Crescemos menos que a média mundial, menos que os ricos, menos que os emergentes, menos que a América Latina
O FMI não é dado a celebrações. Procura sempre manter um tom
neutro em seus elaborados documentos. Mas o Panorama Econômico Mundial
divulgado nesta semana parece, em vários momentos, uma celebração do
crescimento global. Em comparação ao documento de abril, o cenário
básico para 2017 e 18 ganhou em qualidade e quantidade. O ciclo de
aceleração verificado agora é mais rápido, mais forte e está mais
espalhado.
Não se trata de "apenas" uma recuperação, diz o FMI, mas
de um claro momento de expansão. O desastre 2008/09 está superado, os
países reagiram, fizeram ajustes e voltaram ao crescimento, que é ou
deve ser a situação normal de uma economia capitalista. Ah! sim, o
capitalismo escapou de mais uma e segue por aí.Dadas as proporções e a natureza diferente da crise
financeira, os programas de combate e recuperação tiveram de incluir
novos ingredientes de política econômica. Nada que já não fosse
conhecido ao menos nos livros, mas as combinações aplicadas certamente
foram diferentes.
E tudo com ajuste fiscal. Ainda nos EUA, o déficit das
contas públicas foi de 10% do PIB em 2009 - um resultado horroroso -
para menos de 3% já em 2014. Pois é, o governo primeiro gastou - e tinha
estrutura ajeitada para isso - e depois voltou ao ajuste. Alguns dirão: isso porque são os Estados Unidos, o centro da economia global, exploram o mundo todo. Então vamos para a Espanha - um caso central no debate
pós-crise 2008/09. A Espanha estava quebrada, no público e no privado.
Governo, empresas e famílias excessivamente endividadas. Recessão e
desemprego em alta. A União Europeia foi ao resgate de um de seus principais
membros. Topou alguns gastos cíclicos, mas exigiu do governo espanhol um
severo programa de equilíbrios de contas e reformas, incluindo
trabalhista e previdenciária (é, sempre a dupla). Alguns diziam: vão acabar de matar os espanhóis.
No último relatório do FMI, a Espanha aparece bastante
bem, crescendo pouco mais de 3%. O déficit público, que ultrapassava os
11% do PIB em 2009, caiu para a faixa dos 4%. O desemprego permanece
alto por motivos estruturais - foi de 19% no ano passado - mas passava
dos 26% em 2013. Portugal passou por um processo idêntico, com resultados
melhores no quesito contas públicas e desemprego (hoje em 10%). Cresce
menos que a Espanha, na casa do 1,5% ao ano, que é fraco mas maior que -
adivinhe - o do Brasil. O ritmo de crescimento brasileiro está em aceleração, como
no mundo, mas é preciso notar: o Brasil cresce menos que a média
mundial, menos que os ricos, menos que os emergentes, menos que a
América Latina.
Enquanto os outros mantinham políticas tradicionais de
ajuste pós-crise, o Brasil de Lula e Dilma meteu-se na aventura da “nova
matriz econômica", que era o velho populismo latino-americano. Enquanto
os outros se preparavam para a arrancada, mantendo contas públicas
equilibradas, com inflação baixa e, pois, juros baixos, a "nova matriz"
levava o Brasil a mais de dois anos de recessão - e isso com inflação
alta e juros altíssimos. Um desastre completo. Enquanto os outros agora entram no ciclo de expansão, o
Brasil está numa atrasada e moderada recuperação. Essa recuperação é
resultado direto da mudança da política econômica no pós-Dilma, com a
introdução de medidas de controle de gastos públicos (lei do teto, por
exemplo) e algumas reformas (trabalhista). Em resumo, com anos de
atraso, o país volta ao ajuste.
Só que no meio de uma enorme crise política, ética e
institucional, que deixa em dúvida a continuidade da política econômica
agora e no próximo governo. Paciência. O pior que se pode tentar é esquecer o ajuste
em nome de uma suposta calmaria política. Só atrasaria a recuperação e
não resolveria a política.
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