Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador águia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador águia. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 8 de agosto de 2022

É águia sim, e já está voando - Revista Oeste

Ubiratan Jorge Iorio

O que faz as economias voarem é a ação humana descentralizada, por parte de uma infinidade de pessoas que, na maioria dos casos, nem se conhecem


Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

“Assim como um agricultor não gera os frutos,
mas cuida do solo para que seja fértil e produtivo,
um Presidente não cria empregos,
mas trabalha para tornar o ambiente fértil
e favorável para a iniciativa privada, que é quem realmente gera.
É exatamente isso que estamos fazendo.”

Jair M. Bolsonaro, no Twitter, em 28/7/2022

Senti um jato de alegria, uma indescritível sensação de “valeu a pena”, quando deparei com a frase em epígrafe, poucos minutos depois de ser postada pelo presidente. Reli várias vezes para certificar-me de que era aquilo mesmo. 
Jamais havia sequer cogitado que um dia veria um chefe de Estado brasileiro descrever com tanto acerto e concisão a essência do seu papel. E, ao procurar outros exemplos no mundo inteiro, lembrei-me de apenas dois governantes, nos últimos 50 anos, que demonstraram a mesma percepção e se esforçaram para segui-la à risca: Ronald Reagan e Margaret Thatcher.
Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos, e Margaret Thatcher,                           
 primeira-ministra britânica, em 1981 | Foto: Domínio Público

Identifiquei no tuíte do presidente algo como um endosso à minha trajetória de economista e, mais especificamente, de professor da nossa ciência “cinzenta”. Sim, vem sendo décadas de liças e escaramuças incruentas — quase sempre solitário — para ajudar jovens brasileiros a se desvencilharem das amarras ideológicas que lhes são impostas. E a compreenderem o que devem esperar — e, principalmente, o que não devem esperar — do Estado e dos governantes. 

Asseguro que se trata de luta bastante difícil, travada contra vários inimigos: o primeiro é a própria mentalidade dos brasileiros, que detestam políticos, mas acreditam no Estado provedor. O segundo é a crença de que os governantes sabem o que é melhor para nós e que, portanto, portam um salvo-conduto intelectual e moral para decidirem em nosso lugar. E, o terceiro, os economistas avessos ao livre mercado, que, dentro das universidades e na velha imprensa, se recusam a reconhecer os próprios erros e se esforçam garbosamente para persistir neles, desprezando os fatos.

O que faz as economias andarem para a frente — ou, em linguagem figurada, o que faz a águia voar — é a ação humana descentralizada, por parte de uma infinidade de pessoas que, na maioria dos casos, nem se conhecem. Quando o Estado trava esse processo com suas regras, medidas, planos e burocracia, a águia fica acorrentada e, portanto, não pode voar livremente. No máximo, vai tentar imitar uma galinha: dá um cacarejo fraco, sobe meio metro e cai exausta no terreiro, como atesta a história das nossas últimas décadas.

Preparar o solo e semear
Mas por que o papel de um presidente — e do Estado, de maneira abrangente — deve ser semelhante ao de um agricultor (ou de um jardineiro, como dizia Hayek)
Por que ele deve se concentrar em preparar o solo e em semear? 
E por que deve deixar a geração de empregos por conta do setor privado?

É que existe uma distância enorme entre a economia que está nos livros — e na cabeça de muitos comentaristas — e a que se desenrola no mundo real, constituída pelas ações realizadas por bilhões de indivíduos no planeta. Ao agirem, os agentes econômicos acreditam sempre que suas escolhas sejam as melhores possíveis, dado o conhecimento de que dispõem naquele determinado momento. A economia real nada mais é, portanto, do que um conjunto imenso e orgânico de ações individuais que, não poucas vezes, por estarem entrelaçadas, demandarão cursos futuros de outras ações. Alguns destes podem ser mensurados no momento da escolha, outros não. Quando alguém resolve comprar um carro, está aceitando implicitamente incorrer em gastos futuros previsíveis com combustível, revisões e impostos, mas também com eventuais despesas desconhecidas no momento, como multas ou reparos. E todas essas ações impactarão, mesmo que imperceptivelmente, as estruturas de produção de cada um desses bens e serviços, afetando vendedores, fornecedores e suas rendas e empregos.

