O economista Paulo Tafner foi subsecretário geral da Fazenda do Rio
até outubro de 2015 e viu de perto alguns dos erros do estado. Houve um
forte aumento de gastos, ou mesmo farra em algumas situações. A queda do
preço do petróleo e o “descalabro na Petrobras", como define, tiveram
sério impacto na economia fluminense. O socorro da federação alivia, mas
o estado ainda tem um problema estrutural para resolver.
A receita bruta total do Rio cresceu 46% em termos reais entre 2008 e
2014, para R$ 91 bi, de acordo com dados da Fazenda. Em 2015, o
montante caiu 15%. A despesa liquidada total subiu mais no período de
bonança e caiu menos na tempestade. Até 2014, a alta foi de 50%, para R$
90 bi. No ano seguinte, ela recuou 10%, e foi maior que a receita. O
Rio fez escolhas erradas e criou despesas permanentes. Os gastos com
pessoal e encargos subiram 59% entre 2008 e 2015.
Segundo Tafner, o estado adotou uma política de aumentos reais para
os servidores da Saúde, Educação e Segurança. Os reajustes tiveram
impacto também nos gastos previdenciários porque os ganhos são
repassados aos inativos. Com essa regra, cada R$ 1 de aumento no salário
do servidor gera despesa de R$ 4. O governo manejava a receita do
petróleo para bancar os gastos com benefícios. Cerca de 95% dos recursos
de royalties e participações especiais eram usados para cobrir a
previdência do estado. Com a queda na arrecadação, o déficit
previdenciário saltará de R$ 8 bi em 2015 para R$ 13 bi neste ano,
previsão revisada recentemente. As despesas com pessoal foram tomando
espaço cada vez maior no Orçamento. Hoje, quase 100% da receita com ICMS
é destinada ao pagamento da folha salarial. — No Rio, talvez tenha havido um exagero na recomposição de salários,
especialmente na saúde, educação e segurança, que representam quase 90%
da folha. Na previdência, a regra que corrige as aposentadorias pelo
salário dos ativos precisa ser discutida, mas os estados têm pouca
ingerência sobre a legislação — diz Tafner, que é especialista em
sistema previdenciário.
A renegociação da dívida dos estados e municípios era necessária e
precisava ser feita, mas demorou tempo demais. Ela começou em 2013, para
dar um socorro ao município de São Paulo. Na visão de Tafner, a
carência evitará um movimento generalizado de calotes dos estados. Mas a
capacidade financeira da União, que vai ficar um período sem receber os
pagamentos, também tem que ser preservada. O acordo vai custar ao
Tesouro R$ 50 bi em três anos.
O efeito imediato da renegociação é “suavizar” a delicada situação
financeira dos estados. Os governadores ganharam um fôlego, mas a
solução para o desequilíbrio financeiro é mais complexa. Além da
definição sobre a dívida, Tafner defende que os estados façam sua parte.
No caso do Rio, o governador Francisco Dornelles adiantou que vai tomar
“medidas muito duras” após decretar o estado de calamidade. Com exceção
da Cedae, o Rio tem poucos ativos interessantes para privatizar. Tafner
acredita que alguns benefícios terão que ser revogados. O estado ainda
concede adicional por tempo de serviço ao funcionalismo. É uma regra sem
sentido, diz ele, já abolida por alguns governos. Universidades de alta
qualidade têm um custo elevadíssimo e são usufruídas pelos mais ricos,
na maioria dos casos. O programa Aluguel Social, conta o economista,
deveria ser revisto para focar nas pessoas que realmente precisam. O
mesmo vale para o Bilhete Único e o Renda Melhor.
O Rio paga cerca de R$ 6 bi ao ano em dívidas à União e terá pelos
próximos seis meses um espaço maior no Orçamento para cumprir com suas
obrigações. A preocupação com a Olimpíada não é apenas pelas obras, mas
também com o pleno funcionamento dos serviços. Seria um desastre para o
país, explica Tafner, se a saúde e a segurança no Rio ficarem
paralisadas durante o evento. O acordo e a injeção direta de recursos
vão garantir a sensação de normalidade na operação do estado nos
próximos meses, acredita o economista, mas o problema estrutural
persiste.
Tafner lembra que no setor privado as dívidas também são
renegociadas. O que preocupa é que não é a primeira vez que estados são
beneficiados. Ele acredita que o efeito dessa crise nas contas vai
fortalecer a importância de ter políticas públicas responsáveis. Algumas
são impopulares, mas o respeito às boas práticas fiscais é uma forma de
responsabilidade social.
Fonte: Coluna da Míriam Leitão - Com Marcelo Loureiro - O Globo
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