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sábado, 21 de dezembro de 2019

O destino de Trump - IstoÉ

O Presidente americano pode escapar do impeachment no Senado mesmo após a aprovação expressiva na Câmara. O seu futuro, incluindo a reeleição, terá impactos para a democracia no mundo

O Donald Trump que o mundo viu até agora será outro em 2020. O presidente americano ainda será o empresário agressivo e falastrão convertido em presidente que ataca a imprensa e os parceiros comerciais tradicionais e difunde fake news. O que muda, no entanto, é que ele passará a carregar a mácula de ser o terceiro presidente a sofrer um processo de impeachment em 243 anos de democracia americana. Como disputará a reeleição, isso significa que a sua agressividade terá de ser temperada, afinal ele não pode correr o risco de se envolver em conflitos sensíveis politicamente e perder o apoio eleitoral, especialmente no seu partido.

A atual batalha está sendo dura para Trump. Numa sessão histórica, a Câmara aprovou na noite de quarta-feira 18 o impeachment por 230 votos a 197 na acusação de abuso de poder. O placar foi de 229 a 198 por obstrução do Congresso. Ele se recusou a colaborar na investigação que apurava sua ação para prejudicar o rival democrata, Joe Biden, solicitando a ajuda da Ucrânia.

Agora, o Senado retomará o processo em janeiro. Nesta Casa, os republicanos contam com a maioria. O processo precisa ser aprovado por dois terços, o que torna mais provável que seja absolvido, como ocorreu com o ex-presidente Bill Clinton, em 1998. Mesmo que Trump termine absolvido, não escapará ileso. O processo representa por si só uma derrota moral.

O instrumento político do impeachment foi criado nos EUA, e nunca tirou concretamente um presidente de seu cargo. O mais afetado foi Richard Nixon, em 1974, mas ele renunciou antes da votação da Câmara. Já o caso de Trump se assemelha ao de Clinton — não pelos crimes pelos quais é acusado, mas pela forma como, ao que tudo indica, será absolvido. Clinton foi acusado de perjúrio e obstrução à justiça no escândalo sexual com Monica Lewinsky.

Retrocesso democrático
O impeachment não é apenas um problema político doméstico. Reflete uma crise global das democracias, que sempre tiveram os Estados Unidos como parâmetro. Quando a autoridade máxima dos EUA pressiona um governo estrangeiro para investigar um opositor político, significa que os fundamentos do modelo político vão mal. E não é só isso. Trump ataca a imprensa, desqualifica órgãos de Estado e estudos que comprovam o aquecimento global, ataca os direitos das minorias, entre eles os imigrantes. Foi como aconteceu no repugnante episódio de prisão de crianças refugiadas separadas de seus pais. É um sinal ainda pior da força atual das medidas antidemocráticas o pπ de Trump continuar popular e ter tudo para ser reeleito. De acordo com pesquisas pré-eleitorais, o único candidato democrata capaz de derrotá-lo até o momento é o próprio Joe Biden. “O presidente Trump abusou de seu poder e traiu o nosso país”, afirmou o ex-vice presidente após a votação da Câmara. “Mas nos EUA ninguém está acima da lei.”

Trump tem estimulado uma geração de líderes populistas no mundo inteiro que se voltam contra a globalização, propagam mentiras, atacam a imprensa independente e minam as bases da democracia. Isso ocorre em vários países europeus e até no Brasil, onde é modelo para o presidente Jair Bolsonaro. As democracias liberais, responsáveis pela expansão mundial nos últimos 150 anos, nunca estiveram tão fragilizadas — e a conduta do americano é central para esse processo. É isso que está em jogo na política dos EUA em 2020.
Trump tem estimulado uma geração de líderes populistas que são contra a globalização. É isso que está em jogo na política americana

Economia
Ainda assim, as chances de recondução de Trump são concretas, especialmente pelos benefícios econômicos sentidos por boa parte do eleitorado americano. “As pessoas não votam em função de popularidade, e sim de seu próprio bolso”, diz o economista Claudio Roberto Frischtak, da Inter B.

O desemprego no país caiu para 3,5% em setembro, com 136 mil novas vagas criadas. Trata-se do índice mais baixo desde 1969. Além disso, o país vem crescendo ano a ano e deve fechar 2019 com um aumento do PIB em torno de 2,3%. Os resultados endossam o slogan “Make America Great Again” (torne a América grande novamente). Para fortalecer esse discurso, Trump acirrará o ataque a grupos que acusa de crescerem à custa dos EUA e de serem responsáveis por prejudicar seu crescimento. “Para favorecer a política interna, ele terá um discurso radical com a Europa, que tem um déficit de milhões. É um contencioso que usará para fins internos”, diz Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE).

