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segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

A Chernobyl pessoal de Bolsonaro - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

A pandemia já matou no Brasil três vezes mais gente que a radiação liberada pela explosão do reator nuclear de Chernobyl, da União Soviética, desde 1986. Segundo um artigo do “International Journal of Cancer”, as mortes ficaram entre 30 mil e 60 mil 
[em 2020,  de 1º janeiro 2020 a  15 de outubro de 2020, morreram no Brasil de infarto, AVC, outras doenças cardiovasculares, 352.000 PESSOAS - dados que podem ser apurados em Cartórios de Registro Civil;
segundo a mesma fonte, de 1º janeiro 2020 a 15 de setembro 2020, morreram no Brasil mais de 160.000 pessoas vitimadas das doenças respiratórias, digamos, tradicionais: tuberculose, edema pulmonar, enfisema, insuficiência respiratória - todas sem ligação com a covid-19.]

Conduta de Bolsonaro diante do coronavírus guarda semelhança com a dos soviéticos em Tchernóbil

Em abril, o general Luiz Eduardo Ramos disse o seguinte:

“No jornal da manhã, é caixão, corpo; na hora do almoço, é caixão novamente. No jornal da noite, é caixão, corpo e número de mortos. (...) Não tá ajudando. Ninguém aqui está dizendo que tem que esconder. Os senhores (jornalistas) têm que também... Eu conclamo e peço encarecidamente, tem tanta coisa positiva acontecendo”.

(..........)

A pandemia já matou no Brasil três vezes mais gente que a radiação liberada pela explosão do reator nuclear de Chernobyl, da União Soviética, desde 1986. Segundo um artigo do “International Journal of Cancer”, as mortes ficaram entre 30 mil e 60 mil.

Apesar das enormes diferenças entre as duas tragédias, a conduta pessoal do capitão Bolsonaro e dos generais Ramos e Pazuello diante do coronavírus guarda uma triste semelhança com a reação dos comissários soviéticos em Chernobyl.

A explosão ocorreu na madrugada de 26 de abril de 1986. Quando o chefe da Defesa Civil da usina mostrou ao diretor que a radiação chegara a níveis intoleráveis, o burocrata expulsou-o da sala: “Seu medidor está quebrado”. Pela manhã, o vice-presidente do conselho de ministros disse que religaria o reator, e o ministro da energia da Ucrânia explicou-lhe:
— Não existe mais reator.
— Você é um alarmista — respondeu o comissário.
“Não vai ser uma gripezinha que vai me derrubar”, disse Bolsonaro, em março, quando 165 pessoas já haviam morrido. Dias antes, ele dissera que a pandemia reconhecida pela Organização Mundial da Saúde “não é isso tudo que a grande mídia propala ou propaga pelo mundo todo”. [qualquer especialista sério - muitos perdem tal condição quando estão sendo entrevistados como especialistas - confirmará que a taxa de contágio da covid-19 é inferior a da gripe comum = influenza = sazonal.
A atual taxa de contágio, R0, da covid-19 é de 1,02 e a da influenza 1,2.]

O negacionismo seguiu cursos diferentes na fase seguinte, ambos estimulando a inércia. Em Chernobyl, quando o chefe da Defesa Civil mencionou a necessidade de evacuar a população da cidade, um comissário da região foi breve: “Sente-se. Isso não é da sua conta”. O Ministério da Saúde concordava com ele.

Em Pindorama, Bolsonaro chamou os governadores que defendiam o isolamento social de “destruidores de empregos”, e o general Pazuello ainda acha que não se deve falar nisso.  A cidade próxima ao reator Chernobyl só foi evacuada no dia seguinte. Trinta e seis horas depois da explosão não haviam sido disparadas as medidas previstas nos protocolos da Defesa Civil. Vídeos mostram cenas de um casamento e de vida normal em vários lugares.