Acontece que passamos a vida inteira agindo, ou seja, fazendo escolhas, desde o berço. Por exemplo, decidimos certo dia brincar com uma bola e não com um carrinho. As nossas escolhas refletem preferências, que costumam variar com o tempo e, portanto, assim como não faz sentido para um adulto escolher entre brincar com uma bola ou com um carrinho, nada garante que qualquer opção feita em um momento específico do tempo seja considerada também a melhor em outro momento. Outra característica da ação humana é que o nosso conhecimento — aquele necessário para tomarmos qualquer decisão —, além de não ser perfeito, muda no decorrer do tempo, o que implica a existência permanente de incertezas, que afetam as nossas ações.

A economia do mundo real, então, é formada pelo conjunto de bilhões de escolhas realizadas ininterruptamente ao longo das vidas de todos os habitantes do planeta e sempre sujeitas às incertezas provocadas pelas imperfeições inevitáveis do nosso conhecimento. E não há por que acreditar que os governantes sejam oniscientes, providos de todo o conhecimento necessário para a tomada de decisões que afetam a vida da população. A economia é como um universo em permanente processo de evolução.

Por essas razões é que a frase do presidente na epígrafe traz tanta esperança. E basta pensar um pouco para perceber que ela resume bem o que sua equipe econômica vem tentando fazer desde o início
- cuidar do solo para torná-lo fértil e produtivo, trabalhar para garantir um ambiente favorável e remover os entraves que prejudicam a ação humana individual descentralizada. 
O Estado deve limitar-se a cuidar bem do jardim e deixar as plantas e as flores crescerem, a garantir a estabilidade das regras do jogo e a respeitar a liberdade de escolha dos indivíduos — que, afinal, é o que alavanca o progresso. 
E, quando um forte vendaval prejudica o jardim, o Estado deve redobrar o seu cuidado, construindo anteparos, proteções e guarda-ventos provisórios, enquanto durar a emergência.

Por que é uma águia e ela já está voando?

Para desespero da “turma do contra” um estranho apanhado de frutas podres, composto pelos jornalistas da despiora, políticos da desmelhora e analistas do agora —, as notícias sobre a nossa economia são bastante alvissareiras.  
Já em 2019, a águia chegou a ensaiar um voo de debutante, forçosamente interrompido no limiar de 2020 pela pandemia mais inexplicável e nebulosa de que se tem notícia, cujos efeitos são bastante conhecidos e se estenderam por toda a Terra.
 Mas o que está acontecendo agora, mesmo com a situação de conflito na Ucrânia, é que, enquanto a economia mundial desmelhora, a brasileira despiora e de maneira “assustadora” para os críticos da liberdade econômica.

O atual presidente teve o bom senso de cercar-se de economistas que sabem distinguir o joio do trigo

Por que o Brasil, hoje, em termos de política econômica, é um bom exemplo para o mundo? A explicação é simples: depois de muitas décadas de governos de centro-esquerda e de esquerda, com suas políticas de intervenção econômica e com presidentes sem a humildade necessária para reconhecer o seu papel de simples agricultores ou jardineiros, o atual presidente teve o bom senso de cercar-se de economistas que sabem distinguir o joio do trigo.                           Assim, formou uma equipe econômica que, além de certamente ser a mais bem qualificada tecnicamente, é a mais liberal de toda a nossa história.

E o trabalho dessa equipe, desde o início, tem sido insistente e praticamente silencioso, uma vez que o consórcio midiático simplesmente se especializou em esconder boas notícias, inventar estultícias e semear malícias. 
E agora, quando os frutos do bom trabalho começam a ficar visíveis, vem se especializando em um culto bizarro às conjunções adversativas, que chega a ser risível. Bandos de aves agourentas, dentro das redações, escrevem incessantemente coisas como “o PIB vai crescer acima do esperado, mas no ano que vem vai cair”, ou “a inflação está caindo, no entanto vai voltar a subir”, “a relação dívida/PIB diminuiu, todavia deverá voltar a crescer”… 
Uma velha jornalista chegou a afirmar, em sua sanha de atacar o governo, que a queda no preço da gasolina nos postos não é uma coisa boa, porque somente os “ricos” serão beneficiados, e outra chegou a dizer — acreditem! — essa pérola: “Infelizmente, agora vamos às boas notícias…”.
 
Mas qual é o segredo? 
Por que o desempenho da nossa economia está acima do que todos os críticos esperavam, enquanto no resto do mundo o que se vê é uma combinação da maior inflação dos últimos 40 anos com escassez, e já com indícios de recessão técnica? 
Não é segredo. É só fazer a coisa certa, apesar do plantão permanente dos urubulinos.