Se por um lado o discurso em relação à Europa será mais acirrado, o mesmo não deve acontecer com a China. O presidente americano anunciou um grande acordo — pelo menos temporariamente — com o país asiático, em dezembro, amenizando a guerra comercial que vem empreendendo nos últimos anos. E assim deverá se manter em 2020. O documento pode ser considerado, ironicamente, uma abertura de sua campanha à reeleição, uma vez que é estrategicamente pensado para evitar desgastes entre os eleitores e produtores locais. O acordo permite que os EUA suspenda ou corte tarifas em alguns produtos chineses e que a China aceite comprar itens norte-americanos, principalmente os agrícolas — o que pode afetar as exportações do Brasil. O mesmo abrandamento deve ocorrer no posicionamento americano em relação aos conflitos no Oriente Médio, incluindo o Irã, e na Coreia do Norte.

IstoÉ - Perspectiva 2020

 




domingo, 19 de novembro de 2017

A hora de Monica Lewinsky



Ex-funcionário do governo Clinton, aponta o dedo para a ferida mais incômoda: ‘Ela merece nosso pedido de desculpas’


A National Portrait Gallery de Washington, que integra o vasto complexo de museus federais da capital americana, tem em seu acervo 55 retratos do 42º presidente, Bill Clinton — todos feitos sob encomenda da instituição, que contrata artistas sem fazer triagem ideológica.  Todo ocupante da Casa Branca gera uma montanha de quadros, esculturas, caricaturas e fotografias, e essas obras se revezam no espaço do museu seguindo uma programação múltipla. Muitas jamais saem do porão e permanecem desconhecidas do público.

Foi o próprio ex-presidente democrata que, em 2006, inaugurou o mais polêmico desses retratos oficiais. A obra que leva a assinatura de Nelson Shanks, um artista da Pensilvânia, gerou um engasgar nos presentes à cerimônia quando o pano que a encobria foi retirado.
O Clinton de corpo inteiro foi retratado no Salão Oval. Tem o paletó aberto, usa gravata vermelha e tem o olhar algo insolente. Mantém uma mão na cintura — a direita, sem aliança no dedo anular. O quadro contém um sombreado disforme, decodificado só dois anos atrás pelo autor da obra: seria uma referência ao famoso vestido azul manchado de sêmen usado pela estagiária Monica Lewinsky, pivô do escândalo sexual e político que quase pôs a pique o mandato do presidente em 1998. Para Shanks, o sombreado também serve de metáfora para a marca indelével do governo Clinton.

O atual debate mundial sobre poder e abuso sexual é engrossado a cada dia por uma enxurrada de mulheres dispostas a zerar segredos e humilhações do passado. É no país hoje presidido por um predador autodeclarado que as narrativas e acusações mais se multiplicam. Vai daí que intocáveis do mundo do entretenimento, da esfera política, da mídia, das grandes corporações, ninguém mais parece poder garantir o silêncio ou a falta de credibilidade das testemunhas de seus atos.

Nem Bill Clinton.  Juanita Broaddrick, hoje dona de uma casa de repouso para idosos no Arkansas, é uma das três mulheres que duas décadas atrás alegaram terem sido abusadas por Clinton. À época, foram tratadas como oportunistas e pistoleiras pelo establishment liberal que governava o país, com Hillary Clinton à frente da campanha para desacreditá-las.

Juanita reemergiu esta semana. Em entrevista para a Fox News, emissora alinhada ao governo Trump, ela acredita ter chegado o momento em que todas as vítimas têm o mesmo peso. “Não importa se você é democrata ou republicana, heterossexual ou gay, se acredita ou não em Deus. Todos temos o direito à credibilidade”, disse ela. [essa Juanita não desiste de aparecer; o que ela quer narrando algo que talvez nem tenha acontecido? ou se aconteceu ela já esqueceu os detalhes.
Essas 'vítimas' de abusadores famosos, na época tudo fizeram para ser abusadas e diante do insucesso em suas vidas públicas, agora tentam no ocaso da vida divulgar relatos sem nenhuma credibilidade.
O certo é quando for assediada por um famoso. divulgar de imediato; não vale ficar vendo se o assédio vai lhe render alguma fama, ou grana, e quando constata o fracasso, deixa esfriar para depois divulgar.]
 