Quando Bolsonaro falava em gripezinha, o presidente mexicano, Manuel López Obrador, dizia que a Covid “não equivalia a uma gripe”, e o primeiro ministro inglês, Boris Johnson, desdenhava o perigo. Johnson foi parar numa UTI, abandonou o negacionismo e pediu desculpas por ter dado informações erradas. Obrador orgulhosamente anunciou seu plano de imunização dos mexicanos, começando neste mês pelos profissionais de saúde.

Como os burocratas soviéticos, Johnson e Obrador pensavam que mandavam e disseram besteiras, mas corrigiram-se. Bolsonaro ainda não entendeu o que está acontecendo e continua brincando com os diminutivos. No dia em que o número de mortos pela “gripezinha” havia chegado a 179 mil, com a média móvel em alta, ele disse que “estamos vivendo um finalzinho de pandemia”.

(............)

BRETAS E NYTHALMAr
Só o juiz Marcelo Bretas sabe quão próximas eram suas relações com o advogado Nythalmar Dias Ferreira. Surfando a onda da Lava-Jato, esse doutor formou um plantel de clientes que foi do ex-deputado Eduardo Cunha ao empresário Fernando Cavendish.

Dependendo da proximidade, Bretas precisará de um bom advogado. Nythalmar é investigado pela Polícia Federal e poderá achar conveniente colaborar com a Viúva. Não seria desejável que o magistrado deixasse a narrativa em mãos alheias.

Os De Gaulle e os Kennedy
É excelente a biografia do general Charles De Gaulle (1890-1970) escrita por Julian Jackson. Ele governou a França por dez anos, até 1969. Tinha uma filha e um filho longe da política. Outra filha, Anne, nasceu em 1928 com síndrome de Down. Mal enxergava e não falava. De Gaulle nunca se afastou dela, e os dois brincavam por horas.

Já o milionário americano Joseph Kennedy mandou sua filha Rosemary, uma adolescente com distúrbios nervosos, para ser submetida a uma lobotomia. Deu tudo errado. Anne De Gaulle morreu em 1948. “Agora ela ficou como as outras”, disse De Gaulle. Um ano depois, Rosemary Kennedy foi escondida numa casa de religiosas. Ela sobreviveu aos pais e aos irmãos John e Robert. Morreu em 2005, aos 86 anos.

Folha de S. Paulo - Jornal O Globo - Elio Gaspari, jornalista

 

sábado, 24 de agosto de 2019

Proteger a Amazônia - Merval Pereira





O Globo 

A mobilização do mundo em relação às queimadas da Amazônia deve-se à inabilidade da retórica, muitas vezes seguida de atos concretos, do governo brasileiro em relação ao meio-ambiente, desde o início do mandato de Bolsonaro. O governo brasileiro, se tivesse o mínimo de inteligência política, e compreensão da inter-relação das economias num mundo globalizado, tinha feito algo desde o início da estação de seca na região, sem dar chance a que a França usasse as queimadas para tentar boicotar o acordo da União Européia com o Mercosul.

[Detalhes que não podem ser esquecidos:

- os franceses não são confiáveis; em 1982, na Guerra das Malvinas, (Argentina x Inglaterra) a França forneceu misseis Exocet aos 'hermanos' e os argentinos afundaram navios ingleses.

Só que,  traiçoeiramente,  os franceses passaram para os ingleses os códigos dos 'exocet' e com isso deixaram os argentinos totalmente incapacitados de se defender e atacar os ingleses, tanto que perderam a guerra.

- Ameaça militar não impressiona o Brasil;

nossas FF AA não estão bem preparadas, bem equipadas - o descaso com o poderio bélico tem sido uma constante no Brasil, mas, a vastidão territorial favorece ações de defesa e eventuais agressores não podem usar armas nucleares (querem preservar a Amazônia e isto os impede de utilizar armamento nuclear ou mesmo bombardeios convencionais de grande intensidade). Não é um bom caminho para os 'donos' do Mundo.

