Corrupção não é crime menor, reclama magistrado Bretas ao libertador Gilmar
Dono da chave das
cadeias que o juiz Marcelo Bretas enche, Gilmar Mendes, o libertador, abriu nesta segunda-feira a
cela de quatro encrencados na Operação
‘Câmbio, Desligo’: Rony
Hamoui, Paulo Sérgio Vaz Arruda, Athos Albernaz Cordeiro e Oswaldo Prado
Sanches. Com isso, subiu para 19 o número de presos que Gilmar mandou soltar
entre os dias 15 de maio a 4 de junho. Descontando-se três finais de
semana, foram 15 dias de expediente regular. O que faz de Gilmar um candidato
ao livro dos recordes, com a notável marca de 1,26
habeas corpus por dia.
Em ofício endereçado a
Gilmar, o juiz da Lava Jato no Rio de Janeiro anotou: ''Casos de corrupção e delitos
relacionados não podem ser tratados como crimes menores, pois a gravidade de
ilícitos penais não deve ser medida apenas sob o enfoque da violência física
imediata. Os casos que envolvem corrupção de agentes públicos têm enorme
potencial para atingir, com severidade, um número infinitamente maior de
pessoas.'' Entre os argumentos esgrimidos por Gilmar está o de que os crimes supostamente praticados pelos presos que ele manda
soltar são antigos. E não envolveram ameaças ou violência física. De
resto, o libertador avalia que o encarceramento não ajuda no esforço para
recuperar o dinheiro desviado, “pois recursos ocultos podem ser movimentados
sem a necessidade da presença física do perpetrador.”
O ministro alega que as prisões
não se justificam. Gilmar substitui o encarceramento por medidas cautelares.
Coisas como a proibição de conversar com outros investigados e o veto a
viagens ao exterior. Debruçando-se sobre a mesma legislação, Bretas chega
a conclusões opostas: ''A repressão à organização criminosa que teria se
instalado nos governos do Estado e município do Rio de Janeiro haveria, como de
fato houve, de receber deste juízo o rigor previsto no ordenamento jurídico
nacional e internacional.'' No seu ofício, o juiz da Lava Jato
mencionou o caso de Orlando Diniz, o ex-presidente da Federação do Comércio do
Rio, cuja cela Gilmar destrancou na semana passada. Bretas associou o
personagem ao ''desvio de vultosas quantias''. Dinheiro usado para
custear a organização criminosa estruturada pelo ex-governador Sérgio Cabral.
Nas palavras do juiz, Orlando
Diniz ''utilizava de sua atividade empresarial para fomentar os negócios da
organização criminosa e, ao mesmo tempo, se beneficiava dos esquemas
engendrados pelo esquema espúrio para ocultar o capital público desviado para
si''. Os quatro libertados nesta segunda-feira —Hamoui, Arruda,
Cordeiro e Sanches—estão encalacrados na ramificação da Lava Jato que levou
à vitrine uma rede internacional de movimentação de dinheiro sujo. Um
esquema encabeçado pelo “doleiro dos doleiros”: Dario Messer, que
fugiu. Curiosamente, Gilmar manteve na tranca um investigado na mesma
operação: Sérgio Mizrahy. Alegou que, “além de realizar operações de câmbio,
ele atuava como agiota.” Vai entender! A agiotagem merece cana, porque
coloca em risco a “ordem pública”. A lavagem de milhões, não. [a agiotagem é mais danosa a integridade física de suas vítimas,
visto que os agiotas não vacilam em praticar qualquer violência para coagir a
vítima - violência que não se limita apenas a pessoa do devedor, alcançando
todos os seus familiares.
A corrupção é danosa, repugnante, em todas suas formas; mas,
quando atinge recursos da Saúde Pública, da Segurança e da Educação também
causa danos irreparáveis ou de dificil recuperação.]
Bretas colocou-se à
disposição de Gilmar para prestar os esclarecimentos que o Supremo julgue
necessários.
Despediu-se com “protestos de elevada estima e consideração.” É
improvável que Gilmar volte atrás em suas decisões. Em abril, ao analisar no
plenário do Supremo a situação do Brasil, o ministro dissera: “É como se o
diabo nos tivesse preparado um coquetel”. Não é negligenciável a hipótese
de que uma parte do martini diabólico tenha sido derramado na água de Brasília.
Blog do Josias de Souza
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