Um artigo de Peter Baker no “New York Times” cita um notável elenco de liberais ensaiando um mea-culpa. “Acho que erramos ao defender Clinton, ele deveria ter renunciado”, pensa hoje Matthew Yglesias. “O Partido Democrata precisa fazer uma análise profunda da proteção que deu a Bill Clinton”, recomenda a democrata de carteirinha Caitlin Flanagan, inimiga declarada do feminismo automático e ela mesma vítima de abuso sexual. 
David Rothkopf, ex-funcionário do governo Clinton, aponta o dedo para a ferida mais incômoda: “Monica Lewinsky merece nosso pedido de desculpas”. Acertou em cheio.
Monica, como ela mesma insiste em frisar desde que saiu da clausura social três anos atrás, não foi vítima de qualquer abuso sexual. Sua relação com o presidente foi tão consentida quanto desejada por ela. O intenso abuso que quase a destruiu ocorreu depois, quando o affair veio a público e ela se viu engolida pela complexa engrenagem política de Washington.

Monica, como se sabe, era uma estagiária na Casa Branca, recém-saída da faculdade. Tinha 22 anos e apaixonou-se perdidamente pelo chefe sedutor de 49. Mantiveram uma relação de alta voltagem por dois anos. Numa manhã de janeiro de 1998, o caso explodiu no Drudge Report, um dos primeiros sites de política daqueles tempos pré-Google, pré-mídias sociais, pré-Facebook.

Pela primeira vez na história da imprensa, a mídia tradicional tinha levado um furo colossal da internet. “Foi um click que reverberou no mundo inteiro, uma tempestade perfeita que juntou sexo e política”, relembra Monica.  De figura completamente anônima, tornou-se a primeira pessoa a ser humilhada publicamente em todos os idiomas, muito antes da invenção do termo cyberbullying. “Fui a paciente número zero da perda de reputação, identidade e dignidade no palco global. Foi instantâneo”, diz.

Ameaçada pelo FBI com 27 anos de prisão se não admitisse o relacionamento com o presidente, não o fez. Sentada numa saleta sem janelas, sob luz fluorescente, teve que ouvir 20 horas de gravação de seus desabafos mais íntimos para uma amiga — jamais suspeitou que estivesse sendo gravada pela confidente. A íntegra das gravações foi anexada ao relatório de Kenneth Starr, e entregue aos congressistas. Duas semanas depois, num 11 de setembro para Monica mais marcante do que o do atentado às Torres Gêmeas, as gravações com suas inconfidências mais cabeludas ecoavam nas redes de TV e se perpetuaram na internet.

Monica não se suicidou — a mãe só permitia que tomasse banho de porta aberta —, não trocou de sobrenome para poder se esgueirar na vida, e jamais se referiu a Clinton de forma desabonadora. Já o presidente, em seu depoimento, referiu-se a ela como “aquela mulher”. A ex-periguete conseguiu formar-se em Psicologia Social pela London School of Economics e aos 41 anos (hoje está com 44) falou em público pela primeira vez para ser dona de sua história.

Vale a pena assistir no YouTube à palestra que deu para um fórum da revista “Forbes”, e sua TED Talk de 2015. Ambas têm momentos tronchos, frases de efeito, tom edificante e amador. Mas elas conseguem transmitir o essencial: que o sentimento de humilhação humano é devastador, mais potente do que a felicidade plena ou a raiva. E que Monica Lewinsky dá uma aula de caráter em quem tem apenas poder.

Por:  Dorrit Harazim é jornalista

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Precisa-se de uma oposição

Dilma será deposta, Lula está nas cordas, acabou-se o ciclo de poder do PT, e ninguém sabe para onde ele vai

Começa amanhã o julgamento de Dilma Rousseff. Ela será condenada. Os julgamentos que decidem o destino dos presidentes são políticos. Formalmente, Dilma será deposta pelo desembaraço de sua contabilidade criativa, mas sempre será repetida a frase da senadora Rose de Freitas, líder do governo de Michel Temer no Senado: “Na minha tese, não teve esse negócio de pedalada, o que teve foi um país paralisado, sem direção e sem base nenhuma para administrar”.

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Pura verdade, que pode ser contraposta a outro julgamento de impeachment de um presidente, o de Bill Clinton em 1999. Ele era acusado de práticas mais simples, comuns e disseminadas do que as “pedaladas fiscais”. Uma pessoa pode não entender de contabilidade pública, mas entende o que a estagiária Monica Lewinsky fazia com o presidente dos Estados Unidos na Casa Branca. Clinton foi absolvido porque o país não estava paralisado, e a renda per capita dos americanos cresceu enquanto a dívida pública encolheu.