- parar de comprar produtos brasileiros - carne e alimentos do agro negócio -  não é tão simples para os boicotadores. Vão comprar de quem? se seus agricultores tivessem condições imediatas de atendê-los, de há muito não comprariam do Brasil. E,. caso vendam toda sua produção para os países que boicotarem o Brasil, vai ser insuficiente e mais grave é que outros países terão que buscar novos fornecedores e o Brasil tem

Todos tem que comer todo dia (é um 'hábito' que não pode deixar de ser  cumprido,  até por nós, brasileiros, imagine os europeus e outros.), assim, terão que se curvar, mais rápido do que imaginam, diante do Brasil. Poder militar não funciona quando há interesse em preservar o alvo = Amazônia, rebanhos brasileiros e grãos.

Temos que preservar a Amazônia e todo o meio ambiente, mas, sem aceitar regras impostas pelos estrangeiros e cujo objetivo é: impedir que o Brasil alcance o primeiro lugar no mundo como fornecedor de alimentos.]

A decisão que o presidente anunciou ontem, de mandar o Exército para a região das queimadas para ajudar a combatê-las e a reprimir as ações ilegais, e criar uma espécie de gabinete de crise para acompanhar os acontecimentos, deveria ter sido tomada logo que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) alertou para o aumento das queimadas.   Ao invés disso, o governo resolveu desmoralizar o instituto, um dos centros de excelência da ciência brasileira, reconhecido mundialmente. Brigou contra os fatos, como está se vendo agora.  Antes, já tinha brigado com os governos da Noruega e da Alemanha por divergências sobre a utilização do Fundo Amazônia, exemplo de cooperação internacional sadia para ajudar a luta pelo meio-ambiente. Os doadores do Fundo estavam satisfeitos com sua atuação e, por questões políticas, o governo Bolsonaro resolveu intervir.

 Não é possível no mundo atual ser contra a atuação das ONGs, organizações civis que representam o interesse da sociedade em escala internacional. [a maior parte das ONGs representa os interesses de quem 'doa' mais para sustentar a 'luta'.

A troco de grana elas desrespeitam soberania, interferem em investigações policiais, fazendo o que quem as sustenta, manda fazer.]  O governo Bolsonaro, que é contrário ao que chama de mundialização, pretende limitar a ação das ONGs, considerando-as braços intervencionistas de potências estrangeiras.

Fiscalizá-las, como faz através do BNDES, que gere o Fundo Amazônia, é perfeitamente normal, mas não culpá-las irresponsavelmente pelas queimadas, ou transformá-las, no conjunto, em representantes da cobiça internacional. Evidente que França e outros países da Europa estão defendendo seus agricultores, o acordo representa uma disputa difícil para eles, pois a agricultura brasileira é moderna e competitiva. O Brasil é um player internacional importante, e precisa tomar todos os cuidados possíveis para não dar margens a boicotes e afirmações falsas.

O problema é que Bolsonaro não vive neste mundo. Tem uma visão retrógrada e ultrapassada de patriotismo, quando uma verdadeira defesa da Amazônia deveria ser a ocupação econômica, explorando sua imensa biodiversidade.  O Professor Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências, em palestra na Academia Brasileira de Letras, a respeito dos desafios para o futuro do Brasil, lembrou que quando a União Soviética lançou o sputink, os EUA entraram em pânico.

Kennedy então anunciou o novo programa espacial para enviar o homem à Lula. E advertiu, numa frase que ficou famosa no
Moon speech: “Vamos fazer isso não porque é fácil, mas porque é difícil”.  Para concretizar o projeto, mudaram o perfil da educação no país, o da indústria também, e em nove anos colocaram o homem na lua.  Para Davidovich, um programa mobilizador para o Brasil deveria ser a exploração da nossa biodiversidade. Nós temos cerca de 20% da biodiversidade mundial, e só conhecemos 5% dessa  “fonte de riqueza fantástica”. Tanto em terra quanto no mar, lembrou Davodovich.

Contou que na Amazônia existe uma planta da qual se extrai a bergenina, que tem poder antiinflamatório muito grande, e é também antioxidante. Os laboratórios Merck vendem no Brasil a bergenina purificada por mil reais o miligrama. O preço do ouro é 125 reais o grama. Um miligrama de bergenina vale, portanto, 8 mil vezes mais do que o miligrama do ouro.  O mundo está se preparando para a Sociedade 4.0, alertou com exemplos Davidovich. Segundo ele, na África Meridional cresce o cultivo da soja, uma das nossas mais importantes commodities, especialmente porque a China está comprando terras. A soja africana sairá mais barata que  brasileira, no mínimo devido ao frete.

