Assim como Vélez, há uma fila de embaixadores esperando o ‘bilhete azul’ que não vem
A demissão de Ricardo Vélez Rodríguez do MEC foi decidida antes da
viagem a Israel, em 30 de março, e anunciada pelo presidente Jair
Bolsonaro três dias antes de ser formalizada e finalmente publicada
ontem no Twitter e no Diário Oficial. Se parece esquisito, não é caso
único e não será o último. Bolsonaro também anunciou no dia 13 de março, antes da ida aos EUA, que
iria trocar 15 embaixadores, inclusive Sérgio Amaral, de Washington. Deu
um motivo para o “bilhete azul” num encontro com jornalistas: “Não está
vendendo uma boa imagem do Brasil no exterior”. E para ser só na volta:
ficaria muito ruim às vésperas de chegar ao país.
O presidente foi para os EUA no dia 17, voltou, foi ao Chile, voltou,
foi a Israel, voltou. Mas os embaixadores continuam exatamente onde
estavam, como almas penadas. O que mudou, nesse meio tempo, foi o número
dos que estavam com os dias contados. Se Bolsonaro havia falado em 15, a lista que o chanceler Ernesto Araújo
enviou para a Casa Civil continha três vezes mais nomes, em torno de 45
embaixadores que ocupam efetivamente embaixadas ou consulados e chefias
de representações do Brasil em organismos internacionais nos diferentes
continentes. Entre eles, seis estão se aposentando neste ano. Os demais
entram na dança das cadeiras. Até agora, porém, praticamente um mês depois do anúncio feito pelo
próprio presidente da República, ninguém veio, ninguém foi para posto
nenhum. O próprio embaixador Sérgio Amaral, nomeado no governo Michel
Temer, não só continua em Washington como participou ativamente da
viagem de Bolsonaro e, agora, participa da visita do vice Hamilton
Mourão.
O tempo vai passando e Amaral vai ficando. Ele já estava fazendo as
malas, arrumando as gavetas, cuidando das conveniências da família,
quando o Itamaraty deu uma contraordem, mandou parar tudo e aguardar
novas orientações. Que ainda não chegaram, provavelmente porque alguém
deve ter feito as contas: quanto custa a mudança de mais de 40
diplomatas? Sérgio Amaral não é Vélez Rodríguez nem causou tanta confusão, tanto
rebuliço, tantas demissões e tantos recuos, mas sofre nesses três meses o
mesmo processo que atingiu o agora ex-ministro da Educação: fica no
limbo, sabendo de seu destino pela mídia.
Assim como ele, embaixadores brasileiros pelo mundo afora, na Europa, na
Ásia, na África, nas Américas. E, claro, seus assessores diretos, sejam
diplomatas, sejam funcionários. Em consequência, suas famílias. Se há insegurança entre os que saem, há também entre os que podem
entrar. Para Washington, o vice Mourão queria o cientista político
Murillo de Aragão, da consultoria Arko Advice, um frequentador assíduo
da Vice-Presidência. Já a cúpula do Itamaraty preferia o embaixador de
carreira Nestor Forster, do grupo de Ernesto Araújo. Os dois enfrentam
resistências e obstáculos concretos para assumir o que é, nada mais,
nada menos, a embaixada mais importante do Brasil. Aliás, de todos os
países.
No MEC, sai Vélez, filósofo, e entra Abraham Weintraub, um homem das
finanças, mas uma coisa é certa: a ideologia fica. Além de professores
universitários, ambos são também arraigadamente de direita,
conservadores nos costumes, simpatizantes das ideias do tal guru Olavo
de Carvalho. Lembram-se daquela velha corrente que via comunistas em
toda a parte, até debaixo das camas das famílias brasileiras? Agora, é acompanhar a montagem da equipe e identificar os impostos por
Olavo de Carvalho, os indicados pelos militares e os simplesmente
técnicos, que querem ver o ministério andar. Sim, porque a Educação está
paralisada. Mas a guerra no ministério continua.
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo
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