Com Dilma, aconteceu o contrário. Todo mundo sabia o que Clinton fez e, apesar disso, achou-se que deveria continuar. No caso de Dilma, não se sabe direito o que eram as pedaladas, mas acha-se que ela deve ir embora. Quando Dilma entregar as chaves do Palácio da Alvorada, estará encerrado um ciclo de 13 anos de poder do Partido dos Trabalhadores. Em 2003, Lula vestiu a faixa, e a oposição foi para o poder. Hoje ninguém haverá de dizer o mesmo.

Michel Temer era o vice-presidente de Dilma, e seu primeiro escalão ampara-se em figuras que sustentaram o comissariado petista. Henrique Meirelles presidiu o Banco Central de Lula, Eliseu Padilha e Gilberto Kassab foram ministros de Dilma. Mudança imediata, drástica e irrecorrível, só a do garçom Catalão, do Palácio do Planalto, que hoje está no gabinete da senadora Kátia Abreu, ministra de Dilma e adversária do impeachment.

O PT foi apeado do governo e, de uma maneira geral, abriu espaço para quem nunca saiu dele. O tempo dirá quanto custou ao comissariado o inchaço de sua base de apoio e, sobretudo, a expansão de seus interesses pecuniários. Lula e Dilma viveram o engano de um governo com o mínimo possível de oposição. Depostos, Dilma cuidará da vida, Lula tentará se reinventar, mas alguns comissários sabem que suas carreiras estão encerradas.

Outros seguem a ordem de batalha do coronel Tamarindo em Canudos: “É tempo de murici, cada um cuide de si”. Astro dessa categoria é Cândido Vaccarezza, líder do PT na Câmara até 2012. Dois anos depois, ele perdeu a eleição. Deixou o partido e aninhou-se na campanha de Celso Russomanno (PTB) pela prefeitura de São Paulo.

Cortando aqui e perdendo ali, sobra uma militância cujas raízes estão nos anos 70 do século passado. Defendiam o fim da unicidade sindical, a reforma da CLT, as negocia- ções diretas entre empresas e trabalhadores e tinham horror a empreiteiros. (A recíproca era verdadeira.) Esse era um tempo em que os sindicalistas do PT eram bancários. Com o acesso aos fundos estatais, alguns viraram banqueiros e, como João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do partido, estão na cadeia. Oposição, com algumas ideias na cabeça e pouco dinheiro no bolso, é tudo o que o Brasil precisa.

Fonte: O Globo - Elio Gaspari é jornalista

 

sábado, 30 de julho de 2016

Sexo e a Casa Branca

Com Hillary Clinton na Casa Branca - algo que esperamos não ocorra - a luta em prol da liberação mundial do aborto será fortalecida. Matar ser humanos inocentes e indefesos será a regra, algo a ser apoiado e incentivado.

Hillary Clinton tem um longo currículo, mas continua à sombra de Bill - e se orgulha de ter sido sua alcoviteira no caso Mônica Lewinsky.

Enfim, a democrata Hillary Clinton entrou para a História dos EUA como a primeira mulher a vencer as primárias de um partido relevante com chances reais de chegar à Casa Branca — em 1872, Victoria Woodhull foi candidata por um partido nanico. Isso ocorre 228 anos depois de aprovada a Constituição americana, e quase um século após o sufrágio, que permitiu às americanas votar.  O caminho percorrido foi longo, no entanto, na última semana, um dos temas mais debatidos sobre sua candidatura era como Hillary deveria responder aos eleitores se o escândalo político sexual envolvendo o então presidente Bill Clinton e a estagiária Monica Lewinsky voltasse à tona. Donald Trump, o candidato do Partido Republicano, acusou-a de estar playing the gender card (algo como jogando a “cartada do gênero”), ou seja, usar o fato de ser mulher para se beneficiar na corrida presidencial.

Não sei se Trump sabe, mas 51% da população americana são mulheres, não era sem tempo que uma delas chegasse à corrida presidencial. Se um candidato pode tirar vantagem do próprio gênero é Trump. Ser homem tem sido até agora um pré-requisito para a Casa Branca e outros cargos no governo dos EUA. [nada contra as mulheres mas vejamos o exemplo do Brasil - foi só dar chance a uma mulher e ela ferrou com tudo, f ... tudo.]
 
