Ela certamente tinha receio do alarido das redes e da patrulha da imprensa neo-sanguinolenta; ele argumentou sem os limites do pudor
A presidente do Supremo, Cármen Lúcia,
viveu ontem o seu “patético momento”, mas não no sentido de um belo
poema de Cecília Meirelles, que afirma: “Aqui está minha dor — este
coral quebrado,/ sobrevivendo ao seu patético momento.” Poucos sabem,
“patético” não tem o sentido de tolo, boboca, constrangedor, como usamos
habitualmente. Designa, na verdade, o que provoca piedade, dor,
tristeza. Mas também expressa “tragédia” e “terror”. Então ficamos assim: vimos uma Cármen Lúcia diante da “tragédia” e do “terror”.
Nesta quarta, o STF votou, como sabemos,
uma Ação Direta de Inconstitucionalidade para definir se medidas
cautelares impostas pelo tribunal a parlamentares têm ou não de passar
pela Casa Legislativa de onde ele é originário. Por 6 a 5, depois dos
ajustes de votos, a resposta foi “sim”. Acontece, e este é o problema
mais grave, que as ditas medidas não estão previstas em lugar nenhum da
Carta. Elas estão estampadas no Artigo 319 do Código de Processo Penal e
só podem ser aplicadas como alternativas à prisão preventiva, definida
pelo Artigo 312 do mesmo código. Parlamentares estão sujeitos a ambos?
Não! Estão abrigados pelo Artigo 53 da Constituição, que estabelece:
– só podem ser presos em flagrante de crime inafiançável, que são os hediondos (Parágrafo 2º);
– ainda assim, Senado ou Câmara podem reverter a decisão (também Parágrafo 2º);
– essas mesmas Casas podem, inclusive, suspender qualquer processo (Parágrafos 3º, 4º e 5º).
– só podem ser presos em flagrante de crime inafiançável, que são os hediondos (Parágrafo 2º);
– ainda assim, Senado ou Câmara podem reverter a decisão (também Parágrafo 2º);
– essas mesmas Casas podem, inclusive, suspender qualquer processo (Parágrafos 3º, 4º e 5º).
Isso significa, então, que temos
cidadãos de primeira e segunda linhas, como sustentou, num rasgo
detestável de demagogia, o ministro Roberto Barroso? Uma ova! Ele estava
apenas fazendo embaixadinha para a torcida, como é de seu estilo. Os
senhores parlamentares podem, desde sempre, ter cassados os seus
respectivos mandatos por quebra do decoro parlamentar. E isso já
aconteceu muitas vezes. Isso à parte, será que vigora a mais
desbragada impunidade, inclusive na esfera penal, e nada acontece com o
deputado ou senador flagrado cometendo crime? Isso é igualmente mentira.
Ao declarar que parlamentares não estariam sujeitos a nenhuma sanção,
Barroso enganou aqueles que o ouviam. Diz o Artigo 55 da Constituição:
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
I – que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo 54;
II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;
III – que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;
IV – que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;
V – quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;
VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
§ 1º – É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.
§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
I – que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo 54;
II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;
III – que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;
IV – que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;
V – quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;
VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
§ 1º – É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.
§ 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
§ 3º Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
Fazendo a exata contabilidade dos votos, tivemos o seguinte:
– cinco ministros afirmaram que, ao arrepio da Constituição, o Supremo impõe a medida cautelar que quiser ao parlamentar, incluindo o afastamento do mandato, e tal decisão é auto-aplicável. Foram eles: Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Celso de Mello.
– cinco ministros afirmaram que, ao arrepio da Constituição, o Supremo impõe a medida cautelar que quiser ao parlamentar, incluindo o afastamento do mandato, e tal decisão é auto-aplicável. Foram eles: Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Celso de Mello.
– cinco ministros consolidaram uma
posição: as medidas cautelares podem ser aplicadas, em situação
excepcionalíssima, mas têm de passar pelo crivo da Casa a que pertence o
parlamentar. Na verdade, Alexandre de Moraes, que abriu a divergência,
Gilmar Mendes e Marco Aurélio, inicialmente, recusavam as cautelares.
Acabaram aderindo ao voto de Dias Toffoli, que as admite em situação
excepcional, desde que submetidas ao Parlamento. Assim também votou
Ricardo Lewandowski: 5 a 5
Coube a Cármen o voto de Minerva, e ela
era o sinônimo do patético como “terror” e “tragédia”. Ela sabia que as
redes sociais queriam sangue. Ela sabia que o maior grupo de comunicação
também queria as artérias abertas dos políticos. Mas tinha consciência
de que, no curso de seu mandato, um choque inédito poderia se dar entre
Judiciário e Legislativo. Decidiu, então, algo exótico: o
afastamento haveria de ser submetido à Câmara ou ao Senado, mas não as
demais medidas. Nova confusão. Como resumir o que queria aquela
atrapalhada senhora? Celso de Mello veio em seu socorro: passará pelo
crivo parlamentar toda medida cautelar que interferir no exercício pleno
e regular do mandato. E por que a confusão de Cármen? É que ela estava
com medo.
Seu voto era mais próximo do de
Alexandre de Moraes, que abriu a divergência, do que do de Fachin, o
relator. Mas ela insistia que votava com Fachin — não queria ficar de
mal com a galera. Instaurou-se a confusão, e o próprio
Fachin, não sei se num rasgo de bom senso ou para assustá-la ainda mais,
resumiu mais ou menos com estas palavras: “Presidente, Vossa Excelência
não está alinhada com o meu voto; são seis votos a cinco em favor da
submissão da decisão à Casa Legislativa. Meu voto foi vencido”.
Mas ela insistia que não! Tinha medo de,
ao QUASE cumprir a Constituição, em vez de rasgá-la, ser considerada
uma pessoa leniente com a corrupção. Assim, meus caros, vivemos dias em que
cumprir a Constituição, garantindo aos parlamentares brasileiros
prerrogativas que existem em todas as democracias do mundo, se confunde
com tolerância com a corrupção. Por 6 a 5, em suma, caberá ao Congresso
referendar ou não as cautelares, como já lhe cabe fazer sobre a prisão
preventiva. Tempos sombrios.
Como enfrenta-los? Ora, com coragem! E
esta, visivelmente, faltou a Carmen na hora do seu “patético momento”.
Convenham, aquilo não é pra ela!
VEJA TAMBÉM: O É DA COISA: O que se viu no Supremo foi um espetáculo de falta de puder na toga. Feio!
VEJA TAMBÉM: O É DA COISA: O que se viu no Supremo foi um espetáculo de falta de puder na toga. Feio!
Nenhum comentário:
Postar um comentário