A coisa certa
E o que é fazer a coisa certa? Primeiro, é trabalhar duro para mudar um regime fiscal historicamente deficitário, uma transformação que exige reformas estruturais e não apenas conjunturais, com períodos transitórios de austeridade, como se fazia no passado — sendo que, algumas vezes, fizeram exatamente o oposto, como a depredação fiscal dos petistas
Já no fim de 2019, as contas públicas apresentavam fortes sinais de saneamento estrutural, avanço que foi forçosamente interrompido pela pandemia, mas que voltou a ocorrer a partir de 2021. 
Enquanto isso, no restante do mundo, o que se viu foram políticas fiscais excessivamente expansionistas. Ora, quem planta gastos colhe dívidas.
Segundo, o nosso Banco Central também fez a coisa certa, porque foi o primeiro em todo o mundo a antecipar que a conjunção de expansões monetárias descomunais (especialmente nos Estados Unidos e na Europa) com o “fique em casa” da pandemia só poderia resultar em inflação com recessão.  
Precisou ser cauteloso ao longo de 2020 por causa da situação de excepcionalidade, mas já em março de 2021 começou a aumentar a taxa básica de juros para fazer frente à inflação. Enquanto isso, lá fora, apenas recentemente é que o Fed e o Banco Central Europeu abandonaram a tese falaciosa de que a inflação de preços foi provocada exclusivamente pela pandemia e começaram a aumentar as taxas de juros, embora timidamente. Ora, quem planta moeda colhe inflação.
 
Terceiro, o governo realizou nada menos do que 11 reformas tributárias permanentes e a décima segunda, contemplada pelo PL 4188, está em vias de ser concretizada no Congresso
Que outro governo, no Brasil, diminuiu impostos, mesmo temporariamente? 
Nesse ínterim, nos outros países, a tendência é a oposta. Ora, quem semeia imposto colhe recessão.

Em quarto lugar, existe um compromisso firme com as reformas estruturantes, incluindo a da previdência, as privatizações e as reformas tributária e administrativa. Avançou-se e, se o ritmo dessas reformas ficou aquém do desejado, a conta deve ser debitada ao Congresso.

Por fim, o governo vem implementando um feixe volumoso de providências, cujo efeito sobre o crescimento de longo prazo da economia é sempre subestimado, mas que vem contribuindo para o desempenho acima das expectativas da economia: trata-se das minirreformas microeconômicas, como os vários marcos legais, a lei de liberdade econômica, a desburocratização e a mudança no perfil do crédito e dos investimentos, de públicos para privados.

Muito ainda há para ser feito, mas é óbvio que já se pode afirmar que a águia nasceu, é saudável, já está começando a voar e vai voar longe. Como disse o próprio presidente — também pela primeira vez na história —, seu governo tem o compromisso de tirar o peso do Estado das costas dos cidadãos. Entrementes, no restante do mundo, as galinhas não têm mais forças nem para sair dos seus poleiros estatais. 

Ubiratan Jorge Iorio é economista, professor e escritor. Instagram: @ubiratanjorgeiorio. Twitter: @biraiorio

Leia também “Insanidade versus liberdade”

 Revista Oeste 

 

segunda-feira, 28 de março de 2022

O Ocidente já perdeu? - Revista Oeste

Kaíke Nanne

Supostamente, os EUA estão em declínio e a civilização ocidental, em ruínas. Será mesmo? 

A água, símbolo dos Estados Unidos, e o dragão chinês | Ilustração: Shutterstock
A água, símbolo dos Estados Unidos, e o dragão chinês -  Ilustração: Shutterstock

É desolador o panorama que se apresenta quando o objeto da análise é a civilização ocidental. Vladimir Putin não teria tentado ressuscitar a Grande Mãe Rússia e iniciado sua estripulia militar sanguinária na Ucrânia se o Ocidente tivesse líderes fortes. A ordem liberal que preconiza o Estado de Direito, a garantia da propriedade privada e as liberdades individuais está em declínio, e o mundo está ficando menos democrático — de acordo com a Edição 2021 do Global Democracy Index, da revista britânica The Economist, apenas 6,4% da população mundial vive em democracias plenas; é o pior resultado desde o início do levantamento, em 2006. Tem mais. Xi Jinping já declarou que o plano do Partido Comunista Chinês é estabelecerum novo modelo de governança global”, seu país investe pesadamente na Nova Rota da Seda, um ambicioso projeto de infraestrutura que implementará um conjunto de novos itinerários comerciais por terra e mar, e a economia chinesa deve ultrapassar a norte-americana em 2033.