Também a carne, outro produto de exportação brasileira, pode estar a perigo, pois já há pesquisas avançadas nos Estados Unidos para fazer carne sem matar animais, produzida no laboratório a partir da célula do animal, usando tecnologia de célula tronco. A China também investe em uma tecnologia de carne de laboratório de Israel, que tem três empresas de carne celular. Devastar a Amazônia para explorar madeira ou para pastagens é mau negócio no longo prazo. [não se aumenta a área para agricultura e pecuária - de forma controlada 

(de acordo com o Banco Mundial, mais de 90% da Amazônia estão intactos)
 - e ficarem esperando pela carne celular e resultados de outras pesquisas que podem levar anos e anos para chegar a algo que substitua a carne tradicional;
enquanto não descobrem substitutos para a carne e produtos agropecuários, se come o que?

Merval Pereira,  jornalista - O Globo 


domingo, 9 de outubro de 2016

Temer não é ilegítimo, é caótico [mas, é bem melhor que Dilma]

Em agosto do ano passado, o então vice-presidente Michel Temer apresentou-se como candidato ao lugar de Dilma Rousseff dizendo que “a grande missão, a partir deste momento, é a da pacificação do país, da reunificação do país”. Em maio, já pintado para a guerra, dizia que “é preciso alguém que tenha a capacidade de reunificar a todos”. 

Na Presidência, o doutor e sua caravana de sábios decidiram torrar dinheiro da Viúva com uma campanha publicitária essencialmente política, falando bem de si e mal do governo de sua antecessora e companheira de chapa. Nessa gastança, prometeu: “Vamos tirar o Brasil do vermelho para voltar a crescer”. Ao pisar no Planalto, Temer demitiu um garçom e agora vangloriou-se de ter extinguido “4,2 mil cargos de confiança”. Na realidade, em junho ele prometeu cortar os cargos comissionados, mas entre junho e julho demitiu 5,5 mil servidores e contratou 7,2 mil. 

Atitudes desse tipo nada têm a ver com pacificação ou reunificação. Servem apenas para estimular o clima de gafieira que Temer herdou do petismo. A caravana do Planalto não está pacificando coisa alguma. Dedicou-se a flertar com o mercado, ameaçando a sociedade com aumento de impostos. Anunciou uma reforma da Previdência sem detalhá-la, transformando em campo de batalha o tema quase consensual da necessidade da elevação da idade mínima para a aposentadoria. 

A fábrica de fantasmas do Planalto soltou a alma penada de uma reforma trabalhista, sempre em termos genéricos, e logo depois recuou. Conseguiu arrumar confusão até mesmo num serviço banal como a escolha do filme que representará o Brasil na disputa pelo Oscar.
Temer e Henrique Meirelles apresentam-se como campeões da austeridade porque patrocinam uma emenda constitucional que limitará os gastos públicos. Por enquanto, isso é pura parolagem. O que contém gastos é a decisão de não gastar. Se lei equilibrasse orçamento, a da responsabilidade fiscal teria impedido as pedaladas petistas, e a renegociação das dívidas dos estados, ocorrida durante o tucanato, teria impedido a situação de falência em que estão hoje estados e municípios, todos aliviados por Temer.

O governo de Michel Temer não é ilegítimo, é caótico. Inventa encrencas, deforma temas e produz fantasmas. Na hora de a onça beber água, acha que seu problema é de comunicação e decide fazer uma campanha publicitária para que o povo, esse eterno bobalhão, aprenda o que é melhor para ele. 