Elas ocupam 19,4% dos assentos no Congresso americano — menos que a média mundial de 21,9%, o que põe os EUA em 75ª posição num ranking global de representatividade feminina nos governos nacionais, entre 189 países onde estes cargos foram eleitos diretamente, atrás de África do Sul, Cuba, Ruanda. O ranking é feito pela União Interparlamentar, que acompanha as atividades de Parlamentos em todo o mundo. Apenas 10% dos cargos de governador, 12% das prefeituras das cem maiores cidades americanas e 24% dos assentos nos Legislativos estaduais são ocupados por mulheres nos EUA. Elas são também minoria nos postos públicos.

É precisamente por isso que democratas e republicanos nunca tiveram uma candidata à Casa Branca até a última quarta-feira. Porque barreiras ainda impedem a maioria das mulheres com ambições políticas de trilhar uma carreira relevante que lhes permita exercer sua competência e demonstrá-la aos eleitores. Na taxa atual, levará 500 anos para que as mulheres sejam igualmente representadas no Congresso, calcula o site GovFem, que defende maior representatividade feminina na política.

Hillary é uma exceção à regra. Formada em Direito pela Universidade de Yale, onde conheceu Bill Clinton, seu colega de classe, ela trabalhou com uma série de políticos, integrou a equipe que investigou o escândalo de Watergate como consultora jurídica do comitê que analisava o impeachment do presidente Nixon, trabalhou na campanha de Jimmy Carter, e foi consultora legal de seu gabinete, até se tornar primeira-dama quando Bill Clinton foi eleito governador do Arkansas e, em seguida, presidente dos EUA. Depois disso, foi eleita senadora, cargo que ocupou entre 2001 e 2009, e secretária de Estado até 2013, mas continua sendo vista à sombra do marido.

As mulheres nos EUA ainda são retratadas como as quatro personagens do seriado “Sex and the City”: independentes e bem-sucedidas profissionalmente que, ainda assim, só sabem falar em homens e sapatos. Em “Breaking Bad”, mais recente, a personagem feminina é uma dona de casa ingênua, neurótica sobre a possibilidade de traição do marido, que acaba virando mulher de bandido por amor. A personagem, é claro, é mais complexa do que eu teria espaço para descrever aqui, e evolui ao longo da série, mas nunca chega a ser protagonista. 

Em “House of Cards”, Claire Underwood, a personagem forte de Robin Wright, expõe barreiras e preconceitos que a mulher enfrenta na política, relegada a viver à sombra do marido. Ao mesmo tempo, Claire é retratada como uma mulher sem escrúpulos, que mantém o casamento por interesse, e é capaz de fazer qualquer coisa para satisfazer sua ambição, como puxar o tapete da secretária de Estado. O clássico estereótipo da mulher moderna.

Hillary atravessou vários escândalos políticos. Foi investigada sobre o ataque ao posto diplomático americano em Benghazi, Líbia, que resultou na morte do embaixador Christopher Stevens e outras três pessoas. As investigações apontaram “falhas sistemáticas de liderança e deficiências de gerenciamento” no Departamento de Estado. Em maio, foi acusada de usar um servidor privado para trocar e-mails, incluindo informações confidenciais que diziam respeito ao Departamento de Estado.

Ser mulher não garante uma boa administração, nem mesmo em termos de igualdade. Paquistão, Índia, Bangladesh tiveram mulheres como líderes antes dos EUA. Mas não ter mulheres em um governo significa que metade da população não está representada. [só que se tratando de representação da população, deve ser considerado prioridade eleger congressistas, Poder Legislativo.]

Fonte: O Globo - Adriana Carranca 


terça-feira, 21 de julho de 2015

Situação de Dilma é pior do que a de Collor antes do impeachment

Lembro-me, pouco tempo depois de ter atingido a maioridade penal, de uma antiga propaganda de desodorante que fez muito sucesso e que mostrava uma mulher bonita caminhando com indisfarçável arrogância em meio a outras que pareciam estar condenadas ao anonimato.  O interessante da propaganda é que a protagonista era a única que estava vestida com cores vibrantes. O cérebro criativo do publicitário, imagino, quis passar a mensagem de que usar aquele produto fazia uma "sensível diferença", a ponto de emprestar cores à sua vidinha sem graça.

 O governo vem pregando que a política é uma coisa só, um universo composto de cinquenta tons de cinza, mas sempre cinza. Apenas Dilma manteria um colorido vivo. Em recente entrevista para um grande jornal do país, com um certo desdém a presidente declarou que a campanha do candidato derrotado no segundo turno das últimas eleições igualmente se beneficiou de doações de grandes empreiteiras investigadas na operação Lava Jato.