A propalada débâcle ocidental não se expressa apenas na política e na economia. Numerosos analistas dão conta de que a guerra cultural já está perdida. Do TikTok ao Fórum de Davos, da Netflix aos comitês de ESG das grandes corporações, das ONGs às big techs, é só chibata. O Oeste entrou num piro dramático de autoflagelação para expiar os pecados capitais denunciados pelos cavaleiros woke identitários, pela turma de movimentos como Antifa e Black Lives Matter. Nas universidades e na imprensa, a civilização ocidental é frequentemente apontada como produtora de exploração impiedosa e desigualdade social, berço de impérios colonialistas carniceiros, racista e criadora de estruturas que subjugam as mulheres e as minorias.

Em 2050, China e Rússia terão uma redução de nada menos que 20% no número de pessoas com capacidade produtiva

Dado o contexto, parece elementar presumir que o farol do Ocidente está com os dias contados. O Império Americano vai ruir em breve. Os Estados Unidos se tornarão apenas uma sombra do que já foram. E, com os Estados Unidos definhando, todo o ideário ocidental fica à míngua, o Oeste vira História, sem futuro.

Podemos encomendar o mausoléu, certo? Calma. Respire fundo. Conte até dez.

Em primeiro lugar, convém considerar que são os jovens e os imigrantes que têm potencial, energia e disposição ao risco para construir um futuro próspero, com inovação, dinamismo e capacidade de atração de talentos. Em 2050, China e Rússia terão uma redução de nada menos que 20% no número de pessoas com capacidade produtiva, segundo projeções da ONU. Em contraste, os Estados Unidos, de acordo com o mesmo estudo, verão sua população em idade ativa crescer 12% — sem o fator imigração, o país teria uma redução de 4,5% no número de indivíduos economicamente ativos.

Diz o escritor indiano-norte-americano Fareed Zakaria, em artigo para o jornal The Washington Post: “Imigração significa uma economia mais robusta. Os Estados Unidos têm administrado a imigração melhor do que a maioria dos outros países. Recebe pessoas de todos os lugares, elas são assimiladas e integradas ao tecido da sociedade, e os novos imigrantes sentem-se tão motivados quanto os velhos”.

Hoje, cerca de 15,5% da população norte-americana é composta de imigrantes — são mais de 50 milhões de pessoas. A China tem pouco mais de 1 milhão de imigrantes, o equivalente a 0,07% da população. O passaporte azul continua tendo um valor infinitamente superior ao do passaporte vermelho. E isso se reflete no interesse pelo aprendizado do idioma. No mundo, mais de 700 milhões de cidadãos têm inglês como segunda língua. No caso do mandarim, são 180 milhões.

Além dos dados relacionados à imigração, a conta do PIB per capita também precisa ser considerada. Embora a economia chinesa, como um todo, vá superar a norte-americana na próxima década, a geração de riqueza por indivíduo continuará muito maior nos Estados Unidos: em 2050, vai transpor a faixa dos US$ 80 mil por ano, ante pouco mais de US$ 20 mil na China.

No campo da disputa por corações e mentes, os US$ 10 bilhões que o Partido Comunista Chinês gasta por ano na difusão da cultura do país não têm sido suficientes. Aulas de kung fu para jovens africanos e conferências sobre a sabedoria confucionista em universidades ocidentais geram interesse, óbvio, mas não parecem ter o poder de mudar o tal do mindset. Ou você imagina que em Buenos Aires ou Kampala, em Johannesburgo ou Jacarta, a pré-estreia de um filme como A Batalha do Lago Changjin, a mais bem-sucedida produção chinesa de 2021, atrairá um público maior que o lançamento do novo Batman?

Um grupo de analistas internacionais acredita que as aspirações chinesas de dominação mundial podem estar sendo anabolizadas pela maior parte dos observadores — sem má-fé, apenas pelo alarmismo atávico dos que atuam no métier. Segundo essa interpretação contrária ao senso comum, a China estaria mais interessada em assegurar sua ascendência estratégica no leste da Ásia e ampliar seus negócios com todos os países, independentemente do eixo de influência ao qual estejam associados, do que em criar uma nova ordem planetária. O mencionado “novo modelo de governança global” seria um alerta retórico para o Ocidente não criar dificuldades e deixar o país expandir seu comércio sem travas, como regulações ambientais impeditivas.

