
praticar democracia relativa no Brasil; para os demais, é exercício ilegal da
profissão. Quer dizer que o Supremo não assina embaixo de tudo o que o
presidente diz ou faz? Nesse caso não assinou. Tem dado a Lula tudo o que
interessa a Lula, como se dá a César o que é de César — ou se dava, nos velhos
tempos.
Mas outra maneira de ver a mesma coisa é refletir que o STF só dá o que
quer dar; não está claro o quanto quer, nem o que quer, mais exatamente. Há
ainda mais um ângulo: como na Bolsa de Valores, resultados do passado não
garantem resultados no futuro. A ver, portanto.
Outro problema é o Brasil em si. Lula, Janja, Flávio Dino e
outros dos grandes cérebros do seu governo talvez tenham chegado muito tarde à
cena do crime, como diria Geraldo Alckmin.
Se quisessem mesmo um Brasil
comunista, como o partido em que o ministro militou se propõe a criar, deveriam
ter começado uns 60 anos atrás, ou algo assim. De lá para cá, o Brasil virou
outro país. Tem um PIB de US$ 2 trilhões, tornou-se um dos dois ou três maiores
produtores de alimentos do mundo — o que vale mais que qualquer reserva de
petróleo — e criou uma cadeia de interesses grandes demais para ser desmanchada
com despachos no Diário Oficial.
A Venezuela, ao contrário, andou para trás. Já
tinha, antes da ditadura, uma economia de terceira categoria, que vivia
unicamente de um produto, o petróleo. Não tinha empresas privadas de verdade,
não tinha capital, não conseguia exportar um prego, nunca passou do
pré-capitalismo. De lá para cá, ficou muito pior — hoje não tem mais nem papel
higiênico, a não ser para Maduro e a casta de generais, de milicianos e de traficantes
de drogas que manda no país e fica com todos os dólares que ainda entram ali.
Dá para pagar as suas Maseratis. O Brasil já é bem mais complicado.
Com todos
os seus problemas, e põe problema nisso, o Brasil está com um PIB 20 vezes
maior que o da Venezuela de Maduro.
Como é que Lula, Janja, Flávio Dino e os
outros imaginam deixar o Brasil do mesmo tamanho?
Se querem uma democracia
venezuelana, vão precisar de uma economia venezuelana. É fácil transformar a
Venezuela numa Cuba — aliás, Cuba tem hoje um PIB maior.
Outra coisa, bem mais
difícil, é transformar o Brasil numa Venezuela. Fazer discurso no “Foro de São
Paulo”, proclamar-se comunista e ficar fazendo turismo pelo mundo com a mulher
e com Celso Amorim não vai ser suficiente.
Em encontro do Foro de São Paulo, Lula diz que sente
orgulho de ser chamado de Comunista e diz que as pautas dos Costumes, da
Família e do Patriotismo são discursos fascistas pic.twitter.com/Ee07omW1Ux
Lula e o Sistema “L” ficam muito animados, naturalmente,
quando veem aberrações em modo extremo, como a cassação dos direitos políticos
de Jair Bolsonaro.
É esse o paraíso venezuelano que pediram a Deus — um país
onde nenhuma lei vale nada, e a Constituição pode ser anulada a qualquer
momento do dia ou da noite para atender aos desejos e interesses de quem manda
no governo.
Nunca existiu qualquer fato, mesmo daqueles mais ordinários, que
pudesse ser apresentado para dar um mínimo de legalidade, ou mesmo de simples
lógica, à decisão tomada pelo complexo STF-TSE. Bolsonaro não fez nada de
errado, ou proibido por lei, para ser declarado “inelegível”; estava condenado antes
do processo começar, pela única razão de que Lula e o Comissariado Supremo que
governam o Brasil de hoje não admitem que os brasileiros possam votar nele, em
nenhuma hipótese ou circunstância.
Fabricaram, então, uma desculpa para dar
alguma roupagem jurídica ao que tinham decidido fazer — e a desculpa que
escolheram foi um desastre sem nexo, sem inteligência e sem qualquer contato
com os fatos.
Bolsonaro foi cassado, como se viu, porque fez uma reunião
com embaixadores na qual reclamou das urnas eletrônicas do TSE, que nenhuma
democracia do mundo, mesmo da segunda divisão, utiliza.
E daí? O ministro Edson
Fachin, aquele que descondenou Lula por erro no CEP, tinha feito uma reunião
com os mesmos embaixadores — só que para falar bem das urnas.
Dilma Rousseff, a
mártir da esquerda nacional que hoje está num empregão de R$ 300 mil por mês
doado por Lula, também se reuniu com embaixadores pouco antes do seu
impeachment, para ver se arrumava alguma coisa. Não arrumou nada — mas fez
exatamente a mesma coisa que Bolsonaro. Dizer que ele gerou “desconfiança no
sistema eleitoral”, então, é ainda mais prodigioso.
O presidente do PDT, que
pediu ao TSE a cassação de Bolsonaro, fez um discurso inflamado contra esse
mesmo sistema, tempos atrás; disse que onde há voto eletrônico a “fraude
impera”.
A ministra do Planejamento, a quem Lula se refere como “Simone
Estepe”, exigiu que as urnas do TSE tivessem comprovante impresso. O próprio
Flávio Dino, com todo o seu comunismo, disse, repetiu e disse de novo que o
sistema de votação não merecia confiança e tinha de ser reformado. Por que está
certo com eles e está errado com Bolsonaro? Poderiam dizer, já que era para
inventar alguma coisa, que ele cometeu genocídio; talvez ficasse um pouco menos
idiota.
Jair Bolsonaro | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência
Brasil
Lula se livrou de Bolsonaro — em boa hora, já que na sua
última entrevista, no programa Pânico, da Jovem Pan, o ex-presidente teve uma
audiência final de 1,4 milhão de ouvintes, enquanto Lula não conseguiu passar
de miseráveis 6 mil, ou coisa que o valha, nas suas lives produzidas com toda a
majestade da máquina do Estado e um caminhão de dinheiro público.
Será que vai
ter o apoio do TSE, ou STF, ou STJ, ou seja lá o “S” que for, se fizer as
mesmas coisas que a democracia da Venezuela faz — como torturar presos
políticos, prender jornalistas e levar 7 milhões de venezuelanos a fugir do
país para não morrer de fome?
Enquanto isso não fica claro, Lula também não
governa nem fica no Brasil; ultimamente andava mais uma vez pela Argentina, e
só neste mês de julho tem mais duas viagens para o exterior, agora para a
Colômbia e a Bélgica.
A Rede Globo e suas vizinhanças descrevem essa alucinação
como “intensa atividade internacional”, e Lula, para eles, é uma “liderança
latino-americana”. É por onde estamos indo — cuesta abajo, como no tango de
Gardel. Lula, Venezuela e mídia brasileira: uma só paixão.
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