O PMDB comemorou a derrota
O PMDB festeja a ruína petista fazendo de conta que não percebeu o tamanho da própria derrota. Perdeu a prefeitura do Rio e caiu nos últimos metros da corrida em São Paulo. Tinha 1.015 prefeituras, ganhou outras 13, porém, perdeu mais de 3,5 milhões de votos.
Michel Temer convive com índices amargos de desemprego, de produção industrial e de popularidade. Ele pode atribuir o desemprego e a contração da indústria a uma herança maldita, mas não pode descarregar em Dilma Rousseff a queda da aprovação de sua maneira de governar (31% em julho, 28% neste mês).

As coisas vão mal, e ninguém ganha se elas piorarem, mas a charanga do Planalto acredita que o quadro pode mudar trabalhando-se a opinião pública. Trata-se de uma fantasia de maus antecedentes. Na Disney de Brasília, acredita-se que o presidente ganha prestígio viajando para o exterior. Vai daí, na sexta-feira o doutor Michel embarcará para a Índia e o Japão. Vale lembrar que José Sarney também acreditou nesse xarope-viagem. Foi quando Fernando Henrique Cardoso cometeu uma de suas frases mais ácidas: “A crise viajou”.

Brasília e Curitiba
Há um ano a situação do governador Tião Viana (PT-Acre) era considerada desesperadora. Ele era acusado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa de ter recebido R$ 300 mil na sua campanha eleitoral, doados por uma fornecedora atraída pelo magnetismo de propinas da Petrobras. 

A doação, encaminhada pela direção do PT, respeitou as exigências da lei e foi declarada à Justiça Eleitoral. A defesa de Viana argumentou que ele nada teve a ver com a história.
Os argumentos da defesa foram aceitos pela procuradora Ela Wiecko, que recomendou o arquivamento do caso. Seu sucessor confirmou a decisão. Na semana passada, o caso foi julgado pelos 15 ministros do pleno da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça e, por unanimidade, mandado ao arquivo.
Outros casos virão

O tesouro da Oi
Os sábios do grupo de trabalho criado pelo governo para negociar a recuperação judicial da Oi precisam ficar espertos com o patrimônio do fundo de pensão dos funcionários da empresa. A ex-SuperTele tem uma dívida de R$ 65,4 bilhões, mas a Fundação Atlântico tem um tesouro de R$ 8 bilhões. Trata-se de um fundo tão saudável que seria fácil depená-lo. 

Quem emprestou dinheiro à Oi, que vá à luta para salvar o seu. Vale tudo, inclusive acrobacias contábeis e conexões políticas, para pedir refrescos ao BNDES. Não é razoável, contudo, que se armem esquemas para avançar no pecúlio de 25 mil trabalhadores. O alerta é necessário, porque, há alguns anos, diretores, burocratas e fornecedores rapaces depenaram o fundo Aerus e deixaram 20 mil aeronautas na rua da amargura. 

Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e nunca poderá se aposentar, pois jamais trabalhou. Defensor da reforma da Previdência, ele vai a Brasília para visitar o triunvirato que comanda as discussões para a reforma da Previdência. Conversará com o presidente Michel Temer, com o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e com o secretário de Governo, Geddel Vieira Lima. Todos defendem a necessária elevação para 65 anos da idade mínima dos trabalhadores em busca da aposentadoria. 

Temer aposentou-se em 1996, aos 55 anos. Em maio passado, ele recebeu R$ 30.613 como procurador inativo do governo de São Paulo. Como presidente ativo da República, recebe R$ 27.841.  O doutor Geddel aposentou-se em 2011, aos 51 anos. Recebe R$ 20.354 como inativo e R$ 30.934 como ministro. Eliseu Padilha aposentou-se ao 53 e está na base da pirâmide dos aposentados do Planalto, com R$ 19.389 mensais.  Eremildo pedirá aos triúnviros da reforma da Previdência dos outros que devolvam à Viúva o que ela lhes paga como servidores aposentados. 

Fila Brasil
A fila de brasileiros que ao desembarcar em Pindorama ficam à espera da fiscalização de seus passaportes no aeroporto de Guarulhos é maior que a dos estrangeiros enfileirados diante dos guichês do Kennedy, em Nova York. No dia em que um americano tiver que penar numa fila para entrar no seu país, o governo terá os seus dias contados. 