Fatos e dados sobre a mesa, é bastante provável que os Estados Unidos sigam como o farol do mundo, malgrado o eventual ocupante da Casa Branca, hoje e no futuro — nesse sentido, a guerra na Ucrânia pode até fortalecer a aliança ocidental liderada pelo país e trazer a China para perto. Para uma certa classe média alta bem-pensante, que tem o luxo de discutir os prognósticos distópicos para a civilização ocidental entre taças de pinot noir, os Estados Unidos podem até estar caminhando para o desfiladeiro. Mas, para quem quer produzir e gerar riqueza, viver em liberdade e educar bem os filhos, a América é e será por muitos e muitos anos o melhor lugar. Até porque, embora milhões de indivíduos se submetam contingencialmente a regimes autoritários, a vocação para ser livre está no DNA da nossa espécie. 

Kaíke Nanne é jornalista. Foi publisher nos grupos Abril, Time Warner e HarperCollins. Atuou como repórter, editor e diretor em diversas publicações, entre elas Veja, Época, Playboy, Claudia e Oeste

Leia também “Para que correr tanto?”

Kaíke Nanne,  jornalista - Revista Oeste


quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Horror sem fim - Rodrigo Constantino

Se diante desse povo todo nas ruas, a narrativa oficial vai insistir em tratá-lo como um bando de lunáticos fascistas, como haverá possibilidade de contemporização?  

 Quem tem certa idade há de lembrar do filme A Guerra dos Roses, de 1989, em que Michael Douglas e Kathleen Turner interpretam um casal que decide se divorciar após quase duas décadas junto. O problema é que ambos desejam permanecer com a luxuosa mansão em que vivem, sem ceder um milímetro sequer. Permanecendo no mesmo local, uma guerra se inicia para um tentar expulsar o outro. Em vez de um fim horroroso à união, eles optam por um horror sem fim.
Manifestações do Dia da Independência | Foto: Montagem com fotos de Josemar Gonçalves/AGIF e Agência de Fotografia//Estadão Conteúdo
Manifestações do Dia da Independência | Foto: Montagem com fotos de Josemar Gonçalves/AGIF e Agência de Fotografia//Estadão Conteúdo 
 

Divórcios podem se tornar brigas bem feias mesmo. Não obstante, creio que a imensa maioria prefira colocar um ponto final quando não há mais nenhuma possibilidade de convívio amigável e civilizado a permanecer preso num inferno sem nenhuma perspectiva de término. Por mais traumática que seja uma ruptura definitiva, ela ainda parece melhor do que o castigo imposto por Zeus a Prometeu, que amanhecia com seu fígado regenerado apenas para ser devorado novamente pela águia por toda a eternidade.

Muitos temem uma ruptura institucional no Brasil. Lamento informar, mas ela já ocorreu. Não temos um Supremo Tribunal Federal que atua como guardião da Constituição, mas sim uma Corte em que alguns membros praticam o mais escancarado ativismo político, promovendo censura, perseguição, intimidação e até prisões arbitrárias. O país mergulhou num estado policialesco, e isso tem ligação direta com a postura de certos ministros, que mais parecem um partido de oposição ao presidente Bolsonaro, eleito com quase 58 milhões de votos.

Milhões de brasileiros foram às ruas nesse feriado do 7 de Setembro externar essa revolta, pedir liberdade e clamar por respeito à Constituição. A imprensa, igualmente militante, chamou o ato de “antidemocrático”, fingiu não ver a multidão presente nas principais cidades e rotulou como golpista o evento inteiro. Patriotas com suas famílias em verde e amarelo cobrando respeito às leis passaram a representar uma ameaça à democracia, enquanto socialistas de vermelho pedindo ditadura do proletário viraram democratas.

Está tudo invertido em nosso país. E os ministros supremos, como já ficou claro, não vão recuar, e sim dobrar a aposta. Mergulharam demais nesse ativismo, e pela postura intransigente de Bolsonaro, que conta com amplo apoio popular e garante que só sai morto dali, fica claro que um dos lados terá de vencer esse cabo de guerra, o que significará para o outro uma derrota fatal. Quem piscar primeiro está fora da casa!

Seria um caso único na história de impeachment por excesso de apoio popular!

Os moderados pedem diálogo, mas infelizmente ele parece inviável. “Não é possível discutir racionalmente com alguém que prefere matar-nos a ser convencido pelos nossos argumentos”, alertou Karl Popper. O filósofo liberal acrescentou: “Não devemos aceitar sem qualificação o princípio de tolerar os intolerantes, senão corremos o risco de destruição de nós próprios e da própria atitude de tolerância”. É um truísmo, mas o problema é quando cada lado encara o adversário como o intolerante. Se essa é a premissa, a guerra parece inevitável.

