Depois de vir a público prometer a redução das tarifas de energia, governo volta atrás e luz deve subir até 45%
A mensagem da
presidente Dilma Rousseff não poderia ter sido mais clara. “Os
investimentos que fizemos permitem ao Brasil superar as dificuldades
momentâneas, mantendo a política de tarifas baixas”, disse ela em 2014,
sobre o preço final da energia para o consumidor. Meses antes, em cadeia
nacional de rádio e TV, Dilma preconizava a vitória de seu governo
nessa área. “O Brasil tem e terá energia mais que suficiente para o
presente e para o futuro, sem nenhum risco de racionamento”, anunciou.
Em mensagem anterior, a presidente repetia o mantra: “A partir de agora,
a conta de luz das famílias brasileiras vai ficar 18% mais barata”,
dizia Dilma. “O Brasil, que já é uma potência energética, passa a viver
uma situação ainda mais especial no setor elétrico.” Enquanto a
presidente entoava sua cantilena e incentivava o consumo, as usinas
térmicas, cuja produção é mais cara, começavam a ser acionadas para
suprir a crescente demanda. Mas elas não deram conta de tudo. Resultado:
não só houve racionamento como o custo da energia disparou – o oposto,
portanto, de tudo que a chefe da nação tinha prometido. Na terça-feira
3, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou um reajuste
salgado para seis distribuidoras de energia. A conta de luz dos
consumidores atendidos por elas – a maioria da região Sudeste do País –
vai ficar de 18,6% a 45,7% mais cara.
Para especialistas, o reajuste anunciado na semana passada é um sinal de
que o aumento para as outras 57 distribuidoras será da mesma magnitude.
O reajuste deve cobrir um rombo bilionário do fundo CDE (Conta de
Desenvolvimento Energético), destinado a programas sociais, como o Luz
para Todos, e subsídios para as famílias de baixa renda. Além disso, a
Aneel reajustou as bandeiras tarifárias na sexta-feira 6, o que permite,
segundo analistas, concluir que novos aumentos deverão ser impostos aos
consumidores. “Até pouquíssimo tempo atrás, o governo vinha a público
dizer que energia no Brasil era farta e barata”, afirma Cláudio Sales,
presidente do instituto Acende Brasil. “Está mais do que na hora de
passar o sinal correto à sociedade e iniciar um programa de
racionamento.” Programa esse que Luís Gameiro, diretor da Trade Energy,
comercializadora de energia no mercado livre, não acredita que o governo
implementará. “Acho difícil, mesmo que o nível dos reservatórios fique
abaixo de 20% até abril, pela experiência política que tivemos com o
racionamento em 2001”, diz.
Em janeiro, o nível das represas do Sudeste/Centro-Oeste, responsável
por 70% da capacidade de armazenamento do sistema elétrico como um todo,
ficou em 16,8%. No fim do verão no ano passado, era próximo de 40%. De
acordo com Gameiro, “deixaram uma bomba-relógio para 2015.” Nos cálculos
da Trade Energy, a expectativa de aumento médio nas tarifas neste ano,
que antes estava entre 30% e 40%, agora chega a quase 50%. O Sistema
Firjan, que representa as indústrias do Rio de Janeiro, estima que o
aumento do custo da energia para o setor deve ser de 34% neste ano. O
valor, contudo, pode ser revisto para 39,8% segundo o novo percentual
estipulado para as bandeiras tarifárias. No ano passado, o reajuste foi
próximo de 20%. “Não consigo enxergar uma reversão dessa tendência de
alta, porque nenhuma medida estrutural tem sido tomada”, diz Cristiano
Prado, gerente de competitividade industrial e investimentos do Sistema
Firjan. “A consequência é nefasta num momento em que o País não está
crescendo. Isso diminui a produção, a competitividade e o investimento.”
De acordo com a diretora de relações institucionais da Confederação
Nacional da Indústria, Mônica Messenberg, “a elevação das tarifas
representa um obstáculo adicional, dentro de um cenário adverso, para a
recuperação da atividade industrial, no curto prazo.” No varejo, a
notícia também espalhou pessimismo. “Desde 2001, o setor investe na
geração de energia e na redução do consumo”, diz Glauco Humai,
presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers. “Hoje somos
penalizados mesmo sendo o setor que provavelmente mais investe em
eficiência energética.”
Apesar do aumento significativo nos custos, o risco de apagão não está
descartado. Segundo o instituto Acende Brasil, o País ainda está exposto
a novos blecautes ao longo deste verão, já que não há previsão da
entrada de capacidade adicional até março. Se em 2014 o pico de demanda
aconteceu em meados de fevereiro, neste ano ele chegou mais cedo. Na
tarde de 19 de janeiro, dez Estados e o Distrito Federal ficaram 50
minutos sem luz. Os recursos disponíveis de geração, inclusive térmica, e
transmissão estão todos sendo usados no limite.
Fonte: IstoÉ On Line