A Polícia Federal gostaria de ser substituída nessa fiscalização burocrática. Ela imobiliza agentes que poderiam estar correndo atrás de larápios.

Fonte: Elio Gaspari, jornalista - O Globo
 

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Eduardo Paes e sua realidade própria

O prefeito do Rio vive num mundo que é só dele ou acha que os outros devem acreditar na sua marquetagem

A“ciclovia mais bonita do mundo” foi inaugurada em janeiro por um prefeito seguro de si, capaz de dizer que “todo governante tem inveja de mim. Parte da estrutura desabou na semana passada, duas pessoas morreram, e quando Eduardo Paes reuniu a imprensa para tratar do desastre disse o seguinte: “É óbvio que se essa ciclovia tivesse sido feita de forma perfeita, nós não teríamos essa tragédia, nem esse absurdo. Obviamente você tem problemas aí”.

É óbvio que se Kennedy não tivesse ido a Dallas, não teria morrido.  A manipulação do óbvio ululante é uma arma de dois gumes. No caso da tragédia da ciclovia, há outras obviedades, todas chocantes. É óbvio que se funcionários da prefeitura de Paes tivessem colocado cones de trânsito nos acessos à ciclovia, interditando-a, ninguém teria morrido. Defeitos estruturais são coisa para especialistas, mas ressaca é um fenômeno visível a olho nu. Guarda-vidas interditam trechos de praias. A Ponte Rio-Niterói fecha quando os ventos colocam em risco o trânsito. 
 
Quem se revelou incapaz de perceber o óbvio não foi a audiência de Paes, mas sua prefeitura. Diante do óbvio, seu herdeiro presuntivo, o secretário Pedro Paulo Teixeira, espancou a lógica e disse o seguinte:  “A ressaca não é um fenômeno novo, mas a incidência, naquele ponto, não há duvida de que foi um evento novo”. Ganha uma viagem a Saturno quem souber o que ele quis dizer. Talvez ache que nos eventos velhos a ressaca não atingia aquele ponto do litoral. 

Deixem-se de lado detalhes da empreitada da ciclovia entregue à família de outro secretário de Paes, com seus custos e aditivos. Pedro Paulo tornou-se nacionalmente conhecido por ter batido na mulher. É óbvio que era um assunto privado, apesar de ela ter dado queixa à polícia, uma instituição pública. Não foi o primeiro astro da equipe de Paes a encrencar-se. O secretário da Ordem Pública, Rodrigo Bethlem, disse à ex-mulher que coletava R$ 100 mil mensais em propina. Ela gravou. O ex-“xerife do Rio” saiu de cena e tempos depois Paes disse que “se cruzar com ele, dou uma bordoada”.

Ainda não cruzou, mas em 2013, acolitado por guarda-costas, meteu-se numa briga de restaurante com um mal-educado que o insultara. Talvez seja por isso que as pessoas que lidavam com seu nome numa planilha da empreiteira Odebrecht apelidaram-no “nervosinho”.
Há um Eduardo Paes moderno e outro, arcaico. Juntos, formam um personagem com toques perigosamente trumpescos. O moderno resolveu multar os cariocas que jogam lixo no chão. O arcaico foi a um evento em Sepetiba, comeu uma fruta e atirou longe a sobra. Flagrado num vídeo, disse que jogou o lixo para um assessor, que estaria metros adiante. Acreditasse quem quisesse.

Recentemente, teve um piti num hospital público quando foi buscar atendimento para um filho. Teria dito o seguinte a uma médica: “A senhora está demitida. Não quero mais ouvir sua voz. Aqui não estou falando como cidadão, mas como seu patrão. Não quero mais que você trabalhe para mim”. Ele realmente acha que é patrão dos servidores e não empregado dos eleitores.

É óbvio que, em tese, Paes sabe se comportar. O problema é que às vezes, sob pressão, acha que pode se comportar como quiser. Ele diria que isso “é coisa de pobre”.