Ora, se, diante desse povo todo nas ruas, a narrativa oficial vai insistir em tratá-lo como um bando de lunáticos fascistas, como haverá possibilidade de contemporização? O que já ficou claro para muitos é que o “sistema” simplesmente não aceita a existência política da direita conservadora. O lado de lá deseja simplesmente exterminar a existência dos conservadores. É uma luta pela simples sobrevivência, pela liberdade básica de existir e se manifestar. Não há mais escolha. É como Churchill profetizou sobre o esforço de apaziguamento com nazistas: tiveram de escolher entre a desonra e a guerra, escolheram a desonra, e terão a guerra.

Leandro Narloch, um liberal moderado e crítico de Bolsonaro, escreveu na Folha de S.Paulo: “É fácil tomar como loucos e inebriados por fake news os brasileiros que chamam o STF de vergonha nacional. Mais difícil é fazer uma autocrítica e admitir que diversos ministros do Supremo tomaram atitudes para lá de vergonhosas”. Ele diz que os abusos e as ilegalidades do Supremo dão força ao bolsonarismo, suas decisões políticas reavivam um apoio mesmo de quem já começava a se arrepender ou abandonar o barco.

Diante do mar de gente nas ruas, o establishment achou adequado subir o tom e falar em impeachment, não de Alexandre de Moraes, mas de Bolsonaro! 
Seria um caso único na história de impeachment por excesso de apoio popular! 
A elite esquerdista quer uma democracia de gabinete, sem povo, mas resta combinar com este, que se recusa a ficar em casa calado. Se forem adiante com um golpe escancarado desses, acham mesmo que aquela multidão toda vai engolir passivamente o sapo barbudo? Teremos uma convulsão social, quiçá uma guerra civil mesmo. Alguns parecem torcer pelo pior, para finalmente apontarem alguma medida autoritária concreta do presidente, até aqui jogando dentro das quatro linhas da Constituição — ao contrário de seus adversários.
 
A multidão nas ruas dificultou o possível golpe da urna eletrônica. A esquerda errou ao convocar manifestação no mesmo dia, pois ficou evidente demais o contraste entre ambas. [a esquerda tentou realizar  em 12 de setembro uma manifestação contra o Brasil e contra o presidente Bolsonaro - a favor dos inimigos do Brasil - mas fracassou vergonhosamente, apesar do apoio maciço da mídia militante perdeu por 1.000 a 0. 
Em tempo: este Post do Constantino foi escrito em 10 de setembro, portanto, não considera alguns ajustes ocorridos, pós 12 de dezembro  = os inimigos do Brasil começam a se enquadrar, timidamente, mas muitos já pensam se ficam de quatro ou de joelhos.]
Como alguém vai acreditar que o ex-presidente corrupto tem uma vantagem tão grande nas pesquisas, observando seu apoio minguado e inexpressivo, enquanto Bolsonaro arrastava milhões pelo Brasil todo? 
Em desespero, querem derrubar já Bolsonaro ou torná-lo inelegível. Mas acham mesmo que o povo vai tolerar isso? “Sob um governo que aprisiona qualquer pessoa injustamente, o verdadeiro lugar do homem justo é na prisão”, constatou Henry David Thoreau, autor de Desobediência Civil. “Se uma lei é injusta, um homem está não apenas certo em desobedecê-la, ele é obrigado a fazê-lo”, defendeu Thomas Jefferson, um dos pais fundadores da América. “Ninguém é obrigado a cumprir ordem ilegal, ou a ela se submeter, ainda que emanada de autoridade judicial. Mais: é dever de cidadania opor-se à ordem ilegal; caso contrário, nega-se o Estado de Direito”, escreveu em seu voto no STF o relator ministro Mauricio Corrêa, em 1996.

Esticaram demais a corda? Isso é o mínimo que dá para dizer. Muitos acham que ela já se rompeu. Enquanto o povo tomava as ruas para pedir liberdade e respeito às leis, Moraes determinava nova ordem de prisão ao jornalista Oswaldo Eustáquio e detinha de forma irregular o americano Jason Miller no aeroporto para horas de interrogação. Qual o crime ou a suspeita de crime do CEO da rede social Gettr, que foi ao Brasil participar do CPAC, o maior evento conservador do mundo? Resposta: apoiar “atos antidemocráticos”. Como Moraes, assim como a imprensa, considera todo ato a favor de Bolsonaro como antidemocrático, fica claro que qualquer um dos milhões de brasileiros ali presentes pode ser detido para prestar esclarecimentos. Diabos, até uma conversa de bar pode render inquérito policial agora, se o tom das críticas ao ministro for elevado demais!