Por isso, no entender de Dilma Rousseff, estariam todos metidos num mesmo barco. Sim, naquele barco difícil de manobrar da entrevista do Jô, já que parece claro que a intenção de Dilma vem sendo colocar Aécio ao seu lado na cabine de comando de um super petroleiro que está prestes a afundar. Discutir o financiamento público de campanhas ou a proibição de doações por parte de pessoas jurídicas – que evitariam que um volume tão espantoso de recursos migrasse para as candidaturas tanto de situação como de oposição – é uma coisa. Outra coisa bem diferente é falar que se as duas campanhas receberam dinheiro de empresas investigadas no petrolão, ninguém pode se gabar de que tem as mãos limpas.

Há aqui, como na propaganda do desodorante, uma sensível diferença: por controlar a máquina pública, só o governo tem o poder para conscientemente fazer gerar os recursos que serão posteriormente usados para abastecer a campanha de seu candidato, através de doações legais ou ilegais. Só o governo tem a força para vincular doações de campanha com a liberação de recursos para empresas que com ele contratam. Uma pergunta difícil de ser respondida é se o dinheiro proveniente da corrupção da Petrobras foi por si só determinante para alterar o resultado das eleições. Os números podem, no entanto, nos revelar detalhes interessantes. 

A campanha de Dilma recebeu R$ 64,6 milhões de empresas investigadas no escândalo do petrolão, enquanto que a de Aécio recebeu pouco mais da metade, R$ 34,1 milhões. Dilma obteve 54,4 milhões de votos, enquanto Aécio obteve 51 milhões, um saldo de 3,4 milhões de votos em favor da candidatura petista.  Caso se divida o valor que Dilma recebeu a mais das empreiteiras investigadas na Lava Jato pelos votos que a presidente reeleita teve de vantagem, percebe-se que a campanha de Dilma poderia ter destinado R$ 8,97 para conseguir cada um desses 3,4 milhões de votos extras que lhe renderam a vitória, duas vezes mais do que custou cada voto em Aécio (R$ 4,37) e perto do dobro do custo do voto divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral para as eleições gerais de 2014 (R$ 4,80). 

É claro que devemos ter em mente que essa conta de padaria não é um critério científico, já que "custo do voto" e "preço do voto" são coisas distintas – em outras palavras, a expressão "custo do voto" não diz respeito ao preço que foi pago para comprar um voto, mas quanto uma campanha gastou, em média, por eleitor para atingir uma determinada votação. A falta de critério científico, no entanto, não serve de argumento para derrubar a hipótese de que o dinheiro do petrolão serviu para desequilibrar a balança.  

Poço sem fundo
O que é fácil de responder é que, por mais traumático que isso possa ser, não haverá legitimidade moral e legal para a chapa vencedora permanecer no poder caso venha a ser provado que a sua campanha foi abastecida com dinheiro sujo. A democracia impõe essa saída.  Ambiente político para o impeachment existe de sobra. O país é de fato um super-petroleiro sem comando e a popularidade da presidente só não chegou ao fundo do poço porque o poço parece não ter fundo. Além disso, o ambiente jurídico vem se consolidando, na medida em que um desfecho lógico para a artimanha das "pedaladas" se aproxima. A situação de Dilma é significativamente pior do que a de Collor nos meses que antecederam o seu afastamento.

Para jogar um balde de água fria nos pregadores do apocalipse que chamam a oposição brasileira de golpista, vale a comparação de que se Dilma estivesse no lugar de Barack Obama certamente teria pela frente mais do que uma marola que virou onda. A presidente provavelmente seria engolida por um maremoto, o mesmo maremoto que esteve a ponto de engolir Bill Clinton.

O simples fato de manter em ou trazer para a sua órbita direta de influência subordinados hierárquicos que podem vir a ser chamados para testemunhar sobre as doações de campanha seria motivo suficiente nos Estados Unidos para que Dilma sofresse um processo de cassação de mandato. Uma das acusações que levou a aprovação do impeachment de Clinton pela Câmara dos Representantes foi a de que ele teria ajudado Monica Lewinsky a arrumar um emprego e um advogado de sua confiança – da confiança dele, não necessariamente da de Monica – tão logo soube que ela testemunharia no processo de assédio sexual a que estava sendo submetido.

Por aqui – também pela via constitucional o TSE pode aliviar a aflição dos milhões de brasileiros que querem ver o país sair o quanto antes da crise política que hoje ajuda a estrangular a economia. Não se justifica a tese defendida por alguns de que são genéricas as acusações apresentadas pelos tucanos. De acordo com informações divulgadas pela imprensa, um dos líderes do "clube das empreiteiras" teria revelado em sua delação premiada que fez doações à campanha de Dilma após ser lembrado dos contratos de sua empresa com a Petrobras. É provável que o depoimento de Pessoa ao TSE soe como o canto do cisne de um governo que se transformou num equilibrista de pratos bêbado. 