Fonte: Estado de São Paulo - Elio Gaspari, jornalista

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

A segunda chance do Brasil

Lincoln Gordon era um clássico liberal da Guerra Fria e, assim como Kennedy, ele viu no Brasil o próximo alvo para uma expansão da Revolução de Fidel Castro nas Américas
Em 2004, Lincoln Gordon escreveu um livro intitulado “A segunda chance do Brasil”, publicado pela Brookings Institution, em Washington. Gordon é mais famoso (ou notório) no Brasil por seu papel como embaixador americano durante o golpe militar de 1964. Ele foi obrigado a escrever um suplemento ao seu livro, em resposta aos novos documentos que vieram a público. Lincoln Gordon morreu em 2009, com 96 anos.
O regime ditatorial brasileiro antecede em uma década a onda de ditaduras que viria dominar a América do Sul, após Pinochet tomar o poder no Chile. Mas o que aconteceu no Brasil, assim como a reação americana ao regime militar brasileiro, provou-se um modelo para as ditaduras seguintes. Lincoln Gordon manteve que o seu objetivo teria sido (por mais bizarro que isso possa parecer) defender a democracia no Brasil, e não destruí-la. [nada de bizarro no pensamento de Gordon – o Governo Militar no Brasil se manteve dentro da democracia, com o pleno funcionamento do Poder Legislativo, através de suas duas casas e o Poder Judiciário em completo funcionamento.
Cumpre reconhecer que em algumas situações excepcionais,  instrumentos legais excepcionais tinham que ser usado, em nome da celeridade na consecução dos objetivos e compromissos do Governo Militar.] Ele sempre argumentou que Jango representava uma ameaça comunista e que isto justificava a maneira pela qual os americanos abraçavam o golpe com entusiasmo.
Lincoln Gordon era um ex-professor de Harvard e assumiu o cargo com ótimas credenciais. Ainda jovem, administrou o Plano Marshall em Londres e em Paris, onde envolvera-se na reconstrução da Europa no Pós-Guerra. Ele seria o principal agente no Brasil para a Aliança para o Progresso de Kennedy. E esta indicação demonstrava o quão central Gordon era para Kennedy e o seu plano de promover uma alternativa democrática.
Ora, Lincoln Gordon era um clássico liberal da Guerra Fria e, como tal, assim como o presidente Kennedy, ele viu no Brasil o próximo alvo para uma expansão da Revolução de Fidel Castro nas Américas. Gordon estava certo sobre uma coisa: o golpe militar não fora só bem recebido pelo governo dos EUA, governado por Lyndon Johnson, mas também por muitos brasileiros, incluindo políticos, que viraram a casaca depois: com o fim do regime militar, grande parte dos seus apoiadores se tornou participante ativa no restabelecimento do novo regime civil, incluindo José Sarney, que apenas mudou a sua posição ao fim da ditadura.
O ex-embaixador era relativamente otimista com relação ao futuro brasileiro em 2004. Achava que o Brasil iria vingar desta vez e baseou-se em uma análise técnica do que o país havia vivido economicamente desde 1964. Mas encerra o livro com uma ressalva: uma reforma política seria necessária para consolidar estes ganhos. Ele não fala em corrupção, mas sobre a estrutura política do país.
O irônico em tudo isso é que a crise atual no Brasil ressurge no momento em que outro democrata liberal e graduado em Harvard está na Casa Branca. Barack Obama não é, absolutamente, um liberal da Guerra Fria como John Kennedy ou Lyndon Johnson.  Ele é muito retraído quando se tratam assuntos exteriores, pelo menos para os seus críticos republicanos, e também, evidentemente, para Vladimir Putin. No entanto, Obama foi o presidente que deu os primeiros passos para encerrar o embargo a Cuba.  A presença americana no Brasil hoje em dia se realiza, para o bem ou para o mal, menos pela Casa Branca, e mais pelas cortes federais e procuradores, todos agindo muitas vezes de forma independente, para não mencionar o papel das agências de crédito.
Eduardo Campos encerrou a sua última entrevista dizendo: “Não vamos desistir do Brasil”. Teria o otimismo de Gordon em seu livro sido deslocado? Certamente, muitas das velhas ambiguidades sobre a democracia no Brasil ressurgiram fortemente. Assim como ressurgiram os velhos males da amnésia coletiva e as posições que certos sujeitos tomaram antes, durante e após o regime militar.
E que também levaram a uma perigosa justificação daqueles que, como Gordon, acreditavam estar defendendo a democracia, enquanto efetivamente a condenavam. Isto mostra, por fim, como a elite brasileira tem uma capacidade infinita de negociar o inegociável e fingir que, ou nada se passou, ou tudo é passado.
Por: Kenneth Maxwell, historiador