No dia seguinte ao gigantesco ato bolsonarista, o ministro Fux se dirigiu ao povo brasileiro. “Eu conclamo os líderes desse país que se dediquem aos reais problemas do nosso povo: a pandemia, que ainda não acabou, o desemprego, a inflação e a crise hídrica”, disse o ministro. Quantos votos teve Fux para decidir pelo povo quais as suas prioridades? 
Seria impensável um justice da Suprema Corte americana se dirigir ao povo falando em nome do povo e apontando as prioridades do povo, pois juiz constitucional não tem representatividade popular, não é essa sua missão. Mas nossa mídia encara Fux como um estadista.

Não pode restar dúvidas: os “donos do poder” querem Bolsonaro fora do poder. Eles contam com a imprensa em geral, com sindicatos, com ONGs, com a ditadura chinesa, como o STF, com artistas e intelectuais. Eles só não têm mesmo o povo ao seu lado. Este está em peso ao lado de Bolsonaro. E essa elite declarou guerra ao povo. Não se deseja um fim horroroso. Mas é preciso ser realista: a alternativa é um horror sem fim.

Leia também “Os cúmplices de Castro”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste 

 

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Sobre o Poder - Merval Pereira

O Globo

Elogiar ministro é um perigo

O livro “A cadeira da águia”, do escritor mexicano Carlos Fuentes, tem uma ótima citação de Stálin que serve como uma luva na disputa em curso entre o presidente Bolsonaro e seu ministro da Saúde Mandetta. Digo “em curso” porque não acredito que o presidente Bolsonaro se recolha diante da impossibilidade de impor sua vontade. Tentará novamente.

Na década de 30 do século passado, relata Carlos Fuentes, um assessor  do líder soviético gritou ao ser elogiado por seu trabalho: “Por favor, não me elogiem! Não me mandem para a Sibéria”. A insegurança de líderes autoritários, sejam de esquerda ou de direita, é recorrente na história da civilização, e estamos vendo uma repetição dessa eterna disputa de poder, real ou imaginária.

Muitos ministros de Bolsonaro se incomodam com os elogios, pois sabem que podem ter problemas com o capitão. Para compensar, alguns começam a elogiar Bolsonaro e a concordar com ele pelas redes sociais, que é onde o registro vale de verdade para o presidente e seus acólitos.
Esse temperamento inseguro do presidente tem rendido comentários e memes nas mesmas redes sociais, tão valorizadas pelo próprio presidente, que revelam a percepção das angústias de Bolsonaro. O que mais esteve presente nas redes durante essa crise foram brincadeiras sobre os ministros mais criticados de seu governo, como o da Educação Abraham Weintraub, o chanceler Ernesto Araújo ou o do Meio Ambiente Ricardo Salles. 
“Se começarmos a elogiar o Weintraub, será que ele cai?”, é um exemplo do humor cáustico das redes sobre o comportamento nada errático do presidente, que protege os que são “perseguidos” pelos “jornalistas esquerdistas”, e coloca na sua mira os ministros que são elogiados. Se seus “inimigos” gostam deles, é porque não são confiáveis. 

O caso do ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antonio é o mais enigmático de todos os que Bolsonaro protege. Acusado de crime eleitoral como coordenador de um esquema de candidaturas “laranjas”, ele jamais foi incomodado por Bolsonaro, que se jacta de não aceitar corrupção em seu governo. O fato de a acusação se referir à período anterior ao seu mandato presidencial não explica essa leniência, pois quando escolhido o ministro já respondia a esses questionamentos. O fato é que o presidente Bolsonaro lida diariamente com essas angústias que lhe comem as entranhas, situação exacerbada depois que  levou a facada durante a campanha eleitoral. Na ocasião, seu filho Carlos já tuitara dizendo que havia gente no entorno de seu pai que queria sua morte com objetivos políticos, referindo-se claramente ao vice Hamilton Mourão.

Essa paranóia alimentada pela mente tumultuada de Carlos e seus dois irmãos persegue o presidente, e é impossível imaginar que possa ser tutelável. O general Vilas Boas, que uma vez me disse que o candidato Bolsonaro era “incontrolável”, recentemente foi mais cerimonioso numa entrevista e disse que “ninguém tutela o presidente”. De fato, não é bom um presidente tutelado por militares. Mas também não é bom ter um presidente que coloca em risco a população que governa com decisões sem bases legais ou jurídicas. Não se elege um ditador, mas um chefe de Estado que aceita as regras do jogo democrático. Nela, os poderes se contrapõem e se controlam mutuamente.