Dilma não está de todo errada – embora tenha soltado a frase com uma retórica exagerada e num contexto completamente infeliz – quando diz que não respeita delatores. É comum que delatores, de fato, imprimam um toque pessoal às suas "verdades", de acordo com os objetivos que queiram alcançar ou com o que imaginam que os seus interlocutores queiram ouvir. O problema é que as provas produzidas na Operação Lava Jato derivam do cruzamento de informações provenientes de inúmeras fontes de investigação. E aí a porca torce o rabo. 

Não se deve considerar como um mantra a alegação de que a coordenação da campanha de Dilma ignorava o envolvimento das empreiteiras investigadas no esquema de corrupção da Petrobrás. Ainda que isso possa corresponder à verdade – algo que começa a ser questionado –, essa tese deve ser relativizada à medida em que se constata que empresas doadoras foram alvo de operações anteriores da Polícia Federal – fato que por si só justificaria um cuidado redobrado por parte da campanha governista.  Afinal, os antecedentes apontariam para o risco, pelo menos em tese, de parte do dinheiro das doações legais ter saído de forma ilegal dos cofres do próprio governo.

Fonte: UOL - Fernando Tibúrcio Peña









Pessoalmente acredito na honestidade da nossa presidente, mas a verdade é que o vermelho de Dilma desbotou e foi parar no rosto do povo brasileiro.  Não há mais espaço para que continue, assim como a modelo da propaganda de desodorante, olhando os outros de cima para baixo. 


terça-feira, 28 de abril de 2015

"História bem contada transforma traficante em mocinho vitimizado".



...Não vi na mídia nenhum alvoroço semelhante ao do fuzilamento segundo brasileiro quando, em dezembro de 2014, foram divulgados os dados que se seguem. Eis o que a mídia estampou: "O Brasil é o país com o maior número de homicídios no mundo, segundo um relatório divulgado nesta quarta-feira"...
A história do segundo brasileiro fuzilado num paredón da Indonésia bestifica por uma única razão: o que os olhos não vêem o coração não sente. Traficantes, seja no Rio ou em São Paulo, têm executado até o Hino Nacional. Nada se fala. O bicho pega quando se executa ou um filho das "zelites", ou um universitário.

De uns tempos para cá o protagonismo que é contar a história de vida de vítimas, com fotos e cartinhas, deu uma dilatada em seus vastos domínios. Hoje membros da chamada nova classe média, vitimizados, já podem ter suas histórias de vida relatadas na grande mídia. Afinal viraram consumidores e, portanto, converteram-se em gente, sentenciam os editores.  Há 13 anos um meu aluno foi chacinado no Morumbi. Era perto de uma biqueira numa favela não pacificada, como se diz. Ganhou páginas e páginas nos então quatro maiores jornais do país. Levantei os dados: naquele dia 9, rapazes, que regulavam com a idade do universitário, tinham sido chacinados na mesma noite: mas só ele mereceu história de vida.

Há arcanos sobre isso no o prefácio de um livro de Leão Serva, chamado Jornalismo e Desinformação, escrito pelo Fernando Morais. Ele relata levantamento feito nos anos 60 pelo jornalista Argemiro Ferreira, sobre a Guerra do Vietnã. As contas são brutais: era necessário que morressem 35 vietcongs para que estes ganhassem o mesmo espaço (abre de página) que ganhava um oficial dos EUA morto (ou oito oficiais franceses e italianos).

Só nos toca o que é igual à gente: ou é vendido como se fosse igual a nós. Não?  O segundo fuzilamento na Indonésia nos toca mais o coração porque é literariamente relatado por aí. Capricham no texto, e nosso coração fala mais alto. Aquele monstro a quem os EUA pintaram nos anos 90, o Slobodan Milosevic, teve uma sacada genial quando Bill Clinton (para tirar dos jornais o escândalo Mônica Lewinsky/sexo oral) convenceu as Nações Unidas a invadirem o Kosovo, em abril de 1999. Slobodan contratou "n" fotógrafos que mandavam retratos de crianças filhas de suas tropas, loiras e de olhos azuis, para a mídia dos EUA. Era o típico lance da alteridade: vejam, eles são alourados como vocês! São gente também, portanto.