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

‘Selma’ forçou a mão, sem precisar

Quem for ver o filme aprenderá a história de um grande momento, mas será picado pelo veneno da mistificação

A partir de sexta-feira o filme “Selma” poderá ser visto no Brasil. Conta a história de um grande momento da história americana: a marcha de negros e brancos liderados por Martin Luther King a partir da cidade de Selma, no coração racista do Sul dos Estados Unidos. No dia 7 de março ela completará 50 anos. De lá para cá, um negro elegeu-se presidente, e a data de nascimento de King tornou-se feriado nacional. Os sapatos que Juanita Williams calçava durante a marcha podem ser vistos no Museu da História Americana, com seus saltos corroídos. É uma história emocionante.

Centenas de negros na cabeceira de uma ponte querendo começar uma marcha até a capital do Alabama pedindo o fim da discriminação racial eram um desafio inaceitável para o poder local. O pau comeu, a televisão mostrou as cenas de violência e, três semanas depois, a passeata chegou ao seu destino. O resto da história está no filme. “Selma” foi maltratado pela Academia do Oscar, e está debaixo de chumbo pela maneira como retratou o presidente Lyndon Johnson. Para quem participou de marchas contra a Guerra do Vietnã, bem feito. Aquele texano enorme de maus modos, que assumiu depois do assassinato de John Kennedy, não merece sossego. Falso. Johnson destruiu-se pela paranoia que o jogou no Vietnã, uma guerra iniciada por Kennedy, mas foi um grande presidente, sobretudo na questão dos direitos civis. 

O filme mostra Johnson querendo evitar a marcha de Selma. Afinal, numa peça de heróis negros, nada melhor que um presidente branco fazendo o papel de vilão. Na vida real deu-se o contrário. Já na noite de 27 de novembro de 1963, quatro dias depois do assassinato de Kennedy, Johnson reuniu seus assessores mais próximos para preparar seu primeiro discurso ao Congresso e levantou o tema dos direitos civis dos negros. 

Quando lhe disseram que isso significaria um desgaste político, ele respondeu: “Bem, e para que diabos serve a Presidência?” Mestre da costura política, Johnson não quis conter Luther King, aliou-se a ele para prevalecer no Congresso. Sem King e sem Selma, é possível que a aprovação da lei dos direitos civis demorasse algum tempo, mas, sem Johnson na Casa Branca, ela não teria sido aprovada em 1964.

“Selma” não precisava demonizar Johnson. Tudo bem que é um filme, mas a influencia desse meio produz mistificações. Até hoje tem gente que guarda a imagem dos bolcheviques subindo heroicamente as escadarias do Palácio de Inverno de São Petersburgo em 1917. Genial lorota do diretor Sergei Eisenstein no seu filme “Outubro”, de 1927. Ele acaba enganando a memória, pois não há registro do episódio de 1917. 

O palácio estava desguarnecido e uns poucos bolcheviques entraram por janelas e portas laterais. Nas horas seguintes, quando acharam a adega do czar (uma das melhores do mundo), começou o maior porre da história da cidade. A única barricada da ocasião foi montada dias depois, pelos bolcheviques, para proteger as garrafas que restavam. É possível que tenham morrido mais figurantes durante as filmagens de Eisenstein do que na tomada do palácio. A cena da escadaria é uma alegoria, mas a descaracterização de Johnson em “Selma” é um veneno simplificador para a alma de quem vê o filme.

Por: Elio Gaspari é jornalista