Não aceitar essa premissa, e tentar mudar as regras do jogo que o colocaram no poder através de manipulação da opinião pública, coloca o presidente eleito em uma rota de ilegalidade que em algum momento vai cobrar consequências.  Um artigo importante, assinado por um grupo de juristas no Globo Online de ontem, define bem os limites presidenciais numa democracia: “Um presidente da República está limitado pela ciência — porque está limitado pela realidade. Não pode decretar que o sol nasça no poente e se ponha no nascente. Não pode negar evidências científicas seguras, tampouco orientar que sua administração assim o faça”.

Isso quer dizer que o presidente Bolsonaro não pode nem decretar que a  terra é plana, embora possa acreditar nisso, nem dar fim à quarentena sem apoio de bases cientificas. [nenhuma das medidas foi adotada, ou tentada, pelo Presidente da República, JAIR BOLSONARO.] Uma frase atribuída ao chefe do gabinete  Civil do governo Geisel, Golbery do Couto e Silva, define bem a situação: “Há três tipos de poder, o que você acha que tem, o que os outros acham que você tem, e o que realmente você tem.”

Merval Pereira, jornalista - O Globo


segunda-feira, 22 de abril de 2019

As próximas jogadas supremas

O Supremo Tribunal Federal não vai parar apenas na permissão para que o prisioneiro Lula conceda entrevistas (afinal, ficou decidido, consensualmente com o jogo de pressão da sociedade, que a liberdade de expressão vale para todos, inclusive para o chefão petista). Preparem a alma para as próximas ousadias e travessuras supremas. O bicho vai pegar e vai ser pego... É dialético...

O STF tem grandes chances de conceder um habeas corpus para Lula, antes mesmo de definir se segue valendo, ou não, a prisão após decisão de órgão colegiado em segunda instância judicial. Vários condenados da Lava Jato estão no privilegiado regime de prisão domiciliar. Por isso, tem ministro no STF indagando: por que Lula (também) não pode ficar “preso” em casa?

E a entrevista de Lula? Pode ser interessante. Ele tem uma chance de encenar uma oposição ao governo, fazendo cobranças ao Presidente Jair Bolsonaro. Se Lula não fizer isso, aí sim, vai se condenar ao cantinho mais medíocre da História. Se fizer críticas construtivas ou destrutivas, ajudará Bolsonaro a governar privando-o da solidão dos elogios dos puxa-sacos (que, quase sempre, conduzem um governante ao desastre). Assim, quem sabe, a gente escapa, definitivamente, do risco de sofrer repetições do modo Dilma ou Temer de governar...

Tudo que a cúpula do STF fez até agora – gerando polêmicas dentro e fora do Judiciário indica que a Corte entrará em uma fase de “liberou geral”. A casa vai cair para quem não tiver capacidade, sensibilidade e poder para suportar a subida infernal de pressão na guerra de todos contra todos. Quem sobreviver verá... Quem não agüentar poderá “pedir para sair”... A Gestapo que se cuide, pois será forçada a experimentar do próprio veneno... A previsão é de clima de Estado de emergência...
Mas é bom ficar esperto, porque a tendência libertadora também dará lugar a uma onda repressora. Se pau que der em Chico também der em Francisco, muito malandro que hoje está soltinho da silva tende a ser preso. A Polícia Federal nunca investigou tanto. Os delatores premiados devem ganhar mais protagonismo, revelando provas objetivas que justifiquem novas prisões e algumas solturas.

O jogo brutal é para águia e não para pombinho... É missão para samurai e não para gueixa... A estratégia é para ideólogo e não para 171 acadêmico... A tática é para quem tem coragem e honra para agir com respeito, disciplina e ordem. A guerra de todos contra todos vai longe... Só vai valer chute do pescoço para cima... Na guerra, no entanto, temos lances dialéticos... O Instituto de Gilmar Mendes promove a sétima edição de seu Fórum Jurídico em Portugal, e a maior estrela é Sérgio Moro. Curiosamente, o Ministro da Justiça de Bolsonaro é uma das figuras mais criticadas pelo polêmico supremo magistrado... Sabe o que isto significa? 

Pensa...
No mais, o Flamengo conquistou seu 35º título de Campeão Carioca, e o Corinthians faturou seu 30º Paulista. Além da alegria das grandes torcidas, sabe o que isto significa politicamente? Nada...

Releia o artigo de domingo: O Supremo Coelhinho da Páscoa