Sobre homicídios
Não vi na mídia nenhum alvoroço semelhante ao do fuzilamento segundo brasileiro quando, em dezembro de 2014, foram divulgados os dados que se seguem. Eis o que a mídia estampou:

"O Brasil é o país com o maior número de homicídios no mundo, segundo um relatório divulgado nesta quarta-feira (10 de dezembro) pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em Genebra. De cada 100 assassinatos no mundo, 13 são no Brasil.

Segundo o documento, o total de homicídios no mundo chegou a 475 mil. Os dados são de 2012.

O Brasil é o líder no ranking. O governo brasileiro informou 47 mil homicídios em 2012, mas a OMS estima que o número real tenha sido muito superior: mais de 64 mil homicídios. Depois do Brasil aparecem Índia, México, Colômbia, Rússia, África do Sul, Venezuela e Estados Unidos.

A OMS calcula que no Brasil a cada 100 mil pessoas, 32 sejam assassinadas.

Na outra ponta da tabela, com os menores índices de homicídio por habitante, em 1º lugar vem Luxemburgo, depois Japão e em seguida Suíça, empatada com Cingapura, Noruega e Islândia.

Esses números são referentes a homicídios, mas a OMS chama atenção para diferentes tipos de violência mais recorrentes no nosso dia a dia do que se possa imaginar.

De acordo com o levantamento, uma em cada quatro crianças sofre agressões, uma em cada cinco meninas é abusada sexualmente e uma em cada três mulheres já foi violentada pelo próprio parceiro".


Por que tais números não ribombaram, escandalosa e demencialmente? Números não tocam corações.

Sobre narcotráfico
Do que o segundo brasileiro no paredón da Indonésia é ponta de iceberg?

Vejamos: o Relatório Mundial sobre Drogas de 2014, confeccionado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), destaca que o uso de drogas no mundo permanece estável. Cerca de 243 milhões de pessoas, ou 5% da população global entre 15 e 64 anos de idade, usaram drogas ilícitas em 2012. Usuários de drogas problemáticos, somaram por volta de 27 milhões, cerca de 0,6% da população adulta mundial, ou 1 em cada 200 pessoas. O consumo de cocaína dobrou no Brasil no prazo de seis anos, enquanto em outras partes do mundo o uso dessa substância está caindo, diz o Unodoc.

O consumo de cocaína no Brasil aumentou "substancialmente" e atingiu 1,75% da população com idade entre 15 e 64 anos em 2011 - ante 0,7% da população em 2005.  Na América do Sul o uso de cocaína atinge 1,3% da população. A dependência de calmantes e sedativos lidera todas as modalidades, com 227,5 milhões de consumidores, ou quase 4% da população mundial.

Em seguida, vem a maconha. Tem 141 milhões de adeptos, totalizando mais de 3% da população mundial. A cocaína tem 14 milhões de usuários. Cerca de 8 milhões de almas são adeptas contumazes da heroína e 30 milhões, ou 0,8% da população mundial, recentemente mergulharam no consumo desenfreado das chamadas drogas sintéticas, como ATS e meta- anfetamina.

Estima-se que sejam apreendidos em todo o mundo, pelas polícias locais, apenas de 5% a 10% de toda a droga ilegalmente produzida. Para abastecer o lote que vai pular logo mais para 400 milhões de junkies planetários, há mecanismos econômicos que lucram até US$ 400 bilhões por ano - uma soma igual à gerada pela produção mundial de artefatos têxteis.

Em todo o planeta a produção de maconha cresceu 10 vezes em 25 anos. Nos EUA, a erva agora é o cultivo mais lucrativo, com o valor de sua colheita excedendo o do milho, soja e ferro (de resto as três atividades extrativas mais lucrativas daquele país). Em solo norte-americano 500 gramas de maconha podem custar entre US$ 400 e US$ 2.000. A mesma quantidade de maconha da melhor qualidade, conhecida como "sinsemilla" (as sem-sementes, chamadas também de "juicy and seedless", suculentas e sem-semente) é vendida por taxas entre US$ 900 e US$ 6.000 cada 500 gramas. O lucro dos narcotraficantes, no ato da revenda, é de pelo menos 20 vezes.  Esse numerário esmaece a olhos vistos porque a história de vida dos brasileiros traficantes, quando bem contada, fala mais alto que a matemática.

Transcrito da Coluna de Carlos Brickmann http://www.brickmann.com.br/
Artigo publicado originalmente no Blog de Claudio Tognolli no Yahoo - https://br.noticias.yahoo.com/blogs/claudio-tognolli/,
post de 28 de abril de 2015